Metadados do trabalho

Matemática Em Jogos E Brincadeiras Com Crianças: O Que Dizem Os Pesquisas Em Periódicos Nacionais?

Debora Verissimo; Simone Zogaib

Este artigo tem como objetivo de pesquisa apresentar uma caracterização geral e descritiva de estudos científicos sobre jogos e brincadeiras matemáticas na educação infantil e nos anos iniciais publicados em periódicos nacionais no período de 2010 a 2020. Caracteriza-se como uma revisão sistemática bibliográfica em artigos disponibilizados pelo Portal da CAPES, fundamentada nos estudos de Castro (2001), Galvão e Pereira (2014), Sampaio e Mancini (2007) e Zogaib (2019). Após refinamento do quantitativo de estudos, a partir dos filtros disponibilizados no próprio Portal, 9 artigos foram selecionados referentes à temática. Entre os resultados principais destaca-se que ainda há um quantitativo pequeno de pesquisas sobre jogos, brincadeiras e matemática, considerando os procedimentos de busca e a base de dados utilizados. A maior parte dos estudos são de pesquisas de campo com abordagem qualitativa e envolvem jogos e brincadeiras do campo da aritmética. Os poucos estudos sinalizam para a existência de colaboração científica entre pesquisadores e entre instituições do ensino superior. Conclui-se com a necessidade de ampliação e divulgação de pesquisas sobre o tema.

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VERISSIMO, Debora; ZOGAIB, Simone. MATEMÁTICA EM JOGOS E BRINCADEIRAS COM CRIANÇAS: O QUE DIZEM OS PESQUISAS EM PERIÓDICOS NACIONAIS?. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2021 . ISSN: 1982-3657. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/320-matem%C3%A1tica-em-jogos-e-brincadeiras-com-crian%C3%A7as-o-que-dizem-os-pesquisas-em-peri%C3%B3dicos-nacionais. Acesso em: 16 out. 2025.

MATEMÁTICA EM JOGOS E BRINCADEIRAS COM CRIANÇAS: O QUE DIZEM OS PESQUISAS EM PERIÓDICOS NACIONAIS?

 

1 INTRODUÇÃO

          Trabalhar com jogos e brincadeiras na educação infantil e nos anos iniciais é um dos caminhos que podem contribuir para a aprendizagem matemática das crianças nas instituições escolares. Em nossa trajetória acadêmica, o tema dos jogos e brincadeiras para o ensino e aprendizagem de matemática chamou-nos a atenção, principalmente, em virtude das experiências negativas que vivenciamos com a disciplina em nossa história estudantil. Desse modo, procuramos aprofundar os estudos a esse respeito em nosso trabalho de conclusão de curso, buscando conhecer o que se tem produzido em pesquisas científicas sobre a temática.

         Para nortear a busca por algumas respostas, nossa pesquisa teve por objetivo explorar os estudos científicos sobre os jogos e brincadeiras na educação infantil e nos anos iniciais publicados em periódicos nacionais no período de 2010 a 2020. A ênfase deste artigo está em apresentar uma caracterização geral e descritiva dos estudos encontrados sobre a temática. A pesquisa, portanto, caracterizou-se como uma revisão sistemática bibliográfica de artigos científicos no Portal de Periódicos da CAPES (https://portaldeperiodicos.capes.gov.br), com um conjunto de descritores que envolvem os termos jogos, brincadeiras, matemática, educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental, entre outros.

       Destacamos alguns autores que ofereceram suporte teórico para um entendimento mais aprofundado dos conceitos envolvidos neste estudo. Em relação às concepções, diferenças e semelhanças entre jogos e brincadeiras, baseamo-nos nos estudos de Kishimoto (2011), Piccolo (2009) e Vygotsky (2008). Para tratar da relação entre jogos, brincadeiras e educação (matemática), as discussões de Kishimoto (2011), Smole (2003), Muniz (2010), entre outros, foram fundamentais para nossa compreensão mais clara dos desafios e possibilidades da utilização de jogos e brincadeiras na educação. Nesta seção introdutória, trazemos algumas dessas ideias e conceitos.

        Entender de fato o jogar e o brincar é imprescindível para professores, educadores e pesquisadores, tanto do ponto de vista do entendimento teórico como também para dar suporte às práticas educativas nas escolas. Encontrar uma definição para o termo jogo não é algo simples como já afirma Kishimoto (2011). Isso, em primeiro lugar, porque a mesma palavra (jogo) possui distintas especificidades. Nas palavras da própria Kishimoto, temos que:

Quando se pronuncia a palavra jogo cada um pode entendê-la de modo diferente. Pode-se estar falando de jogos políticos, de adultos, crianças, animais ou amarelinha, xadrez, adivinhas, contar estórias, brincar de ‘mamãe e filhinha’, futebol, dominó, quebra-cabeça, construir barquinho, brincar na areia e uma infinidade de outros (KISHIMOTO, 2011, p. 13).

 

          De acordo com Kishimoto (2011), algumas características contribuem para definir os jogos: (i) existem regras e estas são uma característica marcante; (ii) acontecem em um limite de espaço e de tempo, geralmente com início, meio e fim; (iii) possuem caráter não-sério, geralmente relacionado ao riso e ao prazer; (iv) predomina a incerteza, pois não se sabe os rumos das ações dos jogadores, o que vai depender de diferentes fatores; (v) a sua natureza livre e voluntária, pois o jogador só joga quando tiver vontade, não sendo obrigado a fazê-lo.

