Introdução
O presente estudo ancora-se no objetivo de fazer um levantamento historiográfico das produções acadêmicas relacionadas às concepções pedagógicas para o ensino de línguas no Brasil no século XIX, mais especificamente no período imperial, as quais foram defendidas nos Programas de Pós-Graduação em Educação e de Letras no Brasil, bem como publicações de artigos e capítulos de livros publicados em anais e revistas. A busca pela contemplação do objetivo proposto nos levou a compreender como se deu a produção dos referidos estudos e, para isto, identificamos os temas abordados nas pesquisas, os referenciais teóricos utilizados nas investigações, as metodologias adotadas nas pesquisas, as regiões e os estados do país estudados nos Programas de Pós-Graduação, Congressos e as Instituições de Ensino Superior (IES) em que foram produzidas[i].
A escolha metodológica está pautada na base de dados do Banco Virtual de Teses e Dissertações da CAPES. Com o desenvolvimento metodológico apontado foi possível realizar um levantamento dos dados investigados, bem como identificou a produção sobre a temática dessa pesquisa - sua amplitude, tendências teóricas, vertentes metodológicas, dentre outros aspectos. Segundo Soares (1993), esses estudos são necessários no processo científico para a ordenação periodicado conjunto de informações e resultados já obtidos, favorecendo a organização que mostre a integração e a configuração emergentes, as diferentes perspectivas investigadas, os estudos recorrentes, as lacunas e as contradições.
O estudo da História de uma disciplina escolar em um programa de ensino deve buscar as finalidades com que foram criadas e possibilitaram sua permanência e institucionalização no currículo prescrito, apreender por quais motivos determinados conteúdos, compêndios e metodologias foram inseridos ou subtraídos no cotidiano da escola. Assim sendo, podem revelar os rumos tomados por determinada instituição, a fim de consolidar-se como centro material magnético do local social em que está inserida e nos possibilita ampliar o campo de investigação nesse sentido (CHERVEL, 1990).
A História da Educação permitiu o diálogo com a história das disciplinas e da cultura escolar à qual vem se configurando como importante área de estudo, fornecendo novo olhar para escola de outros tempos e lugares (JUNIOR; GALVÃO, 2005).
Segundo Viñao (2008), o estudo das disciplinas escolares deve ainda procurar uma aproximação, na medida do possível, às práticas escolares e à realidade em classe através de memórias, exames, informes, diários e cadernos de aula, documentos particulares, etc. É preciso observar o peso atribuído às disciplinas escolares nos planos de estudo, e o discurso que leva à construção, inserção e permanência de uma disciplina no programa de ensino.
Mesmo não sendo o objetivo proposto neste estudo, é necesário, em uma pesquisa mais ampla, realizar a análise, categorizar e revelar os múltiplos enfoques, perspectivas e as ideias pedagógicas que orientaram sua inserção no programa de ensino. Para Soares (1993, p. 4), num estudo dessa natureza é importante considerar “categorias que identifiquem, em cada texto, e no conjunto deles as facetas sobre as quais o fenômeno vem sendo analisado”. Com isso, optamos por fazer um balanço das respectivas áreas de conhecimento, com a finalidade de diagnosticar temas relevantes para nossa pesquisa, verificando os conceitos e informações nelas contidas. Nesse caso, buscamos estabelecer relação com produções anteriores relacionadas a esse campo de pesquisa dentro do espectro temporal, tais como: obras que tratem acerca de referências pedagógicas nacionais e internacionais utilizadas por educadores brasileiros, pesquisas sobre o ensino de línguas e estudos relacionados as obras dos autores analisados na presente escrita. Por certo, com esse levantamento consolidamos uma área de conhecimento que se constitui como um guia de orientações de práticas de pesquisas com definições e parâmetros para formação de novos pesquisadores e profissionais que atuam na área.
