INTRODUÇÃO
A negação de muitas oportunidades tem: cor, raça, gênero, região, classe social, rede de ensino e tantos outros fragmentos que o sistema opressor escamoteia diariamente. Como é possível entoar esse “lugar de fala”[1], quanto à realidade social num país como o Brasil, que traz as marcas de aproximadamente 388 anos de escravidão vivenciadas por gerações anteriores, as quais tiveram seus direitos violados, como: a educação, moradia e dentre outros, a simples condição de existir no mundo. Logo, esta investigação é uma forma de reivindicar esses direitos, centrando-se na ampliação do olhar sobre a área da Pedagogia voltada para a aplicação das políticas públicas na Educação em espaços para além das escolas, porque por meio da ação educativa não-formal desenvolvida em Projetos sociais, acredita-se que haverá o reforço da garantia dos direitos humanos, bem como, dos valores concernentes ao exercício da cidadania com base nos deveres e direitos.
Sob essa ótica, conforme Santana (2019, p.174-175): “no Brasil é possível encontrar pessoas em condição de vulnerabilidade em diversas regiões”, em Aracaju essa situação não é diferente e isto acontece em decorrência, entre outros aspectos, das disparidades sociais” que colocam, principalmente, crianças e jovens nessa situação. Infelizmente, essa é uma realidade vivenciada no bairro Santa Maria e um dos fatores que favorece essa ocorrência é a baixa escolaridade.
Assim, este trabalho de pesquisa buscou investigar a eficácia do Projeto Recriarte, o qual é auxiliado de forma técnica pelo Ministério Público de Sergipe (MP/SE) no acompanhamento: pedagógico, psicológico e social das famílias que residem no bairro Santa Maria (bairro periférico do município de Aracaju/SE) e isso inclui um reforço escolar, que agrega atividades: culturais, recreativas, esportivas e ambientais, atendendo especificamente crianças e adolescentes da comunidade.
O Recriarte é vinculado à cooperativa de Agentes Autônomos de Reciclagem de Aracaju (CARE), desde o início desse projeto social e legalmente está interligado à Associação de Mulheres do Bairro Santa Maria e Trabalhadoras em Reciclagem (MATER), dentre outros parceiros. Portanto, a pesquisa apresentada mostra as particularidades do Projeto Recriarte, que não se limita apenas ao reforço escolar criativo, atendendo cerca de 100 crianças e adolescentes de escolas públicas, do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, pertencentes à faixa etária de seis a 14 anos de idade. Esse projeto social é um local de acolhimento para as pessoas que vivem nessa comunidade, pois auxilia essas famílias em diversos ângulos.
Neste sentido, há vários fatores que marcam a relação do Recriarte com as crianças e adolescentes assistidos, um deles é a vulnerabilidade social a que estão expostas a população residente no bairro citado, sendo este, um termo utilizado para classificar um grupo de pessoas que se encontram em condições socioeconômicas desfavoráveis diante do restante da sociedade e essas circunstâncias implicam quanto à situação de: moradia, acesso à educação, aquisição de bens materiais, ou seja, impacta diretamente na oportunidade do sujeito exercer sua cidadania de forma plena, conforme dito na Constituição Federal Brasileira de 1988.
Vale frisar que o interesse em desenvolver o presente trabalho de investigação, partiu da realização de estágio efetivado pela autora desta pesquisa no projeto em análise, sendo consideradas informações do primeiro semestre do ano de 2021 até o mês de outubro do mesmo ano, especificamente na lotação da Divisão de Serviço Social do Ministério Público de Sergipe (parceiro do Projeto Recriarte). Assim, diante do contato com o perfil dos atendidos pelo Projeto desencadeou-se o interesse em investigar a efetividade das ações desenvolvidas, partindo do seguinte questionamento: O Projeto Recriarte tem contribuído efetivamente para a inclusão social de crianças e adolescentes?
Desta forma, o objetivo geral da pesquisa buscou-se analisar como o Projeto Recriarte tem contribuído para a inclusão social de crianças e adolescentes atendidas neste ambiente. Com a intenção de enriquecer o trabalho, elencou-se os seguintes objetivos específicos: traçar o histórico do Projeto Recriarte; examinar as ações desenvolvidas no Projeto; identificar a metodologia utilizada no Projeto Recriarte; analisar o perfil das crianças e adolescentes participantes do Projeto; averiguar a formação técnica da equipe responsável pelo desenvolvimento do Projeto; verificar os benefícios do Projeto Recriarte para a comunidade local. A abordagem delineada para a pesquisa tem como suporte bases teóricas, de modo a ampliar o conhecimento sobre a temática em tela. Visto que, essa investigação traz um viés fundamentado em fatos verídicos, capazes de atrelar os conhecimentos prévios por meio das bases teóricas consultadas, sendo necessário buscar uma abordagem mais abrangente e ao assim proceder
[...] permitindo articular melhor a abordagem da pesquisa na perspectiva qualitativa já que essa abordagem adota um olhar voltado para os sentidos e significados conferidos pelos sujeitos aos fatos sociais, ou seja, valoriza a subjetividade para a captação de informações sendo de relevante importância verificar alguns aspectos como: comportamentos, anseios, opiniões etc. (LUDKE; MARLI; ANDRE, 1986, p. 26-27).
Neste sentido, para responder à questão levantada, destacou-se a pertinência de desenvolver uma pesquisa de campo por agregar “um apanhado de informações de autores competentes, para atingir objetivos determinados na investigação”, portanto Gil (2008, p. 76), explana que este tipo de pesquisa permite agregar dados, que podem abranger até uma dimensão territorial. Assim, já que existiu uma necessidade de compreender os fenômenos da comunidade assistida pelo projeto social, por conseguinte, quanto aos objetivos da pesquisa, configurou-se numa “[...] pesquisa explicativa por propor a identificação de fatores”, que contribuem para ocorrência de situações de vulnerabilidade social, como também indagar sobre as contribuições de Projeto Recriarte (CHAER; DINIZ; RIBEIRO, 2011, p. 254).
