Este artigo apresenta algumas possibilidades de utilização da Análise do Comportamento Aplicada – ABA - no caso de crianças no Transtorno do Espectro do Autismo, visando o aperfeiçoamento de sua psicomotricidade no contexto da Educação Inclusiva. Assim sendo, destaca-se, inicialmente, que a tipicidade, relativa ao referido transtorno do neurodesenvolvimento, encontra-se especificada no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM -5).
Campos e Piccinato (2019) esclarecem-nos que a palavra “espectro” significa a apresentação de uma amplitude de intencionalidades. Nesse sentido, a criança no TEA apresentaria uma complexidade de manifestações em diversos níveis. Complementando tal ideia, Gaiato (2018) explicita que a criança no Espectro do Autismo apresenta uma série de sintomas que podem ser percebidos de maneira diferente em cada sujeito, de acordo com o nível no qual se encontra.
Dentre os comportamentos mais comuns relacionados ao TEA, destaca-se a falta de comunicação: a dificuldade em falar ou, até mesmo, de se comunicar através de gestos. Consequentemente, ela não consegue compreender o que está acontecendo no seu entorno, dificultando, inclusive, o relacionamento interpessoal.
Outra característica marcante é a manifestação de estereotipias (Campos; Piccinato, 2019); dentre as quais destacam-se: os movimentos pendulares do corpo para frente e para trás; os flappings (chacoalhar de mãos e braços ao lado do corpo, como se os braços fossem asas), manifestados, geralmente, quando as crianças estão felizes, ansiosas ou irritadas; movimentos repetitivos das mãos em torno dos olhos; andar com as pontas dos pés ou ambular de um lado para outro, aparentemente sem sentido ou propósito.
A criança no TEA apresenta, também, outras importantes dificuldades relacionadas ao campo psicomotor, compreendido a interação entre os aspectos psíquicos e motores dos seres humanos, no que se refere ao seu desenvolvimento global. Para tanto, o (a) psicomotricista foca o seu trabalho em diferentes aspectos, que vão do cognitivo aos motores, passando, inclusive, pelo afetivo; buscando fazer com que o (a) assistido (a) tome consciência do seu corpo através do movimento.
Diante disso, compreende-se que o trabalho psicomotor almeja que o (a) assistido (a) desenvolva uma motricidade ampla; organizando o seu corpo através de experiências motoras que estruturem sua imagem e seu esquema corporal (Fonseca; Soares, 2016)
Projeta-se, portanto, uma intervenção integral que trabalhe, concomitantemente, aspectos cognitivos, inteligíveis, sociais, culturais e motores (Périco; Assis; Conter, 2015); envolvendo a maturação neurológica, o desenvolvimento do esquema e da imagem corporal, os processos de lateralidade, as coordenações, o equilíbrio, o ritmo, e, até mesmo, o desenvolvimento cognitivo e da linguagem, que devem ser abordados de maneira conjunta.
Dentre as várias terapias que podem auxiliar ao (à) psicomotricista no desenvolvimento do seu trabalho, destaca-se a psicologia Behaviorista, baseada, resumidamente, no esquema E – R (estímulo – resposta); compreendendo-se resposta como qualquer comportamento resultante do condicionamento; e estímulo como um acontecimento que provoca uma resposta. De acordo com essa ciência, todas as respostas, mas nem todos os comportamentos, são condicionáveis. Assim sendo, todo condicionamento corresponde a uma aprendizagem que responde ao esquema estímulo-resposta; de modo que, caso exista algum comportamento que não se desenvolva de acordo com os princípios que regem o condicionamento, ele não poderá ser considerado nem como um estímulo, muito menos como uma resposta.
Diante do exposto, considera-se este artigo tem por objetivo analisar as possibilidades de aplicação da ciência da Análise do Comportamento Aplicado (Appilied Behavior Analysis – ABA) no aprimoramento da psicomotricidade em uma criança no transtorno do Espectro do Autismo.
