Metadados do trabalho

Educação Ambiental E Injustiça Ambiental: A Relevância Desses Conceitos Frente Aos Impactos Ambientais Causados Pelo Capitalismo

Romeu Nascimento; Vinicius Henrique Santos; Katinei Santos Costa

Os seres humanos surgiram na natureza e fazem parte dela, haja vista que não podem sobreviver sem os bens naturais encontrados no meio natural. Todavia, com o modo de produção capitalista e seu auge a partir da Revolução Industrial, as alterações na natureza passaram a ser de tal forma, que seu ritmo de recuperação passou a ser mais lento que o de exploração e concepções de que a natureza deveria estar a serviço do homem se tornaram frequentes. Com essa percepção, passou a existir a preocupação a respeito da preservação ambiental. A educação ambiental surge como forma de conscientizar os cidadãos das consequências geradas pelas ações humanas. Com isso, o presente trabalho tem como objetivo analisar a relação entre a educação ambiental e a manutenção da injustiça ambiental, compreender o que é educação ambiental e os desafios de concretizá-la no espaço escolar. Dessa forma, a educação ambiental possibilita a prática de atividades na escola que favorecem a formação de uma consciência sobre o uso dos recursos naturais e a importância da conservação dos mesmos para as gerações futuras.

Palavras‑chave:  |  DOI: 10.34024/revbea.2022.v17.12251

Como citar este trabalho

NASCIMENTO, Romeu; SANTOS, Vinicius Henrique; COSTA, Katinei Santos. Educação Ambiental e Injustiça Ambiental: a Relevância desses Conceitos Frente aos Impactos Ambientais Causados pelo Capitalismo. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2022 . ISSN: 1982-3657. DOI: https://doi.org/10.34024/revbea.2022.v17.12251. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/423-educa%C3%A7%C3%A3o-ambiental-e-injusti%C3%A7a-ambiental-a-relev%C3%A2ncia-desses-conceitos-frente-aos-impactos-ambientais-causados-pelo-capitalismo. Acesso em: 16 out. 2025.

Educação Ambiental e Injustiça Ambiental: a Relevância desses Conceitos Frente aos Impactos Ambientais Causados pelo Capitalismo

A natureza sempre esteve unida ao ser humano, pois é dela que provém todos os bens necessários para sobrevivência. Todavia, com o desenvolvimento que as sociedades alcançaram, e que fizeram eclodir a Revolução Industrial, o ritmo em que se necessitava extrair os bens naturais para manter o padrão de crescimento econômico se deu de forma exponencial, surgindo concepções de que a natureza estava a serviço dos seres humanos.

A partir desse momento os seres humanos não se entendem como parte integrante da natureza, mas a veem como um recurso que está reservada para ser explorada a seu bel-prazer e sem nenhuma moderação. Com isso, os bens naturais passam a ser mercantilizados, haja vista que o capitalismo só se reproduz pela extração das matérias-primas provindas da natureza.

Com o excesso de alterações promovidas ao meio natural, as consequências impactaram aqueles que viam a natureza de forma utilitária, pois se constatou não somente a finitude, como também as respostas indesejadas que a degradação ambiental propiciou, como: alterações climáticas, surgimentos de doenças, desertificação, escassez hídrica, poluição atmosférica, dentre outros.

Dessa forma, a educação ambiental se faz necessária para que os cidadãos estejam cientes do uso indevido da natureza e as consequências que isso trás a curto e longo prazo, sendo a escola o espaço ideal para que os cidadãos desenvolvam a consciência critica e enxerguem os verdadeiros culpados por trás de injustiças ambientais que possam vir a ocorrer.   

As consequências da alteração dos meios naturais que se traduzem, por exemplo, na produção de rejeitos tóxicos, recaem, na maioria das vezes, sobre populações que são negras, com baixo ou nenhum nível de escolaridade e poder aquisitivo irrisório. Esse conjunto de características não são coincidência e sim produto de relações históricas de poder e subordinação.