          E a brincadeira?” como indaga Kishimoto (2011, p. 21). Ela própria responde que “é a ação que a criança desempenha ao concretizar as regras do jogo, ao mergulhar na ação lúdica. Pode-se dizer que é o lúdico em ação”. Se tomarmos as características dos jogos acima citadas, podemos verificar semelhanças e sutis diferenças em relação às brincadeiras. Por exemplo, existem semelhanças quanto à natureza livre e voluntária, a incerteza quanto aos rumos, o caráter “não-sério”. Já em relação ao limite de espaço e tempo, podemos fazer uma distinção, pois as brincadeiras podem acontecer em qualquer tempo, imaginando-se um médico adulto e imitando sua função social. Também não existe um início, meio e fim pré-estabelecido para ser trilhado até se chegar à vitória, por exemplo. Um dos pontos que podem marcar mais efetivamente a diferença entre brincadeiras e jogos está relacionado às regras. Mas isso não significa reduzir a uma afirmação simplista do tipo jogos tem regras e brincadeiras não tem regras.

         Para Vygotsky (1998), as atividades lúdicas praticadas pelas crianças envolvem situações em que a imaginação assume o papel principal e as regras são secundárias. Também envolvem o contrário, em que a situação imaginária existe, mas tem papel secundário. Dessa forma, o autor indica que jogos e brincadeiras possuem uma situação fictícia e regras, que se desenvolvem do exterior (sociedade) para o interior (consciência). A partir desse autor, entendemos que nos jogos, sejam eles de rua, como pique-esconde, queimado, amarelinha, ou de mesa, como xadrez, dominó, ludo, etc., as regras prevalecem sobre a situação imaginária, mas esta existe. Em um jogo de futebol com crianças, elas se imaginam fazendo dribles e marcando gol. A imaginação acontece internamente e até em momentos anteriores. O autor exemplifica com o jogo de xadrez;

Jogar xadrez, por exemplo, cria uma situação imaginária. Por quê? Porque o cavalo, o rei, a rainha etc. só podem se mover de maneiras determinadas. Porque proteger e comer peças são, puramente, conceitos de xadrez. Embora no jogo de xadrez não haja uma substituição direta das relações da vida real, ele é, sem dúvida, um tipo de situação imaginária. O mais simples jogo com regras transforma-se, imediatamente numa situação imaginária (...) (VYGOTSKY, 2008, p. 112).

 

          Quando uma criança está brincando com uma boneca, ela se transporta para um mundo onde imagina uma relação de mãe e filha, um vínculo que transcende e que traz sentido ao faz-de-conta. A situação imaginária prevalece, mas as regras estão ali de uma maneira implícita. Segundo Kishimoto (1996, p. 24) “[...] na brincadeira de faz-de-conta, em que a menina se faz passar pela mãe que cuida da filha. São regras internas, ocultas, que ordenam e conduzem a brincadeira.” Se observarmos as crianças brincando sozinhas ou em grupo, podemos perceber que elas expressam, vocalizam a todo momento os limites da brincadeira, as funções e papéis sociais de cada um, inclusive, modificam as regras no processo.

          De acordo com Piccolo (2009), imaginação e regras assumem perspectivas diferentes nas brincadeiras e jogos, pois o motivo impulsionador das brincadeiras para as crianças está associado com o domínio de uma realidade externa, que é inalcançável em suas atividades cotidianas. Ela não pode ser realmente um médico. Faz isso pela imaginação. Nos jogos, para este autor, o motivo impulsionador está “na apropriação do sistema de regras e significações características de uma dada atividade lúdica (...) nas habilidades de cada criança na realização do jogo” (p. 932). 

         Desse modo, neste trabalho, como o autor, consideramos brincadeiras aquelas atividades lúdicas protagonizadas, em que a imaginação é predominante no faz-de-conta das crianças. Entendemos além disso, que não há uma distinção rígida entre jogos e brincadeiras. Pois, podemos brincar enquanto jogamos e jogar enquanto brincamos. Mas, que podemos distingui-los pelas perspectivas diferentes que imaginação e regras assumem nas atividades lúdicas, classificadas neste texto como jogos e brincadeiras.

         No que diz respeito à relação entre jogos, brincadeiras e educação, o Renascimento é considerado o período considerado de “compulsão lúdica” (KISHIMOTO, 2011), em que essas atividades lúdicas configuram como instrumentos de ensino de conteúdo. 

O jogo serviu para divulgar princípios de moral, ética e conteúdo de história, geografia e outros a partir do Renascimento, o período de compulsão lúdica. O Renascimento vê a brincadeira como conduta livre que favorece o desenvolvimento da inteligência e facilita o estudo. Ao atender às necessidades infantis, o jogo infantil torna-se forma adequada para a aprendizagem dos conteúdos escolares. Assim, se contrapor aos processos verbais de ensino, à palmatória vigente, o pedagogo deveria dar forma lúdica ao conteúdo (KISHIMOTO, 2011, p. 28).