Em poucas palavras, podemos dizer que a ABA atua reforçando os comportamentos positivos. Tendo por base tais premissas, destaca-se que este artigo encontra-se estruturado em duas partes. Na primeira, enfatiza-se a importância da ABA para o aprimoramento da psicomotricidade de crianças que se encontram no Transtorno do Espectro do Autismo (TEA); para, na segunda, propor uma de intervenção, na qual se trabalha o aprimoramento psicomotor de uma criança no Transtorno do Espectro do Autismo, fundamentando-se na interação entre os aspectos físicos e cognitivos do/a assistido/o.
Para Compreender a Análise do Comportamento Aplicada
Inicialmente destaca-se que as ações descritas neste artigo baseiam-se na ideia de que o ser humano possui “plasticidade cerebral” (Rota; Briti Filho; Briti, 2016, p. 78). Esta teoria baseia-se na premissa de que as práticas terapêuticas não são aplicadas simplesmente para reparar déficits, mas, também, como possibilidade de ampliação das funções cognitivas e interativas.
A ideia de plasticidade cerebral parte essencialmente da relação indissociável entre o psíquico que é sustentado por um corpo biológico. Assim sendo, tal constatação permiti-nos compreender que o corpo encontra-se diretamente vinculado a um meio, de modo que, de alguma forma, também pode ser capaz de agir sobre este. De posse dessa outra premissa, reforça-se a ideia de que qualquer ação terapêutica deve ter por objetivo desenvolver a capacidade de reorganização da estrutura neuronal do sistema nervoso central do seu assistido. Esta é exatamente a ideia que sustenta a teoria da plasticidade cerebral. Nesse sentido, tal meta configura-se como um importante desafio para a neurologia dos dias atuais; pois se sabe que: “[...] todas as funções corticais superiores envolvidas na cognição, como gnosiais, praxias e linguagem, são expressões da plasticidade cerebral, considerando as modificações em todos os níveis, do molecular ao cognitivo (Rota; Briti Filho; Briti, 2016, p. 81).
Compreende-se, portanto, no caso de assistidos (as) que se encontram no Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), que a ideia de interação com o ambiente só será possível se buscarmos alterar a função perceptiva que ele (a) tem do meio; ressignificando-o como um espaço de conforto e de rotina previsível e, não somente, como um lugar caótico e opressor. Essa reconstrução do campo simbólico somente será possível quando levarmos em conta as construções subjetivas do (a) assistida (a); de modo que através de intervenções no meio, almejem-se modificações no campo neuronal. Como afirmam os autores supracitados:
Assim como ao longo do desenvolvimento, qualquer sujeito é desafiado pelo seu meio a exercer atividade cada vez mais complexas, exigindo que sua estrutura neuropsíquica se ajuste às novas necessidades; nos casos singulares, esse processo também ocorre (Rota; Briti Filho; Briti, 2016, p. 81).
Sabe-se, ainda, que a disfunção da organização cerebral encontrada em sujeitos no TEA, constitui-se no resultado de uma tentativa do seu sistema nervoso de buscar compensar as áreas deficitárias, mediante a elaboração de uma organização cerebral distinta da das outras crianças. Segundo os referidos autores, a constatação da existência dessa tentativa de reordenamento diverso, aponta-nos para a existência de “[...] um elemento de permanente mudança nos espaços neuronais, como forma de obter uma maior adaptação do indivíduo ao seu meio” (Rota; Briti Filho; Briti, 2016, p. 81). São exatamente nesses espaços que a Análise do Comportamento Aplicado (ABA) deve atuar, estimulando o (a) assistido (a) na organização e ampliação de novas organizações neuronais, traduzidas materialmente na aquisição de novas habilidades.
Compreende-se, portanto, que a referida terapia atua basicamente reforçando os comportamentos realizados com sucesso pelo (a) assistido (a), buscando aplicar os princípios da “aprendizagem sem erros”, qual seja: o constante alerta prévio do comportamento que se almeja alcançar, de modo que a resposta seja inevitavelmente correta e satisfatória. Essa ação é repetida quantas vezes sejam necessárias, de modo que, diminuindo progressivamente, permita ao (a) assistido (a) responder corretamente de acordo com a sua própria iniciativa; aumentando, desse modo, sua motivação e, consequentemente, diminuindo suas frustações.