Segundo Gerhardt et al. (2009, p.37), a pesquisa aplicada tem por objetivo construir saberes direcionados “à execução prática e atrelado a isso estão os fatos e inspirações de determinado local”. Logo, para planejar uma pesquisa é necessário atentar-se sobre qual problema desejou-se identificar, a apresentação de hipóteses, entre outros assuntos que estão intercalados. De acordo com esse direcionamento, permitiu-se perceber e interpretar novas ideias sobre o Projeto Recriarte, dando ênfase ao contexto no qual o projeto está estabelecido, tais como : destacar as dimensões do problema e objetivos elencados, aprofundando-os ao longo da análise.
Destarte, os procedimentos metodológicos fontes de informação foram: pesquisa documental, estudo de caso e pesquisa participante. Logo, a pesquisa documental adentrou para realizar uma “garimpagem” de dados necessários para a pesquisa, permitindo compreender melhor como conduzir a investigação, sendo que nessa situação houve a autorização para ter acesso a esses documentos (SILVA et al., 2009, p.05). Essa pesquisa foi realizada numa oportuna visita técnica no setor da Divisão de Serviço Social no Ministério Público de Sergipe.
Além disso, para esta averiguação foi necessário um aprofundamento do tipo estudo de caso, uma vez que esteve sob análise a efetividade de um projeto específico, o Recriarte, o que possibilitou proceder com a investigação detalhista de suas práticas, gestão e alcance de propósitos bem como proporcionou a interação otimizada do pesquisador com o grupo social do estudo.
De acordo com Gil (2002, p.55), esse modo de obter informações não tem o objetivo de identificar precisamente quem são as pessoas que estão no espaço social estabelecido, “[...] mas investigar os elementos que influenciam essa população”, nesse caso, as condições de vulnerabilidade. Podendo este vir a ser um referencial para outros estudos voltados à indagação de projetos de natureza semelhante.
Contudo, Rodrigues (2009, p.48), destacou que o estudo de caso traz uma certa complexidade, “[...] por propor uma profundidade, quanto aos possíveis fatores que englobam determinado assunto, buscando interpretar a dimensão das situações apresentadas”. Portanto, este tipo de pesquisa exigiu-se um olhar atento quanto à realidade encontrada no determinado meio social, com o intuito de corresponder aos objetivos apresentados na pesquisa. Assim, percebeu-se que a pesquisa executada precisou partir da ótica das pessoas que vivem nesse espaço social, pois só elas sabem dizer as reais necessidades e melhorias que esse ambiente tinha a proporcionar.
Uma vez que, a pesquisadora tinha acesso ao Projeto Recriarte, a coleta de dados pôde acontecer de várias maneiras, através de conversas informais quanto à possíveis dúvidas diante das atividades, entre outras. Assim, as técnicas para coletar os dados direcionados à pesquisa partiram da observação participante “quando o pesquisador está intimamente interligado com o fato”, e da entrevista técnica semiestruturada indispensável para a “obtenção de informações por meio de opiniões individuais” (RODRIGUES, 2009, p. 127-128).
Considerou-se que, a metodologia escolhida parte: de uma pesquisa de abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, desenvolvida com base em fontes bibliográfica, documental e de maneira participante. Visto que, essa investigação traz um viés fundamentado em fatos verídicos capazes de atrelar os conhecimentos prévios, por meio das bases teóricas consultadas, sendo necessário buscar uma abordagem mais abrangente, e ao assim proceder
[...] permitindo articular melhor a abordagem da pesquisa na perspectiva qualitativa já que essa abordagem adota um olhar voltado para os sentidos e significados conferidos pelos sujeitos aos fatos sociais, ou seja, valoriza a subjetividade para a captação de informações sendo de relevante importância verificar alguns aspectos como: comportamentos, anseios, opiniões etc. (LUDKE; MARLI; ANDRE, 1986, p. 26-27).
Já os sujeitos da pesquisa constituíram-se de quinze participantes, os instrumentos de pesquisa decorreram de entrevistas semiestruturadas realizadas de modo presencial e com o auxílio do aplicativo de mensagens WhatsApp por meio de vídeo chamadas, áudios e de forma escrita (diário de campo).
No entanto, deve-se destacar que o período de isolamento social desencadeado pelo vírus Covid-19 limitou a comunicação com os/as alunos/as e seus familiares, pois o projeto não estava funcionando presencialmente, atendendo à determinação governamental de suspensão das aulas (desde à segunda semana de março à julho de 2021), e essa situação ressaltou as desigualdades sociais presentes na sociedade, uma vez que, nem todas as crianças atendidas tinham acesso aos meios tecnológicos para as interações virtuais ora desenvolvidas.
Logo, a pesquisa em questão está organizada em capítulos, os quais abrangem: quanto aos Resultados e Discussões abordou-se sobre o assunto estudado de acordo com os objetivos determinados inicialmente, nas Considerações houve a análise sobre a pesquisa e todo o seu processo e nas Referências colocou-se o embasamento que enriqueceu a discussão sobre o tema proposto.
[1] Expressão utilizada por Ribeiro (2019), para mostrar que o discurso dos sujeitos está situado de acordo com o lugar social que ocupa na pirâmide social e de onde e por quem fala.
2 DESENVOLVIMENTO
Nesse sentido, tendo como base o contexto da pesquisa foram trazidos à fundamentação teórica autores que trataram das questões referentes à exclusão social e racial, a exemplo de Djamila Ribeiro (2019), Paulo Freire (1996), Sílvio Almeida (2018), entre outros. Nesse sentido, evidenciou-se a presença dos Direitos Humanos por ser um assunto de relevância para a discussão no século XXI, em decorrência do protagonismo dos movimentos sociais, que reivindicam o fim das mazelas de um sistema cuja origem estrutural causam inúmeras desigualdades na sociedade brasileira, através do argumento abaixo pode-se perceber a origem desse assunto.