[i] Esse texto é parte da minha pesquisa em construção intitulada História das ideias pedagógicas no Brasil: o caso do ensino de línguas estrangeiras (1823-1890), realizada no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Sergipe.
1. Entre Teses e Dissertações: estudos sobre as ideias pedagógicas voltadas para o ensino de línguas.
A composição de uma disciplina e seus conteúdos não é uma construção simples nem tão pouco descomprometida, mas são pensadas em sintonia com designações políticas, econômicas, culturais e religiosas. Cabe ao historiador ao navegar nesse campo, observar as finalidades de objetivos e finalidades reais que levaram à criação, permanência, extinção ou institucionalização de determinada disciplina no programa de ensino. Nesse sentido, podem revelar e ampliar o campo de investigação da história da educação (CHERVEL, 1990). Por fazer parte do mecanismo de aprendizagem, a pedagogia, é, por conseguinte importante no processo de aquisição do conhecimento, na adoção de determinados conteúdos de estudo e promove assimilação do conhecimento científico de forma efetiva.
A busca por meios que facilitassem a aquisição de conhecimentos adequados e considerados úteis a sociedade, levaram os pensadores brasileiros da educação a pensar na construção de propostas pedagógicas para instrução pública, limitados pelas restrições e as convenções “de maneira mais ou menos clara conforme a posição que ocupam nas relações de dominação o que lhes é possível pensar, dizer e fazer e pelas capacidades inventivas dos indivíduos ou das comunidades” (CHARTIER, 2007, p.49), o que acaba por influenciar as formas de pensar, as questões socais e educacionais de uma geração impactando os programas de ensino e na composição das disciplinas escolares. As disciplinas escolares voltadas ao ensino de línguas são resultantes desse alinhamento entre as propostas pedagógicas educacionais mais ou menos em sintonia com o pensar pedagógico de um determinado tempo e espaço.
Portanto, revelar os múltiplos enfoques de uma disciplina além de significar adotar um objeto cultural como centro de investigação, também revela práticas e saberes até então desconhecidos, tendo em vista que, para a história todo acontecimento é singular e vai adquirir um significado a depender do cenário no qual está inserido, das fontes selecionadas, criticadas e articuladas pelo historiador (VEYNE, 1998).
Assim sendo, as pesquisas compulsadas, ganham relevância e colaboram para o diálogo com o objeto de estudo de tese doutoral sobre a “História das Ideias Pedagógicas para o Ensino de Línguas no Brasil Império”, pois como afirma Chartier (1990), a leitura de um texto permite acessar informações, autores e fontes que são importantes para a construção de uma escrita, revelando possíveis caminhos para futuras pesquisas em diversos campos.
Segundo Almeida Filho (2015), a atuação de profissionais da Grande Área da Linguagem, envolvidos em carreiras regulares ou complementares constituiu um espaço de ocupação que levou aos estudos teóricos e demandou mudanças na formação profissional por parte desses agentes. Assim, o campo de Ensino de Línguas, seu estudo, o ensino e aprendizagem, exigiram também, a inclusão de formação adequada dos agentes envolvidos nos processos de aquisição de ensino, ou seja, professores, alunos e outros indivíduos circunscritos nessa área de formação, bem como demandou o trabalho de cunho historiográfico que nos permitem entender os processos de construção do saber relacionado a esse tipo de estudo. Segundo o autor:
Os historiadores usam várias fontes de informação para (re)construir a sucessão de processos históricos como, por exemplo, escritos, gravações, entrevistas (História Oral) e achados arqueológicos. Algumas abordagens são mais frequentes em certos períodos do que em outros. O historiador procura no presente, respostas sobre o passado, ou seja, é influenciado pelo presente na sua interpretação densa. Historiografia significa “escrita da história”. Tanto no sentido de “como a história deve ser escrita” (uma teoria e uma metodologia da história), quanto no sentido de “como a história foi escrita” (uma história da história). As universidades e associações de professores de línguas vão se beneficiar muito dos estudos de cunho histórico no âmbito da aprendizagem e do ensino de línguas (ALMEIDA FILHO, 2015, p.220).