Percebe-se, também, que a aplicação da ABA pressupõe a exigência inicial de um trabalho individualizado, de modo que a criança, ou qualquer sujeito, no TEA, possa alcançar independência na realização de suas ações e, consequentemente, uma melhor qualidade de vida possível à sua condição.
No entender de Lear (2004) a terapia ABA deve desenvolver um programa intensivo com a criança, estruturando sistematicamente as instruções a serem dadas. Assim sendo, a situação ideal é que a terapia se desenvolva, como já foi destacado anteriormente, obedecendo a um esquema individualizado de um terapeuta para cada criança. Este autor ressalta que, se possível, o ideal é que a intervenção preliminar aconteça no ambiente familiar, garantindo mais conforto à criança no TEA, por ser um ambiente conhecido e, supostamente, seguro. Nessa etapa preliminar, atua-se no aprimoramento de habilidades cognitivas, como a linguagem, por exemplo; bem como em comportamentos relacionados aos cuidados pessoais, motivações e brincadeiras. Pontua-se que os currículos e objetivos planejados durante o processo terapêutico devem ser reavaliados e reestruturados sempre que se julgar pertinente.
Igualmente, destaca-se que a referida intervenção, foi estrutura pressupondo a elaboração de um currículo individualmente planejado, seguindo os parâmetros estabelecidos no repertório de comportamentos apresentados na avaliação inicial. Na ABA, o referido currículo é chamado de “linha de base”. Assim sendo, torna-se indispensável chamar a atenção para o fato de que nessa etapa, bem como em todo o processo terapêutico, o envolvimento familiar é indispensável.
Fernandes e Amat (2013) afirmam que diferentes técnicas foram testadas para avaliar a efetividade da ABA. No entanto, uma das mais relevantes envolve a aplicação do seguinte esquema: Antecedentes – Comportamento – Consequências. Nesse sentido, compreendem-se por antecedentes, os acontecimentos que precedem determinado comportamento; enquanto que as consequências são os eventos que procedem dele, e que devem ser positivamente reforçado quando se pretende estabelecer um novo comportamento ou consolidar um já existente.
No que se refere à psicomotricidade, podemos ter o caso de uma criança no TEA que não queira realizar um exercício específico, solicitado pelo (a) profissional, no sentido de favorecer, por exemplo, a sua percepção de lateralidade. Quando solicitada, ela se nega, embirra e pode até se irritar: chorando e gritando (antecedente). Na forma negativa, o terapeuta desiste de realizar o exercício e propõe outra tarefa na qual a criança demostra interesse em praticar (comportamento), mas que não vai favorecer a consecução da função motora que ela realmente necessita, levando o terapeuta a ficar frustrado e a criança a não praticar a percepção de lateralidade que ela necessita (consequência).
No caso da aplicação da ABA, mesmo a criança se negando (antecedente), o terapeuta diz que, por somente 5 minutos, a criança vai realizar a tarefa solicitada, e que ele realizará junto com ela (comportamento); passado esse tempo, o terapeuta propõe, por exemplo, uma brincadeira que a criança realmente goste de fazer. Então o terapeuta também brinca e se diverte com a criança (reforço positivo). Assim sendo, a criança pratica a lateralidade proposta, fica feliz com a brincadeira realizada depois 5 minutos solicitados na tarefa, e o terapeuta sente-se realizado por ter atingido o seu objetivo (consequência).
Fernandes e Amat (2013) destacam que o reforço positivo funciona como um sistema de recompensa, através do qual o (a) assistido (a) é estimulado (a), por meio de recompensas dadas ao final de cada ação realizada com sucesso; fazendo com que ela se sinta motivada a realizar, de maneira cada vez mais efetiva, os comportamentos que são favoráveis ao aperfeiçoamento da sua autonomia.