Segundo Goss, Silveira e Filho Salles (2018, p.12),
[...] o conceito de Direitos Humanos advém do século anterior (século XX), que teve como marco a Segunda Guerra Mundial. Esse período foi de muita comoção no mundo, pois aconteceram diversas atrocidades contra as vidas de pessoas que estavam à margem e/ou consideradas diferentes do sistema social vigente - judeus, homossexuais, ciganos, artistas, por exemplo - foram alvo da discriminação e do ódio nazista.
Verificou-se que a atual concepção de Direitos Humanos advém de um acontecimento que violou o direito de existir a várias pessoas somente porque as suas origens não correspondiam com as ideias de quem estava no poder. Assim, o atual conceito estabelecido para os Direitos Humanos é o de “[...] valorização da dignidade humana ao configurar-se como algo inseparável de qualquer ser humano seja ele quem for. Logo, evidenciaram-se atributos em relação ao assunto, como: a universalidade, a inalienabilidade e a imprescritibilidade”, os quais englobam os Direitos Humanos e todos eles tratam do direito à vida (PATRIOTA, 2021, p.4-5).
Dessa maneira, constatou-se que os Direitos Humanos permanecem defendendo a condição de existir de todos os seres humanos. No entanto, ao longo dos anos, estão sendo inseridas outras contribuições para minimizar os efeitos da discriminação, em específico: abrangendo a segregação racial, preconceito de gênero, perseguição política, religiosa. Sendo que, parte destas disparidades sociais advém de resquícios de Diáspora Africana (fenômeno histórico e social que retrata a saída forçada dos africanos de sua terra de origem para serem escravizados).
A história mundial nos mostra como o mundo desenvolveu-se baseado numa cultura dotada de um padrão: o dominador e o dominado. Sendo que essa configuração está perceptível na sociedade brasileira e desde a sua constituição histórica.
[...] é só buscar os fatos históricos para a melhor compreensão dessa estrutura que inferioriza quanto à raça e em decorrência vai gerar outras desigualdades como: exclusão dificultando o acesso à diversos oportunidades para ter uma vida digna e distinção socioeconômica (CIDH, 2020, p.21).
Nesse sentido, é importante saber da real história do Brasil e verificar as inúmeras lutas da população negra, que por meio de reivindicações desvelaram o racismo estrutural oriundo de uma sociedade de origem colonial e escravagista, ao expor o quanto essa ideologia afeta as relações sociais e em consequência nega direitos.
No Brasil há a ideia de que a escravidão aqui foi mais branda do que em outros lugares, o que nos impede de entender como o sistema escravocrata ainda impacta a forma como a sociedade se organiza. É necessário reconhecer as violências ocorridas durante o período da escravidão (RIBEIRO, 2019, p.11-12).
Portanto, o reconhecimento dessa estrutura racista que determina normas de comportamentos das pessoas e condiciona grupos sociais a pertencerem a lugares de opressão é algo impensável quando se almeja uma sociedade lastrada no respeito e na dignidade humana.
Paulo Freire (1996, p. 48) nos mostrou o quanto é necessário lutar pela reivindicação desses direitos, por tratar-se de um sistema econômico que acentua as desigualdades de acesso a bens e serviços assim como nega direitos essenciais à manutenção da vida com dignidade, direitos esses cuja garantia está explicitada na Constituição Federal Brasileira:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 2015).
O artigo citado acima, faz uma reflexão de que esses direitos estão presentes na Constituição Federal e essa lei não deveria ser violada. Observou-se que os itens em destaque fazem parte dos direitos sociais a que todos os brasileiros e brasileiras deveriam ter acesso sob a garantia do Estado. De acordo com Almeida (2018, p.138), “[...] o processo histórico de escravidão experenciado no Brasil auxilia nesse olhar de naturalização na contemporaneidade em relação as opressões sociais” direcionadas às pessoas que fazem parte de classes sociais mais vulneráveis, como: negros, indígenas, pessoas do movimento LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer /questionando, intersexo, assexuais/arromânticas/agênero, pan/poli, não-binárias etc.), crianças, idosos, pessoas com deficiências, transtornos de aprendizagem e diante do posicionamento religioso contrário ao que é imposto socialmente.
Ainda se explana como a violência contra as pessoas de etnia negra ocupa indicadores alarmantes: as estatísticas de 2021 revelam a condição desigual à qual essa população está exposta diariamente. Em vista disso, ao explorar o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de (2021), verificou-se estatisticamente diversas situações de violência dentre elas está o crescimento das mortes violentas intencionais que trazem os Estados do Ceará com 45,6%, Bahia 44,9%, Sergipe 42,6% e Amapá 41,7%, ainda, observa-se que 78,0 % dessas mortes foram com emprego de arma de fogo (revólver); já as vítimas em sua maioria são de pessoas negras ocupando 76,2%, tendo como maioria os jovens com 54,3%, e do sexo masculino 91,3%.
Nessa perspectiva, acerca da lógica referente à violência contra meninas e mulheres foi demonstrado que essas atrizes sociais em sua maioria são vítimas de feminicídio, termo que reflete o crime de ódio baseado no gênero, ou seja, o assassinato de meninas e mulheres se diferenciando diante da organização cultural. Além disso, é necessário expor a violência contra crianças e adolescentes que também corresponde um número considerável: ocorreram 267 assassinatos no ano 2020 de crianças de zero a 11 anos de idade e 170 dessas crianças tinham entre 0 a 4 anos de idade; em relação ao ano anterior, 2019, ocorreu um aumento de 1,9% e já 5.855 adolescentes de 12 a 19 anos foram vítimas de mortes violentas intencionais calculando 3,6%.
