Metadados do trabalho

Intelectuais Educadores: O Debate Educacional Na Academia Sergipana De Letras (1929-1931)

Amanda Carolina Ferreira de Andrade Garcez; Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do Nascimento; Dirce Rodrigues da Costa Nascimento

Este artigo tem como objetivo compreender o projeto educacional dos 40 intelectuais fundadores da Academia Sergipana de Letras/ASL, no período de 1929, ano de criação da Instituição, a 1931, quando a ASL concluiu a sua organização conforme o modelo francês e seguindo a orientação institucional da Academia Brasileira de Letras. A pergunta elaborada foi se as Academias de Letras refletiram sobre problemas educacionais ou se se preocuparam apenas com as questões literárias. Para isto, foram trabalhados os conceitos de Intelectuais e de Associação Voluntária, analisando a contribuição desses pensadores para o desenvolvimento das ideias da modernização da instrução pública em Sergipe, adotando-se os princípios da Pedagogia Moderna. A hipótese é de que os fundadores levavam às reuniões debates educacionais, o que veio a colaborar na elevação cultural, na valorização literária, linguística e científica, defendendo, também, ideais políticos e filosóficos de igualdade e do direito à educação, ressaltando o ensino público como o único caminho de combate às desigualdades sociais. À guisa de conclusão, evidencia-se que os instituidores da ASL a legitimaram como uma organização civil com potencial intelectual, que, por seu status social criou um espaço capaz de contribuir com um sistema literário, refletindo essa contribuição para a educação sergipana.

Palavras‑chave:  |  DOI:

Como citar este trabalho

GARCEZ, Amanda Carolina Ferreira de Andrade; NASCIMENTO, Ester Fraga Vilas-bôas Carvalho do; NASCIMENTO, Dirce Rodrigues da Costa. INTELECTUAIS EDUCADORES: O DEBATE EDUCACIONAL NA ACADEMIA SERGIPANA DE LETRAS (1929-1931). Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2021 . ISSN: 1982-3657. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/273-intelectuais-educadores-o-debate-educacional-na-academia-sergipana-de-letras-1929-1931. Acesso em: 16 out. 2025.

INTELECTUAIS EDUCADORES: O DEBATE EDUCACIONAL NA ACADEMIA SERGIPANA DE LETRAS (1929-1931)

1 INTRODUÇÃO

 Este estudo tem o objetivo de compreender o projeto educacional dos 40 intelectuais fundadores da Academia Sergipana de Letras/ASL, no período de 1929, ano de criação da Instituição, a 1931, quando a ASL concluiu a sua organização nos moldes da Academia Brasileira de Letras, atendendo ao modelo francês, com o preenchimento das 40 cadeiras simbólicas e vitalícias. Ao lado disso, tem como finalidade saber se as Academias de Letras pensaram sobre problemas educacionais ou se apenas se preocuparam com questões literárias propriamente ditas. No caso do sodalício sergipano, notamos que os fundadores da Academia Sergipana de Letras tinham em sua agenda de debates a questão educacional e não apenas os problemas literários.

A iniciativa dos intelectuais sergipanos para a difusão da cultura, em Sergipe, no final da década de 1920 e do início dos anos de 1930 do século XX, especialmente incentivados com a repercussão da Semana de Arte Moderna de São Paulo e as ações da Academia Brasileira de Letras, na construção de sociedades literárias congêneres e da Associação Brasileira de Educação, sobretudo voltada para os assuntos educacionais republicanos. Além disso, analisa a participação de educadores na formação da Academia Sergipana de Letras, valendo destacar os nomes dos professores do Colégio Atheneu Sergipense:  Joaquim Prado Sampaio Leite, professor de Aritmética, Álgebra, Literatura,   Lógica, Psicologia e Direito Político; Manoel dos Passos Oliveira Teles, professor da Língua Grega; Antônio Garcia Rosa, professor de Geografia e Ciências Naturais; Artur Fortes, professor de História Geral e História do Brasil; Augusto Cesar Leite, professor de Noções de Higiene Geral, História Natural de Medicina Legal e um dos responsáveis pelas fundações das faculdades de Direito, em 1950 e de Medicina de Sergipe, em 1962; José Magalhães Carneiro, professor de Geografia Geral, Corografia e Noções de Cosmografia; Luiz José da Costa Filho, professor de História e de Geografia, e Clodomir de Souza e Silva, professor da Língua Portuguesa e especialista da cultura popular, e dos professores da Escola Normal:José Augusto da Rocha Lima, professor da Língua Portuguesa, um dos introdutores do sistema escolanovista em Sergipe; Helvécio Ferreira de Andrade, um dos defensores, em Sergipe, da Pedagogia Moderna, responsável pela difusão dos princípios de modernização da instrução publica sergipana nas três primeiras décadas republicanas; Antônio Manuel de Carvalho Neto, um dos intelectuais da educação, que se dedicou à cultura jurídica, notabilizando-se como precursor do Direito do Trabalho e do Direito Penitenciário, além de haver registrado a sua participação na fundação da Faculdade de Direito de Sergipe, da qual foi o seu primeiro diretor; Florentino Teles de Menezes, iniciador dos estudos sociológicos em Sergipe e um dos líderes para a formação do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe; Epifânio da Fonseca Dória e Menezes, incentivador da criação do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, instituição secular que muito tem contribuído para o desenvolvimento educacional do Estado de Sergipe.