Percebe-se, portanto, que na aplicação da ABA, cabe ao terapeuta, inicialmente, identificar um comportamento específico que deseje estimular; para, em seguida, definir a recompensa que será data ao final da realização do mesmo. Ressalta-se que a recompensa não precisa ser algo de grande valor, mas, por exemplo, como no caso apresentado, uma brincadeira que a criança goste de realizar, ou qualquer outro reforçador social, como: elogios ou aplausos.
As autoras supracitadas destacam, também, que não se trata unicamente de oferecer apenas recompensas arbitrárias, mas apresentar reforços naturais, como, no caso citado, o fato do terapeuta brincar junto com a criança, interagindo prazerosamente com ela. Nesse sentido, a observação do que agrada ou não à criança no TEA, constitui-se em uma ação de fundamental importância; para que o terapeuta possa constituir um repertório de ações prazerosas que, no momento devido, sejam utilizadas como reforçadores positivos.
As dificuldades psicomotoras na criança no Transtorno do Espectro do Autismo no contexto da Educação Inclusiva
Como se destacou anteriormente, o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) envolve um conjunto de manifestações psicomotoras complexas, de modo que não existe um/a assistido/a que tenha exatamente as mesmas características do/a outro/a.
As dificuldades de comunicação caracterizam-se como uma das manifestações mais evidentes; observáveis em casos mais levem, nos quais se apontam dificuldades limitas de interação, sem, todavia, existir uma um retrocesso importante na linguagem; até os casos mais graves, que podem chegar a limitar totalmente os processos de socialização, no caso de crianças que não conseguem produzir qualquer tipo de som,
Existem casos em que se observam, inclusive, ocorrências importantes de apraxia, ou seja, uma dificuldade neurológica que afeta a produção de sons da fala, devido à existência de déficits neuromuscular presentes em algumas das estruturas do sistema fonador, como, por exemplo, tônus deficientes ou baixa capacidade de produzir reflexos adequados, mesmo que consiga compreender o que as outras pessoas dizem, ou, até mesmo, comunicarem-se fazendo uso de gesticulações.
Outra ocorrência possível, diz respeito aos casos de alterações na prosódia, quais sejam: dificuldades no ritmo ou na entonação da fala; na intensidade ou na duração, podendo falar alto demais ou muito baixo, lento ou muito rápido.
Ainda no campo da linguagem, crianças no TEA podem apresentar dificuldades de utilizar os pronomes pessoais de maneira adequada, referindo-se, por exemplo, a “ele/a”, ou seja, na terceira pessoa do singular, quando se trata dela mesma. Há, também, manifestações de ecolalia, nas quais palavras ou expressões são repetidas, em sequencia, inúmeras vezes.
Em vista disso, compreende-se que as dificuldades na comunicação podem ser a primeira fronteira a ser superada quando se trata de planejar uma intervenção utilizando-se a Análise do Comportamento Aplicada (ABA), no tratamento terapêutico de crianças no TEA; visto que a troca compreensível de informações é fundamental para o bom êxito do processo como um todo. Nesse sentido, o referido método torna-se indispensável, pois, como afirma Dias (2017, p. 3), o seu principal objetivo é “[...] formar repertórios socialmente consideráveis, e proporcionar estratégias de ensino e aprendizagem [...]” que facilitem a comunicação de indivíduos no TEA, permitindo o adequado, e possível, desenvolvimento dos mesmos, buscando o aprimoramento dos seus processos de inclusão social; pois, como lembra a autora supracitada:
[...] A exclusão dos autistas do grupo social em geral tem início desde a infância, algumas crianças não frequentam as escolas regulares e quando são matriculadas enfrentam várias dificuldades, tais como uma sociedade despreparada devido à ignorância, preconceito, medo, estigmas e crenças que atuam sobre o autismo (Dias, 2017, p. 6)
Tal questão nos coloca em contato direto com a problemática da Educação Especial, compreendendo a referida modalidade como parte da educação escolar que deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para pessoas com necessidades especiais.