Partindo desse pressuposto, o levantamento de trabalhos que tratem do ensino de línguas no país, trazem imbuídos de igual forma, os debates encabeçados por intelectuais em torno de ideias pedagógicas que foram ou não consubstanciadas em determinado tempo e espaço e nos ajudam a entender como as reformas foram implementadas na educação daquela época, e servem de referência para elaboração de outros estudos linguísticos. Nesse sentido, elencamos os trabalhos de Teses e Dissertações encontradas no banco de dados da CAPES, e abordamos posteriormente sobre o objeto de estudos de cada obra.
TABELA 1 – TESES E DISSERTAÇÕES DO BANCO DA CAPES
Nº |
Titulo |
Autor (a) |
Programa |
Curso |
Ano |
|
O projeto de Rui Barbosa: o papel da educação na modernização da sociedade. |
Maria Cristina Gomes Machado |
FE UNICAMP/SP |
Tese |
1999 |
|
A instituição do ensino das línguas vivas no Brasil: o caso da Língua inglesa (1809-1890). |
Luiz Eduardo Menezes de Oliveira |
EHPS PUC/SP |
Tese |
2006 |
|
As leituras pedagógicas de Sílvio Romero. |
Cristiane Vitório de Souza |
PPGED UFS/SE |
Dissertação |
2006 |
|
Josefa Eliana Souza. |
EHPS PUC/SP |
Tese |
2006 |
|
|
De La Salle a Lancaster: os métodos de ensino na Escola de primeiras letras sergipana (1825-1875). |
Luis Siqueira |
PPGED UFS/SE |
Dissertação |
2008 |
|
Das aulas avulsas ao Lyceu Provincial: as primeiras configurações do ensino secundário na Província da Parahyba do Norte (1836 -1884). |
Cristiano Ferronato |
PPGDH UFPB/PB |
Tese |
2012 |
|
Políticas Linguísticas para o Ensino de Língua Estrangeira no Brasil do século XIX, com ênfase na Língua Inglesa. |
JoselitaJunia Viegas Vidotti |
FFLCH USP/SP |
Tese |
2012 |
|
As vitrines da civilização: referências estrangeiras na instrução pública em Minas Gerais no século XIX. |
Rita Cristina Lima Lages
|
FAE UFMG/MG |
Tese |
2013 |
|
A profissão docente como prática ilustrada: o caso dos primeiros professores de inglês do Brasil |
Marcle Menezes Vanessa Santana |
PPGL UFS/SE |
Dissertação |
2013 |
|
A presença da concepção educacional de Condorcet nos primeiros projetos de instrução pública do Brasil independente e sua ausência na legislação aprovada (1822-1857). |
Itamaragiba Chaves Xavier |
PPGEDU UFPEL/RS |
Tese |
2015 |
|
Entre a tradição e a inovação: professores e compêndios de inglês do século XIX.
|
Elaine Maria Santos |
PPGED/ UFS |
Tese |
2017 |
10 |
Os Estados Unidos como nação-modelo no Brasil oitocentista: o caso da instrução pública (1823-1888) |
Augusto Santos |
PPGED/ UFS |
Dissertação |
2017 |
11 |
Written in Black and White: o ensino de Língua Inglesa no Atheneu Sergipense (1870-1877) |
Waldinei Santos Silva |
PPGED/ UFS/SE |
Dissertação |
2017 |
12 |
José Veríssimo (1857-1916), intelectual amazônico: geração de 1870 e a educação do Grã-Pará (1877-1891). |
Felipe Tavares de Moraes |
PPED/ USP/SP |
Tese |
2018 |
13 |
O inglês como língua dos negócios: o caso da instrução comercial luso-brasileira (1759-1902). Tese de Doutorado UFS. 2019. |
Thadeu V. S. Teles |
PPGED/ UFS |
Tese |
2019 |
Fonte: Capes, 2019.
