Metadados do trabalho

Segurança Alimentar: Uma Analise A Partir Dos Mercados Institucionais – Pnae E Paa

Wagner Sena Santos

O artigo visa apresentar uma análise dos mercados institucionais, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) como uma das alternativas para a redução da fome no Brasil e como esses mercados poderão ajudar nessa luta contra as estruturas de poder, já que a fome no Brasil é uma realidade que vem se agravando e gerando cada vez mais desigualdades. Foi feito uma análise bibliográfica sobre os principais autores que trabalham coma fome, com isso será discutido como esses programas irão contribuir para ocorrer a segurança alimentar na vertente de vários autores, e consequentemente como esses mercados institucionais irão promover a segurança alimentar dos brasileiros e principalmente uma alimentação saudável e suficiente e como consequência a esses benefícios trazendo âmbito educacional, etc.

Palavras‑chave:  |  DOI: 10.15448/1677-9509.2017.1.25201

Como citar este trabalho

SANTOS, Wagner Sena. SEGURANÇA ALIMENTAR: uma analise a partir dos mercados institucionais – PNAE e PAA. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2022 . ISSN: 1982-3657. DOI: https://doi.org/10.15448/1677-9509.2017.1.25201. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/428-seguran%C3%A7a-alimentar-uma-analise-a-partir-dos-mercados-institucionais-pnae-e-paa. Acesso em: 16 out. 2025.

SEGURANÇA ALIMENTAR: uma analise a partir dos mercados institucionais – PNAE e PAA

A fome no Brasil é uma realidade persistente e cada vez mais vem agravando-se por conta da má distribuição de renda entre os brasileiros e de outros problemas estruturais. O país, que havia saído do mapa da fome em 2014, reverte essa tendência e volta para essa realidade dramática. Segundo a Rede PENSSAN (2020), eram 10,3 milhões de pessoas em IA [insegurança alimentar] grave em 2018, passando para 19,1 milhões, em 2020. Portanto, neste período, foram cerca de nove milhões de brasileiros (as) a mais que passaram a ter, no seu cotidiano, a experiência da fome. Ainda conforme a pesquisa, 112 milhões de brasileiros sofrem alguém grau de insegurança alimentar.

Segundo Rahal; Gentil e Magalhaes (2020) A alimentação continua a ser um dilema cotidiano para grande parte da população mundial, em especial para a camada mais pobre da sociedade, já que enquanto muitos vivem em situação de fome e carestia, outra grande parcela vive com agravos da saúde produzidos pela má alimentação e pela condição de sobrepeso e obesidade, ou seja, vivemos entre extremos, a extrema pobreza de um lado e a extrema abundância do outro lado.

O processo histórico de transformação no espaço rural brasileiro ocorreu de forma desigual entre as regiões do país, desenvolvendo uma em detrimento de outras. De acordo com Mattei, (2014, p. 83) “durante o processo de modernização da agricultura brasileira (décadas de 1960 e 1970), as políticas públicas para a área rural, em especial a política agrícola, privilegiaram os setores mais capitalizados e a esfera produtiva das commodities voltadas ao mercado internacional e produzidas nos grandes latifúndios, visando fazer frente aos desequilíbrios da balança comercial do país”.

Entre os anos 1930 e 2000, as políticas criadas para combater a pobreza e a fome tinham como característica o assistencialismo, a seletividade, a fragmentação e a descontinuidade, não garantindo assim a autonomia do indivíduo, reforçando o clientelismo, agindo de forma compensatória e mitigadora (RAHAL; GENTIL; MAGALHAES, 2020).

A agricultura familiar só veio ser beneficiada de políticas públicas após o processo de redemocratização do país e, especialmente, com a promulgação da Constituição de 1988, ocorre um reordenamento do Estado brasileiro, levando a uma descentralização das ações governamentais com o intuito de ampliar o acesso aos recursos públicos, por um lado, e de democratizar as próprias políticas, por outro (MATTEI, 2014). É neste contexto de mudanças políticas e econômicas do Brasil no final dos anos 1990 e início da primeira década do século XXI que emerge o debate sobre desenvolvimento rural com foco em ações descentralizadas e participativas acompanhas de programas e políticas públicas como, por exemplo, a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) já em 1955, o Programa de Assistência Técnica e Extensão Rural, o Plano Safra, a Política de Desenvolvimento Territorial, dentre outras ações com a finalidade de fortalecer o desenvolvimento rural no Brasil.

Conforme Silva et al. (2014), os mercados institucionais surgem como uma forma do Estado proteger, de certa forma, as populações excluídas, tanto as que não têm acesso aos alimentos necessários, como as que têm dificuldades em colocar seus produtos alimentícios no mercado. Para facilitar essa relação entre os órgãos públicos e os agricultores cria-se o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), denominados de mercados institucionais, os mesmos fazem parte de um conjunto de ações e diretrizes integradas do extinto Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e do Ministério da Educação (MEC) com a finalidade de fortalecer a agricultura familiar e a segurança alimentar da população em condições de pobreza.

