A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento prescritivo que descreve objetos de conhecimento e aprendizagens essenciais que o aluno da Educação Básica deve desenvolver a cada ano e nas diversas áreas de conhecimento. Diante das orientações de aprendizagem e levando em conta alguns estudos que norteiam a educação, como as teorias da aprendizagem, este artigo visa compreender a relação das teorias de aprendizagem com a BNCC no que tange ao ensino da Língua Portuguesa do Ensino Fundamental Anos Finais.
Dessa forma, objetiva-se, neste estudo, analisar a proposta de ensino de Língua Portuguesa conforme preconiza a BNCC, constatar a relação entre as teorias da aprendizagem e a peça da normativa e averiguar suas contribuições à luz das teorias da aprendizagem para o ensino da Língua Portuguesa Anos Finais.
Este trabalho conta com abordagem qualitativa e é embasado por uma pesquisa bibliográfica que leva em consideração leituras de artigos, dissertações, capítulos de livros e documentos de semelhante relevância, que foram selecionados visando-se o alcance dos objetivos propostos neste estudo.
No que se refere à natureza de pesquisa, esta se classifica como resumo de assunto. Ademais, quanto aos objetivos, será utilizada a pesquisa descritiva, já que o intuito é observar, analisar e averiguar as contribuições das teorias de aprendizagem na BNCC para o ensino da Língua Portuguesa no Ensino Fundamental Anos Finais.
Este trabalho se justifica pela necessidade de compreender, com clareza, a relação linear das teorias da aprendizagem na BNCC e como esta contribui para o ensino da Língua Portuguesa nos Anos Finais do Ensino Fundamental. A compreensão dessa relação permitirá à comunidade acadêmica, bem como aos docentes, a possibilidade de uma reflexão ou orientação mais profunda da realidade basilar da aprendizagem. Além disso, possibilitará a ampliação do número de trabalhos escritos, servindo de fonte para novas pesquisas, que auxiliarão ainda mais no entendimento dessa temática. Este artigo almeja, ainda, contrastar a BNCC com pressupostos teóricos de pesquisadores como Henri Wallon e Vygotsky para obter os resultados esperados.
A PROPOSTA DE ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA CONFORME PRECONIZA A BNCC
A construção de embasamentos teóricos que proporcionem aprendizagens essenciais no Ensino Básico é um desafio enfrentado, em diversos momentos históricos, pela educação brasileira.
Dentre as medidas adotadas pelos órgãos educacionais para atingir metas de aprendizagem e desenvolvimento, destaca-se a criação de um documento que servisse como base curricular única para todo o território nacional. Esse documento está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996, p. 12), que, no artigo 9º, define: “estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum”. Assim, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) foi formulada com esse objetivo e homologada em 20 de dezembro de 2017 pelo ministro da Educação, Mendonça Filho. Consta no documento o seguinte:
Art. 1- Fica homologado o Parecer CNE/CP no 15/2017, do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação, aprovado na Sessão Pública de 15 de dezembro de 2017, que, junto ao Projeto de Resolução a ele anexo, instituem e orientam a implantação da Base Nacional Comum Curricular – BNCC, explicitando os direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, a ser observada obrigatoriamente ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica. (BRASIL, 2018, s/p).
A BNCC propõe que aprendizagens essenciais sejam garantidas por meio do desenvolvimento de competências, habilidades, atitudes e valores. O alcance satisfatório dessas aprendizagens visa proporcionar a equidade educacional e a formação integral do indivíduo.
No Ensino Fundamental Anos Finais, a Base organiza os componentes curriculares em cinco áreas de conhecimento – Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Ensino Religioso – que devem ser trabalhadas de acordo com a finalidade da aprendizagem e a necessidade de cada nível escolar. Dentro dessa estrutura, o Ensino Fundamental se divide em Anos Iniciais e Anos Finais.
A proposta da composição da BNCC para os Anos Finais, no que se refere à área de Linguagens, é proporcionar ao aluno a construção do aprendizado por meio da prática de linguagens diversificadas. Esses componentes diversificados e articulados serão complementos fundamentais para a ampliação do aprendizado da área. Acerca da área de Linguagens, a Base traz o seguinte:
Na BNCC, a área de Linguagens é composta pelos seguintes componentes curriculares: Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e, no Ensino Fundamental – Anos Finais, Língua Inglesa. A finalidade é possibilitar aos estudantes participar de práticas de linguagem diversificadas, que lhes permitam ampliar suas capacidades expressivas em manifestações artísticas, corporais e linguísticas, como também seus conhecimentos sobre essas linguagens, em continuidade às experiências vividas na Educação Infantil. (BRASIL, 2018, p. 63).