Essas Teses e Dissertações apresentam estudos sobre as metodologias para a educação primária e secundária, o funcionamento da instrução pública, o ensino de línguas, os decretos Imperiais e Ministeriais sobre a educação, o pensamento dos filósofos que debatiam e propunham modelos e ações voltadas às questões educacionais, as referências às nações desenvolvidas como modelo a ser seguido e as leis que regulamentavam a instrução pública no Brasil. Podemos afirmar que elas acrescentaram referências que ajudaram a ampliar o entendimento sobre a educação no século XIX e sinalizaram as possibilidades e os direcionamentos que contribuíram para nortear e ampliar nossa pesquisa sobre o pensamento pedagógico dos intelectuais da educação brasileira no campo da educação e sobre as ideias pedagógicas voltadas para o ensino de línguas.
Optamos por elencar as pesquisas por ano de defesa em que ocorreram. Assim, entre os textos examinados, destacamos a tese de Machado (1999), defendida na UNICAMP, denominada “O projeto de Rui Barbosa: o papel da educação na modernização da sociedade”. A autora faz um estudo sobre a contribuição de Rui Barbosa para a proposta de modernização da instrução entre 1878 e 1892, e como se processou esse movimento educacional na transição do Império para a República. Para a pesquisadora, Rui Barbosa experenciava um momento de pensamento de mundo globalizado e, por isso, considerava que o país precisava abandonar as ideias escravocratas para modernizar a sociedade através da industrialização e da educação. Para a efetivação desse processo desenvolvimentista, o conteúdo científico seria o mais apropriado para a formação profissional e do cidadão. O seu projeto para instrução foi resultado de leituras de obras internacionais oriundas de países que realizavam experiências bem-sucedidas de ensino e se tornaram objeto de discussão no Brasil. A autora concluiu que, embora as concepções de Rui Barbosa fossem importantes para a modernização da nação, encontraram barreiras, uma vez que, a sociedade burguesa brasileira ainda estava em via de desenvolvimento desse pensamento de educação para todos, e, portanto, ainda longe da democratização do ensino em âmbito nacional.
A pesquisa de Oliveira (2006), intitulada “A Instituição do Ensino das Línguas Vivas no Brasil: o caso da Língua inglesa (1809-1890)”, tese defendida na PUC de São Paulo, que investigou o processo de institucionalização do ensino das Línguas Vivas no Brasil, bem como de sua configuração como disciplina escolar, com destaque para o caso específico da Língua Inglesa. De acordo com o autor, o processo de institucionalização das línguas vivas no Brasil como disciplina escolar é resultado de políticas culturais e pedagógicas. O conhecimento das línguas vivas simbolizava o acesso ao moderno e ao século das luzes e da ciência. Ao lado da finalidade instrumental pelo seu caráter ilustrado, uma vez que dava acesso às obras científicas e intelectuais das nações cultas da Europa e dos Estados Unidos. A Língua Inglesa passou a adquirir uma finalidade utilitária no momento de abertura dos portos brasileiros ao comércio estrangeiro e pela necessidade da Inglaterra conquistar novas possibilidades de comércio devido ao embargo promovido por Napoleão Bonaparte. De caráter elitista, as línguas estavam ligadas a uma classe privilegiada da sociedade e de acesso aos cargos de prestígio social. Em seu estudo, o autor concluiu que as disciplinas de línguas no processo de institucionalização atenderam três finalidades: a primeira de 1809 a 1837, quando as línguas modernas possuíam uma finalidade instrumental de acesso ao conhecimento científico; a segunda que vai de 1837 a 1870, que, além do caráter instrumental, assumiu uma finalidade literária com a criação do Colégio de Pedro II, e a terceira que abrange 1870 a 1890, que manteve a finalidade instrumental e literária, passando a assumir uma finalidade prática com introdução de elementos de oralidade. Ao inserir estudos sobre filósofos que contribuíram para os debates pedagógicos sobre a educação oitocentista no país, sua pesquisa sinalizou referências para o nosso objeto de estudo.
