Metadados do trabalho

Reflexões Sobre Infâncias, Territórios E Tempo Integral: Um Estudo Documental

Janacélia Andrade Lacerda Destefani; Maria Celeste Reis Fernandes de Souza; Guilherme Rodrigues dos Santos

Este texto propõe refletir sobre a relação entre infância e território na Escola em Tempo Integral (ETI) de Governador Valadares, que universalizou, a partir de 2010, o tempo integral, na rede municipal de ensino, para crianças matriculadas em creches, pré-escolas e para o ensino fundamental. A metodologia adotada, de cunho qualitativo, é um estudo documental, cujo corpus de análise é composto por 4 Cadernos orientadores da proposta da ETI e os Projetos Político- Pedagógicos de duas instituições de educação infantil de um território vulnerável da cidade. Como reflexões teóricas, são adotados estudos da Sociologia da Infância, Geografia das Infâncias e Educação Integral/Tempo Integral, que orientam a análise na qual se reflete sobre as infâncias na ETI, Território e Infâncias na ETI. As conclusões apontam a importância de se valorar, no tempo a mais de escola, as vozes das crianças e o que elas nos permitem compreender dos territórios, posto que a escola pode ser potencializadora do reconhecimento e da valoração das infâncias nos territórios e dos direitos das crianças aos espaços escolares e demais espaços nos quais elas vivem. 

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DESTEFANI, Janacélia Andrade Lacerda; SOUZA, Maria Celeste Reis Fernandes de; SANTOS, Guilherme Rodrigues dos. Reflexões sobre Infâncias, Territórios e Tempo Integral: um Estudo Documental. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2023 . ISSN: 1982-3657. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/537-reflex%C3%B5es-sobre-inf%C3%A2ncias-territ%C3%B3rios-e-tempo-integral-um-estudo-documental. Acesso em: 16 out. 2025.

Reflexões sobre Infâncias, Territórios e Tempo Integral: um Estudo Documental

          A correlação entre infância e direitos tem se firmado no cenário brasileiro em diferentes marcos legais.  Aponta-se como um marco inicial a Constituição brasileira de 1988, artigo 227, que afirma a prioridade a ser conferida a crianças, adolescentes e jovens, com direito a acesso à vida, saúde, lazer, educação, dentre outros, e a necessidade protetiva contra todas as formas de opressão, discriminação e violências (BRASIL, 1988).

            Como decorrência desse marco, podemos identificar outro marco importante, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que em seus artigos 3º e 7º afirma que a criança goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, pela via da proteção integral.  Determina que toda criança tem direito ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência (BRASIL, 1990).

No campo educacional, um dos marcos pode ser identificado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que alia infância e escolarização em seu artigo 29: “a educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”. A legislação aponta que a oferta deve ser feita em creches ou entidades equivalentes, a crianças de até 3 anos, e a pré-escola para crianças de 4 e 5 anos de idade (BRASIL, 1996).

Embora o direito das crianças tenha sido assegurado do ponto de vista legal, no plano educacional, esse direito não tem se efetivado no tocante à escolarização, como mostra o Plano Nacional de Educação (PNE), com vigência no período de 2014 a 2024. A meta 1 preconizava a universalização, até 2016, da educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliação da oferta de educação infantil em creches, de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das crianças de até 3 (três) anos, até o final da vigência do documento. Em vias de finalização do PNE, acompanhamos a distância entre o proposto e o que se apresenta como nessa meta que, além de não cumprida, é indicada como retrocesso no documento “Balanço do Plano Nacional de Educação”, elaborado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, na Semana de Ação Mundial (SAM, 2023). 

            A meta 1, além da universalização, considerando peculiaridades locais, enfatiza a importância de estimular o acesso à educação infantil em tempo integral para todas as crianças de 0 (zero) a 5 (cinco) anos, conforme estabelecido nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2010; BRASIL, 2014).

            Referenciando-nos nesses marcos legais, tomamos como premissa o direito à educação, aliado ao mais tempo diário das crianças na escola, com atenção para a relação entre infâncias e territórios, sustentando-nos em estudos sobre Sociologia das Infâncias e Geografia das Infâncias, e em estudos e autores que discutem tempo integral e infâncias. O estudo, de base qualitativa, toma como objeto de análise um conjunto documental, elaborado pela Escola em Tempo Integral de Governador Valadares, que universalizou o tempo integral a partir de 2010, para crianças de 0 a 5 anos, na educação infantil e ensino fundamental (GOVERNADOR VALADARES, 2009; 2010a, 2010b, 2010c). Apontam-se retrocessos na ETI nos anos finais do ensino fundamental com a redução da jornada escolar e oferta de oficinas no contraturno para grupos de estudantes, destoando da perspectiva da universalização (SOUZA; ROSA; SANTOS, 2022). Mas a ampliação da jornada escolar diária é mantida para as crianças matriculadas na rede municipal de ensino, muito embora ainda sejam necessários esforços para dar cumprimento ao apresentado na meta 1 do PNE, para a cidade de Governador Valadares.

