A Educação no Brasil tem buscado acompanhar o desenvolvimento científico e tecnológico dos últimos tempos. Tem-se procurado elevar a qualidade da educação básica ao ensino superior com a finalidade de conquistar prestígio nacional e internacional. Nosso olhar no presente artigo se volta para a educação superior e, especificamente, para os cursos de pós-graduação lato sensu, denominados de cursos de especialização, nível de ensino ofertado para quem já possui diploma de graduação e, no entanto, deseja aumentar seus conhecimentos em uma área específica (HAMBURGER, 1980).
A atual legislação menciona dois tipos de cursos de pós-graduação, stricto sensu e lato sensu. De acordo com a Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) no artigo 44 e parágrafo III, esse nível de ensino classifica-se como cursos “de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, cursos de especialização, aperfeiçoamento e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino” (LDB, 2020, p. 33).
Com base na LDB (2020) percebe-se que a lei não estabelece diferenças entre stricto e lato sensu, contudo, de acordo com Oliveira (1994) a distinção entre os programas só virá após a publicação do
Parecer nº 977/65 do Conselho Federal de Educação [que] definiu dois tipos de cursos: pós-graduação stricto sensu (PGSS), considerando nessa categoria os cursos de mestrado e doutorado, e pós-graduação lato sensu (PGLS), incluindo nessa instância os cursos de especialização e aperfeiçoamento (OLIVEIRA, 1994, p. 19).
Até aqui depreende-se que esse nível de ensino vem após a graduação e se divide em duas categorias, stricto e lato sensu, entretanto, não fica clara qual a função de cada categoria. Supõe-se que essa falta de clareza venha do fato de o ensino superior e a pós-graduação no Brasil terem uma história recente, embora se tenha conhecimento da existência de cursos de aperfeiçoamento e especialização desde a Primeira República.
Esses cursos eram oferecidos aos portadores de diplomas de curso superior, como veremos nas seções seguintes, porém, as definições sobre as diferenças e finalidades de cada programa só vieram mais tarde com a consolidação da pós-graduação na década de 70. Diante desse fato, o documento legal em questão, ou seja, o Parecer n° 977/65 teve grande importância, pois lançou luz sobre as peculiaridades de cada programa.
O presente artigo tem como objetivos conhecer a história e legislação que normatiza a pós-graduação lato sensu no Brasil, refletir sobre a relevância dos cursos de especialização na formação dos estudantes e discutir as dificuldades de ingressar no mercado de trabalho com a obtenção do título de especialista.
A revisão de literatura incluiu a legislação, as produções acadêmicas e as pesquisas relacionadas a esse nível de ensino. O que pode-se considerar é que existe um reduzido número de publicações que tratam da temática da pós-graduação lato sensu, pois foi encontrado pouco material escrito até a conclusão do estudo.
Por ocasião da consulta à literatura catalogada surgiram algumas indagações concernentes aos cursos de especialização, tais como: qual a relevância da pós-graduação lato sensu na formação dos pós-graduandos? Há facilidades de ingresso no mercado de trabalho com o título de especialista? Como se dá a concorrência entre os egressos da pós-graduação lato sensu e stricto sensu? Espera-se que essas questões sejam esclarecidas nas seções que seguem.
A hipótese é de que haja uma confusão conceitual em torno da pós-graduação lato sensu tornando-a inferior ou subordinada à pós-graduação stricto sensu, dificultando a inserção no mercado de trabalho, bem como a atuação profissional dos egressos dos cursos de especialização, uma vez que se dá maior importância aos profissionais que possuem títulos de mestrado ou doutorado.
O trabalho está estruturado com as seguintes partes retóricas: primeiramente faz-se um resumo histórico sobre a educação superior e a pós-graduação lato sensu no Brasil, em seguida faz-se uma reflexão sobre a relevância do curso de especialização na formação dos estudantes de pós-graduação e, por fim, discute-se as dificuldades que os egressos enfrentam para ingressar no mercado de trabalho com a titulação de especialista.
2 SÍNTESE HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR E DA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU NO BRASIL DE 1822 À 1996
Nesta seção faz-se um recorte no tempo compreendendo o período da Primeira República até a promulgação da Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 2020), a fim de tecer uma síntese histórica da educação superior e da pós-graduação lato sensu no Brasil.
O termo “Educação Superior” de acordo com Souza (2001), é o “grau de escolaridade que, na hierarquia do Sistema de Ensino, situa-se no topo de todos os demais” (SOUZA, p. 29). No Brasil, o ensino formal segue três etapas: Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior (MENEZES; COSTA; SANTOS, 2022). Desse modo, o sistema se assemelha a uma escada ascendente, cujo topo é ocupado pela graduação e a pós-graduação e para ter acesso ao Ensino Superior o candidato precisará comprovar a conclusão dos estágios anteriores (LDB, 2020).