Compreende-se que os/as educandos/as com necessidades especiais são aqueles que, durante o processo de aprendizagem, apresentaram: I. Dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitação no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, compreendidas em dois grupos: a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica; b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências; II. Dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis; III. Altas habilidades/ superdotação, grande facilidade de aprendizagem que os levem a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes. (Art. 5º, Resolução nº 2/2001 do CNE/CEB/MEC).
Podem ser entendidos/as, também, como alunos/as com Necessidades Especiais, aqueles/as que durante o processo educacional apresentam comportamentos que impeçam o encaminhamento rotineiro das práticas pedagógicas em sala. Vele destacar que a maioria desses/as alunos/as demandam ajustes para realizarem suas capacidades e potencialidades nas melhores condições possíveis.
Alunos/as com Necessidades Especiais também são aqueles/as que apresentam diferentes ritmos de aprendizagem. Esses/as alunos/as necessitam de sinais ou códigos para se comunicares, como a língua brasileira de sinais, ou de algum mecanismo para ler e escrever como o Braille. De qualquer maneira, são necessárias adaptações nas estruturas corriqueiras de ensino, para favorecer e potencializar a capacidade de aprendizagem de cada um/a deles/as. Destaca-se, portanto, que é através dessas adaptações que a socialização se torna possível.
A garantia da Educação Especial na escola encontra-se enunciada no Art. 8º, § 3º, da Constituição Federal Cidadã, de 1988, ao determinar que o Estado deve proporcionar o atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com Necessidades Especiais. O Cap. 5 do Art. 58, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9394/96, confirma esse principio da nossa Lei Maior, ratificando a gratuidade desse atendimento na Rede Pública de ensino.
Nesse sentido, enquanto modalidade de Educação Escolar, a legislação brasileira determina que a Educação Especial tem por base o princípio de igualdade de oportunidades a todos os alunos e alunas. Nisso reside a compreensão primária da Educação Inclusiva: a ideia de educar para a cidadania, ou seja, ao pleno acesso aos direitos e deveres comuns a qualquer pessoa, seja ela deficiente ou não.
Esse princípio foi apresentado concretamente na Declaração de Salamanca, também de 1994, na qual a Educação Inclusiva é apresentada como uma Política Pública vinculada ao principio da Justiça Social. Trata-se de um tipo de educação que se dá através do acolhimento da diversidade e do multiculturalismo, como aspectos que constituem a natureza humana.
Essa compreensão de Educação para Todos foi reforçada pelo Congresso da Tailândia, de 1999, criando uma frende mundial em defesa da inclusão, passando a fazer parte das Políticas Públicas vinculadas à educação de diferentes países, desenvolvendo, dessa forma, elementos concretos que possibilitassem a passagem das diretrizes para as ações. Assim sendo, acesso e qualidade passam a ser duas palavras chaves para se efetivar o processo de inclusão.
Tal contexto passou a gerar, concretamente, o compromisso de diferentes profissionais, principalmente dos (as) professores (as), com os princípios da Educação Inclusiva, visto que se trata de uma prática inovadora, que visa garantir uma educação de qualidade para todos/as. Nesse sentido, as escolas precisaram se modificar, ou seja, fazer a adaptações necessárias para dar conta desse processo.
Dentre tantas adaptações necessárias, destaca-se especial relevância ao aperfeiçoamento e atualização dos docentes. Os professores e professoras precisaram rever as suas práticas pedagógicas, inclusive as concepções que tinham sobre Educação Especial, visto que a Legislação Brasileira passou a propor uma concepção dessa modalidade de educação baseada fortemente no Principio da Inclusão.
Esse novo paradigma desafiou fortemente o cotidiano escolar do nosso país, exigindo um esforço coletivo de todos os sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, inclusive no que consiste estar aberto a aprender mais com a diversidade e com o diferente. Talvez esse seja o maior ganho da ética da inclusão no caminho da construção de uma sociedade mais igualitária, onde a justiça social seja compreendida como um princípio de cidadania garantido a todos e a todas.