Evidencia-se aqui um caso de violência que chocou os moradores do bairro Santa Maria (população à qual está sendo direcionada a pesquisa) e foi veiculado pelos meios de comunicação. O canal F5 NEWS (2021), noticiou o “Caso Lorrany”, uma menina de 06 (seis) anos de idade que estava desaparecida e depois foi encontrada morta no Morro do Avião e teria sido violentada sexualmente pelo suspeito do crime que era conhecido da família e tinha o costume de oferecer doces a criança. A população do Santa Maria ficou revoltada com esse fato, houve a tentativa de invasão da unidade da polícia e três veículos do transporte público foram depredados (este fato ocorreu no dia 21 de outubro de 2021).
Logo, é necessário fazer uma reflexão sobre o Projeto Recriarte, no sentido de perceber o quanto ele favorece a proteção de crianças e adolescentes, principalmente das meninas. O momento em que estes se encontram nesse ambiente educacional, minimiza a ocorrência de estarem na rua e até mesmo de serem privados de algo dentro da própria casa. Assim, verifica-se a importância da educação formal propiciada pelas escolas nas práticas de inclusão social desde quando a formação educacional oportuniza novos pensamentos, com intuito de alcançar novas perspectivas e ultrapassando as desigualdades sociais.
Somada a isso, afere-se a ideia sobre os direitos fundamentais para as crianças e adolescentes e ao jovem determinando que esse dever se destina à família, à sociedade e ao Estado. Portanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é um documento oficial que estabelece a defesa de crianças e adolescentes independente de sua procedência, identificando e defendendo direitos fundamentais à vida, os quais devem ser respeitados. De maneira que:
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais (BRASIL,1990).
Portanto, essa população deveria ter uma assistência efetiva para a garantia dos direitos expressos de acordo com o ECA, pois estão em fase de construção da vida. No entanto, o que se evidencia são os vários casos de violência em relação a crianças e adolescentes no país, acontecendo dentro e fora de seus lares. Neste sentido, no Congresso Digital comemorativo dos 30 anos do ECA realizado em 2020 (CNJ, 2020), a conselheira do Conselho Nacional de Justiça Ivana Farina destacou que um dos desafios quanto a efetivação do ECA é tirá-lo do papel. Ela argumentou que pensar em redução da maioridade penal não é solução, seria ocultar os problemas do contexto social desses indivíduos, ainda pontuou que o jovem negro precisa de um acolhimento maior. Já, para Pedro Hartung (representante do Instituto Alana) o investimento em políticas públicas de Estado combateria a desigualdade social.
Deste modo, notou-se a potencialidade das políticas públicas na transformação social, pois têm por objetivo macro reduzir a pobreza oriunda de um regime político cuja desigualdade é estrutural e excludente. As políticas públicas são práticas relevantes na sociedade pela garantia de direitos e essas ações advêm de iniciativas do Estado através de programas sociais.
Na concepção de Agum, Riscado e Menezes (2015, p. 05), ao falar de políticas públicas é preciso reforçar o quanto estas devem estar de acordo com as demandas sociais e científicas, no intuito de haver um estudo apropriado e acompanhamento preciso para que haja equilíbrio, em relação a proposta planejada e a concretização desta. Muitas vezes, essa política pública está em torno de várias construções sociais, então é pertinente focar num tema para pontuar os problemas que o envolvem.
Em levantamento efetuado pela UNICEF BRASIL (2021, p. 51-53), antes e durante o período de pandemia da COVID-19 desde o ano de 2019 até os dias atuais, faz-se necessário verificar os impactos dessa situação entre as pessoas mais vulneráveis: as escolas precisaram ser fechadas, a maioria das crianças não possuíam acesso à internet, as condições de pobreza se agravaram e vários outros elementos ainda não analisados exaustivamente pelos especialistas a exemplo da evasão escolar e da violência doméstica, podem vir a contribuir para a regressão da educação das crianças brasileiras acirrando ainda mais as desigualdades sociais.
Assim, neste tópico foram apresentadas as principais questões que se encontram na sociedade e que também circunda o projeto social correspondente. Dessa maneira, foi necessário elencar questões: raciais, de violência, exclusão escolar e partilhando que existe um documento (ECA) que deveria proteger fielmente as crianças e adolescentes, ainda, se fez uma analogia em relação à esses elementos e o Projeto, permitindo delinear os benefícios que ele proporciona aos assistidos e assim possibilitando possíveis mudanças sociais.
3 CONHECENDO O RECRIARTE
Neste trecho será exposto como ocorrem as ações do Projeto Recriarte. Desse modo, por meio da indagação realizada, estão descriminadas as principais atividades da instituição e as expectativas de realizações para o futuro. A primeira ação a ser examinada neste item será o reforço criativo escolar, que é um dos principais motivos da procura de muitos pais da comunidade para suas crianças e adolescentes, uma forma de complemento da educação formal e a inserção de temas transversais para a obtenção de conhecimento de mundo, ainda oferece merenda escolar (essa refeição é muito aguardada pelos alunos). Esse reforço é assessorado pelo MP/SE atendendo cerca de 100 crianças e adolescentes (40 pela manhã e 60 pela tarde), mas devido as restrições da COVID-19 aconteceu uma redução dos alunos, no ano 2021 havia 67 alunos matriculados, possuíam seis turmas (três turmas período matutino e três turmas no período vespertino), denominadas de Meio Ambiente, Arco-íris e Reciclar.
Vale salientar que essas crianças e adolescentes participam do Projeto no horário inverso do horário escolar, tendo como matérias principais português, matemática e temáticas referentes à sociedade a serem desenvolvidas ao longo das aulas, ainda os alunos levam as atividades da escola para serem respondidas no reforço. Na instituição de ensino também é oferecida Assistência Psicológica que é desempenhada pelas assistentes sociais e psicólogas que são da equipe externa (logo mais, serão apresentadas), elas realizam um trabalho com as crianças, adolescentes e familiares quando solicitadas pela coordenação pedagógica do projeto.