Dessa forma, o presente trabalho tem como objetivo analisar a relação entre a educação ambiental e a manutenção da injustiça ambiental, compreender o que é educação ambiental e os desafios de concretizá-la, além de observar a injustiça ambiental e a correlação com a falta de instrução dos cidadãos, bem como enfatizar a importância da escola na construção da educação ambiental.

Para alcançar os resultados esperados, como metodologia, foram utilizados referenciais bibliográficos em artigos, em revistas, dissertações e teses, livros e publicações em eventos de anais. Como método, foi utilizado o método dialético, que “proposto por Hegel e Marx, é justamente uma tentativa de pensar o mundo integrando as diferentes esferas contraditórias do real” (ZAGO, 2013, p. 111). Os principais autores foram: Acselrad (2009), Marques (2018), Ribeiro (2008), Ribeiro (2020), dentre outros.

Deste modo, em uma sociedade desigual e dividida entre classes sociais, o tema da justiça ambiental e a educação ambiental são relevantes para discussões na ciências geográficas, bem como para as sociedades, haja vista que nem sempre quem mais degrada os recursos naturais recebem as punições cabíveis, por isso a necessidade de instigar aos alunos a refletirem acerca desses temas, pois a escola é o ambiente propício para formar sujeitos conscientes e capacitados para questionar o que está posto tanto em seu espaço de vivência, como em escalas mais abrangentes.

1 Educação ambiental: breve introdução do conceito

Os seres humanos evoluíram paulatinamente até o ponto em que o modo de vida caçador foi sendo substituído por agrupamentos que se fixavam em locais de moradia, isso só foi possível com a descoberta da agricultura. Essa descoberta possibilitou não somente alimento fixo e em abundância, como também o surgimento de excedentes, que depois seriam base para formações sociais tão complexas de modo a influenciar no surgimento de impérios e cidades.

Ao passo que essas grandes transformações ocorriam as sociedades foram evoluindo e incorporando novas técnicas, as quais permitiam transformações na matéria encontrada na natureza de modo mais eficiente. Isso reverberou na maior capacidade de extrair recursos do meio natural e, consequentemente, gerando desequilíbrios aos sistemas naturais.

Foi com a ascensão do Modo de Produção Capitalista que a natureza passou a ter valor econômico em detrimento do valor de uso para subsistência. A matéria-prima extraída do meio natural será o principal meio de sustentação das bases econômicas do capital, por isso o uso exacerbado dos bens naturais.

A partir da Revolução Industrial e a incorporação das máquinas nos processos produtivos que a natureza passou a ser utilizada como meio de extração de matérias-primas e combustíveis em uma escala frenética, em que os processos de destruição passaram a superar a capacidade regenerativa da natureza. Marques (2018, p.73) traz uma reflexão que exemplifica o dito anteriormente quando diz que:

Apenas quando a Revolução Industrial contava já dois séculos que a humanidade percebeu que os efeitos da mecanização estavam ameaçando tornar a biosfera inabitável para todas as espécies, ao poluí-la não apenas localmente, mas globalmente, e inabitável para o homem em particular, ao usar recursos naturais insubstituíveis que haviam se tornado indispensável para ele. (Marques, 2018, p.73).

Soma-se a isso o despejo de resíduos do processo industrial na natureza que não são degradados na escala de tempo humana, poluindo mananciais e afetando a fauna e a flora dos locais onde ocorrem esses despejos, pois segundo Marques (2018) “somente as secreções do homem na era industrial não se reinteragem no ciclo de recomposição da matéria, por sua escala, pelo ritmo em que se multiplicam e por serem em grande parte materiais quimicamente mais estáveis”.

No modo de produção capitalista, a natureza passa a ser vista como meio de extração de “mais-valia ambiental”, ou seja, exploram-na com vistas à lucratividade. (ACSELRAD, 2008).  Perde-se a noção, então, de que o ser humano é parte integrante da natureza, cujo poder de devastação é superior à medida que se avança o poder tecnológico. Diante disso, nota-se que ao contrário do que muitos defensores do modelo capitalista pregam, o avanço tecnológico demanda maior exploração da natureza (GONÇALVES, 2019).