Os mercados institucionais fazem parte do rol dos mercados alternativos, oferecendo aos produtores e consumidos outro caminho para produção, comercio e consumo de alimentos. Segundo Preiss e Schneider (2020), esses mercados permitem uma maior e melhor inserção dos agricultores familiares, que encontram mecanismos mais benéficos para escoar sua produção, valorizar o seu saber-fazer, produzindo um alimento com história, proporcionando autonomia para o produtor, possibilitando a redução dos intermediários, proporcionando o enraizamento social e territorial dos alimentos.

Entre os pontos positivos dessas políticas públicas está, a superação da invisibilidade em que boa parte dos indivíduos acha-se imersa, pois para isso há a necessidade de que os agricultores, se organizem para participarem destes processos como beneficiários produtores. Outro ponto é a instituição de um mecanismo de compra antecipada de uma produção que permanecia na invisibilidade e à mercê dos especuladores.

O presente artigo pretende fazer uma apresentação sumária dos mercados institucionais: PNAE e PAA, como caminho para a segurança alimentar. Para tanto discutirei o tema segurança alimentar e como esse conceito vem mudando com o tempo. Tenho a intenção de trazer à tona que os mercados institucionais podem promover uma segurança alimentar no Brasil.

Segurança Alimentar

 

O mundo atualmente enfrenta vários desafios quando se trata da alimentação, pois não se restingue apenas a disponibilidade de alimentos, mas também à qualidade e o valor nutricional do produto colocado à disposição para o consumo. Segundo Santos e Torres (2022, p. 2) “para enfrentar essa problemática da fome e da má nutrição de forma ampla e sistêmica, torna-se essencial a efetivação de uma política de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), pautada nos princípios do Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas (DHANA) e da Soberania Alimentar”.

Apesar de todos os condicionantes naturais do Brasil, a fome e a desnutrição ainda persistem e fizeram parte da história de nosso país. Durante muito tempo, a questão da segurança alimentar foi tratada como um tema diminuto, associado à prestação de caridade ou assistencialismo, que era dirigida a indivíduos desafortunados ou acometidos por eventos climáticos ou de saúde precária. É somente a partir do trabalho de Josué de Castro (1908-1973) que o tema da segurança alimentar ganha visibilidade e passa a ser tratado como um fato decorrente dos fatores sociais, políticos e econômicos que, juntos, sentenciam certos indivíduos à fome e à miséria (PREISS; SCHNEIDER; COELHO-DE-SOUZA, 2020).

 Maluf; Menezes e Valente (1996, p. 2) corroboram com a ideia afirmando o pioneirismo das ideias de Josué de Castro sobre a fome e mostra como apenas a partir de 1986 a segurança alimentar apareceu dentro da política de abastecimento alimentar.

 

No Brasil destacam-se as análises pioneiras e clássicas de Josué de Castro - um dos fundadores da FAO - sobre o fenômeno da fome, ainda na década de 1930. Porém, apenas em 1986, o objetivo da segurança alimentar apareceu, pela primeira vez, dentre os elementos definidores de uma proposta de política de abastecimento alimentar. Formulada por uma equipe de técnicos a convite do Ministério da Agricultura, ela teve poucas consequências práticas à época. Note-se que a utilização da noção de segurança alimentar limitava-se, até então, a avaliar o controle do estado nutricional dos indivíduos, sobretudo a desnutrição infantil, sob a égide da Vigilância Alimentar e Nutricional.

 

Nesta versão, atribuía-se papel central a autossuficiência produtiva nacional, porém enfatizando os problemas de acesso aos alimentos por insuficiência de renda, o que levou a acrescentar a equidade (acesso universal) aos quatro atributos da disponibilidade agregada de alimentos básicos - suficiência, estabilidade, autonomia e sustentabilidade (MALUF; MENEZES; VALENTE, 1996).

Mesmo com o impulso representado pelo trabalho de Josué de Castro, ainda tardou até que a atuação do Estado frente ao tema da segurança alimentar deixasse de ser precária e pontual. Foi apenas em 1985 que, pela primeira vez, se mencionou oficialmente o termo segurança alimentar em um documento do Ministério da Agricultura e Abastecimento do Brasil. No ano seguinte, em 1986, realizou-se a I Conferência Nacional de Alimentação que contribuiu com a adição do termo “nutricional” e, a partir daí, se propôs um sistema nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), articulando as diferentes esferas de atuação do Estado (PREISS; SCHNEIDER; COELHO-DE-SOUZA, 2020).

Ainda consoante os autores, em 1994, dois eventos com significados opostos foram emblemáticos para a SAN no país. No início do ano, realizou-se a I Conferência Nacional de SAN tendo um papel importante na mobilização nacional para a Cúpula Mundial de Alimentação (1996) e, em 1998, foi criado o Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional – FBSAN. Outro marco temporal na questão da SAN no Brasil é a criação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), aprovada em 2006, levou à criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), consolidando a responsabilidade do Estado frente ao problema e assegurando o devido espaço ao controle social na governança participativa das políticas públicas.

Buscando garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada, o país a adotou o conceito de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), com a seguinte configuração definida na Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), Lei n.º 11.346, de 15 de setembro 2006:

 

Art. 3º A Segurança Alimentar e Nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (Brasil, 2006).