 

     “Dar forma lúdica ao conteúdo” resume a relação que vai se constituindo entre jogos, brincadeiras, ensino e aprendizagem. Pesquisadores e educadores enfatizam a relevância dos jogos e brincadeiras para a educação das crianças. Pois, podem se tornar instrumentos para desenvolver, de um modo geral, a concentração, a interação com os colegas e professores, o espírito de coletividade e, consequentemente, aprende a esperar sua vez e a lidar com as regras e as normas estabelecidas. Dornelles (2001, p.11) evidencia que “[...] é pelo brincar que as crianças se expressam e se comunicam. É através das brincadeiras que elas começam a experimentar e fazer interações com os objetos e as pessoas que estão à sua volta”.

         Fortuna (2000, p.152) afirma “para que cumpra um papel pedagógico (...), a brincadeira deve ter intencionalidade”. Esse caráter intencional também é apontado por Kishimoto (1994, p. 36) ao afirmar que “quando as situações lúdicas são intencionalmente criadas pelo adulto com vista a estimular certos tipos de aprendizagens, surge a dimensão educativa.” Brougère (2001, p.99), embora apresente questionamentos a esse respeito, indica que “a ludicidade como instrumento pedagógico deve objetivar um aprendizado, seja ele no campo cognitivo, socioafetivo ou cultural”. 

        Entretanto, esses autores também fazem o contraponto e apresentam o paradoxo dessa relação entre as atividades lúdicas (brincadeiras e jogos) e a educação de crianças nas instituições escolares. Se retomarmos um dos aspectos que caracterizam tanto o jogo como a brincadeira, ou seja, sua natureza livre e voluntária, alguns questionamentos e dúvidas podem ser colocados. Kishimoto (2011, p. 26) argumenta que “o jogo infantil só pode receber esta designação quanto o objetivo da criança é brincar. O jogo educativo, utilizado em sala de aula, muitas vezes, desvirtua esse conceito ao dar prioridade ao produto, à aprendizagem de noções e habilidades.”

       Muniz (2014, p. 60-61) traz uma questão a esse respeito: “Como ‘controlar’ tais produções [das crianças] de forma a garantir a qualidade das aprendizagens, sem romper com o princípio da liberdade de ação que é elemento fundamental da caracterização da atividade proposta como um jogo?” O autor cita Brougére (1998) ao afirmar que esta é uma questão que ainda está sem uma resposta precisa nos debates e embates sobre as relações entre jogo e educação.

       Com esses questionamentos, reiteramos que esses autores não se colocam contra a relação entre atividades lúdicas e educação, mas problematizam tal relação. O que é relevante para que professores tenham clareza de que, a fim de favorecer a aprendizagem de conteúdos escolares, pode-se descaracterizar a perspectiva da natureza livre e voluntária dos jogos e brincadeiras, da experiência lúdica (MUNIZ, 2010). Esse autor aponta para a necessidade de observarmos a matemática que as crianças vivenciam e expressam ao jogar e brincar, independente da intervenção dos adultos. Zogaib (2019) também aponta para uma “matemática das crianças” que elas evidenciam em suas brincadeiras e interações no espaço escolar e fora dele. Para Steffe e Thompson (2000 apud Zogaib 2019), existe uma matemática dos estudantes, diferente dos adultos e que deveria se tornar fundamento da matemática escolar. Ou seja, nos momentos de brincadeiras e jogos livres das crianças, são importantes o olhar e a escuta atentos do adulto, não necessariamente com intervenção, mas, para compreensão dessa matemática que se manifesta enquanto jogam e brincam. Dallabona e Mendes defendem que

O lúdico permite um desenvolvimento global e uma visão de mundo mais real. Por meio das descobertas e da criatividade, a criança pode se expressar, analisar, criticar e transformar a realidade. Se bem aplicada e compreendida, a educação lúdica poderá contribuir para a melhoria do ensino, quer na qualificação ou formação crítica do educando, quer para redefinir valores e para melhorar o relacionamento das pessoas na sociedade (DALLABONA; MENDES, 2004, p. 107).

 

          Kátia Smole (2003) também aponta que “ao jogar, os alunos têm a oportunidade de resolver problemas, investigar e descobrir a melhor jogada; refletir e analisar as regras, estabelecendo relações entre os elementos do jogo e os conceitos de aprendizagem” (p. 11). Para a autora, as atividades lúdicas podem fazer diferença no trabalho pedagógico e, principalmente, na vida das crianças em sua relação com a matemática. Borin (2007) aponta que os jogos nas aulas de matemática ajudam a

(...) diminuir bloqueios apresentados por muitos de nossos alunos, que temem a matemática e sentem-se incapacitados para aprendê-la. Dentro da situação de jogo, onde é impossível uma atitude passiva. Notamos que, ao mesmo tempo em que estes alunos jogam apresentam um melhor desempenho e atitudes mais positivas frente seus processos de aprendizagem (BORIN, 2007, p. 9).

 

        Encontramos em muitos autores e pesquisadores, inclusive na revisão sistemática bibliográfica que realizamos neste trabalho, resultados positivos relacionados à utilização de jogos e brincadeiras no ensino e aprendizagem matemática. Entretanto, é importante sinalizar que também encontramos os questionamentos, desafios e riscos que citamos anteriormente. Muniz (2010), um educador matemático que se dedica a estudar sobre o brincar e o jogar nessa área, afirma que

A perspectiva da liberdade de ação, que caracteriza a atividade lúdica, cria um espaço de tensão epistemológica e metodológica quando se trata da utilização de jogos no espaço escolar da sala de aula de Matemática, uma vez que há necessidade, por parte do professor, da construção de conceitos e procedimentos matematicamente válidos (MUNIZ, 2010, p. 60, grifos nossos)

 

        Este autor, por meio de seus estudos, indica-nos algumas dimensões importantes para pensar a relação entre jogos, brincadeiras e matemática. Baseia-se em um estudo etnográfico realizado durante 4 anos a respeito das atividades lúdicas de um grupo multicultural de crianças que frequentavam a Ludoteca Municipal d’Issy les Loulineaux, na periferia de Paris, na França. O autor identificou 1776 jogos que envolviam diretamente conhecimentos matemáticos.