Dessa forma, quanto maior for o uso de tecnologias e sofisticação das mesmas, maiores serão os danos causados ao meio ambiente. Depreende-se que os países desenvolvidos terão maior capacidade de destruição e apropriação da natureza, tendo em vista que eles possuem necessidades crescentes de consumo. Isso demonstra que os impactos dos países periféricos não se comparam aos danos causados pelas nações ricas.

Entretanto, ao buscar os verdadeiros responsáveis pela degradação da natureza, a mídia não mostra quem são os culpados pelo impacto e consumismo exacerbado dos bens naturais. Por os países periféricos, às vezes possuírem maiores populações, há a tendência a se relacionar o crescimento populacional à degradação ambiental, quando na verdade isso não passa de uma falácia perpetrada pelo status quo, que são os verdadeiros culpados por tais ações. Por isso, para Flores e Misoczky (2015) “o argumento da escassez remonta, principalmente, às formulações malthusianas que legitimam a desigualdade e a miséria como forma corretiva de crescimento populacional”.

Outro argumento que é bastante veiculado é o de que as nações de primeiro mundo teriam uma maior capacidade de gerir e preservar os ecossistemas dos países periféricos, cujos níveis de biodiversidade e, portanto, patrimônio genético, são elevados. Mas isso não passa de uma falsa constatação, pois o que está por trás é o interesse em extrair os bens naturais que ali se encontram.  

Dos 17 países considerados megadiversos em biodiversidade e que, portanto, possuem potencial de fornecer matérias-primas, a maioria desses, são países periféricos e que outrora foram dominados tanto pelo imperialismo como pela colonização, tais quais Brasil, Colômbia, Peru, Venezuela, República Democrática do Congo, Equador, Madagascar, Índia, dentre outros, sendo alvo constante de cobiça pelos países hegemônicos. Marques et al (2014, p. 44) corroboram com essa ideia ao relatar que:

[...] esse conjunto de países apresentam, independentemente de sua extensão, cerca de 60 a 70% da biodiversidade mundial, tanto em terra firme como em suas águas doces e marinhas. O Centro Mundial de Conservação e Monitoramento reconhece os 17 países megadiversos, incluindo: Austrália, Brasil, China, Colômbia, República Democrática do Congo (RDC) (ex-Zaire), Equador, Índia, Indonésia, Madagascar, Malásia, México, Papua Nova Guiné, Peru, Filipinas, África do Sul, Estados Unidos da América e Venezuela. (Marques et al 2014, p. 44).

Como a natureza começou a dar mostras de sinais de finitude, começou-se haver preocupações a respeito de sua preservação. Dessa forma, surgem conceitos nas conferências ambientais a respeito da educação ambiental, que se caracteriza por um conjunto de práticas que visam conscientizar os sujeitos da importância de preservar o meio ambiente, entendendo que os bens naturais que provém à sociedade são finitos e são condição indispensável à manutenção da vida no planeta, sendo responsabilidade dos cidadãos conservá-los. Esse conceito tem sido utilizado como discurso falacioso pelos detentores de poder político e econômico para legitimar suas ações.  Carvalho (como citado em Machado et al, 2022, p.111) destaca que:

Definiu-se EA como um campo de mudança e transformação da/na educação, no sentido da construção coletiva das relações, sejam elas entre a humanidade e a natureza, na busca de justiça social, autonomia, liberdade e de alternativas voltadas ao bem comum.  No seu escopo teórico-metodológico, encontraram-se diferentes tendências e práticas   estabelecidas   entre   a sociedade, a natureza e indivíduo, que vão desde contextos escolares até os não formais. Dentre as tendências, cabe elencar:  a popular; a naturalista; a crítica; a conservacionista; a feminista; a humanista; a pragmática; a reformista; a do desenvolvimento sustentável, entre outras. (Carvalho como citado em Machado et al, 2022, p.111).