            A esse conjunto documental da ETI foram incorporados dois Projetos Político- Pedagógicos (2023), de duas instituições de educação infantil, localizadas em um território vulnerável. Essa incorporação foi intencional, pela correlação entre proteção, cuidado e educação nas infâncias e pela atualidade desses documentos, que nos permitem refletir sobre o estabelecido nos documentos legais da ETI (2009 e 2010) e o proposto pelas instituições.

O texto encontra-se organizado em três seções, além desta introdução. Na primeira seção, apresentam-se reflexões teóricas sobre infância, território e tempo integral; a segunda seção analisa a relação entre infâncias e território e como elas se conectam com a ampliação da jornada diária escolar. Na terceira, é apresentada a análise feita a partir do estudo do arcabouço documental.

Reflexões teóricas

 

        Ao falarmos de infância, estamos nos referindo a um campo de estudos do ponto de vista geracional, que em sua multiplicidade necessita da pluralização do termo para “infâncias” e reconhecimento do protagonismo infantil.   “Estudar as crianças emerge do campo teórico da Sociologia da Infância, afirmando que elas são atores sociais de direito e têm, em suas infâncias, questões geracionais importantes para a compreensão de suas vozes e ações” (FERNANDES, 2022, p.8).

    Estudos no campo da Sociologia da Infância explicitam a historicidade do modo como se compreende conceitualmente a infância na cultura ocidental,  posto que nem sempre as crianças eram vistas como atores sociais de direito, o que foi mudando com a emergência de novos modos de organização da vida social. Contribuições de pensadores como Piaget, Vygotsky e Wallon, que teorizam sobre o desenvolvimento infantil, bem como contribuições da Sociologia das Infâncias, são instigadoras da necessidade de compreensão dos diferentes modos de se viver as infâncias (SARMENTO, 2005; NIEHUES; COSTA, 2012; FERNANDES, 2022).

    Manuel Sarmento, um dos autores-referência no debate sobre a Sociologia das Infâncias enfatiza que:

A constituição do campo (sociologia das infâncias) concretiza-se na definição de um conjunto de objetos sociológicos específicos (no caso vertente, a infância e a criança como ator social pleno), um conjunto de constructos teóricos de referência e um conjunto de investigadores implicados no desenvolvimento empírico e teórico do conhecimento (SARMENTO, 2005, p 362).

    Advindo dessas contribuições, afirma-se que o século XXI encontra-se marcado por estudos mais aprofundados sobre a infância como categoria social, geracional e historicamente construída, e as múltiplas infâncias, no reconhecimento das crianças como atores sociais e sujeitos de direitos. Com efeito, a Sociologia das Infâncias

 

(...) abre um espaço para a infância no cenário sociológico, evidenciando a subjetividade e a ação das crianças, considerando a infância como estrutura social. Nesse viés, é fundamental pensar que esse campo teórico, progressivamente, apresenta, de forma expressiva nos últimos anos, novos conceitos e abordagens, as quais foram surgindo e, consequentemente, nos possibilitando reflexões culturais e sociais da infância na atualidade (FERNANDES, 2022, p.15).

    Niehues e Costa (2012) argumentam que a criança deve ser considerada um ser competente, com demandas e necessidades específicas, com modos próprios de pensar e agir. Argumenta-se, também, que as representações sociais sobre infância podem variar conforme a inserção da criança na família e na sociedade, de modo geral, com  marcadores sociais de classe, gênero, raça, grupos etários, territoriais, o que se apresenta como fértil para estudos sobre Sociologia das Infâncias (NIEHUES; COSTA, 2012; SARMENTO, 2005; FERNANDES, 2022).

    Fernandes (2022) evidencia que se faz necessário rompermos com os paradigmas tradicionais de socialização e estimularmos uma compreensão da criança como aquela que ocupa um papel social ativo no seu processo de socialização e, por meio das interações sociais, interpreta o mundo.

    Corroborando o mesmo pensamento, Ramos e Brostolin (2022, p. 22) argumentam que “entender a criança implica em reconhecê-la como um ator social, com autonomia para participar ativamente do seu mundo social. A criança e a infância nos fazem pensar nas culturas infantis, sendo um termo plural e polissêmico”.

    Sarmento (2005) preconiza que as crianças são competentes e têm capacidade de formular interpretações da sociedade, dos outros e de si próprias, da natureza, dos pensamentos e dos sentimentos e fazem isso de modo distinto, usando essas interpretações para lidar com tudo aquilo que as rodeia. Esse modo de pensar a criança e a infância amplia os olhares a respeito delas e de todos os recursos, instituições, objetos, cultura, história, identidade e territórios. Nesse sentido, não concebemos mais o sujeito fora do território ou o território desvinculado do sujeito.