A pós-graduação lato sensu pode ser definida como a educação subsequente à graduação com fins ao aperfeiçoamento profissional, conforme Artigo 1º da Resolução nº 1, de 6 de abril de 2018, que denomina essa modalidade educacional como
[...] programas de nível superior, de educação continuada, com os objetivos de complementar a formação acadêmica, atualizar, incorporar competências técnicas e desenvolver novos perfis profissionais, com vistas ao aprimoramento da atuação no mundo do trabalho e ao atendimento de demandas por profissionais tecnicamente mais qualificados para o setor público, as empresas e as organizações do terceiro setor, tendo em vista o desenvolvimento do país (RESOLUÇÃO 1, 2018).
O excerto acima deixa transparecer que uma das finalidades da pós-graduação lato sensu é “complementar a formação acadêmica”. Cabe, portanto, um questionamento: será que há uma deficiência na formação inicial na graduação? Porém, isso é uma discussão para outro estudo. No entanto, quando se discute acerca do ensino superior no Brasil tudo deve ser considerado para fins conceituais.
Fazendo um percurso histórico com um recorte, inicialmente, no regime da Primeira República, o que se observa é que a história da educação superior no Brasil é considerada recente, de acordo com Oliven (2002) o “Brasil não havia criado instituições de ensino superior em seu território até início do século XIX” (OLIVEN, 2002, p. 31). Até então, quem quisesse e tivesse condições financeiras para fazer um curso superior tinha que sair do país.
A possibilidade de criação de uma universidade brasileira surgiu ainda no Período Colonial quando da chegada da Família Real Portuguesa na Bahia em 1808. De acordo com Oliven (2002), “Dom João VI, então Príncipe Regente, recebeu solicitação dos comerciantes locais no sentido de ser criada uma universidade no Brasil; para tanto, dispunham-se a colaborar com uma significativa ajuda financeira” (OLIVEN, 2002, p. 32). O desejo dos comerciantes não fora atendido pois, segundo a autora, em vez de uma universidade, “Salvador passou a sediar alguns cursos como, Curso de Cirurgia, Anatomia e Obstetrícia; com uma Escola de Cirurgia, além de Academias Militares e a Escola de Belas Artes, bem como o Museu Nacional, a Biblioteca Nacional e o Jardim Botânico” (OLIVEN, 2002, p. 32).
A primeira universidade brasileira só veio a ser criada em 1920, no Rio de Janeiro. Uma das razões para a criação dessa universidade foi outorgar o título de “Doutor Honoris Causa” ao Rei da Bélgica que tinha intenção de visitar o Brasil por ocasião das comemorações do Centenário da Independência em 1922 (OLIVEN, 2002, p. 33). A autora comenta ainda que o “sistema de educação superior no Brasil, pode ser considerado um caso atípico no contexto latino-americano, [pois] desde o século XVI os espanhóis fundaram universidades [em suas colônias] na América” (OLIVEN, 2002, p. 31).
No que se refere à pós-graduação lato sensu, de acordo com Oliveira (1994), o primeiro curso foi criado por meio do Decreto nº 16.782-A de 13 de janeiro de 1925, tratava-se do “Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, cujo objetivo era o aperfeiçoamento técnico dos médicos que viessem a desempenhar funções sanitárias” no Brasil (OLIVEIRA, 1994, p. 20). Um dos pré-requisitos para fazer esse curso era a posse do diploma de médico, ficando, portanto, caracterizado como curso de pós-graduação. Oliveira (1994) ainda menciona que, o mesmo decreto no art. 284 autoriza “professores catedráticos de qualquer instituição de ensino superior realizar cursos de aperfeiçoamento, remunerados ou não, para diplomados nos estabelecimentos oficiais de ensino” (OLIVEIRA, 1994, p. 20).
Prosseguindo neste percurso histórico, mais precisamente no regime da Nova República, data de 1934 o ano em que o Estado de São Paulo reuniu algumas faculdades isoladas e criou a Universidade de São Paulo (USP), a primeira universidade pública estadual do Brasil. No ano seguinte, através de um Decreto Municipal foi criada a Universidade do Distrito Federal por Anísio Teixeira, então Diretor de Instrução do Distrito Federal. A existência dessa universidade foi breve, pois a mesma fora extinta no ano de 1939. Para Oliven (2002), a causa disso foi o “clima político autoritário reinante no país” (OLIVEN, 2002, p. 35) na época. Todos os recursos pertencentes a esta universidade foram transferidos para a Universidade do Rio de Janeiro.