Ainda no âmbito de construção do aprendizado, no que se refere ao componente curricular Língua Portuguesa no Ensino Fundamental Anos Finais, o objetivo norteador é possibilitar ao aluno vivências que favoreçam a formação crítica contextualizada às práticas sociais e integrada à oralidade pela escrita e por outras linguagens. Nessa perspectiva, a BNCC esclarece:
Ao componente Língua Portuguesa cabe, então, proporcionar aos estudantes experiências que contribuam para a ampliação dos letramentos, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens. (BRASIL, 2018, p. 67-68).
Diante disso, a Base traz a centralidade do texto em favor do ensino da Língua Portuguesa, sendo trabalhado a partir de eixos de integração: oralidade, leitura/escuta, produção (escrita e multissemiótica) e análise linguística/semiótica. Esses eixos devem ser entrelaçados no campo de atuação que propõe a seleção de gêneros, práticas, atividades e procedimentos contextualizados ao conhecimento escolar, expressivos para o aluno e sua vida social, tendo em vista o engajamento de novas experiências.
Assim, para assegurar o desenvolvimento de dez competências específicas, o componente Língua Portuguesa apresenta um conjunto de habilidades que estão atreladas aos diversos objetos de conhecimento (conteúdos). No tocante à definição de competência, a BNCC conceitua:
[...] competência é definida como “a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades, (práticas, cognitivas e socioemocionais) atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho” (BRASIL, 2018, p. 8).
De modo geral, as competências contemplam as intenções da Base em relação aos objetivos esperados e sugeridos para o ensino da Língua Portuguesa no Ensino Fundamental Anos Finais. Espera-se que, ao término do período escolar, o estudante tenha adquirido as competências mínimas como recomendado no documento. A respeito das competências trazidas na Base, convém citá-las:
1. Compreender a língua como fenômeno cultural, histórico, social, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso, reconhecendo-a como meio de construção de identidades de seus usuários e da comunidade a que pertencem.
2. Apropriar-se da linguagem escrita, reconhecendo-a como forma de interação nos diferentes campos de atuação da vida social e utilizando-a para ampliar suas possibilidades de participar da cultura letrada, de construir conhecimentos (inclusive escolares) e de se envolver com maior autonomia e protagonismo na vida social.
3. Ler, escutar e produzir textos orais, escritos e multissemióticos que circulam em diferentes campos de atuação e mídias, com compreensão, autonomia, fluência e criticidade, de modo a se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos, e continuar aprendendo.
4. Compreender o fenômeno da variação linguística, demonstrando atitude respeitosa diante de variedades linguísticas e rejeitando preconceitos linguísticos.
5. Empregar, nas interações sociais, a variedade e o estilo de linguagem adequados à situação comunicativa, ao(s) interlocutor(es) e ao gênero do discurso/gênero textual. 6. Analisar informações, argumentos e opiniões manifestados em interações sociais e nos meios de comunicação, posicionando-se ética e criticamente em relação a conteúdos discriminatórios que ferem direitos humanos e ambientais.
7. Reconhecer o texto como lugar de manifestação e negociação de sentidos, valores e ideologias.
8. Selecionar textos e livros para leitura integral, de acordo com objetivos, interesses e projetos pessoais (estudo, formação pessoal, entretenimento, pesquisa, trabalho etc.).
9. Envolver-se em práticas de leitura literária que possibilitem o desenvolvimento do senso estético para fruição, valorizando a literatura e outras manifestações artístico-culturais como formas de acesso às dimensões lúdicas, de imaginário e encantamento, reconhecendo o potencial transformador e humanizador da experiência com a literatura.
10. Mobilizar práticas da cultura digital, diferentes linguagens, mídias e ferramentas digitais para expandir as formas de produzir sentidos (nos processos de compreensão e produção), aprender e refletir sobre o mundo e realizar diferentes projetos autorais. (BRASIL, 2018, p.87).
É imprescindível ressaltar que, na BNCC, é esclarecido o que se espera que estudantes aprendam como conhecimentos, competências e habilidades. Sendo assim, orienta os professores quanto aos objetivos de ensino no que se deve ensinar para atingir as expectativas de aprendizagens essenciais propostas no documento. No entanto, as estratégias de ensino ficam a cargo dos professores da Educação Básica e, de forma mais enriquecedora, são elaboradas em parceria com os gestores e profissionais envolvidos no processo educacional.