    Essa amplitude nas discussões sobre infância nos convoca a refletir sobre processos e práticas educativas sob a ótica da abordagem territorial, compreendendo que território é mais do que se apresenta em mapas. O território também é o vivido, sentido, permeado de saberes, e se constitui nas experiências dos sujeitos; por isso mesmo se coloca, também, como permeado por relações de poder (SANTOS, 2011; HAESBAERT, 2009).

    O geógrafo Milton Santos explica que “o território não é apenas um conjunto de sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido como território usado, não o território em si. O território usado é o chão mais identidade” (SANTOS, 2011, p.10). Esse território usado também se torna educativo no seu uso. As relações entre os sujeitos produzem diversos territórios inseridos em multiplicidade espacial.

   Território se forja como local de vida dos sujeitos e de todas as suas criações culturais, inclusive das crianças, como afirmam os autores do campo da Geografia que discutem infâncias e territórios. Discutir território é trazer ao debate as complexidades do mundo, que estão engendradas em como a educação opera processos em espaços escolares e na sua relação com a comunidade.

    As infâncias se configuram não somente de maneira social ou histórica, mas também, pela via da espacialização, primordial para que sejam realizadas leituras e reflexões sobre como as crianças se constituem e se constroem como sujeitos especializados. Nessa perspectiva, emergem as contribuições da Geografia das Infâncias, como campo de estudo.

 

Nesse campo de estudo, a integração entre a criança e o meio e o seu papel de autor e criador de interpretar e construir a cultura, desde uma organização interna de afirmação do seu ‘eu’ no mundo, possibilitando uma reformulação na própria cultura. Dessa forma defendemos que a infância, ela se forma a partir de um espaço e um tempo, que marcam a identidade de cada criança em sua individualidade. Através dos mapas vivenciais, podemos compreender como se desenvolve o protagonismo infantil das crianças de diversas origens na produção desses espaços e a sua relação no espaço no qual estão inseridas (COSTA, 2021, p. 145).

 

    Portanto, para além de reconhecer a infância como categoria é preciso concebê-la como criação, permeada por relações, vivências, culturas, territórios e significados, como nos traz Costa (2021, p. 142), dizendo que “não é suficiente apenas reconhecer a infância como categoria e a criança como ser social geracional, partindo de diferentes contextos sociais, é preciso ouvir suas vozes, suas narrativas, suas vivências”.

    Segundo Lopes (2006), toda criança nasce em um certo momento histórico, em um certo grupo cultural, em um certo espaço, em que estabelece suas interações sociais e constrói sua identidade. A criança está no território, mas ela precisa, para além de estar, fazer parte e uso dele, sem exclusões. Em se tratando das crianças, o território é o espaço/lugar onde se estabelecem as relações e se constroem as identidades a partir de seu uso, conclamando-nos, como educadores e pesquisadores, a reconhecer suas culturas, suas vozes e a integralidade da sua formação, quando se coloca em cena a escola.

    Pode-se identificar, nas Diretrizes Curriculares Nacional para a Educação Infantil (DCNEI, 2010), o reconhecimento da criança como:

 

Sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2010, p. 12).

 

    Essa conceituação de infância traz em aporte as multiplicidades inerentes às infâncias, evidenciando-as como ativas e construtoras de sentidos, o que corrobora as discussões a respeito da diversidade e das configurações das identidades infantis nos territórios.

    O conjunto das reflexões teóricas nos instiga, como educadores envolvidos em práticas e processos educativos com crianças e como pesquisadores, a interrogar sobre o tempo diário da criança na escola, reduzido a 4 horas (tempo parcial) e sobre os desafios da ampliação nas escolas das experiências infantis, levando em conta a necessidade de considerar as infâncias e suas realidades (social, cultural, territorial, dentre outras).

    Cumpre explicar, que pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no seu artigo 34,a jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola” (BRASIL, 1996). Segundo as DCNEI (2010) “é considerada Educação Infantil em tempo parcial, a jornada de, no mínimo, quatro horas diárias e, em tempo integral, a jornada com duração igual ou superior a sete horas diárias, compreendendo o tempo total que a criança permanece na instituição” (BRASIL, 2010).

    Portanto, temos um aparato legal que fundamenta a oferta da educação em tempo integral. Entretanto, discutir essa temática vai além do que está posto no plano legal. Falar sobre educação integral implica considerar a questão das variáveis tempo, ampliação da jornada escolar, proposta curricular e pedagógica, proteção social e espaço, tendo como referência os territórios onde cada escola está situada, a fim de promover diálogos (MOLL, 2012).

    Segundo o texto referência para o debate nacional sobre educação integral, publicado em 2009,

A ampliação da jornada, na perspectiva da Educação Integral, auxilia as instituições educacionais a repensar suas práticas e procedimentos, a construir novas organizações curriculares voltadas para concepções de aprendizagens como um conjunto de práticas e significados multirreferenciados, inter-relacionais e contextualizados, nos quais a ação educativa tenha como meta tentar compreender e modificar situações concretas do mundo (BRASIL, 2009, p.35).