O trabalho está inserido na História da Educação, cujas produções deste campo de estudos vem, há décadas contribuindo com a História Cultural, tanto no alargamento das fronteiras e com o seu diálogo com outros segmentos, como para a implantação de uma multiplicidade temática, quanto na adoção de novos objetos e a incorporação de fontes diversificadas de pesquisa, produzindo, também, sínteses analíticas e tendenciais.

Para o historiador francês Roger Chartier[1], a História Cultural tem como objetivo “identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler”. Logo, um estudo que analise a ação de indivíduos dedicados à atividade literária, mas, que, também, mantinham na sua pauta de prioridades as preocupações com a política educacional do período em que atuaram na vida sergipana ajudará a compreender o conjunto de influxos intelectuais recebidos pelo debate educacional em Sergipe.

Na construção do artigo em que se demonstra a função da Academia Sergipana de Letras e a dos intelectuais que a formaram, consultou-se atas, Regimento Interno, Estatuto, jornais, revistas, livros, dissertações, destacando a contribuição da instituição para a prática educativa em Sergipe.  

 

[1] CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990, p. 15. 

2 AS ACADEMIAS DE LETRAS, NO BRASIL.

 

            Antes de fundar-se a Academia Brasileira de Letras em 20 de julho de 1897, várias tentativas haviam sido feitas no mesmo sentido. A mais antiga delas, remonta ao Império, quando a ideia surgiu no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e encontrou apoio do próprio Imperador e manifestações de apoio de João Cardoso de Meneses e Sousa, Barão de Paranapiacaba e do Conselheiro João Manuel Pereira da Silva. Nas palestras literárias que, sob a presidência do Imperador se realizavam no Palácio Imperial de São Cristóvão mais de uma vez se tratou do assunto, como anota Raimundo de Menezes[1]. Mas essas tentativas não surtiriam efeitos. Outras reuniões chegaram a se realizar no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, presididas por Francisco Otaviano, porém foram baldados todos os esforços para a construção do Soligeu, ficando a ideia adormecida por mais de quarenta anos. Quando então, Franklin Távora, José de Alencar, Candido Mendes e Benjamin Franklin Ramiz Galvão, o Barão de Ramiz Galvão, reacenderam o desejo de criar a instituição cultural, que, também, não prosperou mesmo com o bafejo do Imperador.

 Proclamada a República, caberia a Medeiros de Albuquerque, então diretor da Instrução Pública do Governo Provisório, levantar, de novo, a ideia da fundação de uma Academia. Nesse sentido teve um entendimento com Aristides Lobo, ministro do Interior, e Lúcio de Mendonça, secretário de Campos Sales, então Ministro da Justiça. Pelo projeto de Medeiros os acadêmicos receberiam um ordenado e usariam um uniforme que se “assemelhava ao dos cardeais romanos, porque tinha uma ampla capa vermelha”, contaria ele mais tarde[2].

Já em 1986, a tendência era para a criação de uma academia com a chancela oficial, para a qual trinta membros fossem nomeados pelo governo e dez outros correspondentes, brasileiros residentes em outros Estados ou no estrangeiro, e eleitos por aqueles. Cuidou-se dos atos oficiais para a sua fundação, que se daria por ocasião das comemorações do 7º aniversário da República, a 15 de novembro de 1896. Entretanto, o decreto redigido por Lúcio de Mendonça e enviado ao Ministro Alberto Torres, que não prosperou por alegação de que o documento era contrário à essência do regime democrático.  

Como se vê, muitos foram os atropelos para a fundação da Academia Brasileira de Letras, cujo projeto como associação civil só se consolidou em 20 de julho de 1897, diante da atuação inicial  dos escritores Machado de Assis, Lúcio de Mendonça, Inglês de Sousa, Olavo Bilac, Afonso Celso, Graça Aranha, Medeiros e Albuquerque, Joaquim Nabuco, Teixeira de Melo, Visconde de Taunay e Ruy Barbosa, que se dedicaram a construí-la e normatizá-la dentro dos padrões propostos e com os princípios do cultivo da língua portuguesa e da literatura brasileira.