Ainda existe o Programa Adolescente Aprendiz (POA), que proporciona uma extensão do Projeto Recriarte só que é voltado para práticas do mercado de trabalho e incentivo ao primeiro emprego. Esse programa é decorrente da cooperação técnica entre Ministério Público do Trabalho em Sergipe, Ministério Público de Sergipe, Superintendência Regional do Trabalho, Fundação Renascer e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). Algumas das afirmativas coletadas sobre esse projeto com uma das coordenadoras do Recriarte.
- Então, porque era uma preocupação da gente do setor de Divisão de Serviço Social, era o que fazer com esses adolescentes quando eles saíssem do projeto, o projeto atende até 14 anos, não é. E 14 anos é a pior fase assim da adolescência e eles saem do projeto e voltam para aquela realidade e aí a gente sempre tinha o desejo do que com eles quando acabassem essa fase de faixa etária que é própria para o projeto. E aí, foi uma iniciativa de Dra. Lilian de incluir o projeto nesse Programa de Oportunidade Aprendiz, o nome do Programa é POA (Projeto Oportunidade Aprendiz) (Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
As parcerias são essenciais para manter um projeto social, pois um projeto social na maioria das vezes é sem fins lucrativos e sobrevivem através de doações. Lembrando, que os projetos sociais são desenvolvidos para minimizar alguma lacuna da sociedade.
- [...] a gente recebeu umas doações do Mesa Brasil de sopa e aí é pouca, o que recebe é pouco, porque é festa. E isso nos alegra muito porque está trazendo um benefício, claro que é através de parceiros. Mas, o Recriarte, a MATER está tudo junto, esse desenvolvimento é melhorar e crescer cada dia mais (Presidente da MATER).
Por meio da afirmativa acima, a presidente da MATER informou sobre uma doação do programa de segurança alimentar e nutricional da cidade. Isto mostra que a associação repassa a doação para o Recriarte e que existe uma expectativa das pessoas assistidas para receber essas doações. Em vista disso, destacam-se outras ações de acolhimento, que acontecem através de doações como: distribuição de cestas básicas, lanches com o apoio de parceiros do Projeto (CARE, Ultragaz, Maratá, etc.).
E por fim, a expectativa para os projetos futuros, nesse caso há um em especial: Reciclatec. De acordo com o MP/SE (2020), esse projeto tem reconhecimento internacional, que possibilitará a profissionalização de adolescentes de 12 a 21 anos em condições de vulnerabilidade social. O acesso à uma capacitação técnica na área de informática, promovendo o letramento digital e inserção no mercado de trabalho. Essa é uma iniciativa do Ministério Público de Sergipe (MPSE), Ministério Público do Trabalho em Sergipe (MPT/SE), por meio do Termo de Cooperação Técnica, que destinou recursos para auxiliar o Projeto Reciclatec – desenvolvido por interposto a Biblioteca Pública Epifânio Dória (BPED) e sob a atribuição da Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura (SEDUC).
- Então, tem o Reciclatec que é outra iniciativa da Promotoria da Infância, que é uma parceria com a Biblioteca Epifânio Dória tem letramento, consertos de computadores, horta, tem várias vertentes do Projeto e também atingiria esse público que é de 14 para cima. O projeto já está pronto, já tem a parceria com a Epifânio Dória. Eu acho que só está esperando regularizar mais essa questão da pandemia para iniciar. Talvez, eu acho que, próximo ano comece. (Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
Desse modo, verificou-se neste tópico as ações desenvolvidas do Projeto Recriarte e os projetos futuros que possibilitarão outras oportunidades. Em seguida, serão explanados os resultados e discussões que foram adquiridos no decorrer da pesquisa.
4 O RECRIARTE SEGUNDO SEUS ATORES
Neste tópico apresenta-se como ocorreu a imersão no campo empírico da pesquisa, a partir de observações, entrevistas e acesso aos entrevistados, com o intuito de entender com maior exatidão aspectos concernentes à origem do Projeto Recriarte. Para tanto, será dividido em blocos trazendo indagações acerca do Projeto correspondente, nesse tópico pretende-se contemplar o problema a ser desvendado e as delimitações da temática escolhida. Assim, estarão disponíveis de tal maneira: um apanhado geral da história do Projeto junto aos desdobramentos temporais que aconteceram nele; a composição atual do Projeto Recriarte detalhando os aspectos que lhe dão sustentação; e o desvelamento do problema central finalizando o discurso.
Nesse sentido, para compreender a parte histórica do Projeto foram trazidas para a discussão e análise três pessoas, as quais foram entrevistadas através de videochamada via WhatsApp (entrevista virtual) e de forma presencial (visita técnica no MP/SE), e serão retratados a seguir. Assim, ressalta-se que o primeiro lugar pesquisado foi o Ministério Público/SE (MP/SE), pois foi por intermédio deste órgão que a pesquisadora teve acesso ao Projeto Recriarte. Ocorreu então uma visita técnica realizada ao setor de Divisão de Serviço Social para compreender melhor sobre os aspectos constituintes do Projeto Recriarte. Na visita foi possível identificar peculiaridades contidas no Projeto bem como elucidar dúvidas, com uma servidora que acompanhou todo o processo da pesquisa, contribuindo para traçar os caminhos que precisariam ser percorridos; será identificada na pesquisa como: Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
Ainda, houve uma entrevista com a Assistente Social, que fez parte do Programa de Defesa Comunitária do Ministério Público em 1997 (Programa voltado para o desenvolvimento da noção de cidadania nas comunidades) participando no cadastramento das famílias da lixeira do Santa Maria e esteve presente no surgimento da Cooperativa dos Agentes Autônomos de Reciclagem de Aracaju (CARE) e do Projeto Recriarte.
Um outro ponto destacado pela Assistente Social é que, em 2010, aconteceu uma reforma significativa para o projeto e para ponderar se fez necessário trazer à discussão o “Senhor W” (Presidente de uma associação à serviço da oncologia educador), o qual nesse período era Dirigente dessa associação e fez parte desse momento do Projeto.