A relação entre as teorias da aprendizagem e a peça normativa da BNCC
A Base Nacional Comum Curricular é um documento que foi elaborado após pesquisas e debates realizados por especialistas de diversas áreas que se engajaram com professores e a sociedade para contribuir com os objetivos de aprendizagem. Até constatar a necessidade de uma peça normativa, como a BNCC, e efetivar sua elaboração, são necessários embasamentos epistemológicos que norteiam e dão significados ao corpo documental. Diante desses pressupostos, teorias de aprendizagens se relacionam com a peça normativa da BNCC para fundamentar o documento.
Henri Paul Hyacinthe Wallon foi um pesquisador que defendeu o desenvolvimento humano através da união entre o afeto, a inteligência e o social. O autor estudou o desenvolvimento humano com base na integração de cinco campos funcionais: impulsivo-emocional; sensório-motor e projetivo; personalismo; categorial, e puberdade e adolescência.
No campo puberdade e adolescência, ocorrem mudanças fisiológicas causadas pelo amadurecimento sexual que provocam tanto transformações corporais quanto psíquicas. Articulada a essa ideia, a BNCC, na etapa do Ensino Fundamental Anos Finais, declara que “Os estudantes dessa fase inserem-se em uma faixa etária que cor[1]responde à transição entre infância e adolescência, marcada por intensas mudanças decorrentes de transformações biológicas, psicológicas, sociais e emocionais” (BRASIL, 2018, p. 60). Nesse estágio, a autoafirmação é bem marcada, e o professor tem papel preponderante como estimulador de vínculos afetivos e sociais. De acordo com Almeida e Maboney,
Na puberdade e adolescência, o recurso principal de aprendizagem do ponto de vista afetivo volta a ser a oposição, que vai aprofundando e possibilitando a identificação das diferenças entre idéias, sentimentos, valores próprios e do outro, adulto, na busca para responder: quem sou eu? Quais são meus valores? Quem serei no futuro?, que é permeada por muitas ambiguidades.
O processo ensino-aprendizagem facilitador do ponto de vista afetivo é aquele que permite a expressão e discussão dessas diferenças e que elas sejam levadas em consideração, desde que respeitados os limites que garantam relações solidárias. (2005, p. 14).
Dessa forma, o professor, por meio de suas intencionalidades educativas e como detentor de saberes, pode usar a emoção e a afetividade entre professor/aluno e aluno/aluno ou o grupo para proporcionar condições que favoreçam o processo de desenvolvimento de aprendizagem, por meio da criação de vínculos sociais, da interação, da inclusão e da identificação do indivíduo.
Em conformidade com essa questão, a Base Nacional Comum Curricular, na etapa do Ensino Fundamental Anos Finais, traz o seguinte:
Nesse período de vida, como bem aponta o Parecer CNE/CEB nº 11/2010, ampliam-se os vínculos sociais e os laços afetivos, as possibilidades intelectuais e a capacidade de raciocínios mais abstratos. Os estudantes tornam-se mais capazes de ver e avaliar os fatos pelo ponto de vista do outro, exercendo a capacidade de descentração, “importante na construção da autonomia e na aquisição de valores morais e éticos” (BRASIL, 2010, p. 60).
Nesse aspecto, o professor deve reconhecer as transformações que ocorrem tanto por fatores biológicos quanto por fatores emotivos e sociais que geram a necessidade de autoafirmação e pertencimento a determinados grupos. Para os autores Dourado e Prandini (2012, p. 8), “o professor pode, desta forma, auxiliar o adolescente em suas indecisões e angústias, propondo atividades que propiciem o reconhecimento de suas tendências e o cultivo de aptidões orientando a proposição de metas e objetivos futuros.” A BNCC compartilha dessa ideia na etapa do Ensino Fundamental Anos Finais, assinalando que
As mudanças próprias dessa fase da vida implicam a compreensão do adolescente como sujeito em desenvolvimento, com singularidades e formações identitárias e culturais próprias, que demandam práticas escolares diferenciadas, capazes de contemplar suas necessidades e diferentes modos de inserção social. (BRASIL, 2018, p. 60).
De acordo com a teoria walloniana, o desenvolvimento não termina na adolescência, ele continua por toda a vida do indivíduo. A afetividade e a cognição estarão sempre presentes na vida humana, às vezes haverá predomínio de uma ou de outra, mas se considera que estarão sempre em interação durante as inúmeras aprendizagens que desenvolvemos ao longo da vida.