         Dessa experiência de pesquisa, Muniz (2010) aponta para a necessidade de observarmos a matemática que as crianças vivenciam e expressam ao jogar e brincar, independente da intervenção dos adultos. Um outro aspecto indicado pelo autor refere-se aos jogos e brincadeiras planejados com fins pedagógicos para o trabalho com matemática.  Muniz (2014) afirma que existem duas dimensões a considerar neste contexto.

a atividade matemática proposta pela estrutura lúdica do jogo sugeridos pelo educador – estrutura física e as regras – e a atividade matemática gerada pelos alfabetizandos a partir das relações estabelecidas com a estrutura do jogo proposto pelo adulto-educador. Tais dimensões apontam para a existência de um diferencial entre aquilo que o adulto educador oferece à criança, e aquilo que efetivamente ela realiza. (MUNIZ, 2014, p. 61).

 

             Para o autor, o mais importante é o que a criança realiza, pois os jogos e brincadeiras elaborados e planejados para o ensino da matemática são reelaborados e ressignificados pela criança. Segundo Muniz (2014) não são propriedade do adulto, “mas da criança, que está efetiva e integralmente em ação cognitiva e emocional (p. 61).

 

 

2 CONSTRUÇÃO MEDOTOLÓGICA DE UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

           A pesquisa realizada caracterizou-se como uma revisão bibliográfica sistemática a partir dos estudos de Castro (2001), Galvão e Pereira (2014), Sampaio e Mancini (2007) e Zogaib 2019. Com esses autores, entendemos a revisão sistemática bibliográfica como um processo de busca e análise de produções científicas sobre um determinado tema e em certo período de tempo, para “[...] selecionar, avaliar, e sintetizar as evidências relevantes disponíveis” (GALVÃO; PEREIRA, 2014, p.183), conduzindo a uma visão panorâmica do que se tem produzido cientificamente a respeito do tema em questão. As etapas de uma revisão sistemática bibliográfica são as seguintes: definição e utilização de descritores de busca; critérios de inclusão e exclusão; identificação dos estudos pré-selecionados; leitura e categorização dos estudos selecionados; descrição, análise e interpretação dos dados; apresentação da revisão/síntese do conhecimento

        Na primeira etapa da revisão, procedemos a uma busca por produções no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Nível Superior - CAPES (http://www.periodicos.capes.gov.br). A escolha dessa base de dados se deu por algumas razões: a) pelo acesso direto à produção científica nacional e internacional, permitindo-nos pesquisar sobre o que a ciência tem produzido mundialmente; b) por possibilitar escolhas baseadas em dados confiáveis; c) pelo acesso institucional que temos como estudantes da Universidade Federal de Sergipe.           

        Durante o processo inicial de busca de estudos a respeito do tema, fomos utilizando uma série de descritores com o intuito de abarcar um conjunto de produções científicas para a análise. Desse modo, os descritores de busca foram: jogos AND, brincadeiras AND, matemática; jogos matemáticos; lúdico na matemática; brincadeiras AND, matemática; jogos didáticos; jogos AND, ensino de matemática. Posterior a estes levantamentos de descritores, foi realizado a busca pelos artigos científicos no período de (2010 a 2020). Portanto, nesta primeira fase obtivemos 1.084 produções referente a busca no portal da CAPES, considerando todos os descritores apontados.

             A segunda etapa consistiu na  exclusão e inclusão das produções relacionadas ao objeto de estudo, qual seja, jogos e brincadeiras matemáticas na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental. Inicialmente, para o refinamento dos estudos, utilizamos os filtros disponíveis no próprio Portal da CAPES: tipo de texto (artigos); periódicos revisados por pares; os tópicos Education, Mathematics, Mathematics Education, Teachers, Teaching, Learning, Ensino de Matemática, Matemática, Pedagogy, Jogos; e o período de 2010 a 2020. Com esse refinamento, chegamos ao total de trezentas e cinquenta e três artigos científicos.

          Nesse conjunto de produções levantadas, notamos que muitos estudos não se relacionavam à temática investigada. Ou seja, trabalhos que não traziam de uma forma mais específica os jogos e as brincadeiras relacionado às crianças e muito menos relacionado à matemática propriamente dita. Sendo assim, optamos por um segundo momento desse processo de exclusão e inclusão, que consistiu na leitura dos títulos e resumos e palavras-chave dos artigos científicos.