- Em 2010, a gente tinha um conhecimento, fez uma parceria na época (eu não lembro o nome dele) era uma das pessoas que eram encarregadas, a gente tomou conhecimento do Projeto do CARE e o Projeto Recriarte que era a extensão para dar assistência as crianças dali daquela região. Então, quando nós conhecemos, eu como educador, né! e aí eu fui e vi exatamente a coisa muito simples, muito precária no sentido de dar assistência em termo da pedagogia, da assistência social, entendeu. Aí, foi que a gente teve a ideia de conversar com a diretoria: - Olhe, a gente tem alguns recursos e a gente pode ajudar! (Senhor W).
Logo, faz-se necessário investigar sobre as nuances que englobam o Projeto em análise por meio da sua formação técnica, apontando quais as pessoas que estavam envolvidas no projeto em 2021 de forma interna, na base (ficando lotadas no Projeto Recriarte no bairro Santa Maria) e externamente (estão lotadas no MP/SE e se fazem presente no projeto quando solicitadas).
Nessa perspectiva, através das informações coletadas com a Coordenadora Pedagógica do Projeto (turno matutino), identificou-se tais cargos: Uma Coordenadora do Setor de Divisão de Serviço Social do MP/SE(DIVSS);Duas psicólogas e três assistentes sociais; Uma Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino); Uma Coordenadora Pedagógica no turno vespertino; Uma Coordenadora Administrativa do Projeto Recriarte no turno matutino; Cinco Estagiárias graduandas na área de Pedagogia e uma professora substituta contratada pela MATER ( já graduada em Pedagogia), Uma Cozinheira; E uma Auxiliar de serviços gerais.
Ainda, verificou-se quais eram os perfis dos alunos matriculados no Projeto e as relações envolvidas nesse processo, como: família, condições socioeconômicas, questões emocionais, as escolas em que estudam atualmente, etc.
Nesse sentido, para compreender melhor como tudo isso acontece, fez-se presente nessa discussão a Coordenadora Pedagógica do turno vespertino, pois ela lida diretamente com os alunos e as famílias. Ela informou que a maioria das crianças e adolescentes são de classe baixa, a renda familiar das famílias não possibilita pagar uma escola particular, moram em lugares simples, sobrevivendo com o básico para suprir as necessidades mais urgentes, como alimentação. Em relação à constituição familiar, alguns alunos moram com o pai e a mãe, outros têm pais separados e em algumas situações moram com os avós.
Além disso, identificou-se a metodologia utilizada no Projeto Recriarte, a saber: metodologia de ensino, planejamentos, temáticas, relatórios, habilidades desenvolvidas, bem como os procedimentos metodológicos adotados nesse período pandêmico, dentre outras.
Já a metodologia trabalhada nas aulas está centralizada na “Pedagogia de Projeto”, que é uma metodologia ativa a qual estimula as crianças a aprenderem de maneira autônoma e participativa, envolvendo atividades lúdicas (jogos, brincadeiras, dinâmicas em grupo, resolução de desafios) direcionadas às matérias de Português e Matemática. Avulta-se, que também são transmitidos conhecimentos sobre temas transversais (Meio Ambiente, Saúde, Ética etc.) presentes na sociedade.
Os programas e projetos da educação não formal devem se cruzar, atuar e potencializar. Para isso, é fundamental que haja uma compreensão, por parte dos gestores das políticas públicas, sobre a necessidade da articulação do formal com o não formal. Então, problemas como violência, bullying e drogas, como devem ser trabalhados? Nas escolas, apenas a partir das estruturas curriculares que temos, sem trabalhar com educação não formal, eu não vejo saída (GOHN, 2016, p. 03).
No ano de 2021, com a instrução da Coordenadora Pedagógica do Projeto (turno matutino), foi englobada ao Projeto a técnica dos “Processos Circulares” pertencente à “Justiça Restaurativa”, a qual proporciona uma dinâmica voltada a soluções preventivas de conflitos.
- Então, é algo bem novo, novo inclusive para o Ministério Público, mas como aí é uma ideia da própria Secretária da Educação do Estado aderir e eu já faço esse trabalho aqui na COAPAZ e assim eu acho a “cara” do projeto, acho muito apropriado para a metodologia e para a intenção do projeto (Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
Vale aduzir o desenvolvimento das habilidades socioemocionais (são aptidões que vão além do cognitivo, mas atinge o sistema emocional e psicológico do ser humano). Além disso, ressalta-se as condições atípicas do ano de 2021 (devido ao período desencadeado pelo vírus Covid-19), que gerou impactos também no Projeto, pois desde a segunda semana de março até julho não houve aulas presenciais, apenas aulas virtuais.
Desse modo, um outro ponto analisado foi a verificação dos benefícios proporcionados pelo projeto para os assistidos (alunos e famílias) e pessoas que estão a cerca dele. Foram captados alguns dos relatos enviados no grupo de WhatsApp de determinada turma pelos pais dos alunos de forma voluntária, dentre eles destaca-se o depoimento desta mãe:
- [...] eu só tenho uma palavra a dizer, que é gratidão!! Que inclui tudo: amor, dedicação, eu só tenho a falar gratidão. E vou orando ao senhor para que esse vírus passe logo e às vezes ele não faz algumas atividades porque às vezes aqui a internet cai. E como eu faço faxina, às vezes eu consigo dinheiro para pagar à internet. Aí, tem semana que eu não consigo. Aí, fica meio complicado, mas com Deus no controle tudo vai dar certo (Mãe de um dos alunos do turno vespertino).
Por essa ótica, além de relatos que foram enviados via WhatsApp pelos pais das crianças e adolescentes, perguntou-se à Coordenadora Administrativa se ela acreditava que através do Projeto ocorreram algumas mudanças sociais na comunidade, vejam a resposta:
- O critério de estudar na escola pública é bem rigoroso porque somos um Projeto social onde os ensinamentos sócios pedagógicos são de extrema relevância e com isso evitamos a evasão escolar (Coordenadora Administrativa do turno matutino).