 

O conceito de Segurança Alimentar considera três aspectos principais: quantidade, qualidade e regularidade no acesso aos alimentos. Para Belik (2003)

 

Os alimentos podem estar disponíveis [...], mas as populações pobres podem não ter acesso a eles, seja por problemas de renda, ou seja, devido a outros fatores como conflitos internos, ação de monopólios ou mesmo desvios [...]. Outro aspecto importante diz respeito à qualidade dos alimentos consumidos. A alimentação disponível para o consumo da população não pode estar submetida a qualquer tipo de risco por contaminação, problemas de apodrecimento ou outros decorrentes de prazos de validade vencidos. Evidentemente, a qualidade dos alimentos diz respeito também à possibilidade de consumi-los de forma digna. Dignidade significa permitir que as pessoas possam comer em um ambiente limpo, com talheres e seguindo as normas tradicionais de higiene. Nesse caso, seriam condenadas certas práticas como ministrar rações, preparados energéticos e outras misturas visando combater os efeitos da desnutrição. Há também uma corrente muito forte de estudiosos e mesmo entre os militantes das causas ambientais que consideram que no aspecto da qualidade para a segurança alimentar não seria admissível o uso dos alimentos transgênicos. [...] O último elemento referente à definição de segurança alimentar diz respeito à regularidade. Isso quer dizer que as pessoas têm que ter acesso constante à alimentação (alimentando-se ao menos três vezes ao dia, como se passou a considerar recentemente).

 

 

A incapacidade de acesso é o fator preponderante do atual quadro de insegurança alimentar no Brasil, como afirma Maluf; Menezes; Valente (1996, p. 8),

 

Para que haja segurança alimentar, é necessário que a disponibilidade de alimentos seja suficiente, gerando-se uma oferta capaz de atender às necessidades de consumo de toda a população. Por outro lado, o sistema alimentar deve ser estável, não sofrendo flutuações na oferta e na demanda de alimentos, ao longo do tempo, que ameacem o adequado atendimento daquelas necessidades alimentares. Deve, também, o sistema alimentar possuir uma autonomia de tal ordem, que não o faça depender incondicionalmente de importações para suprir a demanda de alimentos.

 

Mas do que um alimento na mesa se faz necessário um alimento de qualidade e com valor nutricional. Outro elemento importante nessa questão é a sustentabilidade do sistema alimentar, onde garantida a satisfação das necessidades alimentares no curto prazo não se dá através do sacrifício dos recursos naturais renováveis e não renováveis, tornando possível a preservação das condições futuras de disponibilidade de alimentos (MALUF; MENEZES; VALENTE, 1996)

Os mercados institucionais se consolidam como um forte aliado na luta para uma segurança alimentar no Brasil, sendo eles um canal de comercialização curto e é benéfico para o pequeno produtor familiar, dinamizando a região e consolidando o pequeno agricultor no campo.

 

Mercados institucionais – PNAI e PAA

 

O processo histórico de transformação no espaço rural brasileiro ocorreu de forma desigual entre as regiões do país, desenvolvendo uma região em detrimento de outras. O principal foco do processo modernizante foi a região centro-sul do país, com os seus grandes latifúndios, voltados a produção de commodities para o mercado exterior. De acordo com Mattei, (2014, p. 83) “durante o processo de modernização da agricultura brasileira (décadas de 1960 e 1970), as políticas públicas para a área rural, em especial a política agrícola, privilegiaram os setores mais capitalizados e a esfera produtiva das commodities voltadas ao mercado internacional e produzidas nos grandes latifúndios, objetivo de fazer frente aos desequilíbrios da balança comercial do país”. Ainda segundo o autor:

 

Para o setor da agricultura familiar, o resultado dessas políticas foi altamente negativo, uma vez que grande parte desse segmento ficou à margem dos benefícios oferecidos pela política agrícola, sobretudo nos itens relativos ao crédito rural, aos preços mínimos e ao seguro da produção (MATTEI, 2014, p. 71).

 

A agricultura familiar só passa a ser beneficiada de políticas públicas após o processo de redemocratização nacional, ocorrido depois de 21 anos de uma ditadura militar (1964-1985). De acordo com Anjos e Becker (2014), havia uma grande expectativa em torno da realização de uma reforma agrária ampla, assim como de ações emergenciais para atenuar a crise do campo, refletida na intensificação do êxodo rural-urbano e na formação de bolsões de pobreza nas grandes metrópoles brasileiras, além disso, a década de noventa coincide, com sucessivos anos de seca na agricultura dos estados meridionais do país. A crise experimentada pelos pequenos produtores deságua em manifestações multitudinárias lideradas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), Departamento Nacional dos Trabalhadores Rurais da Central Única dos Trabalhadores Rurais (CUT Rural) e pelos setores progressistas da igreja. As jornadas nacionais de luta emergem dentro do que se chama “Gritos da Terra Brasil”, passando a exigir que os instrumentos de política agrícola – como crédito, garantia de preços e acesso ao mercado – fossem ampliados e adaptados às necessidades dos agricultores familiares.

Com o processo de redemocratização do país e, especialmente, com a promulgação da Constituição de 1988, ocorre um reordenamento do Estado brasileiro, possibilitando uma maior intervenção dos atores sociais, a qual se viabilizou através dos conselhos gestores de políticas setoriais e das políticas gerais de desenvolvimento nas diversas esferas governamentais (MATTEI, 2014).