Souza (2006), em sua dissertação intitulada “As leituras pedagógicas de Sílvio Romero”, UFS, objetivou analisar os estudos de obras pedagógicas empreendidas por Sílvio Romero. A autora desdobrou-se em analisar as competências e as práticas de leitura do intelectual sergipano, traçando um perfil da Biblioteca Pedagógica, para além de compreender como esse intelectual se apropriou das leituras de Herbert Spencer, Edmond Demolins, Paul Rousiers, Henri de Tourville e Vacher de Lapouge. A pesquisadora concluiu que a partir das competências que adquiriu tanto na educação formal quanto na informal, Sílvio Romero tornou-se um leitor crítico das letras nacionais e estrangeiras e apropriou-se dos livros analisados de modo ativo, construindo representações que lhe permitiam pensar a educação brasileira. Para a autora, Sílvio Romero ao tomar as leituras desses pensadores estrangeiros, buscou filtrar as ideias pedagógicas propostas por eles para adaptar à realidade brasileira, propondo modelos de educação que possibilitassem desenvolver o progresso do país, e preconizou o ensino de caráter científico conforme Spencer, mas com a permanência de algumas disciplinas clássicas no programa de ensino.
Souza (2006), produziu a obra Uma compreensão a partir de referente norte-americano do "Programa de Instrução Pública" de Aureliano Candido Tavares Bastos (1861-1873). Em sua Tese de doutorado, a historiadora examinou os escritos de Aureliano Cândido Tavares Bastos produzidos na década de 60 e 70 do século XIX, retratando as discussões sobre a educação brasileira registradas nas obras: A Província, Cartas do Solitário e Os males do presente e as esperanças do futuro. Segundo a pesquisadora, Tavares Bastos entendia que a mudança moral e a regeneração civilizatória do país viriam pela reforma da instrução pública. O Brasil poderia se tornar uma nação desenvolvida tomando como base o modelo sociocultural e de educação americanos. Ao analisar as apropriações de Tocqueville e Horace Mann nos escritos de Tavares Bastos, concluiu que o político se pautou no pensamento de Tocqueville, que considerava ser positivo o papel dos imigrantes na América, afirmando que o Brasil também deveria abrir os portos a imigração americana como forma de regeneração moral do povo brasileiro, e incorporou os elementos propostos por Horacce Mann para educação, tais como, liberdade de ensino, ensino público obrigatório pautado em conhecimentos úteis. Esses princípios poderiam ser utilizados adaptando-os à realidade brasileira.
A dissertação de Siqueira (2008), “De La Salle a Lancaster: os métodos de ensino na Escola de Primeiras letras sergipana (1825-1875)”, UFS, pesquisou as escolas de primeiras letras no século XIX e seu processo de escolarização para a população em idade escolar. De acordo com o autor, os administradores da província buscavam recorrer à tecnologia pedagógica moderna para essas escolas como o método lancasteriano e de La Salle. Essas escolas de primeiras letras deveriam formar um homem capaz de respeitar as leis imperiais e a religião professada pelo Império, garantindo dessa forma condição de governabilidade a partir da década de 1870. O pesquisador concluiu que os administradores provinciais se apropriaram das ideias de Pestalozzi e Basedaw, passando a indicar uma metodologia de ensino emprestadas da França e da Inglaterra por terem se tornado modelos de civilização, e que no século XIX, as escolhas por um modelo de ensino eram políticas e visavam à instrução da classe trabalhadora para servir a Nação.