 

    Quando falamos em ampliação da jornada escolar ou de tempo a mais não estamos retratando somente um tempo cronológico; estamos nos referindo para além dele. Esse tempo a que nos referimos é o tempo dos corpos, é o tempo implícito nas relações de poder evidenciadas no espaço escolar, é o tempo que, muitas vezes, não possibilita um tempo de aprender, mas um tempo institucionalizado e, portanto, marcado por inflexibilidades (MOLL, 2012; ARAÚJO, 2015, CARVALHO, 2015; FERREIRA; SOUZA; ROSA; SANTOS, 2022).

    Verifica-se a articulação dessas perspectivas na educação em estudos sobre infância e territórios e nas discussões sobre educação infantil, educação integral/tempo integral (ARAÚJO, 2015; CARVALHO; SILVA, 2017; FERREIRA; SOUZA, 2021). Sobre a apropriação de outros territórios pelas crianças em tempo integral, Carvalho e Silva (2017) destacam o cuidar e o educar em articulação com o território de pertencimento da criança e “ganha força a ideia da escola e da comunidade como pertencentes a uma rede de proteção social da infância” (CARVALHO; SILVA, 2017, p.31).

    Na busca de refletir sobre essa relação e estabelecer olhares sobre a realidade de uma política educacional e de práticas educativas para as infâncias, na próxima seção, serão analisados  os Cadernos da Escola em Tempo integral de Governador Valadares: o Caderno de Diretrizes Curriculares 1, com 36 páginas, tem como objetivo a apresentação geral da proposta; o Caderno de Diretrizes Curriculares 2, com 34 páginas, tem como título “Identidade e Diversidade”; o Caderno de Diretrizes Curriculares 3, com 34 páginas, é intitulado  “Comunicação e Múltiplas Linguagens” e o Caderno de Diretrizes Curriculares 4, com 40 páginas, orienta a respeito da “Sustentabilidade e Protagonismo”. Os Projetos Político-Pedagógicos de duas instituições de educação infantil de um território vulnerável da cidade também são incluídos no conjunto de análises. Tomando como referência as reflexões teóricas, foi feita a leitura do corpus documental e a análise reflete sobre infâncias na ETI, Território e Infâncias na ETI.

 

Análise documental

    As infâncias foram, durante muito tempo, invisibilizadas nas políticas públicas do nosso país, e a educação infantil foi por muitos anos ofertada a partir de uma perspectiva assistencialista (FULY, VEIGA, 2012). Em Governador Valadares, não tivemos uma realidade diferente. O Documento “Transição dos recursos para financiamento das instituições de educação infantil: articulação entre Assistência Social”, produzido pela Secretaria Municipal de Educação de Governador Valadares (SMED), em 2008, narra que, historicamente, a Assistência Social financiou parte da rede de instituições de educação infantil e manteve esses recursos para o atendimento às crianças de 0 a 6 anos, mesmo após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB ter definido a educação infantil como a primeira etapa da educação básica (BRASIL, 1996). Isso ocorreu, dentre outros fatores, devido à falta de fontes específicas de financiamento para essa etapa da educação básica.

    A educação para as crianças pequenas, no município, era ofertada por escolas municipais e em sua maioria em instituições religiosas ou de matriz filantrópica, em período parcial e integral. No ano de 2008, houve algumas mudanças, a partir da Lei nº 11.494/07, que dispõe sobre o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica - FUNDEB, que representou um passo importante, reforçando a natureza educacional das creches e pré-escolas. Segundo essa lei, até janeiro de 2009, toda a rede de instituições de educação infantil deveria ser assumida pelo Sistema de Educação, e nesse processo, foram formalizados convênios do poder público com as Instituições Não Governamentais. Desde então, diversas mudanças ocorreram a fim de melhorar a qualidade do atendimento às crianças matriculadas em instituições partícipes da rede municipal de ensino de Governador Valadares.

    Diante disso, faz-se necessário buscar entender, e até mesmo questionar, como se constituem as relações das crianças com/nos espaços, nas suas vivências e experiências, e como os processos de relação com o território permeiam a constituição de suas identidades. Como as documentações curriculares, os documentos político-pedagógicos dialogam ou criam interfaces com as infâncias e a sua relação com os territórios?

    Em 2010, foi instituído, na rede municipal de ensino, a Escola em Tempo Integral (ETI) que universalizou a jornada diária de 8 horas para todas as crianças e todos os adolescentes matriculados na educação infantil e no ensino fundamental, em todas as 50 instituições educacionais das zonas urbana e rural (GOVERNADOR VALADARES, 2009; UFMG, 2012; SOUZA, 2016; SOUZA; CHARLOT, 2016). Atualmente, o projeto continua em execução, ofertando, de acordo com informações advindas da Secretaria Municipal de Educação, a mesma carga horária para a educação infantil, em 67 instituições, sendo 60 pertencentes à Prefeitura Municipal e 7 creches parceiras[i]. O financiamento da oferta feita pelas instituições parceiras se fundamenta na Lei 13.019, de 2014, que regulamenta a parceria do poder público com instituições filantrópicas não governamentais (GOVERNADOR VALADARES, 2014).