O resultado da pressão exercida, desde âmbito político, foi a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), em 1995, e sua institucionalização, em 1996, como uma política específica de crédito (custeio e investimento) dirigida aos agricultores familiares e assentados da reforma agrária. A criação do PRONAF suscita a elaboração de diversas políticas direcionadas para o desenvolvimento rural como,

 

[...] a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) em 1999, e da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF) no interior deste em 2001, institucionalizaram a dualidade da estrutura agraria e fundiária no país; e, em 2006, foi regulamentada a Lei da Agricultura Familiar que reconheceu a categoria social, definiu sua estrutura conceitual e passou a balizar as políticas públicas para este grupo social (GRISA e SCHNEIDER, 2015, p. 20).

 

É neste contexto de mudanças políticas e econômicas do Brasil, que no final dos anos 1990 e início da primeira década do século XXI, emerge o debate sobre desenvolvimento rural com foco em ações descentralizadas e participativas acompanhas de programas e políticas públicas como, por exemplo, a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o Programa de Assistência Técnica e Extensão Rural, o Plano Safra, a Política de Desenvolvimento Territorial, dentre outras ações com a finalidade de fortalecer o desenvolvimento rural no Brasil.

O PRONAF é um programa de crédito disponível exclusivamente aos agricultores familiares. Para serem considerados aptos ao PRONAF, os agricultores devem ser registrados na Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP), que [...] habilita a usufruir da condição e prerrogativa da agricultura familiar, entre as quais, ter acesso a financiamentos a juros subsidiados e participar de programas governamentais (ANJOS e CALDAS, 2017, p. 219), para isso deve seguir os requisitos presentes no Art. 3o da Lei no 11.326, de 2006, que dispõe de alguns requisitos necessários para considerar um agricultor familiar:

 

I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais;

II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;

III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;

IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.

 

Conforme afirma Mattei (2014), esta política representa, a legitimação, por parte do Estado brasileiro, de uma nova categoria social – os agricultores familiares – que até então era praticamente marginalizada em acesso aos benefícios da política agrícola. Segundo o § 2o, do Art. 3o da Lei no 11.326, de 2006, são também beneficiários desta Lei: silvicultores; aquicultores; extrativistas; pescadores; povos indígenas e integrantes de comunidades remanescentes de quilombos rurais e demais povos e comunidades.    

Concomitantemente a criação do Pronaf, foram elaboradas políticas públicas pautadas na criação de mercados institucionais para a agricultura familiar. O agora extinto Ministério do Desenvolvimento Agrário descreve os mercados institucionais como sendo uma oportunidade de comercialização dos produtos da agricultura familiar. Ao abordar o mercado institucional de alimentos, em seu sentido mais amplo, o setor envolve pelo menos uma das três esferas governamentais (municipal, estadual e federal) em todas as suas operações de compra de alimentos. Essas operações podem ter caráter contínuo, atendendo, por meio das compras dessa natureza, a escolas, creches e hospitais; ou caráter esporádico, como as realizadas para o atendimento de calamidades públicas e programas de governo ou os referentes às políticas de estado e aos programas de governo, como a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) (MACIEL, 2008).

Anjos e Caldas (2017) afirma, que o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) que agora não está mais em vigor e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) ainda em vigência são às duas principais modalidades de mercados institucionais existentes no Brasil e seu surgimento devesse a continuidade do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).

Políticas públicas ligadas aos mercados institucionais não são recentes na política brasileira, pois compras governamentais, para estabilização de preços, já existem no Brasil desde o XX.

 

Na crise econômica do café, no início do sec. XX, já se observava a atuação de governos estaduais e, logo em seguida, do governo federal via compras públicas. A queda dos preços internacionais do café, a valorização cambial e a superprodução do café em 1906 desencadearam a Primeira Política de Valorização do Café (Convenio de Taubaté) que, dentre outras medidas, visava elevar o preço do produto e assegurar a proteção de renda para o setor cafeicultor por meio da retirada de parte da produção do mercado via compras efetuadas pelos governos estaduais e a respectiva formação de estoques. (GRISA e PORTO, 2015, p. 158)

 

 Os mercados institucionais, que faziam parte de um conjunto de ações e diretrizes integradas dos Ministérios do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e do Ministério da Educação (MEC) com a finalidade de fortalecer a agricultura familiar e a segurança alimentar da população em condições de pobreza.

O período subsequente representa a continuidade dos avanços logrados no ambiente institucional e do espírito que marcou a criação do PRONAF. Isso fica evidenciado com a aparição, no ano 2003, do Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), instituído pelo art. 19 da Lei n° 10.696, de 2 de julho de 2003, e alterada pela Lei n° 12.512, de outubro de 2011 e regulamentada por diversos decretos, o que está em vigência é o Decreto n° 7.775, de 4 de julho de 2012 (BRASIL, 2015). De acordo com Anjos e Becker (2014, p. 95) o PAA trata-se de uma

 

[...] política pública surgida durante o primeiro mandato do Presidente Luís Inácio Lula da Silva e se insere no marco do “Fome Zero”, por meio do qual o governo federal assegura a compra antecipada dos produtos da agricultura familiar, ou como se denomina, dos chamados “beneficiários produtores” que são destinados aos “beneficiários consumidores” (asilos, creches, albergues, hospitais, etc.).