Considerando a continuidade como um fator preponderante para o desenvolvimento integral do ser humano, na escola a aprendizagem deve ocorrer de forma progressiva em todos os níveis escolares. Nesse sentido, a BNCC ressalta a ideia da transição da Educação Infantil (os direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, explicitando a síntese das aprendizagens esperadas nos campos de experiências) para o Ensino Fundamental (por meio das habilidades de cada componente curricular em sua respectiva área de conhecimento). O documento também aponta que
Essa síntese deve ser compreendida como elemento balizador e indicativo de objetivos a ser explorados em todo o segmento da Educação Infantil, e que serão ampliados e aprofundados no Ensino Fundamental, e não como condição ou pré-requisito para o acesso ao Ensino Fundamental. (BRASIL, 2018, p. 53).
Ao considerar a síntese de aprendizagem como esperado em cada campo da experiência nos diversos níveis escolares, a BNCC evidencia a relação com a teoria de Vygotsky, na perspectiva dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento. Lev Semyonovich Vygotsky foi mais um pesquisador que, assim como Henri Wallon, contribuiu com estudos sobre o desenvolvimento da aprendizagem humana sob a perspectiva das relações sociais. Para o autor, o aprendizado é resultante das relações entre o indivíduo e o meio. A BNCC traz isso da seguinte maneira:
O eu, o outro e o nós – É na interação com os pares e com adultos que as crianças vão constituindo um modo próprio de agir, sentir e pensar e vão descobrindo que existem outros modos de vida, pessoas diferentes, com outros pontos de vista. Conforme vivem suas primeiras experiências sociais (na família, na instituição escolar, na coletividade), constroem percepções e questionamentos sobre si e sobre os outros, diferenciando-se e, simultaneamente, identificando-se como seres individuais e sociais. Ao mesmo tempo em que participam de relações sociais e de cuidados pessoais, as crianças constroem sua autonomia e senso de autocuidado, de reciprocidade e de interdependência com o meio (BRASIL, 2018, p. 36).
Dessa forma, concebe-se que o conhecimento é adquirido no decorrer de quatro estágios, quais sejam: sensório-motor, pré-operatório, operatório-concreto e operatório-formal. No estágio operatório-formal, que ocorre a partir da adolescência, a linguagem e a interação social com o grupo têm papel relevante na construção do aprendizado. Nessa fase, o ser humano busca o próprio conhecimento na interação com o meio e ainda cria possibilidades de interferência sobre o meio a partir de reflexões internas e experiências. Para Neves e Damiani,
Na abordagem Vygotskyana, o homem é visto como alguém que transforma e é transformado nas relações que acontecem em uma determinada cultura. O que ocorre não é uma somatória entre fatores inatos e adquiridos e sim uma interação dialética que se dá, desde o nascimento, entre o ser humano e o meio social e cultural em que se insere. (2006, p. 7).
Nesse âmbito, o papel do professor é mediar o processo de aprendizagem por ser mais experiente, poder planejar suas intervenções e ter interações contínuas na escola. Além disso, o objetivo da aprendizagem precisa ser a busca pelo desenvolvimento humano. Acerca do exposto, Freitas explica:
O professor, na perspectiva de Vigotsky (1991), é aquele que, detendo mais experiência, funciona intervindo e mediando a relação do aluno com o conhecimento. Ele está sempre, em seu esforço pedagógico, procurando criar Zonas de Desenvolvimento Proximal, isto é, atuando como elemento de intervenção, de ajuda. Assim, na Zona de Desenvolvimento Proximal, o professor atua de forma explícita, interferindo no desenvolvimento dos alunos, provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente. Vygotsky, dessa forma, resgata a importância da escola e do papel do professor como agentes indispensáveis do processo de ensino-aprendizagem. (2000, p. 15).
Sendo assim, mais uma contribuição de Vygotsky para a BNCC, no que tange à relevância do professor e da escola para alcance dos objetivos de aprendizagem, é a participação de indivíduos adultos como mediadores, capazes de construir interações sociais que levem em consideração a diversidade cultural como uma das características humanas, uma vez que o desenvolvimento de um indivíduo está integrado ao contexto histórico e social sob a perspectiva da linguagem. A BNCC esclarece:
Atenta a culturas distintas, não uniformes nem contínuas dos estudantes dessa etapa, é necessário que a escola dialogue com a diversidade de formação e vivências para enfrentar com sucesso os desafios de seus propósitos educativos. A compreensão dos estudantes como sujeitos com histórias e saberes construídos nas interações com outras pessoas, tanto do entorno social mais próximo quanto do universo da cultura midiática e digital, fortalece o potencial da escola como espaço formador e orientador para a cidadania consciente, crítica e participativa. (BRASIL, 2018, p. 62).