 

3. A HORA LITERÁRIA E A ACADEMIA SERGIPANA DE LETRAS

 

As ideais para as criações das academias de letras no Brasil tomaram corpo, efetivamente, com a fundação da Academia Brasileira de Letras, em 20 de julho de 1897, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, sete anos após a Proclamação da República. Essa sociedade literária seguiu o modelo da Academia Francesa, fundada por Richelieu em 1635, sob o reinado de Luís XIII de França, que é considerada como uma das mais antigas e importantes instituições francesas, composta com 40 membros, os assim chamados imortais, dentre os quais se incluem destacados homens públicos e personalidades literárias.

Assim, sob a influência da Academia Brasileira de Letras e com a sua linha programática, seguiram-se as criações das academias estaduais, entre elas a Academia Sergipana de Letras, fundada em 1º de junho de 1929.

Surge, então, no cenário sergipano, a Academia Sergipana de Letras como uma associação voluntária ou sociedade de ideias, seguindo a linha do pensamento de Alexis Tocqueville, citado por Nascimento, que anota:

Para Tocqueville, a associação consistia na adesão pública que um grupo de indivíduos dava a determinadas doutrinas e se comprometiam para fazê-laprevalecer, envidando todos os esforços na direção de um só objetivo. Os homens que caminhavam para o mesmo objetivo não eram obrigados a marcharem pelos mesmos caminhos, sacrificando sua vontade e razão, mas a aplicarem-nas para o êxito de uma empresa comum. O direito de associação era uma importação inglesa que existia na América desde a sua fundação, e neste país tomara uma nova configuração[3].

 

Nesse mesmo sentido, compreendendo a Academia Sergipana de Letras como associação voluntária ou sociedade de ideias (WEBER, 2002), Nascimento (2011, p. 355), aponta que

“as sociedades voluntárias, ou sociedade de ideias, – maçônicas, patrióticas, literárias, religiosas etc – foram formas modernas de sociabilidade que ofereceram novos modelos associativos em meio de uma sociedade globalmente organizada em torno de uma estrutura corporativa hierárquica, formada por sujeitos sociais coletivos”.

 

Dentro desse diapasão estabeleceu-se a novel instituição cultural, sucedendo a Hora Literária General Calazans, uma sociedade lítero-artística, fundada em 10 de abril de 1919, que era composta por escritores de ambos os sexos e de todas as tendências literárias. A Hora Literária funcionava na residência do empresário José da Silva Ribeiro, inicialmente localizada na Rua do Barão, atual Rua João Pessoa e, transferida depois, para a Colina do Santo Antônio, tempo em que passou a denominar-se como Hora Literária do Santo Antônio, movimento cultural, aberto às diversas manifestações da inteligência. Dentre os seus objetivos essa sociedade literária tinha como metas a promoção do estudo, o desenvolvimento intelectual do cidadão e a difusão do pensamento.

Apesar da importância da Hora Literária, as aspirações dos poetas e escritores era fundar uma academia, nos moldes da Academia Brasileira de Letras. Antes de fundar-se a Academia Sergipana de Letras, várias tentativas haviam sido feitas no mesmo sentido, especialmente, pelo poeta Joaquim Prado Sampaio Leite e pelo jornalista Edison Ribeiro, cujas ideias eram defendidas nas páginas do Diário de Aracaju, jornal que dirigia, na época.

Cumpria, a Hora Literária, as suas finalidades, quando o movimento em prol da fundação da Academia consolidou-se, principalmente a partir de 13 de abril de 1929, quando deliberou-se que, para a composição do quadro acadêmico, ficariam mantidos os acadêmicos que pertenciam à Hora Literária[4].

Para o escritor Jackson da Silva Lima, havia duas agremiações em conflito:

 

Existem, é preciso notar, duas sociedades: uma – Hora Literária, outra – A Academia Sergipana de Letras, sociedade esta que tem no seu seio vultos representativos da nossa pujança mental e da qual faço parte como Ocupante da Cadeira patrocinada pelo gigante cantor das ‘Selvas e Céus’, Cadeira que obtive com o meu desvalioso trabalho ‘Vulto que Fica’. ‘Hora e ‘Academia’ existem, assim, unidas e separadas, graças ao coração e ao espírito de Silva Ribeiro, belo tipo de cavalheiro e cidadão que ama e protege as letras e os moços, seus patrícios. Separadas e unidas, sim, elas viverão. Com a reforma que pretendemos fazer, ainda mais separadas viverão as duas sociedades; separadas e unidas, sim, porque sendo ambas protegidas pelo Cel. Silva Ribeiro, que não podemos compreender que uma faça guerra a outra. Isso não. Criada a ‘Academia’ pela ‘Hora’, e já tendo merecido a distinção do honrado Governo do Estado, um projeto convertido em lei, que a fez de utilidade pública, ela, a ‘Academia’, tem agora o dever e é mesmo do seu programa zelar pelo nome de Sergipe. Separada absolutamente da ‘Hora’, aumentado o número de acadêmicos para 40, poderá ela melhormente realizar o seu programa[5].