 

A política tem como principal objetivo incentivar a produção da agricultura familiar por meio de operações de compra a preços que atendam às peculiaridades do mercado regional (MACIEL, 2008, p. 12-13). O PAA foi delimitado por um Grupo Gestor (GGPAA), formado por representantes do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS); Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA); Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; Ministério da Fazenda e Ministério da Educação, que repassará recursos para órgão ou entidade da administração pública, direta e indireta, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que por chamada pública, compraram produtos de fornecedores - agricultores familiares; empreendedores familiares rurais; assentados da reforma agrária; silvicultores; aquicultores; extrativistas; pescadores artesanais; indígenas e integrantes de comunidades remanescentes de quilombos rurais e de demais povos e comunidades tradicionais; cooperativas e associações, que detenham a DAP, este grupo contemplara uma organização que recebera os alimentos, e os fornecerá aos beneficiários consumidores - indivíduos em situação de insegurança alimentar e nutricional, aqueles atendidos pela rede sócio assistencial, pelos equipamentos de alimentação e nutrição, pelas demais ações de alimentação e de nutrição financiadas pelo Poder Público, aqueles atendidos pela rede pública de ensino e de saúde e que estejam sob custódia do Estado em estabelecimentos prisionais e em unidades de internação do sistema socioeducativo (BRASIL, 2009).

Conforme Grisa e Porto (2015, p. 156), “a “novidade” trazida pelo Programa e que despertou grande interesse consiste justamente em articular, em uma mesma política pública, o apoio à comercialização da agricultura familiar com ações de segurança alimentar e nutricional”. Essa articulação se dá, a partir da compra de alimentos e sementes da agricultura familiar e doa para equipamentos públicos de alimentação e nutrição, entidades da rede sócio assistencial, famílias em situação de vulnerabilidade social, e destina para a formação de estoques estratégicos.

“A execução do programa pode ser feita por meio de seis modalidades: Compra com Doação Simultânea, Compra Direta, Apoio à Formação de Estoques, Incentivo à Produção e ao Consumo de Leite, Compra Institucional e Aquisição de Sementes. ” (BRASIL, DECRETO Nº 7.775, DE 4 DE JULHO DE 2012).

Para participar de qualquer modalidade do PAA, o agricultor familiar deve se,

 

[...] enquadrar nos critérios estabelecidos para grupos A, B, C, e D do PRONAF, e possuir à DAP, o instrumento de identificação do agricultor familiar para acessar políticas públicas. Para obter a DAP, o agricultor familiar deve dirigir-se a um órgão credenciado pelo governo federal (entidades de assistência técnica, sindicatos de produtores rurais, entre outros), e estarem preferencialmente, organizados em cooperativas, associação ou grupos de interesse informais com no mínimo cinco agricultores. (ALVES, 2017, p. 60)

 

De acordo com Amaral; Zagonel e Basso (2015) as aquisições realizadas no âmbito do PAA são realizadas dispensando-se o processo licitatório, previsto na Lei de Licitações n.º 8.666/1993, que rege as compras da administração pública, o que vem facilitando as aquisições de alimentos diretamente dos agricultores familiares e suas organizações. Outro avanço ocorrido com o PAA foi a adoção de referências locais e regionais para a fixação de preços. O “destravamento” desses gargalos tem gerado mais interesse por parte dos agricultores fornecedores e maior viabilidade aos entes públicos nas aquisições.

Outra ação do governo federal de incentivo à aproximação entre a produção da agricultura familiar e o consumidor é o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que existe oficialmente desde os anos de 1950, mas sofre uma verdadeira revolução  a partir da Lei n.º 11.947, de 16 de junho de 2009 (BRASIL, 2009), que estabeleceu um percentual mínimo de 30% dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), repassados aos municípios pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), os quais devem ser destinados à aquisição de alimentos produzidos pela agricultura familiar, para suprir, parcialmente, as necessidades nutricionais dos alunos da rede pública de educação básica ampliando significativamente o mercado institucional do PAA. Segundo o Art. 4º da Lei n.º 11.947, de 16 de junho de 2009 (BRASIL, 2009):

 

O Programa Nacional de Alimentação Escolar PNAE tem por objetivo contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo.

 

O PNAE é o maior programa de alimentação escolar de atendimento universal do mundo, e o terceiro em número de alunos atendidos, atrás da Índia e China. O programa atende estudantes que frequentam instituições públicas de educação e funciona sem interrupção, em âmbito nacional, desde a sua criação, na década de 1950 (IPC-IG, 2013). Conforme o relatório O PNAE estabelece para si os seguintes objetivos oficiais:

 

  • Atender às necessidades nutricionais das crianças, por meio de uma refeição diária;
  • Estimular hábitos alimentares saudáveis e prover educação nutricional;
  • Melhorar a capacidade de aprendizagem;
  • Prevenir a repetência e o abandono escolar.