Assim, a coordenadora entrevistada reforça como o Projeto influencia para que não haja evasão escolar, agregando a frequência escolar como critério e quando é possível as pessoas que moram próximo do Projeto também são beneficiadas.
E enfatiza-se como se dá o desenvolvimento do Projeto em relação à questão orçamentária diante da fiscalização atribuída aos recursos financeiros recebidos. Ao tratar de uma forma de promover política pública à sociedade, através de um Projeto Social, é necessário pontuar como todo esse trabalho é desencadeado, um outro fator a ser colocado é a participação do Ministério Público de Sergipe (que é um órgão que tem como uma das funções fiscalizar estruturas do terceiro setor) nesse processo.
- Importa frisar que a atuação do Ministério Público vem se transformando ao longo do tempo e, cada vez mais se apresenta como um fomentador ou indutor das políticas públicas, ao lado de seus papéis tradicionais de acusador e fiscalizador (MP/SE,2009, p.03).
A primeira pergunta partiu de uma dúvida da entrevistadora e foi possível desmitificar a ideia que fora encontrada em algumas publicações (não- oficiais) de que o Projeto Recriarte seria uma Ong, foi respondido desse modo:
- Não, é um Projeto Social que é vinculado a uma Associação, nem CNPJ ele tem na verdade, ele é ligado ao CNPJ da MATER” (Coordenadora Pedagógica do Projeto (turno matutino).
Já a segunda pergunta, trouxe como “de fato” o MP/SE executa esse assessoramento ao Recriarte em relação ao que esse órgão representa para a sociedade sergipana e quanto às pessoas que são cedidas para essa instituição social.
- Nós não podemos ajudar financeiramente, nem é atividade fim do MP esse tipo de projeto (tipo: assumir, ficar à frente), não é atividade fim do MP. Aqui nós temos a Divisão de Serviço Social que é atividade meio, é como se fosse um suporte para as Promotorias, ... para os outros setores e aí dentro da Divisão é cedido parte dessa equipe (Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
Desse modo, notou-se o elo existente do Ministério Público de Sergipe com a construção da cidadania de jovens e crianças, na perspectiva da garantia de direitos e fomento de discussões coletivas. O MP/SE contribui para promoção da inclusão social, especialmente daqueles que possuem maiores desafios econômicos e sociais, por meio do Projeto Recriarte.
Quando se perguntou como eram distribuídos os recursos financeiros recebidos para manter o projeto, constatou-se tal afirmativa:
- A única fonte de renda monetária é da Ultragaz. Desse valor que a Ultragaz doa, paga o salário do pessoal de apoio (as responsáveis pela cozinheira e pela auxiliar de serviços gerais) e da Coordenadora Pedagógica do turno vespertino, é pago o salário de quem não é do Ministério Público, é pago com esse valor da Ultragaz e o que sobra é para os encargos de contrato que elas são clt e para material, insumos essas coisas assim e o restante é doação (Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
E por fim, expõe-se um dos principais questionamentos postos na pesquisa, perguntou-se se o Projeto Recriarte tem contribuído efetivamente para a inclusão social de crianças e adolescentes como ideia central e foram constatadas respostas fornecidas pelos sujeitos da pesquisa.
Por conseguinte, apresentam-se dois relatos de pessoas que estiveram presentes no Projeto. Desse modo, evidencia-se a opinião da Assistente Social (a qual teve desde o começo), destacando o quanto o Projeto faz a diferença no bairro, oportunizando que as crianças assistidas cresçam o seu intelectual e tenham outra perspectiva de vida”. Em seguida outro ponto de vista:
- Eu acredito que sim, acredito muito que sim ... os pais também sempre relatam que os meninos eles mudam um pouco quando estão no projeto, chegam em casa com outras ideias. Então, eu acho que é uma forma de atingir, de mudanças (Coordenadora Pedagógica do Projeto do turno matutino).
Nesse sentido, ressalta-se como a educação possibilita “furar bolhas” e informar à população carente sobre os seus direitos e o porquê de viverem nessas condições precárias, então, o Projeto Recriarte pode contribuir para desvelar parte destas lacunas.
CONSIDERAÇÕES
De imediato, revela-se o quanto o trabalho em questão foi construído baseado no zelo, ética, cercado de cuidados consideráveis para com a instituição pesquisada e seus atores, ao tempo em que se salienta o quanto a temática precisa ser reverberada para mais pessoas.
Dessa maneira, foi possível compreender como funciona o Projeto Recriarte, averiguando suas diversas particularidades. O primeiro passo a ser introduzido foi trazer os principais pontos que dão base ao Projeto Recriarte: O que era o Projeto; qual o público atendido; a importância do Projeto para a comunidade etc., ainda se abordou os fatores que marcam a relação do Recriarte com as crianças e adolescentes assistidos e um desses é a vulnerabilidade social, sendo um reflexo da realidade vigente na localidade. Após esse entendimento inicial, destacou-se o interesse em investigar a contribuição efetiva do Projeto para a inclusão social de crianças e adolescentes e quais os direcionamentos para desvendar esse questionamento.
Em seguida, determinou-se a metodologia e os procedimentos adequados para desenvolver a pesquisa do tipo estudo de caso, pois analisou-se o caso específico de um Projeto educacional. Para melhor captar as informações indicadas partiu-se para a pesquisa bibliográfica, documental e a pesquisa participante.
Nesse sentido, a abordagem teve perspectiva qualitativa com o intuito de perceber as riquezas de detalhes do Projeto, ainda se notou a necessidade de fazer uma pesquisa aplicada através da pesquisa de campo etapa na qual houve o acesso e emprego de entrevista semiestruturada às pessoas que participaram da construção do Projeto bem como à equipe técnica, além de pais e responsáveis pelos assistidos.