Ferronato (2012), em sua tese intitulada Das aulas Avulsas ao Lyceu Provincial as primeiras configurações da instrução secundária na província da Parahyba do Norte (1836-1854), discutiu as transformações ocorridas no ensino secundário paraibano no período compreendido entre as primeiras iniciativas de organização do Estado Nacional Brasileiro Imperial e as vésperas da República. A sua pesquisa aponta que a criação do Liceu da Paraíba do Norte esteve inserida no processo chamado pacto imperial estabelecido entre as elites provinciais com o poder central, particularmente, conduzido pelos liberais simpáticos às ideias estrangeiras. A educação entraria como elemento significativo na construção da nação ao prover quadros para gerir a máquina administrativa e atuar na sociedade civil. Esse pensamento, passou a ser alvo de debates na primeira Assembleia Constituinte em 1823. O ideal defendido pela classe burguesa seria a criação de uma educação com caráter e identidade nacional. Ao trazer as discussões em torno da educação, o pesquisador sinaliza o programa de educação proposto por Martim Francisco Ribeiro d’Andrada Machado, que não logrou êxito em sua efetivação por questões políticas.
Na tese de Vidotti (2012), intitulada “Políticas Linguísticas para o Ensino de Língua Estrangeira no Brasil do século XIX, com ênfase na Língua Inglesa”, USP, a pesquisadora elegeu como objeto de estudo o discurso político-educacional sobre o ensino de língua estrangeira no Brasil no século XIX, examinou o ensino de línguas estrangeiras na educação brasileira, afirmando que a consolidação das línguas inglesa e francesa no Brasil iniciou no s&e
Conclusão
Os trabalhos relacionados à História das disciplinas escolares estão circunscritos a grande área de História da educação. A pesquisa ainda demonstrou que os estudos não englobam em sua maioria todas as disciplinas, mas tratam de disciplinas isoladas, ou com foco em uma determinada língua, e tem sido respaldado também em relatórios ministeriais, relatórios dos presidentes das províncias, compêndios e discursos dos intelectuais da época. As pesquisas são voltadas para um determinado local, ou região e se concentram em grande parte em análises pontuais de uma disciplina, uma instituição, um curso ou uma aérea específica de formação. Por isso, são menos abrangentes levando em conta a extensão do país, e por vezes fragmenta o entendimento mais abrangente da História da educação brasileira.
Os grupos de pesquisa voltados para esse campo possibilitam ampliação do conhecimento nessa área de estudos. As pesquisas, por exemplo, do grupo NECUFS- Núcleo de Estudos e Cultura da Universidade Federal de Sergipe, encabeçadas pelo professor Doutor Luis Eduardo Menezes de Oliveira tem constituído em um polo para pesquisas relacionadas às línguas.
De igual forma, o professor Doutor José Carlos Paes de Almeida Filho tem conduzido estudos na área de Linguística Aplicada da Universidade de Brasília com o projeto denominado Perspectiva de um Modelo Global da Formação e Práticas Renovadoras e da Epistemologia da Disciplina Ensino de Línguas, que são pesquisas voltadas para história das instituições e do ensino de línguas no país.
Destarte, o levantamento das produções acerca das ideias pedagógicas voltadas ao ensino de línguas no Brasil Império apontou um número reduzido de estudos. A temática apresenta uma lacuna a ser preenchida, a fim de que se possa compreender como ocorreram as apropriações dessas concepções pedagógicas, se de fato aconteceram, e até que ponto chegaram a nortear os rumos da educação, bem como até que ponto tais concepções contribuíram para o desenvolvimento da educação no País no que tange as disciplinas de línguas estrangeiras e nacional. A profusão de textos produzidos por esses políticos e intelectuais remetem a leituras acerca da escolarização brasileira no século XIX. Conforme atenta Juliá (2011), sobre a metáfora aeronáutica da “caixa preta”, cabe aos pesquisadores envidar esforços para garimpar em algum documento empoeirado pelo tempo, informações que possam jogar uma luz no passado.
Esse texto é parte da minha pesquisa em construção intitulada História das ideias pedagógicas no Brasil: o caso do ensino de línguas estrangeiras (1823-1890), realizada no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Sergipe.
Referências
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