    A implantação do tempo integral nas escolas municipais da cidade suscitou diversas questões, tornando-se um campo de debates e reflexões, pois nacionalmente as temáticas inerentes à educação integral em tempo integral estavam em voga, e chamava   atenção, na ETI, o aspecto da universalização, a proposta curricular, o engajamento de estudantes, dentre outros (UFMG, 2012; SOUZA, 2016; SOUZA; CHARLOT, 2016;SOUZA; ROSA; SANTOS 2022). Com relação às infâncias, identifica-se o estudo realizado por Ferreira (2018), que discorre sobre o brincar das crianças na escola em tempo integral e as tensões entre as fronteiras territoriais e as culturas infantis.

  Infâncias na ETI

    O reconhecimento das infâncias como sujeitos da Escola em Tempo Integral, comparece nos 4 Cadernos analisados, em diálogo com as questões sociais e culturais, relacionadas com o brincar, com as múltiplas linguagens, a Arte e os saberes matemáticos. Especialmente no Caderno de número 3, que trata das múltiplas linguagens (Caderno de Diretrizes Curriculares 3:  Comunicação e Múltiplas Linguagens), comparecem proposições do trabalho com as infâncias.

    A criança é reconhecida como sujeito de direitos e a infância como uma etapa distinta das outras fases da vida, que tem importância e significado em si mesma. É dado enfoque ao protagonismo infantil, considerando as fases do desenvolvimento humano, respeitando as características da idade, a partir das concepções construtivistas, apresentadas em tabelas por etapa ou ciclos, trazendo o que deveria ser trabalhado nas escolas de acordo com currículo delineado.

    O Caderno 1 preconiza a integralidade da formação, os contextos das escolas municipais, características de desenvolvimento humano, o desenvolvimento da capacidade humana de articular significados coletivos e de compartilhá-los em diferentes situações de comunicação verbal e não verbal e a preparação dos educandos para participação ativa na vida social (GOVERNADOR VALADARES, SMED, 2009).

    No Caderno de número 1, a palavra infância foi citada 11 vezes. Nos Cadernos 02 e 03, ela aparece 8 vezes e, no de número 4, ela compareceu 5 vezes. As infâncias estão subscritas na educação infantil (0 a 5 anos) e no ciclo das infâncias. É importante destacar que o currículo delineado nos cadernos é organizado trazendo: a educação infantil (0 a 6 anos), o ciclo da infância (6 a 8 anos), da pré-adolescência (9 a 11 anos), da adolescência (12 a 14 anos) e a Educação de Jovens e Adultos, a partir de 15 anos (GOVERNADOR VALADARES, SMED, 2009).

    No Caderno de número 2, é feita uma relação entre infância e identidade, o que expõe indicativos de uma discussão pela via da pluralidade.

 

Nesse sentido, por meio do brincar, a criança vai conhecer, aprender e se constituir como um ser pertencente ao grupo, contribuindo para a construção de sua identidade, que compreende todas as experiências por meio das quais tomamos consciência de nós mesmos como pessoas distintas de todas as outras. A construção da identidade é possível pelo desenvolvimento de um trabalho que valorize as marcas pessoais de cada criança, sendo relevante organizar momentos e atividades para a criança observar, descobrir e falar sobre aspectos das características físicas, modos de agir e pensar, história pessoal, gostos, preferências e habilidades. (GOVERNADOR VALADARES/SMED, 2010, p.13)

 

    É preciso refletir, que o período de 8 horas que as crianças ficam nas instituições de educação infantil não pode se resumir a atividades escolarizantes. Essa ampliação da jornada escolar deve possibilitar a elas momentos de liberdade para o brincar, para as interações, para se comunicarem, expressarem seus sentimentos e vontades, para desenvolverem seus pensamentos e imaginação, fazerem parte de experiências que as envolvam e protagonizem suas produções e construções dentro e fora da escola. Esse tempo ampliado não é para que se apresente mais do mesmo; pelo contrário, é a abertura para que se possa inovar e estreitar laços com a comunidade, explorando os territórios.

    Em se tratando das infâncias, é necessário trazer o tempo que está interligado à autonomia, ao desenvolvimento das identidades, ao tempo com liberdade e não da “grade”, da rotina, mas sugestivo, que possibilita a criação e a criatividade, que propicia experiências individuais e coletivas. Pensar no tempo escolar é ir além da escola, é vislumbrar um tempo que também está fora dela, que a influencia e que também a possibilita influenciar. Ferreira; e Souza (2021, p.21) enfatizam a importância de se “compreender a criança como sujeito que interage em diferentes segmentos sociais e que, por meio de suas brincadeiras e interatividades, constrói identidades individuais e coletivas, constituindo uma cultura própria”.