Como o modo de produção capitalista se sustenta a partir da exploração irrefreada dos bens naturais e necessita se expandir incessantemente, é impossível falar de desenvolvimento sustentável nessas condições, pois toda ação humana tem como necessidade a alteração do meio natural, sendo que no capitalismo a predação da natureza é ainda mais alarmante. Só pode se falar em sustentabilidade quando não houver capitalismo (MARQUES, 2018).

Diante disso, nota-se a complexidade que envolve o conceito de educação ambiental, que passa a ter força a partir das transformações engendradas pelo modelo de desenvolvimento capitalista e que surgiu a partir do debate sobre a finitude dos bens naturais. Na década de 70 do século XX, as discussões sobre o meio ambiente ganharam força até se concretizarem na forma de conferências internacionais, sendo a primeira de relevância, a Conferência de Estocolmo, na Suécia, em 1972 (RIBEIRO, 2020).

Entretanto, em que pese a notoriedade que o conceito de educação ambiental ganhou, os desafios para sua implementação prática são relevantes, haja vista que não é de interesse da classe hegemônica do modelo de produção vigente a conscientização efetiva dos indivíduos quanto aos motivos que estão levando à destruição maciça do meio ambiente. Ao contrário, a educação ambiental e outros conceitos relacionados, como o de desenvolvido sustentável, são deturpados e apropriados pelos detentores de poder com vistas a obscurecer suas verdadeiras intenções.

Os países periféricos são responsabilizados por algo que não tem tanto impacto se comparado aos países centrais. Há a pseudo ideia arraigada na mente dos cidadãos de que os impactos causados nos sistemas naturais são maiores nos países pobres por causa do tamanho populacional e da falta de desenvolvimento. Entretanto, fica claro que quem tem maior poder tecnológico e de consumo inflige na maior devastação dos bens naturais do planeta. 

Porém, cabe ressaltar que não é porque quem engendra os danos mais significativos ao meio ambiente sejam os países centrais, que os países da periferia do capitalismo estejam isentos de responsabilidade, pois as minorias desses países fazem parte dos interesses capitalistas de pregação dos bens naturais em escala global. Na verdade, são as populações pobres que pagam por algo que não tem capacidade de promover, qual seja, a degradação massiva do meio natural em que vivem.

Portanto, os prejudicados são os de sempre, aqueles que sustentam o poder das classes hegemônicas em todas esferas contidas no espaço geográfico, constatando que independentemente do país, da região, da localidade, há sempre o explorador e o explorado. Mas, ao contrário do que os detentores de poder imaginam, a lógica da natureza não está atrelada aos seus interesses e, mesmo em uma sociedade de classes, as consequências dos desequilíbrios naturais afetaram a todos sem distinção, pois a dinâmica da natureza é implacável.

2 A injustiça ambiental e a correlação com a ausência de instrução

Com o uso intenso e indevido da natureza pelos detentores do capital para extrair a “mais-valia ambiental”, é notório o descarte de rejeitos em locais indevidos, pois as quantidades destes são exorbitantes. Como esses rejeitos, muitas vezes, demoram muitos anos para serem degradados, ficam na natureza contaminando não só os seres humanos, como também outros seres vivos.

Quando da ocorrência desse tipo de situação, é dever do poder público intervir no combate ao descarte inadequado de resíduos em locais onde moram comunidades carentes e que devem ter seus direitos garantidos. Segundo a Constituição Federal Brasileira (1988), é assegurado que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Não obstante, o poder público está atrelado aos interesses do Estado, que é uma instituição burguesa e, por conseguinte, mantenedora da sociedade de classes, que para existir necessita das desigualdades sociais. Para manter o modo de produção capitalista em expansão não é possível a preservação da natureza, e a sua destruição exige a produção de rejeitos seja durante ou no fim dos processos produtivos. Dessa relação surge a chave para entender o porquê da injustiça ambiental.

Foi partindo desse pressuposto que a partir de movimentos sociais nos Estados Unidos, na década de 1980, chegou-se à constatação de que as populações carentes e negras recebiam as maiores desvantagens em relação ao despejo de rejeitos e a poluição atmosférica pelas indústrias. Surgiram, então, os movimentos pela justiça ambiental para dirimir a sua contraparte, a injustiça ambiental.