A prática da Educação Inclusiva exige que professores e professoras se encontrem em sintonia com todos os atores que compõem a escola, inclusive da comunidade como um todo. Assim o processo de inclusão vai se consolidando de maneira mais consistente, baseado em um sentimento de ajuda mútua, no qual alunos e alunas vão interagindo de maneira positiva, baseados em princípios como o respeito e a solidariedade.
Tudo isso ocorre, quando professores e professoras desenvolvem as suas ações com base no Principio da Inclusão, mediante o qual se garante a consecução de um processo educacional que visa atender à criança em transtornos, dentro das suas possibilidades, na classe de ensino regular, buscando elementos que possam potencializar as suas capacidades.
Para tanto, professores e professores devem ter em mente um modelo básico de atendimento voltado para aos alunos e alunas com necessidades especiais, tendo em vista que possuem um direito constitucional, que os iguala aos/às demais. Nesse sentido, suas praticas pedagógicas devem visar um melhor desenvolvimento físico e psíquico desses/as alunos/as. Ou seja, trata-se de uma potencialização, criando-se as condições ideais para que essas crianças concretizem os seus processos de ensino e de aprendizagem.
Diante disso, constata-se que professores e professores devem ter sempre em mente que uma das metas mais relevantes da Educação Inclusiva é fornecer uma aprendizagem onde as crianças possam adquirir conhecimentos juntas, mesmo tendo objetivos e processos diferenciados. Para tanto, os/as docentes devem desenvolver a capacidade de usar formas criativas no processo de ensino e aprendizagem, abandonando as “velhas fórmulas” anteriormente praticadas. Decorre de tal fato, a necessidade de uma reciclagem constante, consistindo em uma mudança de mentalidade, que possibilite a ruptura com modelos ultrapassados, anteriormente fundamentados em princípios médicos baseados em “parâmetros de normalidade” (paradigma da integração).
Assim sendo, em todos os sentidos, os/as docentes se encontram diante do desafio da adaptação a um novo processo, inclusive revisando conceitos e preconceitos, para que todos sejam incluídos e não haja mais segregação no processo educacional, compreendendo que o que se encontra em pauta são as relações humanas fundamentadas nos princípios da solidariedade e da aceitação.
Outra questão bastante relevante, que professores e professores enfrentam diante do paradigma da inclusão, diz respeito aos problemas estruturais existentes nas escolas. No entanto, estes não podem ser usados como desculpas para “não fazer”. O que se tem que buscar é criar, transformar; buscar realizar o melhor, com a melhor qualidade possível, usando o que se tem; mesmo que a legislação diga que se tem que ter. Para isso existe Ministério Público, para garantir o direito de todos e de todas, inclusive, das crianças com deficiência, a usufruírem dos recursos disponíveis que garantam o bom êxito dos processos inclusivos de ensino e aprendizagem, em igualdade de condição com os demais.
Mais um problema relevante que professores e professores devem enfrentar é o desconhecimento das condições reais dos seus alunos e alunas. Por isso, deve-se procurar conhecer minimante o grupo, para que se possa trabalhar com qualidade. Nesse sentido, não se pode duvidar, ou pressupor, que “ter limitações” signifique que não se tenha possibilidade de criação.
Reconhecem-se, portanto, as dificuldades, porém professores e professoras se colocam em atitude de abertura diante das possibilidades que podem ser exploradas. Nesse contexto, cria-se um clima de respeito às individualidades, através do qual, tem-se a consciência que cada indivíduo é único, inclusive no que refere às suas potencialidades; naquilo que, de fato, o destinge dos demais.