    Todas as políticas têm um endereçamento. O planejamento macro se estabelece nas construções loco-espaciais, ou seja, nas escolas ou nas instituições educativas para as infâncias. Portanto, na estruturação do fazer pedagógico, do currículo e da organização escolar, temos o Projeto Político-Pedagógico, um documento primordial para a reflexão que pretendemos fazer neste artigo. A LDB, em seus artigos 12, 13 e 14, atribui aos estabelecimentos de ensino a incumbência de elaborar e executar, de forma democrática, seus Projetos Pedagógicos (BRASIL, 1996).  Ele deve nortear todas as ações pedagógicas de cada instituição e se estruturar em contínua discussão e reformulação, na busca constante da melhoria da qualidade da oferta do atendimento às crianças. As DCN para a educação infantil retratam que as propostas pedagógicas devem cumprir plenamente suas funções sociopolítica e pedagógica, oferecendo condições e recursos para que as crianças usufruam de seus direitos civis, humanos e sociais (BRASIL, 2010).

    Quando se realiza um trabalho em conjunto, articulando infância e território, o desenvolvimento integral das crianças passa a ser entendido como responsabilidade, não somente das escolas/instituições como também de suas comunidades, pois os sujeitos do território podem se inserir em um processo de ressignificação e potencializar ações transformadoras de vidas.

 

 Território e Infâncias na ETI

 

    Quando se coloca em cena a discussão sobre educação integral e tempo integral, faz-se necessário destacar a importância da relação entre a escola ou instituição de educação infantil com o território em que ela está inserida. A interlocução com o território gera dinamicidade, fortalece as identidades locais e corrobora uma compreensão mais ampla das infâncias, pois elas são marcadas por construções socioespaciais (CARVALHO; SILVA, 2017; FERREIRA, 2018; FERREIRA, SOUZA, 2021).

    Ferreira; Souza, (2021) tomam como referência estudos da Sociologia das Infâncias e Geografia das Infâncias para refletir sobre as infâncias na ETI. Destacam a importância de se considerar o brincar como um dos eixos articuladores da experiência das crianças no tempo integral e afirmam a importância de se considerar a escola como um território, bem como os territórios nos quais as crianças vivem. Argumentam que o território é

 

constituído pelos valores, pelas práticas, pelos modos como nos apropriamos dele, pelos gestos, pela memória, pelas regras, pela linguagem, pelos meios empregados pelas pessoas para a sobrevivência e refletindo sobre as crianças e suas culturas, também pelo brincar (FERREIRA; SOUZA, 2021, p. 6).

    A partir da premissa da importância dessa relação entre território e infâncias, buscamos a referência da palavra território nos Cadernos da ETI - Escola de Tempo Integral de Governador Valadares. A palavra território não comparece de maneira explícita nos quatro cadernos analisados de forma relacionada às infâncias. Por sua vez, são encontradas referências a espacialidades, lugar, diversidade e identidade, que nos permitem inferir essa relação, posto que, como se argumenta na literatura, território diz respeito ao vivido, aos usos, e as infâncias constituem-se no território, ao mesmo tempo que o constituem (LOPES, 2006; CARVALHO; SILVA, 2017; COSTA, 2021; FERREIRA; SOUZA, 2021).

    Conforme o Caderno 1 da ETI, que faz uma apresentação geral da proposta, a estratégia curricular adotada é “o desenvolvimento da identidade social e respeito à diversidade para o desenvolvimento sustentável” (GOVERNADOR VALADARES/SMED, 2009, p.5). Essa estratégia se desdobra em eixos temáticos apresentados no Caderno 2, o que também permeia toda a proposta. O eixo temático é definido como:

Tema amplo originário de uma situação-problema (necessidade social e pedagógica previamente identificada), a ser trabalhado através da articulação de várias disciplinas dos diversos campos do conhecimento. A soma de Eixos Temáticos estrutura uma estratégia educacional. No caso, a SMED adota três Eixos Temáticos que dialogam entre si e com o seu projeto estratégico, vinculado à identidade social e respeito à diversidade. Os Eixos Temáticos superam os conteúdos pré-estabelecidos e fechados. Rompem com o isolamento de cada disciplina, indicam caminho curricular que vai ao encontro da educação integral, pois envolvem as várias dimensões do saber e da vida cotidiana dos alunos, de suas comunidades e de espaços e dilemas sociais amplos (GOVERNADOR VALADARES/SMED, 2010, p.3).