A respeito do tema elencado, a BNCC no Ensino Fundamental explicita o reconhecimento do aluno como um ser social que é capaz de interagir racionalmente com o meio e construir o próprio saber de forma crítica e participativa.
Contribuições da BNCC à luz das teorias da aprendizagem para o ensino da Língua Portuguesa Anos Finais
A Base Nacional Comum Curricular, na área de Linguagens, inicia com uma breve contextualização que explana sobre conceitos, finalidades e quais os componentes curriculares que fazem parte desse campo do saber. Ademais, explica como ocorrem as atividades humanas e a interação:
As atividades humanas realizam-se nas práticas sociais, mediadas por diferentes linguagens: verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e, contemporaneamente, digital. Por meio dessas práticas, as pessoas interagem consigo mesmas e com os outros, constituindo-se como sujeitos sociais. Nessas interações, estão imbricados conhecimentos, atitudes e valores culturais, morais e éticos. (BRASIL, 2018, p. 63).
Dessa maneira, o destaque para a interação, nessa área de conhecimento, esclarece como o aluno constitui-se sujeito e que a linguagem faz parte desse processo. Em conformidade com esse assunto, nas competências específicas de linguagens para o Ensino Fundamental, a BNCC também contempla questões de linguagem como mediação de práticas que resultam na interação social, conforme segue:
- Compreender as linguagens como construção humana, histórica, social e cultural, de natureza dinâmica, reconhecendo-as e valorizando-as como formas de significação da realidade e expressão de subjetividades e identidades sociais e culturais.
- Conhecer e explorar diversas práticas de linguagem (artísticas, corporais e linguísticas) em diferentes campos da atividade humana para continuar aprendendo, ampliar suas possibilidades de participação na vida social e colaborar para a construção de uma sociedade mais justa, democrática e inclusiva. (BRASIL, 2018, p. 64).
Nesse âmbito, Vygotsky possui teorias que contribuem significativamente para fundamentar concepções de interação social sob o aspecto da linguagem e que é possível de serem reconhecidas na BNCC. O autor defende a preponderância da linguagem na organização de pensamento. Segundo Rabello e Passos,
Vygotsky enfatizava o processo histórico-social e o papel da linguagem no desenvolvimento do indivíduo. Sua questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio. Para o teórico, o sujeito é interativo, pois adquire conhecimentos a partir de relações intra e interpessoais e de troca com o meio, a partir de um processo denominado mediação. (s/d, p. 3).
Em continuidade com essa ideia, a BNCC, no componente Língua Portuguesa, sugere “proporcionar aos estudantes experiências que contribuam para a ampliação dos letramentos, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens.” (BRASIL, 2018, p. 67).
Um ponto em comum sobre as teorias de Vygotsky e Wallon que é notável na BNCC, no que diz respeito à Língua Portuguesa Anos Finais, é quanto à necessidade da participação e interação social no contexto escolar. Os referidos autores “tentaram mostrar que a capacidade de conhecer e aprender se constrói a partir de trocas estabelecidas entre o meio e o sujeito.” (FELIPE, 2007, p. 27). Indo ao documento mais uma vez, temos:
Nos Anos Finais do Ensino Fundamental, o adolescente/jovem participa com maior criticidade de situações comunicativas diversificadas, interagindo com um número de interlocutores cada vez mais amplo, inclusive no contexto escolar, no qual se amplia o número de professores responsáveis por cada um dos componentes curriculares.
Essa mudança em relação aos anos iniciais favorece não só o aprofundamento de conhecimentos relativos às áreas, como também o surgimento do desafio de aproximar esses múltiplos conhecimentos. A continuidade da formação para a autonomia se fortalece nessa etapa, na qual os jovens assumem maior protagonismo em práticas de linguagem realizadas dentro e fora da escola. (BRASIL, 2018, p. 136).
Nesse sentido, o estímulo à participação do aluno por meio da interação social com situações comunicativas, seja de forma oral ou escrita, proporciona o desenvolvimento da aprendizagem através da partilha de conhecimentos e experiências.