Propondo um plano de intervenção através da Análise do Comportamento Aplicada (ABA)
Nesta proposta de intervenção, inicialmente, pensou-se nas três primeiras aulas de um planejamento trimestral, compreendendo encontros semanas (3 vezes na semana), com duração de 50 minutos por aula, em ambiente aberto, numa quadra esportiva, por exemplo, no qual o/a aluno/a demonstre interesse em estar; fazendo com que o espaço seja acolhedor e receptivo para ele/a. Durante as referidas intervenções, a criança no Espectro do Autismo, deve ser incentivada a brincar e se divertir, de maneira animada e tranquila.
No primeiro encontro, procura-se criar um vínculo afetivo. Antes, porém, desenvolve-se um momento de conversa entre o/a professor/a, a mãe, ou responsável, e o/a filho/a, para que possam se conhecer melhor; buscando-se elencar alguns possíveis comportamentos repetitivos. Essa interação preliminar é importante, para que o/a professor/a possa observar se a criança é atenciosa, ou seja, se demonstra atenção durante a conversa, tentando responder todas as perguntas, como por exemplo: “oi!”, “tudo bem?”, “qual é o seu nome?” “vamos brincar?”. E com a mãe “oi!”, “tudo bem?”, “como está o/a aluno/a?”, “ele/a toma medicamentos?”, “quando ocorre com mais frequência o comportamento disruptivo?”. Avalia-se, portanto, inicialmente, o nível de interação possível entre a criança e o/a professor/a. Destaca-se que, durante esse momento, a mãe também pode aproveitar para questionar o/a docente sobre o trabalho que será realizado.
Os 10 minutos iniciais desse primeiro encontro, deve ser de conversação, observação e exploração do ambiente, principalmente das condições estruturais disponíveis. Em seguida, o/a aluno/a deve passar por uma avalição preliminar, no que tange a sua condição psicomotora (tonicidade, equilíbrio, lateralidade, noção de corpo, estruturação espaço-temporal, motricidade grossa e fina).
Ressalta-se que, no decorrer dessa etapa, o/a aluno/a deve contar com o auxilio parcial do/a professora/a, tendo em vista o seu bem estar durante as atividades; pressupondo que a qualidade dos movimentos realizados pela criança encontra-se diretamente relacionada com o ambiente, a atenção recebida e suas próprias emoções. Destaca-se que, durante a observação, a criança deve ter plena liberdade para explorar o espaço e conhecer o ambiente, com curiosidade e atenção.
No segundo encontro, depois de ser elaborado o planejamento preliminar, através do qual se estabelece a “linha de base” da intervenção, propõe-se, como primeira atividade, o exercício intitulado “Sobe e desce”. O objetivo principal desse movimento é pegar as argolas no chão, partindo da posição deitada em decúbito dorsal e passar para o/a professor/a, mediante a elevação do tronco. Em termos motor, esta atividade propicia o desenvolvimento da tonicidade. Como segunda atividade, pode ser proposto o movimento conhecido como “Pareamento correndo”. O objetivo dessa atividade é estimular a percepção visual. Ato contínuo pode-se propor a terceira atividade: “Lança no alvo”, que consiste em lançar a bola em um alvo estabelecido durante a tarefa. Nessa atividade busca-se desenvolver a coordenação mão-olho. Em seguida, pode-se propor a quarta atividade, aqui pensada com sendo a “Condução de bola”, que tem por objetivo conduzir a bola entre obstáculos, sem perder o controle. Nessa atividade desenvolve-se a concentração e o equilíbrio.
No terceiro encontro, pode-se acrescer uma nova sequência de atividades. A primeira delas intitula-se: “Sobe e desce”. O objetivo principal dessa atividade é pegar as argolas no chão, partindo da posição deitada em decúbito dorsal, e passar para o/a professor/a, mediante a elevação do tronco. Nessa atividade desenvolve-se a tonicidade. Em sequência, passa-se para a segunda atividade da aula: “Pareamento correndo”. O objetivo dessa atividade é estimular a percepção visual. Em seguida, parte-se para a terceira atividade: “Lança no alvo”. O objetivo é lançar a bola no alvo estabelecido na tarefa. Nessa atividade desenvolve-se a coordenação mão-olho.