A injustiça ambiental se refere ao conjunto de práticas em que os pesos e medidas em relação à distribuição dos impactos causados pela ação capitalista predatória sobre o meio ambiente são distribuídos e de responsabilidade de grupos sociais específicos, na maioria das vezes pobres, especialmente pessoas negras. Nesse sentido, faz-se necessário a luta pela justiça ambiental que segundo Acselrad (2008, p.16):

[...] implica, pois, o direito ao um meio ambiente seguro, sadio e produtivo para todos, onde o “meio ambiente” é considerado em sua totalidade, incluindo suas dimensões ecológicas, físicas construídas, sociais, políticas, estéticas e econômicas. Refere-se, assim, às condições em que tal direto pode ser livremente exercido, preservando, respeitando e realizando plenamente as identidades individuais e de grupo, a dignidade e a autonomia das comunidades. A noção de justiça ambiental afirma, por outro lado, o direto de todo trabalhador a um meio ambiente de trabalho sadio e seguro, sem que seja forçado a escolher entre uma vida sob o risco e o desemprego. Afirma também o direito dos moradores de estarem livres, em suas casas, dos perigos ambientais das ações físico-químicas das atividades produtivas. (Acselrad, 2008, p.16).

A saúde das populações que convivem com o descarte inadequado de rejeitos pelas indústrias e o agronegócio se vê comprometida, pois muitos dependem dos bens naturais para sobreviver. Um exemplo é a água, a qual é contaminada por efluentes que são jogados pelas indústrias nos rios sem nenhum tratamento e, como os grupos vulneráveis só possuem esses cursos de água para consumir, muitos serão contaminados e apresentarão problemas de saúde.

O agronegócio tem ocasionado casos de injustiça ambiental e que contribuem para o desenvolvimento de doenças quando da utilização de venenos que contaminam o solo e escoam para os mananciais que abastecem populações carentes. Um outro exemplo desse tipo de injustiça ambiental perpetrada pelo agronegócio é a utilização de aviões que jogam venenos nas lavouras de cana-de-açúcar próximas às residências, ocasionando problemas respiratórios e susceptibilidades a outras doenças. Santos (2014, p.122) corrobora ao relatar casos de contaminação por pulverização área ao relatar que:

[...] os funcionários responsáveis pela pulverização aérea têm que ter habilidade para não causar danos imediatos mais graves, pois muitas plantações são entremeadas por lotes camponeses, o que aumenta as chances de contaminação pelo veneno, principalmente em crianças. Segundo uma das agentes de saúde que atende no PA Fazenda Primavera, também residente no local, os problemas de saúde mais comuns no assentamento são casos de hipertensão, alguns casos de câncer (sem relação com a pulverização em análise preliminar), dentre outras complicações. Explica que a exposição ao agrotóxico pode afetar a saúde das pessoas em longo prazo, acumular no organismo e levar a complicações futuras. (Santos, 2014, p.122).

Os casos de injustiça ambiental são vistos, principalmente nos países subdesenvolvidos, em que muitas vezes são locais de destino de rejeitos perniciosos dos países centrais. Todavia, não é de forma direta, mas sim a partir das relações de subordinação engendradas pela divisão internacional do trabalho. Nessas relações os países periféricos exploram seus bens naturais gerando rejeitos, mas os lucros advindos dessa exploração são destinados aos detentores do poder dos países desenvolvidos, constatando, assim, uma desigualdade na distribuição de proveitos e rejeitos.