 

    Fica explícito, na leitura dos 4 Cadernos de Diretrizes Curriculares, a intenção de busca pela construção de uma identidade municipal apoiada na diversidade, a partir dos processos educativos, pois o retrato social da cidade é o fenômeno histórico da emigração para os Estados Unidos e que se faz persistente (ALVES; SIQUEIRA, 2020).  Conforme se apresenta nos cadernos, por meio de gráficos e estudos, a questão econômica é preponderante; se o fator emigração fragiliza os laços identitários com a cidade, pensa-se um currículo que tem potencial para fortalecer esses laços, como apresentado nas orientações gerais da proposta e explicitado nos Cadernos 2 e 4 que tratam da identidade e diversidade; sustentabilidade e protagonismo, respectivamente (GOVERNADOR VALADARES, 2009, 2010a; 2010c).  Essa busca de identidade perpassa pelas questões de território, pois abarca o sentimento de pertencimento dos sujeitos que produzem o território, ao mesmo tempo que provoca o engajamento de outros atores e conhecimentos, visando contribuir para a construção identitária. No Caderno 4, que discute sustentabilidade e protagonismo, explicita-se essa demanda e proposta.

Movidos pela construção do sentimento de pertencimento local e regional e pela formação de dirigentes locais, necessário se faz construir o perfil de uma nova escola pública municipal que organizará seu currículo pautado numa proposta multidisciplinar por área de conhecimento. Esta deverá ser pensada como uma teia, uma rede, um rizoma que simboliza o conjunto de todas as ciências, perpassando por vivências e saberes cotidianos dos sujeitos que os produzem, aprendem e utilizam. (GOVERNADOR VALADARES/SMED, 2010, p.7).

 

    No Caderno 4, comparece o debate sobre protagonismo e sustentabilidade em uma relação entre ambiente e trabalho, evocando “lugar”. A relação “com” o território não comparece de maneira explícita; está interligada a objetivos para desenvolvimento de aprendizagens relacionadas à paisagem, lugar e espaço. Observa-se que, nesse Caderno, a sobreposição do território interligado a questões estatais e regionais, como o território brasileiro, ficando subtendido na perspectiva dos vividos no território.

    No Caderno de número 2, afirma-se que “a constituição da identidade e do projeto de vida implica se apropriar de um conjunto de valores que oriente a perspectiva de vida: quem sou eu, quem eu quero ser, o que quero para mim e para a sociedade. Isso exige busca de autoconhecimento, de compreensão da sociedade e do lugar social a que pertence” (GOVERNADOR VALADARES/SMED, 2010, p.9). Essa construção de si não prescinde de territórios, nos quais se imbricam as culturas e modos próprios de apropriação socioespacial e que são diferentes para crianças, como a literatura sobre a Geografia das Infâncias nos mostra (LOPES, 2008; COSTA, 2021; COSTA; SOUZA, 2022).

    Compõem também o corpus de análise os Projetos Político-Pedagógicos de duas instituições de educação infantil atualizados no ano de 2023. Esses documentos trazem demonstração da participação da comunidade no processo de suas construções e trazem de maneira preponderante a criança como sujeito de direitos, com múltiplas identidades, culturas e saberes. Apresentam seus propósitos em consonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2010), explicitando a concepção de proposta pedagógica, a proposição de elaboração coletiva e a imbricação entre educar e cuidar, quando se trata de uma proposta de trabalho com infâncias.  

Proposta pedagógica ou projeto político pedagógico é o plano orientador das ações da instituição e define as metas que se pretende para a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças que nela são educados e cuidados. É elaborado num processo coletivo, com a participação da direção, dos professores e da comunidade escolar. (BRASIL, 2010, p.13)

 

    As instituições estão localizadas em um bairro periférico, marcado por questões de vulnerabilidade social. De acordo com o PPP de uma das instituições, a região apresenta alto índice de criminalidade, conforme pesquisas realizadas no território. Outra referência do bairro trata-se do conhecido ― “lixão", onde famílias de crianças matriculadas na creche/escola trabalham para a sobrevivência. Esses dois aspectos demarcam a vulnerabilidade do território (SOUZA; ROSA; SANTOS, 2022); portanto, foi uma escolha intencional marcada, também, pela nossa inserção como profissionais e pesquisadores/as nesse bairro. A instituição  A[ii] é uma creche, tem 29 anos de existência, atende a 187 crianças de 7 meses a 3 anos e 11 meses, em período integral (8 horas diárias) e conta com uma equipe de 51 colaboradores (PPP, A, 2023) A instituição B é uma escola municipal de educação infantil e ensino fundamental,  tem 8 anos de existência, atende a 384 crianças de 1 ano a 5 anos de idade, em período integral (8 horas diárias) e conta com uma equipe composta de 38 professores e 11 monitores de apoio à educação (PPP, B, 2023).

    Ambas as instituições, a partir da análise dos documentos, se dedicaram ao estudo do território onde estão inseridas para elaboração dos projetos pedagógicos. Nesses documentos são apresentados a estrutura do bairro, questões sociais e econômicas das famílias, equipamentos urbanos presentes, comércios, espaços de atendimento à saúde, esporte, organizações comunitárias etc.