 

Para a realização desses objetivos, é necessário que os recursos financeiros consignados no orçamento da União para execução do PNAE sejam repassados em parcelas aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às escolas federais pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, mediante depósito em conta-corrente. Esses recursos serão incluídos nos orçamentos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios atendidos, para serem utilizados exclusivamente na aquisição de gêneros alimentícios. O montante repassado será calculado com base no número de alunos devidamente matriculados na educação básica pública (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos) matriculados em escolas públicas, filantrópicas e em entidades comunitárias (conveniadas com o poder público) de cada um dos entes governamentais, usando como base os dados oficiais de matrículas do censo escolar realizado pelo Ministério da Educação. (BRASIL, 2009)

O Estado pode transferir a seus municípios a responsabilidade pelo atendimento aos alunos matriculados nos estabelecimentos estaduais de ensino e autorizar o repasse direto ao município, por parte do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), da parcela de recursos calculados. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios apresentaram ao FNDE a prestação de contas do total dos recursos recebidos e manterão em seus arquivos, os documentos comprobatórios de gastos, e estarão obrigados a disponibilizá-los, sempre que solicitado, ao Tribunal de Contas, ao FNDE, ao Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal e ao Conselho de Alimentação Escolar – CAE – órgão fiscalizador do programa. O FNDE realizará auditagem da aplicação dos recursos nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, a cada exercício financeiro, podendo ainda, delegar competência a outro órgão ou entidade estatal para fazê-lo (BRASIL, 2009). 

A Lei n° 11.947, de 16 de junho de 2009, e regulamentada pela Resolução n.º 38, de 16 de julho de 2009, garante que, no mínimo, 30% dos repasses do FNDE sejam investidos na compra direta de produtos da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e as comunidades quilombolas em âmbito local.

De acordo com ALVES (apud BRASIL, 2010, p. 138):

 

Esta medida tende também a favorecer a proximidade com os hábitos alimentares locais, a dinamização da economia local e a participação mais efetiva desse público com a educação. A aquisição dos alimentos poderá ser realizada dispensando-se o procedimento licitatório, desde que os preços sejam compatíveis com os vigentes no mercado local, observando-se os princípios da Constituição Federal, e os alimentos atendam às exigências do controle de qualidade estabelecidas pelas normas que regulamentam a matéria.

 

Segundo ALVES (2017), os beneficiários fornecedores são os Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais e/ou suas organizações econômicas, bem como assentados da reforma agrária, comunidades tradicionais indígenas e quilombolas que possuem DAP. Assim, os agricultores familiares participam de forma individual ou em organizações de grupos informais, utilizando a DAP Física; como também em grupos formais (cooperativas e associações) através da DAP Jurídica. As Entidades Executoras (EEx) são as Secretarias de Educação dos Estados e do Distrito Federal, prefeituras municipais e escolas federais, responsáveis pelo recebimento, execução e prestação de contas dos recursos financeiros transferidos pelo FNDE.

Entre os benefícios proporcionados por essas políticas públicas está, a superação do atomismo dos agricultores, rompendo o véu da invisibilidade em que boa parte dos indivíduos acha-se imersa, pois para isso há a necessidade de que os agricultores, assentados da reforma agrária, comunidades remanescentes de quilombos, pescadores artesanais, dentre outros atores da realidade rural brasileira, se organizem para participarem destes processos como beneficiários produtores. Nestes casos, a produção individual de alimentos (hortaliças, frutas, etc.) dificilmente consegue ingressar nos circuitos comerciais em condições que respondam às expectativas dos agricultores familiares, os quais estão normalmente sujeitos às armadilhas impostas pelo capital comercial e pela lógica ditada pelos atravessadores. A criação dos mercados institucionais introduz um elemento que modifica sensivelmente esta dinâmica, sobretudo quando institui um mecanismo de compra antecipada de uma produção que invariavelmente permanecia na invisibilidade e à mercê dos especuladores. (ANJOS e BECKER, 2014)

Nos últimos anos, as doenças relacionadas à contaminação com venenos são crescentes no Brasil, chegando a níveis alarmantes, este cenário é refletido nos hábitos alimentares da população. As políticas púbicas referentes aos Mercados Institucionais buscam transformar esse cenário, já que a exigência principal na compra é por alimentos orgânicos que possam nutrir as crianças das escolas públicas brasileiras, com índices nutritivos satisfatórios para sua idade. Além disso, ao valorizar o hábito local, tende a trabalhar ideologicamente com as crianças a necessidade de consumir frutos e verduras, este ciclo é uma forma de reconectar os produtos aos consumidores, ampliando a produção do pequeno agricultor e descaracterizando a falsa ideologia de que o campo é atrasado e lugar que merece ser desprezado (MENEZES, 2017).