Como as populações dos países periféricos são em sua maioria pobres, os países desenvolvidos os veem como receptáculos dos rejeitos produzidos por eles mesmos. Como há uma flexibilização das leis ambientais dos países subservientes, não há punição nem responsabilização sobre quem induz à devastação da natureza, mesmo porque órgãos internacionais que tratam dessa questão, estão atrelados e tem suas sedes em centros de poder hegemônico.  Mendes e Tybusch (2017, p.77) com contribuição de Castells (2006) apregoam que:

A atividade poluente gerada por essa nova estratégia empresarial afeta os países em desenvolvimento. A maioria destes países tem uma legislação mais branda no que se refere à produção de danos ambientais com o objetivo de atrair empresas para aumentar o desenvolvimento econômico através da criação de empregos. Essa estratégia denota a ligação do caráter econômico na propagação da degradação do natural por meio da desigualdade econômica (Castells, 2006). O risco ambiental é transferido para os países periféricos com a premissa de evitar/retardar a chegada deste risco aos países hegemônicos. Os países hegemônicos figuram como desenvolvedores deste mesmo risco, por meio da construção de novos produtos frutos do uso das novas tecnologias, em especial, dos bens/insumos de origem biotecnológica. (Mendes e Tybusch, 2017, p.77).

A injustiça ambiental não fica restrita somente aos países periféricos. Como o sistema de produção capitalista se reproduz a partir da exploração de alguns sobre outros, ou seja, para haver classe dominante se faz necessário existir classe dominada, nos países centrais existem bairros de grupos vulneráveis que também sofrem por injustiça ambiental, mas que são ocultados pela mídia para não manchar a reputação de países sem mazelas sociais.

Nesse ínterim, há uma visão distorcida quando se refere aos países desenvolvidos, pois muitos acreditam que as riquezas nessas nações são distribuídas de forma igualitária para todos os cidadãos e, consequentemente, bairros com pouca infraestrutura, sem saneamento básico, favelas, com índice de analfabetismo baixo nas comunidades carentes,  são uma realidade apenas dos países subdesenvolvidos, quando na verdade faz parte de muitos locais de países como os Estados Unidos, Inglaterra, França, dentre outros.

As populações que majoritariamente sofrem de injustiça ambiental nos bairros de grupos subservientes nos países dominantes, são, também, em sua grande maioria, pessoas negras, com baixos índices de escolaridade, não por falta de esforço como a mídia e muitos burgueses querem impor, mas pela exclusão social, pelo preconceito e fortes repressões sofridas durante a história.

Dessa forma, como a educação é elemento basilar para a sociedade conhecer o que está posto no espaço geográfico, ela se faz necessária para o desvelamento das relações de poder entre países dominadores e dominados. Quando os índices de analfabetismo são elevados, principalmente nos países subdesenvolvidos, torna-se fácil a perpetuação de ideias distorcidas, fazendo com que reproduzam discursos que responsabilizam eles próprios pelos danos causados ao meio ambiente.  

Na relação pobreza-classe-cor da pele, um elemento que complementa esses conceitos é a ausência de escolaridade, pois na medida em que as pessoas que sofrem de injustiça ambiental não possuem conhecimentos de seus direitos enquanto cidadãos e das causas históricas que se desdobram no espaço-tempo na formação das desigualdades sociais, ficam à mercê das ações indiscriminadas de grupos que visam o lucro a qualquer custo.

Não raro, os sujeitos afetados pela injustiça ambiental são persuadidos de que as ações de determinado grupo visam o desenvolvimento econômico de todos, quando na verdade estão interessados nas vantagens locacionais da localidade em questão, tais como: ausência de leis ambientais, isenções fiscais e mão-de-obra barata.

Quando da fixação de algumas empresas em determinados locais, mesmo elas sendo aparentemente benevolentes, utilizando-se de estratégias com vistas a desenvolver projetos como construção de creches, clínicas, escolas, praças, quadras esportivas para poder persuadir as populações carentes, já que estas são desprovidas desses bens. Isso acaba escondendo os altos riscos que esses empreendimentos possuem ao se instalarem próximos a residências, sendo, de certa forma, um caso de injustiça ambiental.    

Diante disso, a injustiça ambiental se dá principalmente em locais onde não existe instrução e índices de escolaridade baixos, pois as pessoas não conhecem os seus direitos, o que os faz naturalizar práticas que afetam a própria vida desses indivíduos. Como há flexibilização das leis que teriam a função de coibir casos de injustiça ambiental, os países ditos periféricos são vitimados constantemente desses casos.