      Ao realizar esse procedimento, encontramos temas como: o trabalho com regras e limites na educação física; a matemática nas turmas do proeja; estudo de zoologia em relação aos jogos; educação alimentar nutricional; a presença do lúdico no ensino atômico, conteúdos matemáticos voltados aos ensino fundamental maior, ensino médio e pós- graduação;  a matemática voltado aos alunos com deficiência visuais e surdo cegueira; estudo relacionado as crianças no ensino de geografia e história; abordagem de doenças sexualmente transmissíveis jogos para o ensino de química e biologia; aulas de danças e educação ambiental. Desse modo, procedemos a exclusão desses trabalhos. Após essa seleção, obtivemos uma queda expressiva de estudos equivalentes a dezesseis estudos, sendo que quatro deles não estavam disponíveis para download, restando assim, doze artigos científicos.

          Na terceira etapa, iniciamos a fase de iniciamos a fase de identificação dos estudos pré-selecionados, com a leitura inicial dos artigos para sua organização e categorização.  Ao iniciar a leitura da introdução, percebemos que dois estudos não se relacionavam ao tema, por não se referirem ao trabalho com matemática por meio de jogos e brincadeiras.  Assim, ao passar por esta fase de identificação dos estudos pré-selecionados, restaram nove artigos. Partimos então, para a próxima etapa, que envolveu a leitura e o fichamento desses estudos selecionados, em que foi possível organizar os dados e as informações necessárias para a realização deste trabalho.    

          Na quarta etapa, já conduzindo para a apresentação da síntese, realizamos, a partir das leituras e dos fichamentos, a caracterização dos estudos selecionados. Essa fase envolveu a organização dos dados gerais dos artigos como: autoria, instituições, periódicos, datas de publicação, autores mais citados, procedimentos metodológicos utilizados e resultados principais das pesquisas. Também, por meio dos fichamentos e anotações, organizamos os principais conceitos sobre a temática e os jogos utilizados pelos pesquisadores em seus estudos.

           Em relação à quinta etapa, produzimos o texto referente à discussão e à análise dos dados que estão na quarta seção deste texto. Nessa seção, indicamos a caracterização geral dos nove artigos e também os principais conhecimentos matemáticos utilizados nas pesquisas de campo. A sexta etapa e última desta revisão bibliográfica sistemática consiste na apresentação da síntese dos conhecimentos adquiridos com esta pesquisa. Esta síntese encontra-se neste texto monográfico que apresenta o processo e os resultados desta revisão sobre jogos e brincadeiras matemáticas na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental.

3 JOGOS E BRINCADEIRAS MATEMÁTICAS: CARACTERIZAÇÃO DAS PRODUÇÕES CIENTÍFICAS

         Após os procedimentos de busca no Portal de Periódicos da CAPES e a sequente etapa de exclusão de estudos, conforme os critérios já indicados, restaram 9 artigos científicos que se relacionavam com a temática de pelsquisa. Nesta seção, portanto, apresentamos uma caracterização geral e descritiva do conjunto de artigos selecionados. Desse total de 9 trabalhos, temos 2 estudos bibliográficos e 7 pesquisas de campo. Nas pesquisas de caráter bibliográfico encontramos: um estudo que aborda a relação entre ludicidade e matemática com base no filósofo Huizinga (SILVA, 2018); um trabalho que traz a relação entre o lúdico e a aprendizagem no contexto da educação matemática (BESERRA SOBRINHA; SANTOS, 2016).

           Em relação às pesquisas de campo, podemos organizá-las em dois grupos: 5  delas envolveram jogos e brincadeiras para a investigação e/ou desenvolvimento de conceitos matemáticos com crianças da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental (MEDINA, 2012; MORAES; ARRAIS; MOYA; LAZARETTI, 2017; CAMBRAIA; LOBATO; NASCIMENTO, 2018; STAPRAVO; BIANCHINI; MACEDO; VASCONCELOS, 2017; LACANALLO; MORI, 2019). Os outros 2 artigos relacionaram-se à formação docente, um deles à formação inicial (SILVA, 2019) e o segundo, à formação continuada (CRUZ; SELVA, 2017).

        É importante ressaltar que essas 7 pesquisas de campo foram classificadas por seus autores como de abordagem qualitativa, sendo que 6 delas tiveram como participantes as crianças da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental. Três desses 6 estudos também envolveram os professores como participantes. A sétima pesquisa foi realizada com licenciandos de pedagogia no contexto de um modelo matemático de práticas pedagógicas denominado Mateludicando. De um modo geral, os procedimentos e instrumentos de coleta de dados envolveram entrevistas, questionários, jogos e brincadeiras matemáticas, análise de livros didáticos. Verificamos, então, que nas 7 pesquisas de campo, por adotarem uma abordagem qualitativa, o foco estava em interpretar, compreender e também propor alternativas ao ensino e à aprendizagem de matemática por meio de jogos e brincadeiras, analisando processos, diálogos, notações e resoluções de situações matemáticas.

        No ano de 2012, encontramos o estudo “Didática recreativa matemática: ensino e aprendizagem em uma escola da comunidade, realizado por Medina com 30 crianças do 2º ano do Ensino Fundamental (escola pública). Em 2016, dois artigos: um estudo bibliográfico de Bezerra Sobrinha e Santos intitulado “O lúdico na aprendizagem: promovendo a educação matemática”; uma pesquisa com crianças do 5º e 6º anos do ensino fundamental (escola pública) realizada por Lacanato e Mori com o título “Psiu, estou jogando!!”: o jogo no ensino da Matemática”.