Outro aspecto importante é que as compras governamentais contribuem para reduzir a atuação de atravessadores que, invariavelmente, se aproveitam do isolamento dos produtores para lucrar na compra e venda de hortifrutigranjeiros (ANJOS e CALDAS, 2017). Diniz; Neto e Hespanhol (2008, p. 4) expõe que “[...] o PAA vem contribuindo para a elevação dos preços pagos aos produtores e, também, diminuindo a ação dos atravessadores que normalmente pagam um preço bem inferior aos alimentos produzidos pelos agricultores familiares”. Esses atravessadores compra aos agricultores familiares, seus produtos a preços baixíssimos e revende-os, a preço bem mais caro do que foi pago anteriormente, fazendo dessa atividade muito lucrativa para os mesmos e diminuindo a renda dos pequenos agricultores, que teriam o dinheiro da venda dos seus produtos todo para si ou sua família, mas que precisa vender a um preço menor, para ser comercializado mais adiante em um valor superior. Com o programa os agricultores têm um canal de comercialização direto entre produtor e o consumidor, sem a necessidade e um intermediário, ficando toda a renda para ele.

Ainda de acordo com Anjos e Becker (2014), no caso específico do PAA, o estímulo ao consumo de produtos da estação (sobretudo frutas frescas) e os efeitos benéficos deles decorrentes para a saúde dos consumidores, bem como a preservação da cultura alimentar de populações tradicionais, tanto no caso dos produtos in natura quando no caso de produtos oriundos da indústria artesanal (conservas caseiras, geleias, etc.) Para Siliprandi e Cintrão (apud DINIZ; NETO e HESPANHOL, 2008, p. 7), o programa também cria uma oportunidade comercial importante para os produtos processados, permitindo agregar valor à produção da agricultura familiar, e para um conjunto diverso de produtos do extrativismo, os quais são considerados, na maioria, como “atribuições das mulheres” nos estabelecimentos de agricultura familiar. O protagonismo feminino na condução do programa está também associado à maior atenção que as mulheres têm com a qualidade e a conservação dos alimentos, o que se reflete tanto no âmbito do cuidado com os processos de acondicionamento e/ou beneficiamento quanto na busca da redução/eliminação do uso de agrotóxicos nos manejos agrícolas.

Em virtude dos alimentos serem produzidos e consumidos em locais relativamente próximos, o PAA fomenta a criação de circuitos curtos de comercialização, em contraponto aos circuitos longos e à desconexão entre produção e consumo, favorecendo a aproximação entre produtores e consumidores, a construção e o resgate de identidades, a valorização da cultura alimentar local/regional e do trabalho dos agricultores familiares, promovendo uma relação virtuosa de empoderamento deste grupo social e fortalecimento da segurança alimentar e nutricional de populações em situação de risco/vulnerabilidade social (GRISA; PORTO, 2015).

Além disso, o PAA estimulava a produção agroecológica e orgânica com um sobre preço de até 30% aos produtos cultivados segundo tais manejos e com o incremento no valor de comercialização por DAP/ano nas modalidades de doação simultânea. Promove a aquisição de sementes crioulas, retirando da marginalidade as sementes locais e permitindo fortalecer os processos sociais de resgate e uso dessa biodiversidade que se opõe aos sistemas “modernos” da revolução verde e o uso das sementes transgênicas. Estas medidas também contribuíram para a autonomia das unidades familiares por meio da promoção de uma matriz produtiva orientada pela redução de insumos externos a propriedade e pela coprodução com a natureza (GRISA e PORTO, 2015). Diniz; Neto e Hespanhol (2008, p. 5), salienta, que “[...] o PAA, além de propiciar o aumento e a diversificação da produção de alimentos nos estabelecimentos rurais familiares, tem contribuído para a melhoria nutricional dos próprios agricultores e suas famílias.  

No tocante aos efeitos gerados às populações que se beneficiam da doação dos alimentos, Delgado et al., (2005) apontam que o PAA fomenta a diversificação e o enriquecimento da alimentação servida nas escolas, creches, albergues, instituições de caridade, hospitais, etc., contribuindo para a segurança alimentar e nutricional dos beneficiários e, colabora para o aumento da frequência e do desempenho escolar dos estudantes, redução da evasão escolar e, especialmente, para a diminuição das doenças entre as crianças.

Com relação ao PNAE, Menezes (2017), destaca a importância que o programa tem para a educação pública, ou seja, são centenas de jovens que estudam rede pública de ensino e necessitam da alimentação escolar para ter condições nutritivas favoráveis para executarem as atividades de ensino-aprendizagem, além disto, tem os agricultores familiares que vendem seus produtos no mesmo lugar de vivência e produção, fato que, fortalece os laços familiares e institucionais. É importante ressaltar, também, que estes dois agentes (agricultores familiares e jovens estudantes) são os principais beneficiados, mas, é possível afirmar que as melhorias transcorram estes atores, pois todo o município ganha com o desenvolvimento socioeconômico.

Diniz; Neto e Hespanhol, (2008) destaca como as principais externalidades positivas geradas pelo programa: o fomento à produção orgânica e/ou agroecológica; o estímulo a uma maior aproximação entre comunidade, nutricionistas, produtores familiares, Conselho de Alimentação Escolar (CAE) e entidades de assistência técnica e extensão rural (ATER); a ampliação do debate nas instituições de ensino superior sobre o tema da alimentação escolar, fomenta a criação de novos conteúdos nos cursos de nutrição com o intuito de possibilitar a superação dos desafios criados pela nova forma de trabalhar a alimentação nas escolas; o incentivo ao cooperativismo e à constituição de organizações formais de agricultores, contribuindo para um maior poder de barganha na compra de insumos, no processamento e na aquisição de embalagem dos alimentos de alta perecibilidade e redução nos custos de transporte.