Assim, as leis não devem existir apenas no papel, devem ser efetivadas na prática, protegendo o direito de um ambiente saudável a todos indivíduos, o que se configura na justiça ambiental. Para tanto, o incentivo à educação se faz necessário para que os indivíduos tenham conhecimento sobre si mesmos, sobre seus direitos, bem como da importância da manutenção de um meio ambiente digno e saudável.

3 O ambiente escolar como fomentador da educação ambiental

A educação, é necessariamente, em sua gênese, o processo de ensino-aprendizagem entre os diferentes sujeitos, ou seja, é a socialização do conhecimento adquirido durante o desenvolvimento do ser social em comunidade. Diante dessa realidade, a escola e a educação formal são uma criação ocidental que, sob o prisma do capital, atende e funciona de acordo com os interesses e a ideologia dominante, mesmo apresentando contradições, pois a escola em si é um território de relações de poder e conflitos entre duas classes antagônicas, a dominante e a dominada.

Quando o índice de analfabetismo é grande em um país, isso denota ausência de investimentos do poder público, que na verdade fazem parte de uma estratégia para manutenção da dominação perpetrada pelo poder hegemônico, que não se interessa por indivíduos conscientes e críticos da realidade em que vivem.  

Nesse sentido, numa educação que valorize a emancipação dos sujeitos socias, deve haver a mediação entre professor-aluno, numa construção mútua de saberes. O professor não é um detentor absoluto do conhecimento e sim um fomentador da curiosidade e desejo pela busca do saber dos alunos e deve ter o papel de desconstruir as relações de poder engendradas pela dominação capitalista. É necessário, então, que o ensino não seja pautado na memorização de conteúdos, conceitos, mas sim no desenvolvimento da criticidade no processo de formação enquanto cidadão.

Os assuntos abordados em sala de aula pelo educador devem levar em consideração o espaço de vivência dos educandos, pois, estes não são vazios de conhecimento ao adentrar no ambiente escolar. Caso o professor não relacione os assuntos com o dia a dia dos estudantes, estes terão uma visão obscura das contradições presentes no espaço geográfico em seu entorno.

Por isso, o ambiente educacional nem sempre contribui para a emancipação dos sujeitos enquanto cidadãos conscientes, ao contrário, colabora para perpetuação de valores hegemônicos, quais sejam, os da classe burguesa. A difusão dessa forma de saber não valoriza a educação ambiental, já que com isso estaria indo de encontro a seus ideais. Por isso Junior et al (2009, p.152) alertam que:

Como reprodução da sociedade, a educação é parte da sociedade. Mas, como integrante da própria sociedade, tem a tarefa de reproduzir o modelo vigente na sociedade com todos seus aspectos econômicos, sociais e políticos, o que representa na verdade uma forma de amoldar os indivíduos para perpetuação de um modelo. (Junior et al, 2009, p.152).

Apesar dos discentes possuírem conhecimentos ao adentrarem no ambiente escolar, estes ainda são incompletos, sem desenvolvimento cognitivo para conectar os assuntos. O docente, então, tem o papel não só de tornar os conteúdos claros, como também fomentar o espírito cidadão oculto nos indivíduos, ou seja, ele é o mediador na busca do conhecimento emancipatório de seus alunos. Caso o professor não cumpra com esses objetivos, os alunos serão influenciados e, por conseguinte, tornar-se-ão cidadãos que não enxergam o que está posto, pelo contrário, ajudam a manter a visão difundida pelo status quo.

O ambiente educacional é um espaço de construção de saberes e formação de sujeitos cidadãos, sendo por isso ambiente ideal para o fomentar da educação ambiental, pois os professores são vistos pelos alunos como modelos de conduta a ser seguidos. A partir da orientação, mediação e instigação, o professor deve tornar os alunos sujeitos críticos a respeito das transformações pérfidas que o meio ambiente tem sofrido com a ganancia da classe burguesa. Para Baptista (2010, p.13):

O desafio atual é o de formular uma educação ambiental, ao mesmo tempo crítica e inovadora, voltada    à    transformação social, norteada   em perspectivas holísticas de ação, relacionando o homem e a natureza, principalmente no que se refere à utilização dos recursos naturais. Deve-se entender que eles são finitos e o principal    responsável pela sua degradação é o próprio ser humano. (Baptista, 2010, p.13).