    Percebe-se que há uma interlocução do território para além do espaço institucional, buscando articulação de trabalhos com as crianças, com o objetivo de explorar e pensar a respeito do entorno das instituições. No PPP (instituição A) afirma-se:

A Instituição através da sua organização pedagógica e planejamento dos projetos deve promover a interação das crianças com o território. É interessante que visitem as praças, que brinquem nas ruas, que conheçam o cinema, realizem passeios, ao museu e pontos turísticos da cidade, pois assim haverá maior acesso aos bens culturais, ampliando as possibilidades de construção de saberes levando-as a construção e valorização da identidade e protagonismo (PPP - A, 2023, p. 18).

    Em ambos os documentos, percebe-se que é feita uma relação da criança com o território em que vive, com o objetivo de potencializar suas qualidades e transformar o que é visto como fragilidade. A criança é entendida como sujeito histórico, cultural e de direitos; pode ser participante do processo e ter o direito de acessar os espaços do território em que vive. Há uma intencionalidade no documento A, o que também comparece no documento B quando dialoga com espaços, tempos e transformações, afirmando, na página 36, que “a criança precisa observar, manipular, explorar e investigar seu entorno, consultando informações para buscar respostas para suas curiosidades e indagações”. Esse explorar e investigar seu entorno deve ser visto com um olhar para além dos espaços escolares; está fundamentado no objetivo de ir além dos muros institucionais. Apresenta-se no direito a outros espaços educativos, como relatado em estudos sobre educação integral e sobre infâncias em tempo integral (MOLL, 2012; FERREIRA; SOUZA, 2021), o que não pode ser reduzido a “passeios” ou incursões pontuais no bairro ou na cidade, mas no direito efetivo de entrada de atores do território na escola, com intencionalidades educativas.

    A relação escola/instituição e famílias é um ponto primordial para que haja fortalecimento e difusão de conhecimento no território, especialmente na jornada ampliada. É um processo de validação dos saberes existentes na comunidade, protagonizando-os e levando conhecimento dos seus direitos para a transformação social, bem como para a compreensão sobre a relação entre tempo integral, território e infâncias. Cabe refletir aqui sobre o binômio cuidar e educar, muito presente no debate da educação infantil, que também se apresenta como perspectiva na ampliação da jornada escolar diária e nas aspirações das famílias. As instituições de educação infantil devem prever condições para o trabalho coletivo e para a organização de materiais, espaços e tempos que assegurem a educação em sua integralidade, compreendendo o cuidar e educar como indissociáveis do processo educativo (PEIXOTO; SCHUSHTER; ARAÚJO, 2015).

 

[i] Informações disponibilizadas pela equipe de inspeção da Secretaria Municipal de Educação (SMED) e podem ser conferidas em http://www.smedgv.com/SMED.php#team . Acesso em 28 de agosto de 2023.

 

 

[ii] As instituições serão referenciadas como A e B, com vistas a preservar a identidade documental.

 

 

    A partir das reflexões sobre infância, território e tempo integral, a análise documental dos Cadernos da ETI e dos Projetos Pedagógicos das instituições de educação infantil, chega-se a um entendimento de que se faz necessária uma ampliação das discussões a respeito da temática nas redes de ensino, no espaço escolar. O currículo precisa ser real e dinâmico, partindo das demandas das infâncias e da realidade local do território onde elas vivem.

    Para que haja relação efetiva entre infância e território é preciso que estejam reunidos diversos atores sociais e estes devem estar em liberdade para expor seus saberes, suas vivências e conceitos emanados de diferentes contextos, evidenciando a pluralidade e a diversidade.

    É somente a partir do Projeto Político-Pedagógico, construído coletivamente e com uma proposta curricular que dialogue com as questões territoriais, que a escola/instituição pode desenvolver seu trabalho de orientação e articular as ações e atividades propostas, na perspectiva da idealização da educação integral e em tempo integral, levando em conta os desafios concretos da comunidade onde está inserida.  A educação integral constitui ação estratégica frente às questões da contemporaneidade atravessadas por diversas transformações, no que diz respeito à construção e difusão de conhecimentos, nas relações sociais e na constituição de culturas.

    Ao considerarmos as crianças como protagonistas do processo pedagógico, somos instigados a ouvir as suas vozes, as relações que estabelecem com territórios e que convocam escolas a se reconhecerem como partes dos territórios e não como expectadoras do que neles se desenrola. As infâncias podem apontar diretrizes porque as crianças veem o mundo de forma criativa, questionam localidades, limites e fronteiras, tensionam ou expõem exclusões e inclusões por vezes precárias em territórios vulneráveis. Portanto, estabelecer a relação entre infância e território, quando se pretende ampliação da jornada escolar diária, é mais que importante, é urgente.

[1] Informações disponibilizadas pela equipe de inspeção da Secretaria Municipal de Educação (SMED) e podem ser conferidas em http://www.smedgv.com/SMED.php#team . Acesso em 28 de agosto de 2023.

[1] As instituições serão referenciadas como A e B, com vistas a preservar a identidade documental.

 

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