           Já em 2017, temos 3 publicações: de Moraes, Arrais, Moya e Lazaretti, “O ensino de matemática na educação infantil: uma proposta de trabalho com jogos”, com crianças de 4 e 5 anos (escola pública); de Cruz e Selva, Classificação na Educação Infantil: discutindo propostas, concepções e práticas”, com crianças de 3 a 5 anos e duas professoras da rede municipal; de Starepravo, Bianchini, Macedo e Vasconcelos, “Autorregulação e situação problema no jogo: estratégias para ensinar multiplicação”, com 30 crianças do 4º ano do ensino fundamental e a professora (escola pública).

        Em 2018, encontramos duas publicações: um estudo bibliográfico de Silva, “Johan Huizinga e o conceito de lúdico: contribuição da filosofia para a literatura infantil matemática”; um estudo com crianças entre 5 e 6 anos e professores de duas escolas (pública e privada) realizado por Cambraia, Lobato e Nascimento, que tem por título A ludicidade na alfabetização matemática no âmbito da educação infantil”. Por fim, em 2019, temos uma pesquisa de Silva, Literatura com conteúdo(s) matemático(s) na perspectiva do Mateludicando”, com licenciandos em Pedagogia de uma universidade pública brasileira.

         Como observamos, 5 das 7 pesquisas de campo foram realizadas em escolas públicas da rede estadual e municipal de ensino, uma com escolas da rede pública e privada, e a última com licenciandos de universidade pública. Notamos que, mesmo os estudos voltados para a formação de professores tinham como foco a investigação de estratégias e procedimentos para trabalhar a matemática por meio de jogos e brincadeiras. Desse modo, temos 3 pesquisas direcionadas à educação infantil, 3 com ensino fundamental (2º, 3º, 4º, 5º e 6º anos) e 1 voltada para os dois níveis de ensino.

      Partindo para a análise das produções de acordo com a quantidade de publicações no período de 2010 a 2020, observamos, em primeiro lugar, que o total de pesquisas sobre a temática e disponibilizada no Portal de Periódicos da CAPES ainda é escassa. Quando analisamos o estudo de Alencar e Oliveira (2019), que realizaram uma revisão bibliográfica em dissertações e teses no banco de teses da CAPES, verificamos que a situação não é tão diferente. As duas autoras encontraram apenas duas teses e três dissertações em pesquisas brasileiras.

      Os poucos estudos encontrados sobre o tema, considerando os procedimentos utilizados nesta revisão sistemática bibliográfica, levam-nos a ponderar sobre a necessidade de mais pesquisas a esse respeito. E, se relembrarmos o que estudiosos e pesquisadores afirmam sobre a relação entre jogos e brincadeiras e o desenvolvimento e aprendizagem das crianças (MUNIZ, 2010); SMOLE, 2003; KISHIMOTO,1994) podemos reafirmar a relevância de estudos científicos e de práticas educativas sobre jogos e brincadeiras matemáticas, em todos níveis de ensino e na formação de professores, tanto inicial quanto continuada.  

           Embora sejam poucos estudos,verificamos em que períodos temos o maior quantitativo de produções, o que se dá entre 2016 e 2018 com 7 dos 9 artigos pesquisados. Há um artigo publicado em 2012 e outro em 2019. Não há publicações nos anos de 2010 e 2011, nem tampouco entre 2013 e 2015 e 2020. Com esses dados, a partir dos procedimentos de busca utilizados, parece-nos que nos últimos 5 anos houve um interesse maior em pesquisar sobre a temática. Mas, ressaltamos que, essa hipótese pode ser mais investigada com pesquisas em outras bases de dados, o que já indicamos como sugestão.

       Quando verificamos o quantitativo de autores dos 9 artigos selecionados, verificamos um total de 20 autores nas produções científicos, sendo todo eles afiliados a instituições superiores, que totalizam 11 universidades. Nesse contexto, queremos dar destaque a um aspecto considerado relevante na produção científica nacional e internacional – a colaboração científica entre pesquisadores e também entre universidades. Pois, na maior parte das pesquisas, 6 delas, dois ou mais autores estão envolvidos em sua produção. E 3 desses estudos articulam o trabalho de pesquisadores de universidades diferentes. De acordo com Grácio (2018),

a colaboração científica vem se configurando como uma resposta à profissionalização da ciência. Nesse cenário, a colaboração na ciência é uma estratégia adotada por pesquisadores, envolvendo uma atividade social que tem como meta viabilizar, facilitar e potencializar o desenvolvimento de pesquisas, principalmente aquelas de natureza empírica e/ou experimental. Acontece a partir do trabalho intelectual coletivo de pesquisadores, instituições ou países, formado por um sistema ou rede de colaboradores, que ao unir esforços tende a identificar semelhanças e traçar diferenças para produzir novas ideias (GRACIO, 2018, p. 24).

 

            Entendemos como a autora que a colaboração científica potencializa o desenvolvimento do conhecimento e também dos pesquisadores envolvidos, porque envolve habilidades e conhecimentos distintos, acesso a recursos materiais e informacionais, que possibilitam “estudos mais aprofundados, com diferentes perspectivas e opiniões, análises mais precisas e elaboradas, além de agilidade e redução de tempo na construção do trabalho” (GRACIO, 2018, p. 25).