Anos mais tarde, outras universidades foram surgindo, tanto universidades públicas como privadas, dentre as quais a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC RIO (1964). Ainda de acordo com Oliven (2002) “durante a Nova República, foram criadas 22 universidades federais, constituindo-se o sistema de universidades públicas federais. Cada unidade da federação passou a contar em suas respectivas capitais com uma universidade pública” (OLIVEN, 2002, p. 35). Além das universidades públicas federais e estaduais, nesse período também surgiram 9 universidades religiosas, sendo 8 católicas e 1 presbiteriana.
Em se tratando da pós-graduação lato sensu, deve-se ressaltar que, nesse período, a Reforma do Ensino Superior empreendida por Francisco Campos, então ministro da educação, através do Decreto 19.851 de 11 de abril de 1931 menciona no art. 35 vários cursos de especialização e aperfeiçoamento oferecidos nos estabelecimentos de ensino superior (OLIVEIRA, 1994, p. 21).
Outro documento que regulamentou os cursos de especialização e aperfeiçoamento foi o Decreto nº 19.852 de 11 de abril de 1931. Segundo Oliveira (1994) o documento permitiu a muitas instituições que possuíam caráter técnico e científico, dentre elas os Institutos Oswaldo Cruz e de Química, o Instituto Médico Legal, o Museu Nacional e o Jardim Botânico implementar cursos de aperfeiçoamento e de especialização em forma de mandatos universitários, colaborando na ampliação do ensino da Universidade do Rio de Janeiro (OLIVEIRA, 1994, p. 21). Ainda de acordo com Oliveira (1994) os programas dos referidos cursos mencionados, assim como os métodos de sua execução, precisavam ser aprovados pelo Conselho Universitário. Tais cursos poderiam ser preparados e lecionados por professores catedráticos ou ainda por docentes livres cabendo ao Conselho Técnico-administrativo permiti-los (OLIVEIRA, 1994, p. 21).
Aos estudantes destas instituições supracitadas era facultado o direito de estudar em mais de um curso de aperfeiçoamento, contanto que não houvesse incompatibilidade de horário. Foram elencados doze cursos de especialização, além daqueles que integravam disciplinas de curso médico (OLIVEIRA, 1994, p. 21). No que se refere à duração, alterava-se em conformidade com a natureza deles. Requisitava-se a execução de trabalhos práticos e estágios como condição para admissão nas provas finais de habilitação. O Decreto n° 19.852 normalizou ainda os cursos de especialização em Perícia Médico-Legal e Higiene e Saúde Pública. O Decreto referia-se aos cursos em nível de pós-graduação, uma vez que, o art. 115 determinava como requisito para a matrícula que só poderiam matricular-se candidatos diplomados em medicina pelas faculdades oficiais ou similares (OLIVEIRA, 1994, p. 21).
A autora também diz que, após a II Guerra Mundial o Brasil foi tomado pela mentalidade do desenvolvimento industrial. Nessa época foram criadas as escolas profissionais do Sistema “S”, SENAI e SENAC “voltadas para preparar recursos humanos para o trabalho” (OLIVEIRA, 1994, p. 22). Seguindo a ideologia “liberal-democrática”, em 18 de junho de 1946 foi publicado o Decreto nº 21.231 que no seu art. 74 fala sobre os cursos de especialização que seriam destinados a ministrar conhecimentos nos diferentes ramos de estudos. O art. 76 corrobora o disposto no anterior dizendo que, os cursos de pós-graduação teriam como finalidade a formação sistemática de especialização profissional (OLIVEIRA, 1994, p. 22).
No ano de 1952 foi firmado um acordo entre os Estados Unidos e Brasil do qual resultaram vários convênios que produziram reflexos na história da pós-graduação, pois vários alunos foram enviados aos EUA para cursar programas de mestrado e doutorado, de igual modo, pesquisadores americanos vieram ao Brasil com objetivo de desenvolver cursos de pós-graduação lato e stricto sensu.
Outro importante documento histórico que precisa ser destacado é a Lei 4.024 de 20 de dezembro de 1961, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). O referido documento faz distinção entre os cursos de pós-graduação e de especialização em seu art. 69. Essa é a primeira vez que se usa a expressão “pós-graduação” nas diretrizes educacionais (OLIVEIRA, 1994, p. 22).
Já no período pós 64 e, portanto, no contexto da Ditadura Militar, houve uma expansão dos cursos de graduação como consequência da reforma do sistema educacional realizada nos anos anteriores.