Na Língua Portuguesa Anos Finais, é possível promover a autonomia dos alunos por meio de práticas de linguagem que favoreçam situações de desenvolvimento da aprendizagem e troca de experiências. Consta na BNCC (BRASIL, 2018, p. 136) que “amplia-se o contato dos estudantes com gêneros textuais relacionados a vários campos de atuação e a várias disciplinas, partindo-se de práticas de linguagem já vivenciadas pelos jovens para a ampliação dessas práticas, em direção a novas experiências.”
Por conseguinte, nota-se que os gêneros textuais são ferramentas essenciais que, quando bem utilizadas, proporcionam interação e integração com as práticas de linguagem e o favorecimento de um ensino significativo na vida dos alunos.
Conforme abordado neste artigo, a BNCC apresenta em seu corpo documental recomendações pedagógicas que estão atreladas às contribuições epistemológicas de estudiosos, como Henri Wallon e Lev Vygotsky, que colaboraram com a educação nos diversos níveis escolares. A relação dessas teorias com a Base Nacional Comum Curricular pode ser constatada em diversas partes da peça normativa no que diz respeito à formação e ao desenvolvimento humanos.
A Base Nacional Comum Curricular está embasada em princípios, como educação integral e igualitária, que buscam proporcionar a aprendizagem por meio do desenvolvimento de competências e habilidades.
Nesse contexto, no que diz respeito ao componente Língua Portuguesa Anos Finais, o ensino deve proporcionar ao aluno estímulos para desenvolver a autonomia e a formação crítica e assim atingir aprendizagens como a ampliação de letramentos que favoreçam a troca de experiências, a interação com o meio social e o aprendizado expressivo e contextualizado com o aluno.
Vale ressaltar, mais uma vez, que os teóricos aqui elencados contribuíram, de forma significativa, com vários pensamentos no campo da educação, e na BNCC as ideias desses estudiosos são marcantes.
Wallon e Vygotsky desenvolveram teorias que defendem a interação com o meio social para o desenvolvimento de aprendizados. A BNCC sugere a interação em diversos níveis escolares e, no Ensino da Língua Portuguesa Anos Finais, sugere o desenvolvimento de habilidades por meio dos gêneros textuais que precisam estar contextualizados para assim contribuir com a valorização das experiências individuais e o favorecimento da interação do coletivo.
Wallon recomenda o fortalecimento de vínculos afetivos no ambiente escolar para potencializar o aprendizado, e Vygotsky defende a interação mediada pela linguagem.
Conclui-se que este estudo contribuirá de modo significativo para estudantes, professores ou interessados em entender melhor sobre as teorias dos referidos autores e a BNCC, bem como acerca do Ensino da Língua Portuguesa Anos Finais. Espera-se, com este trabalho, instigar a busca pelo entendimento da necessidade da integração entre fundamentos teóricos e um documento como a Base Nacional Comum Curricular. Assim, este estudo pode despertar no leitor valores e a compreensão da busca das intencionalidades educativas por meio da interação social, da afetividade e do uso da centralidade do texto como fonte de discernimento para interferir no processo educacional.
ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; MAHONEY, Abigail Alvarenga. Afetividade e processo ensino-aprendizagem: contribuições de Henri Wallon. Psicologia da Educação, São Paulo, p. 11-30, 2005.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 12 abr. 2021.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Portaria nº 1.570. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: PORTARIA1570DE22DEDEZEMBRODE2017.pdf (mec.gov.br). Acesso em: 18 abr. 2021.
BRASIL. Ministério da Educação. LDB - Lei de Diretrizes e Bases. Lei nº 9.394. Brasília: MEC, 1996. Disponível em: Ministério da Educação - Ministério da Educação (mec.gov.br). Acesso em: 18 abr. 2021.
DOURADO, Ione Collado Pacheco; PRADINI, Regina Célia Almeida Rego. Henri Wallon: psicologia e educação. Augusto Guzzo Revista Acadêmica, São Paulo, 2012.
FELIPE, Jane. O desenvolvimento infantil na perspectiva sociointeracionista: Piaget, Vygotsky, Wallon. São Paulo: Artmed editora S.A., 2007.
FREITAS, Maria Tereza de Assunção. As apropriações do pensamento de Vygotsky no Brasil: Um Tema em Debate. São Paulo: Psc. Ed., 2000.
NEVES, Rita de Araujo; DAMIANI, Magda Floriana. Vygotsky e as teorias da aprendizagem. Unirevista, Rio Grande do Sul, v. 1, n, 2, abr. 2006.
RABELLO, Elaine; PASSOS, Jose Silveira. Vygotsky e o desenvolvimento humano. Disponível em: http://www.josesilveira.com. Acesso em: 30 abr. 2021.