        Em relação as 11 universidades em que atuam os pesquisadores, o Gráfico 2 informa-nos de que forma estão distribuídas essas instituições acadêmicas no território brasileiro. Existem mais produções de universidades da Região Sudeste, especificamente no estado de São Paulo, 4 instituições estão em 5 estudos produzidos. Na Região Sul, no estado do Paraná, temos também 3 instituições em 3 pesquisas. Na Região Nordeste, verificamos 1 pesquisa em 2 universidades no estado da Paraíba e 1 pesquisa em 1 universidade no estado de Pernambuco. Na região Norte, observamos 1 pesquisa, em 1 instituição no estado do Acre. Somente na região Centro-Oeste não possui estudo produzido. Embora sejam poucos artigos direcionados à temática, a maior concentração de estudos ainda se origina em instituições das regiões sudeste e sul. É importante destacar, entretanto, que já existe uma colaboração científica sinalizada entre universidades dessas regiões e outras do país. A título de exemplo, o estudo de Starepravo et al. (2017) que envolve quatro pesquisadores de quatro instituições diferentes de São Paulo e Paraná.

            Ao verificarmos os autores mais citados pelos pesquisadores, selecionamos 5 que mais aparecem nesses 9 estudos. A autora mais citada é Kátia Smole, com 10 indicações, seguida por Vygotsky com 8 referências, Elkonin com 6, Huizinga com 4 e Kishimoto com 2 referências. Katia Smole, autora de muitos livros na área, trabalha com o ensino de matemática e tecnologia, aborda em uma grande parte das suas pesquisas o envolvimento de atividades lúdicas e aspectos que envolvem o raciocínio lógico e habilidades. A pesquisadora, inclusive, é autora de uma série de obras que trazem propostas jogos e brincadeiras para o trabalho com a matemática tanto na educação infantil como no ensino fundamental.

         Os demais autores são também referências em pesquisas envolvendo a criança, os jogos, as brincadeiras e atividades lúdicas. O segundo autor mais citado, o psicólogo bielorrusso Vygotsky, enfatiza em seus escritos que a brincadeira tem papel fundamental no desenvolvimento das crianças. Para ele, tanto o jogo de regras (por exemplo, a amarelinha, o dominó, o xadrez etc.) como o jogo de papéis (por exemplo, brincar de mamãe e filhinha) possibilitam as interações entre as crianças e criam condições para internalização e aprendizagem de conhecimentos. Pois, por meio desses jogos, é possível, mobilizar as capacidades de imaginar situações, representar papéis, seguir regras de conduta de sua cultura etc. Elkonin, de modo semelhante à Vygostky, afirma a atividade lúdica como fundamental no desenvolvimento psíquico da criança. Esse autor destaca o jogo de papéis dentre os outros tipos de jogos, porque, por meio dele a criança reconstitui as atividades sociais que deseja representar.

           Os dois últimos autores, com menor número de citações nos artigos, são Huizinga e Kishimoto. O primeiro, Huizinga, é conhecido pelos seus trabalhos na área da história cultural e aborda em suas pesquisas o jogo como elemento da cultura humana. Já a professora e pesquisadora Kishimoto, trabalha com pesquisas voltada a área da educação envolvendo jogos, brinquedos e brincadeiras como peças fundamentais para o desenvolvimento cognitivo, afetivo, social e físico das crianças, essas últimas entendidas como sujeitos históricos e culturais que têm direito ao brincar, entre outros.

         Em umas das etapas inicias da revisão sistemática bibliográfica, fizemos um levantamento das palavras-chave utilizadas pelos pesquisadores, inclusive para orientar e confirmar as nossas opções por descritores no Portal de Periódicos da CAPES. Reunimos todos os termo, ao reuni-los, logo percebemos os termos que mais se destacam pela frequência com que aparecem como palavras-chave nos artigos: matemática, jogos, brincadeira, educação infantil, ensino, aprendizagem, criança.Notamos que essas palavras-chave das pesquisas se relacionam diretamente com os descritores que utilizamos para a busca de pesquisas e estão no cerne do que nos propusemos a estudar: jogos e brincadeiras matemáticas para ensino e aprendizagem de crianças (na educação infantil). E que também fazem parte do interesse dos pesquisadores que realizaram as pesquisas científicas sobre o tema. Tais termos, inclusive, podem servir para busca e ampliação de pesquisa sobre este tema em outras bases de dados, com vistas à ampliação dos estudos. Em contrapartida, percebemos que outras palavras indicadas com menos frequência podem sugerir pesquisas da relação de jogos e brincadeiras matemáticas com outros temas como a formação de professores, a literatura, a filosofia, entre outros.

          Notamos também  que os temas matemáticos trabalhados nas pesquisas com as brincadeiras e jogos relacionam-se a alguns campos da matemática mais do que a outros. Se tomarmos esses campos como indicados na BNCC (BRASIL, 2018) para os anos iniciais, temos: aritmética, geometria, álgebra, grandezas e medidas, estatística e probabilidade. Se nos referendarmos no que autores como Lorenzato (2011) e Smole (2003) indicam para o trabalho com matemática na educação infantil, temos a exploração de três campos principais: sentido espacial, sentido numérico e sentido de medidas.