A quarta proposta chama-se: “Condução de bola”. O objetivo dessa atividade é conduzir a bola entre os objetos, sem perder o controle. Nela desenvolve-se a concentração e o equilíbrio. A quinta atividade, arrolada neste planejamento de intervenção, é conhecida como: “Pula saci”. O objetivo dessa atividade é transpor obstáculos apenas com um dos pés tocando no chão. Nela trabalha-se o equilíbrio. A sexta e última atividade sugerida, consiste em “pular corda”. O objetivo dessa atividade é pular a corda que está em movimento giratório. Nessa atividade é trabalhada a noção espaço-temporal.
Destaca-se, nas sequências de atividades que foi proposta, a aplicação de técnicas de intervenção de aprimoramento psicomotor em ambiente natural. Ressalta-se que, inicialmente, deve haver uma tentativa discreta de vinculação aluno/a - professor/a -ambiente, através da qual o/a primeiro/a tenha a liberdade para brincar e reconhecer o meio no qual as atividades foram desenvolvidas.
Sugere-se que tal aproximação desenvolva-se de maneira altamente satisfatória, buscando com que o/a aluno/a participe confortavelmente do trabalho proposto, demostrando motivação, ao tempo em que deve ser motivado/a a prestar bastante atenção na explicação, principalmente no que se refere ao número de vezes pré-determinadas, nas quais o movimento deverá ser repetido; buscando motivar o/a aluno/a a participar de todas as tarefas com disposição e alegria, como se estivesse brincando.
Ressalta-se que, ao final de cada tarefa realizada com sucesso pelo/a aluno/a, ele/a deve receber um reforço social (observação, aplausos e abraços) que funcionam, dentro da ciência da Análise do Comportamento Aplicada (ABA), como reforçadores positivos.
O modelo da Educação Inclusiva convida professores e professoras a lançarem “outro olhar” sobre o processo de ensino e aprendizagem. É como se fossemos inseridos, em uma imersão constante e permanente, em “outra cultura”, na qual o “mistério” consiste em aprender com as limitações, extraindo delas possibilidades de desenvolvimento.
De fato, o que se cultiva, de maneira geral, é uma metanoia, uma mudança de mentalidade, ou seja, o desenvolvimento de uma “nova cultura” baseada no “principio da igualdade”, através do qual se compreenda que uma pátria verdadeiramente inclusiva, consiste naquela através da qual se vive com direitos e deveres iguais, compartindo-se, solidariamente, os princípios da cidadania plena.
Assim sendo, mediante as potencialidades da intervenção planejada, conclui-se que a aplicação da terapia ABA apresenta inúmeras possibilidades de ser potencializada enquanto instrumento incentivador de habilidades psicomotoras, no caso de criança no Transtorno do Espectro do Autismo. Percebe-se, ainda, que um dos principais benefícios desse tipo de ensino e aprendizagem é a diminuição do desânimo e, principalmente, da frustração do/a aluno/a.
Consta-se, também, que a garantia de que o aluno/a concretizará as tarefas com sucesso, repetindo o número de vezes que for previamente estabelecido pelo/a professor/a, vincula-se sempre ao recebendo de um reforço positivo, principalmente depois da aquisição de uma nova habilidade, incentivando o/a a se manter motivado e com desejo de aprender.
Destaca-se, também, que as tarefas propostas foram planejadas levando-se em consideração a execução de movimentos que o/a aluno já realiza em suas brincadeiras cotidianas. Nesse sentido, a psicomotricidade ajudou a criança a compreender que as ações que fazem parte de sua vida, como movimentos naturais já realizados por ela, podem ser potencializadas, de forma organizada e planejada, para que ela possa desenvolver novas habilidades.
Em suma, corrobora-se com a ideia que a intervenção escolar inclusiva baseada na Análise do Comportamento Aplicada (ABA) vem se mostrando eficaz, e altamente promissora, para o desenvolvimento psicomotor da criança no TEA.
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