Na medida em que os casos de injustiça ambiental ocorrem em locais onde estão inseridas populações majoritariamente pobres e, em extensão, negras, percebe-se que o índice de analfabetismo dessas populações é elevado. Isso faz com que esses grupos populacionais não possuam conhecimento sobre seus direitos e isso atesta a maior necessidade de difundir o espaço escolar nessas localidades.

Como não há investimentos em educação para as populações carentes, já que não é de interesse dos grupos sociais dominantes a criticidade de todos indivíduos, grupos dentro das próprias comunidades são criados para tentar instruir as demais populações que não tem acesso ao conhecimento a respeito das injustiças cometidas pela classe hegemônica.

Portanto, para que se consiga atingir a conscientização das comunidades sobre seus direitos é necessário agir em conjunto, pois o ser humano enquanto ser social só consegue transformar a realidade em que vive a partir de práticas que ensejem a coletividade. O debate da educação ambiental se faz necessário nas escolas, porém é preciso difundir o conhecimento no dia a dia dos cidadãos, pois os sujeitos que transformam o espaço não estão restritos somente em sala de aula, mas em todos os locais do espaço geográfico.    

Ao se relacionarem educação ambiental e injustiça ambiental, nota-se a importância do ambiente escolar na conscientização sobre o que viria a ser esses dois conceitos e, mais que isso, a construção da noção e a aplicação prática dos direitos e deveres dos órgãos competentes que devem dirimir as ações indiscriminadas sobre o bem-estar de um meio ambiente saudável para todas populações, independentemente da classe social.

Sendo a educação ambiental um conjunto de práticas e ações que levam aos indivíduos a perceberem a importância e a noção de finitude dos bens naturais, bem como a atuar de forma ativa nessa questão, é necessário levar em conta as nuances políticas, sociais e econômicas que estão por trás da problemática ambiental. 

Discutir a educação ambiental nas escolas se faz necessário, porém se deve atentar que esta instituição é uma construção social e que, por isso mesmo, muitas vezes atua de forma a legitimar o poder hegemônico, que não se interessa pela apreensão crítica da realidade por parte dos indivíduos.

A injustiça ambiental tem correlação com o índice de escolaridade e com a cor da pele, denotando uma complexidade que vai além da condição social, mostrando, assim, a importância da educação como reveladora de tais contradições. Porém, o docente deve estar a serviço da emancipação crítica dos cidadãos, caso contrário, a educação como um todo perde significado.

Como há poucos investimentos em educação para as classes subservientes, os cidadãos mais instruídos, devem tentar fazer com que outras pessoas tenham conhecimento da devastação ambiental que está acontecendo e suas consequências que não são, como perpetrada pela mídia, um problema para as gerações futuras, mas sim que já está presente no dia a dia desses cidadãos que vivem em condições de vulnerabilidade.

As lutas pela justiça ambiental se iniciaram nos Estados Unidos, o que denota que os problemas ambientais são globais e não restritos somente aos países periféricos. Esses problemas existem nos países desenvolvidos, mas são camuflados pelos meios de comunicação e só mostram as partes nobres de um padrão de vida almejado pelas pessoas, mas que esconde sua faceta perversa, a da degradação ambiental e as injustiças contidas nesse processo. 

Agradecemos imensamente à professora Dr. Katinei Santos Costa pelo incentivo, apoio intelectual e disponibilidade para contribuir com este e demais trabalhos que estamos realizando sob suas orientações. Além disso, queremos agradecer, ainda, à professora Dr. Alberlene Ribeiro de Oliveira pelas valiosas inspirações e reflexões que nos fizeram enxergar e ter ideias para alcançar os objetivos propostos neste trabalho, além da confiança que teve em nós desde as primeiras aulas. Agradecemos, também ao professor Dr. Daniel Almeida por desde o início da graduação ter acreditado no nosso potencial e pelas contribuições enquanto profissional.

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