          Desse modo, relacionado ao campo da aritmética e sentido numérico temos as brincadeiras e jogos que envolveram números e operações: adição, subtração, multiplicação, contagem, estimativa, sistema de numeração decimal. Dos 7 artigos, 5 deles apresentam um desses temas. Adição e multiplicação aparecem em dois trabalhos e os demais em um dos estudos. Quanto ao campo da geometria, encontramos 2 artigos que trabalharam com figuras geométricas. Os conhecimentos relacionados às grandezas e medidas aparecem nos jogos e brincadeiras de 4 estudos. Probabilidade é tema de uma das pesquisas. Não há nenhum estudo relacionado à álgebra. E um dos trabalhos envolve o tema da classificação, que consiste em um processo mental básico do raciocínio matemático como um todo, não se relacionando apenas a um dos campos (LORENZATO, 2011).

         Como já afirmava Lorenzato (2011), as práticas educativas relacionadas ao ensino e aprendizagem matemática, em geral, enfatizam o campo da aritmética, dos números e operações, em detrimento da geometria, álgebra, probabilidade etc. Pelo que nos parece, com as pesquisas envolvendo jogos e brincadeiras também não foi diferente. A maior parte das atividades está relacionada ao trabalho com números e operações. No que diz respeito à geometria, o mesmo autor argumenta sobre uma dupla restrição. A primeira tem a ver com a ênfase na aritmética. A segunda restrição se deve ao trabalho com a geometria enfatizar quase que totalmente as figuras geométricas, em detrimento do desenvolvimento do sentido espacial das crianças, fundamental para o pensamento geométrico infantil e adulto. Smole (2003) ainda acrescenta que, em geral, até mesmo as práticas educativas relacionadas às figuras geométricas também se restringem à sua nomeação e reconhecimento.

          Foi interessante também notar que o tema das grandezas e medidas aparece em 4 das 7 pesquisas. Percebemos que, nesses estudos, os sujeitos de pesquisa encontravam-se na faixa etária da educação infantil, ou seja, são crianças entre 3 e 6 anos de idade. Uma das razões para tal é que, é nesta fase que há uma ênfase em atividades que envolvam as noções de grande, pequeno, fino, grosso, maior, menor, cheio, vazio. Porém, ressaltamos a necessidade do trabalho com grandezas e medidas em todos os níveis de ensino, envolvendo jogos e brincadeiras, com o propósito de conferir sentido às práticas. O mesmo podemos dizer sobre probabilidade (01 artigo) e álgebra (nenhum artigo), temas que podem ser intencionalmente abordados desde a educação infantil, de modo relacionado aos outros campos da matemática, por meio de jogos e brincadeiras e outras atividades.

 

4 CONCLUSÃO

       Nosso objetivo neste trabalho consistiu em apresentar uma caracterização geral e descritiva dos estudos encontrados sobre jogos e brincadeiras matemáticas na educação infantil e nos anos iniciais publicados em periódicos nacionais no período de 2010 a 2020.

     Nesse sentido, podemos indicar, por meio de uma revisão sistemática bibliográfica, como brincadeiras e jogos matemáticos são abordados nas pesquisas publicadas em artigos científicos de 9 estudos selecionados por meio desse procedimento de no Portal de Periódicos da CAPES. Em primeira instância, destacamos as características gerais desses estudos, apontando a frequência dessas pesquisas por ano, a distribuição por estados no território brasileiro, as abordagens metodológicas e procedimentos de pesquisas mais utilizados, os referenciais teóricos mais citados, dentre outros.

        Dessa análise das características gerais dos estudos, reafirmamos aqui os poucos estudos encontrados, considerando os procedimentos de busca que utilizamos. Essa situação é preocupante, pois, mesmo que a matemática seja trabalhada por meio de jogos e brincadeiras nas salas de aula, ainda são necessárias mais pesquisas referentes à essa temática, tanto para o crescimento das discussões científicas a esse respeito como para ampliar os fundamentos teórico-práticos das atividades lúdicas que envolvam jogos, brincadeiras e matemática nas escolas.

         Com as pesquisas analisadas, conseguimos perceber que existem diversos campos para estudos sobre jogos, brincadeiras e matemática, para além do que foi apresentado neste texto. Como exposto, a nossa pesquisa se limitou a investigar com mais detalhamento os artigos envolvendo a educação infantil e os anos iniciais do ensino fundamental. Todavia, os procedimentos de busca utilizados no portal da CAPES também abrem outras possibilidades de investigações que podem servir de sugestões e recomendações para futuras pesquisas. Trazemos como ideias a possibilidade de pesquisas sobre jogos e brincadeiras nos anos finais do ensino fundamental, no ensino médio e superior, além da abordagem de jogos digitais para o trabalho com matemática. Ademais, sinalizamos para a necessidade de estudos que abordem jogos e brincadeiras matemáticas em outros campos da área como a geometria, a álgebra, as grandezas e medidas, probabilidade e estatística.

         Em síntese, este estudo possibilitou um entendimento da potencialidade dos jogos e das brincadeiras para o ensino e aprendizagem matemática de uma maneira que muitos não compreendem ou não tem oportunidade de compreendê-la. Devido a esse entendimento, podemos afirmar que os jogos e brincadeiras precisam ser tratados com seriedade, com planejamentos e atividades marcadas pela intencionalidade, mas de uma forma divertida, por meio de práticas pedagógicas que escutem, observem o que as crianças gostam, sabem e fazem, e também ampliem suas experiências para que se desenvolvam, tanto na dimensão cognitiva, mas também afetiva, física e social. Acrescentamos também que a matemática deve ser vista nessa caminhada chamada vida, não apenas para resolver um cálculo ou um problema, mas, como possibilidade de transformar vidas e restabelecer conexões perdidas.

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