Em 1965 o ministro da educação solicitou ao Conselho Federal de Educação uma definição dos cursos de pós-graduação na tentativa de esclarecer as confusões em torno do conceito de pós-graduação. Nas palavras de Oliveira (1994), o Conselho Federal de Educação publicou o Parecer nº 977/65 em que distingue dois tipos de pós-graduação, a saber: os cursos lato e stricto sensu. Sobre os cursos lato sensu abrangem cursos de especialização e de aperfeiçoamento, os quais têm natureza técnica, prática e profissional. São cursos que conferem certificação de aperfeiçoamento, exceto os cursos de especialização em medicina, que por sua vez, eram praticados em formato de residência (OLIVEIRA, 1994, p. 23). No que tange ao stricto sensu são compostos pelos cursos de mestrado e doutorado, cujo objetivo possui natureza acadêmica e são voltados para a pesquisa, tendo como meta o avanço do saber. Tais cursos, uma vez que, estão diretamente ligados “à essência da universidade, são atividades regulares e permanentes e conferem diplomas de mestre ou doutor” (OLIVEIRA, 1994, p. 23).
Apesar dessas iniciativas as confusões conceituais em torno da pós-graduação lato sensu persistiram e, nesse ínterim, mais uma tentativa de elucidar essas confusões é feita por meio da Resolução de nº 12/1983. Fonseca (2004) diz que “o espírito de Resolução n° 12/83 apresentava uma preocupação que se centrava no aspecto formativo de cursos de aperfeiçoamento e especialização para o magistério superior” (FONSECA, 2004, p. 174). Nesta perspectiva, existia um requisito regularizador acerca da qualificação do corpo docente para a atuação na pós-graduação que dizia que “o número de professores sem o título de mestre não poderia ultrapassar a um terço” (FONSECA, 2004, p. 174).
Outro ponto importante da referida Resolução se reporta à formação didático-pedagógica e de iniciação à pesquisa. Tais requisitos apontavam para uma preocupação com a qualificação dos egressos que, de modo geral, poderiam atuar no magistério superior. A resolução estabelecia “uma carga horária de 60 horas destinadas para as disciplinas de formação didático-pedagógica, frequência mínima de 85% e aproveitamento em processo formal de avaliação, equivalente, no mínimo, a 70%” (FONSECA, 2004, p. 174).
Isto posto, percebe-se que neste momento histórico o principal documento que regulamentava a pós-graduação era a Resolução n° 12/1983.
Já nos anos subsequentes e, portanto, no período pós Ditadura Militar, o principal documento, resultado de um longo debate que durou cerca de oito anos (1988-1996) foi a Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Não há dúvidas de que o documento mais importante no contexto da educação brasileira é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). É ela quem regulamenta todo o sistema de ensino em todos os níveis. Nesse artigo, destacamos o que diz respeito ao ensino superior e, especificamente, à pós-graduação lato sensu.
A LDB dá um novo ordenamento para os cursos de pós-graduação lato sensu. De acordo com Fonseca (2004) “No entendimento da Capes, para dar novo enfoque à pós-graduação lato sensu fazia-se necessário mudar a concepção da Resolução nº 12/83 com o objetivo de adequá-la ao novo cenário do ensino superior” (FONSECA, 2004, p. 174). Ainda de acordo com a autora, no entendimento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), as mudanças ocorridas na pós-graduação na última década tornam necessária a revisão da Resolução CFE nº 12/83, principalmente, em relação à expansão do sistema de pós-graduação stricto sensu que torna obsoleta a ideia de fazer dos cursos de especialização um meio de qualificação do magistério superior (FONSECA, 2004).
Outro ponto é a inexistência de um conceito claro para os cursos de aperfeiçoamento e especialização que na prática se usa os dois termos na mesma regulamentação. Tal fato dificulta ainda mais a compreensão da função deste tipo de formação, aumentando a confusão conceitual. Sabe-se que os cursos de especialização ocupam um espaço considerável no ensino pós-graduado, há um variado número de cursos de especialização em oferta atualmente, tanto no setor privado quanto no público (FONSECA, 2004, p. 174).
Para Fonseca (2004), além do que já fora dito anteriormente, as transformações que aconteceram na pós-graduação nos últimos 15 anos tornaram imprescindível a revisão da Resolução CFE nº 12/83. Em decorrência disso, é importante destacar que o notável crescimento do sistema de pós-graduação stricto sensu, bem como o Know-how que detém para formar mestres e doutores enfraquece a ideia da busca pelos cursos de especialização como via oportuna para a qualificação do magistério superior (FONSECA, 2004, p. 174).