Logo, para embasar a investigação foram consultados autores que trataram dos Direitos Humanos, o Panorama da Violência, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Panorama da Exclusão Escolar no Brasil no ano de 2020 (abrangendo como foi o desenvolvimento escolar no período de pandemia).
Assim, o trabalho possibilitou ampliar o olhar diante de questões sociais que estão enraizadas no nosso cotidiano, que muitas vezes são ignoradas. O Projeto Recriarte é a possibilidade de transformar as dores, as opressões, as tristezas em esperança de um mundo melhor e a educação é o meio para que essa semente gere bons frutos.
REFERÊNCIAS
AGUM, R.; RISCADO, P.; MENEZES, M.. Políticas públicas: conceitos e análise em revisão. Agenda Política, v. 3, n. 2, p. 12-42, 2015.Disponível em: https://www.agendapolitica.ufscar.br/index.php/agendapolitica/article/view/67/63. Acesso em: 04 nov. 2021.
ALMEIDA, S. L.de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte: Letramento, 2018.
BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário oficial [da] república federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 jul. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm#:~:text=Art.%205%C2%BA%20Nenhuma%20crian%C3%A7a%20ou,omiss%C3%A3o%2C%20aos%20seus%20direitos%20fundamentais. Acesso em: 07 maio. 2021.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 90, de 15 de setembro de 2015.Dá nova redação ao art. 6º da Constituição Federal, para introduzir o transporte como direito social. Diário oficial [da] república federativa do Brasil, Brasília, DF, 15 de setembro 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc90.Acesso em: 14 maio. 2021.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2016. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10644726/artigo-227-da-constituicao-federal-de-1988. Acesso em: 04 nov. 2021.
BRASIL. Ministério Público de Sergipe. Procuradoria – Geral da Justiça. Relatório 2009. Disponível em: https://sistemas.mpse.mp.br/PublicDoc/PublicacaoDocumento/AbrirDocumento.aspx?cd_documento=4113. Acesso em: 04 nov. 2021.
BRASIL. Ministério Público de Sergipe. Procuradoria – Geral da Justiça. Cooperação Técnica – MPSE E MPT destinam recursos ao Projeto Reciclatec, 2020. Disponível em: https://www.mpse.mp.br/index.php/2020/02/28/cooperacao-tecnica-mpse-e-mpt-destinam-recursos-ao-projeto-reciclatec/. Acesso em: 04 nov. 2021.
CHAER, G.; DINIZ, R. R. P.; RIBEIRO, E. A. A técnica do questionário na pesquisa educacional. Revista Evidência, v. 7, n. 7, 2011. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/maio2013/sociologia_artigos/pesqusia_social.pdf. Acesso em :07 maio. 2021.
CIDH. Situação dos direitos humanos no Brasil. Washington: Organização dos Estados Americanos, 2020.Disponível em: http://www.oas.org/pt/cidh/relatorios/pdfs/Brasil2021-pt.pdf. Acesso em: 26 abr.2021.
CNJ. Especialistas preferem políticas públicas a novas leis para o ECA. 2020. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/especialistas-preferem-politicas-publicas-a-novas-leis-para-o-eca/. Acesso em :14 maio. 2021.
FORÚM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2021. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario-15/. Acesso em: 04 nov. 2021.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Paz e Terra, 1996.
F5 NEWS. Caso Lorrany: revolta e vandalismo no bairro Santa Maria, em Aracaju, 2021. Disponível em: https://www.f5news.com.br/cotidiano/caso-lorrany-revolta-e-vandalismo-no-santa-maria-em-aracaju.html. Acesso em: 04 nov. 2021.
GERHARDT, T. E.; SILVEIRA, D. T. Métodos de pesquisa. Plageder, 2009.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
GIL, Antonio C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
GOHN, M.G. Educação não formal nas instituições sociais. Revista Pedagógica, v. 18, n. 39, p. 59-75, 2016. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/5840270.pdf. Acesso em: 04 nov. 2021.
GOSS, C. C.; SILVEIRA. L. A., FILHO SALLES, N. A. Conceituando Direitos Humanos, cultura de paz e sustentabili-dade: caminhos para refletir sobre a Agenda 2030 da ONU. In: FILHO, N. A. S; SALLES, V. O. Cultura de paz, direitos humanos e sustentabilidade: olhares interdisciplinares. FILHO SALLES, N. A.; SALLES, V. O. (org.). Ponta Grossa: Texto e Contexto, 2018. Disponível em: http://londrinapazeando.org.br/wp-content/uploads/2019/05/Cultura-de-paz-direitos-humanos-e-sustentabilidade-Ebook.pdf. Acesso em: 14 maio. 2021.
LUDKE, M.; ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. Em Aberto, v. 5, n. 31, 1986. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4091392/mod_resource/content/1/Lud_And_cap3.pdf. Acesso em: 26 abr. 2021
PATRIOTA, E. B. A urgência da educação em direitos humanos. 2021.Disponível:https://www.brazilianjournals.com/index.php/BRJD/article/view/22830. Acesso em :08 dez. 2021.
RIBEIRO. D. Pequeno manual antirracista. 1° ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
RODRIGUES, A. J. Metodologia Científica. UNIT, Aracaju, 2009.
SANTANA, L. B. Fragilidade e vulnerabilidade socioambiental na região metropolitana de Aracaju/SE. 2019. 256 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-graduação em Geografia, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2019.
SILVA, L. R. C. et al. Pesquisa documental: alternativa investigativa na formação docente. In: Congresso Nacional de Educação. 2009. p. 4554-4566. Disponível em: https://educere.bruc.com.br/cd2009/pdf/3124_1712.pdf. Acesso em: 05 nov. 2021.
UNICEF BRASIL, C. E. Cenário da exclusão escolar no Brasil: Um alerta sobre os impactos da pandemia da COVID-19 na Educação. Produção ed. CENPEC. 2021.Disponivel em: https://www.unicef.org/brazil/relatorios/cenario-da-exclusao-escolar-no-brasil. Acesso em: 15 maio.2021.