Segundo Alves (2017), o PNAE incentiva a organização dos agricultores, já que o mesmo prioriza os agricultores em associações e cooperativas, além disso, contribui na dinamização da economia local, maior sustentabilidade via circuitos curtos de comercialização e valoriza os produtos regionais. Outras externalidades positivas geradas pelo programa, destacam-se:

 

[...] a capacidade de promover hábitos alimentares mais saudáveis, tendo em vista a obrigatoriedade da oferta de trutas e hortaliças, a proibição de bebidas de baixo valor nutricional (refrigerantes e refrescos em pó) e a restrição a alimentos com alta quantidade de gordura. (DINIZ; NETO e HESPANHOL, 2008, p. 7)

 

Com relação aos principais entraves que atingem ambos os programas, encontram-se os entraves burocráticos, os quais se traduzem no atraso na liberação dos recursos e a fragilidade das organizações que intervêm nesse processo. Anjos e Caldas (2017) salienta o peso político das classes conservadoras, como o caso da chamada “bancada ruralista”, que fazem o uso de retóricas e ações divergentes com o intuito de enfraquecer os programas e manter seu status quo. Mudanças no quadro político nacional também podem levar ao encerramento desses programas ou à redução de recursos disponibilizados.

Conforme Amaral; Zagonel e Basso (2015, p. 12) “Outro aspecto que merece atenção é a possibilidade dos agricultores, ao buscarem os mercados institucionais, virem abandonar os demais canais de comercialização que permitiram a agricultura familiar escoar sua produção até os dias de hoje”. Caso o produtor ache que os mercados institucionais são a “salvação da lavoura” e apostar tudo aí, arrisca ficar dependente desta forma de escoamento. Entretanto, se esse mercado for trabalhado como mais entre as várias formas de venda de seus produtos, esse risco reduz sensivelmente ou até mesmo desaparece.

Maciel (2008, p. 87) também ressalta de que agricultura familiar “não deve ficar dependente única e exclusivamente de nenhum tipo de Mercado Institucional de Alimentos, sob pena de se tornar pouco eficiente e competitiva”. A agricultura familiar deve aproveitar dos mercados institucionais como mais uma forma de mercado, não esquecendo os mercados convencionais, pois eles podem acrescer a renda do produtor, além de ser mais uma forma de segurança para o futuro dos produtores.

A criação de políticas públicas apresentar-se diante do Estado como um interlocutor legítimo e capaz de propor inovações relevantes de caráter técnico e institucional. Nesse sentido, a dinâmica dos mercados institucionais há que ser vista como materialização dos pressupostos contidos na obra seminal de Amartya Sen, sobretudo quando atestam que os mercados devem ser vistos como uma construção social capaz de promover a inclusão social e a redução das desigualdades.

A obra seminal de Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia (1998), intitulada “Desenvolvimento como liberdade” (1999), apoia-se na visão de que, o desenvolvimento se baseia na formação das capacidades humanas que assegurem aos indivíduos a conversão destes em agentes, e não somente como beneficiários passivos de engenhosos programas de desenvolvimento. Segundo esta perspectiva, a liberdade de escolha dos indivíduos, assume um valor intrínseco, a qual deve ser vista não somente como um fim a ser alcançado, mas como um meio para chegar ao desenvolvimento, ampliando o universo de oportunidades dos indivíduos.

Considerações Finais

 

Os Mercados Institucionais como  o PAA e o PNAI tem estimulado no campo a diversificação produtiva, a valorização da produção local/regional e agroecológica/orgânica, o uso de práticas mais sustentáveis de conservação dos recursos naturais, a melhoria da qualidade da produção para o autoconsumo, a dinamização dos mercados locais, a revitalização de tradicionais técnicas de beneficiamento da produção agrícola, etc., contribuindo para a ampliação do empoderamento, a emancipação social dos produtores familiares e o desenvolvimento de suas comunidades e municípios e com relação às populações beneficiadas pelos alimentos adquiridos através destes programas, percebe-se que ocorre a diversificação e o enriquecimento da alimentação servida nas escolas, creches, albergues, instituições de caridade, hospitais, etc., contribuindo para a segurança alimentar e nutricional dos beneficiários, para o aumento da frequência e do desempenho escolar dos estudantes, redução da evasão escolar e, especialmente, para a diminuição das doenças entre as crianças.

Os programas podem proporcionar ao Brasil uma grande mudança no campo: eles podem ser um canal de proteção e dessa parte da população excluída que não possuem acesso a alimentos ou que possuem dificuldades de expansão de seus alimentos no mercado, nesse sentido esses programas surgem visando contribuir com essa população para ocorrer o processo de fortalecimento da agricultura familiar e a segurança alimentar da população que está em condição de pobreza.

Wágner Sena santos- graduado em Geografia/UFS, mestrando em geografia pelo programa de pós-graduação em Geografia-PPGEO/UFS. 
Mirela de Jesus Gerônimo- graduada em Geografia/UFS, mestranda em sociologia pelo programa de pós-graduação em sociologia-PPGS/UFS.

REFERÊNCIAS

 

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