Outra questão importante trata da ausência de uma concepção para os cursos de aperfeiçoamento e especialização, equívoco conceitual que levou à prática corrente de utilizar-se de ambos os vocábulos concomitantemente – aperfeiçoamento/especialização – para referir-se a uma única normalização (FONSECA, 2004, p. 174). Ainda, de acordo com pesquisa feita pela Capes sobre os cursos de especialização, em seus vários tipos, os mesmos conquistaram atualmente importante lugar no ensino pós-graduado. O referido estudo mostra que existem mais de 3 mil cursos ofertados para um público composto por mais de 60 mil estudantes, com relevante presença também na esfera pública (FONSECA, 2004, p. 174).
Outro destaque a ser feito refere-se ao infortúnio dos legisladores na investida de esforços para impedir que se fizesse referência à Resolução 12/83 como ‘oficialização’, mesmo que de forma ambígua, “dos cursos não orientados para o magistério superior, em razão de ser essa a única regulamentação existente para esse nível de pós-graduação” (FONSECA, 2004, p. 174).
Pode-se ainda salientar que as inúmeras funções que, atualmente, cumprem os cursos de especialização com considerável distinção entre as áreas: qualificação para o exercício da docência na etapa da educação básica, mais precisamente no ensino fundamental e ensino médio, além de “atualização ou reciclagem profissional, preparação para o mestrado, educação continuada, especialização profissional em sentido estrito, além da qualificação para o ensino superior” (FONSECA, 2004, p. 174).
Outro fato a ser considerado está ligado à busca incessante e gradual pela pós-graduação em nível de mestrado profissional a qual nos últimos anos fora regulamentada pela Capes (Portaria 80, de 16/12/98) podendo assim atuar “em espaços e com clientelas comuns às dos cursos de especialização e a consequente necessidade de uma definição mais clara de níveis de pós-graduação e respectivas funções” (FONSECA, 2004, p. 174) Como vimos, o ato de dar continuidade à formação acadêmica, ou profissional está parcialmente relacionado com uma questão pragmática, pois é um dos principais meios de ascensão profissional, mas também está ligado a uma questão particular de autorrealização. Após a graduação os egressos se enchem de expectativas quanto ao futuro de suas carreiras e para aumentar suas chances em uma sociedade altamente competitiva é comum optarem pela educação continuada, vindo, logo em seguida, à procura por cursos de pós-graduação. O aluno pós-graduando inicia seu curso de especialização cheio de esperanças, porém, ao concluí-lo, logo se depara com a decepção, pois o mercado se rege pela noção de formação ascendente acolhendo a melhor qualificação e preparo. Tal fato somente aumenta o excedente de egressos com certificado nas mãos. A situação mencionada acima é uma história cujas personagens são milhares de egressos da pós-graduação lato sensu que, ao recebem seus títulos de “especialistas” encontram muitos obstáculos à sua frente. Um destes trata-se de uma herança que a história da pós-graduação nos deixou, a confusão conceitual em torno desse nível educacional, que reduziu os cursos de especialização a um degrau para se alcançar programas de mestrados e doutorados. Apesar disso, se reconhece a relevância que os cursos de especialização em nível de pós-graduação têm para a formação dos estudantes do ensino superior, pois eles complementam a formação inicial e aperfeiçoam os conhecimentos em uma área específica, fazendo dos egressos profissionais especialistas. Consideramos ser de grande importância a criação de políticas públicas que dê o devido enfoque aos cursos de especialização, que eles também sejam priorizados como é a pós-graduação stricto sensu, que haja um instrumento de avaliação dos cursos para atestar sua qualidade. Coube a LDBEN dar nova orientação para o exercício do magistério superior, dando certa prioridade aos cursos de mestrado e doutorado, deixando indefinida a função da pós-graduação lato sensu. Dessa forma, espera-se que o quadro de indefinição para o setor de pós-graduação lato sensu mude, a fim de que esses cursos ocupem lugar nas “planilhas” dos órgãos de estatística para assim, oferecer dados para as pesquisas a seu respeito, pois não adianta flexibilização legal para abertura e ministração desses cursos, nem o aumento de sua oferta pelas Instituições de Educação Superior (IES) públicas e particulares, se também, não comprovar sua utilidade prática na vida e carreira profissional dos especialistas. Em comparação com outros níveis de formação, a especialização tem sua relevância no que concerne ao conhecimento especializado. Na área de negócios os MBAs (do inglês Master of Business Administration) são considerados cursos de especialização de alto desempenho e são bastante valorizados. Vale ressaltar que tanto o MBA quanto os demais cursos de especialização estão no mesmo nível. No entanto, são mais valorizados do que os cursos na área de humanas, por exemplo. 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