 

 

O certo é que, em 1931, como noticia a Revista da Academia Sergipana de Letras[6], no seu primeiro número, a instituição estava composta com os seus quarenta patronos e membros fundadores, todos empossados nos seus devidos cargos honoríficos.

Com isso, a representação acadêmica, constituiu-se da seguinte forma: Cadeira nº 1 – Patrono: Tobias Barreto de Menezes; fundador: Antônio Garcia Rosa. Cadeira nº 2 – Patrono: Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero; fundador: José Magalhães Carneiro. Cadeira nº 3 – Patrono: Fausto de Aguiar Cardoso; fundador: Cleômenes Campos de Oliveira. Cadeira nº 4 – Patrono: Francisco Leite de Bittencourt Sampaio; fundador: José Augusto da Rocha Lima. Cadeira nº 5 – Patrono: Ivo do Prado Montes Pires de França; fundador: Dom Antônio dos Santos Cabral. Cadeira nº 6 – Patrono: Gumersindo de Araújo Bessa; fundador: Gilberto de Lima Azevedo Souza Ferreira Amado de Faria. Cadeira nº 7 – Manuel Curvelo de Mendonça; fundador: Ranulfo Prata. Cadeira nº 8 – Felisbelo Firmo de Oliveira Freire; fundador: Manoelito Campos de Oliveira. Cadeira nº 9 – Patrono: Maximino de Araújo Maciel; fundador: Rubens de Figueiredo Martins. Cadeira nº 10 – Patrono: Elziário Prudêncio da Lapa Pinto; fundador: Artur Gentil Fortes. Cadeira nº 11 – Patrono: Francisco Antônio de Carvalho Lima Júnior; fundador: Luiz José da Costa Filho. Cadeira nº 12 – Patrono: Severiano Maurício Cardoso; fundador: Padre Carlos Camélio Costa. Cadeira nº 13 – Patrono: Frei José de Santa Cecília; fundador: Clodomir de Souza e Silva. Cadeira nº 14 – Patrono: Horácio Pereira Hora; fundador: Manuel José dos Santos Melo. Cadeira nº 15 – Patrono: Manoel Armindo Cordeiro Guaraná; fundador: Helvécio Ferreira de Andrade. Cadeira nº 16 – Patrono: Pedro de Calazans; fundador: Hermes Floro Bartolomeu Martins de Araújo Fontes. Cadeira nº 17 – Patrono: Ascendino Ângelo dos Reis; fundador: Manoel dos Passos de Oliveira Teles. Cadeira nº 18 – Patrono: Vigário José Gonçalves Barroso; fundador: Padre Mário de Miranda Vilas Boas. Cadeira nº 19 – Patrono: João Antônio Pereira Barreto; fundador: João Pires Wynne. Cadeira nº 20 – Patrono: José Luiz Coelho e Campos; fundador: Alfeu Rosas Martins. Cadeira nº 21 – Patrono: Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior; fundador: Joaquim Maurício Cardoso. Cadeira nº 22 – Patrono: Martinho Cezar da Silveira Garcez; fundador: João Passos Cabral. Cadeira nº 23 – Patrono: Ciro Franklin de Azevedo; fundador: Joaquim Prado Sampaio Leite. Cadeira nº 24 – Patrono: Pedro Ribeiro Moreira; fundador: Padre Júlio Ferreira de Albuquerque. Cadeira nº 25 – Antônio Dias de Barros; fundador: Antônio Manuel de Carvalho Neto. Cadeira nº 26 – Patrono: Monsenhor Antônio Fernandes da Silveira; fundador: Florentino Telles de Menezes. Cadeira nº 27 – Patrono: Manuel Luiz Azevedo de Araújo; fundador: Benedito da Silva Cardoso. Cadeira nº 28 – Patrono: Conselheiro Salustiano Orlando de Araújo fundador: Gervásio de Carvalho Prata. Cadeiranº 29 – Patrono: Jackson de Figueiredo Martins; fundador: Abelardo Maurício Cardoso Cadeira. nº 30 – Patrono: José Jorge de Siqueira Filho; fundador: Enoch Matuzalém Santiago. Cadeira nº 31 – Patrono: José Maria Gomes de Souza; fundador: João Esteves da Silveira. Cadeira nº 32, Pedro Antônio de Oliveira Ribeiro; fundador: Edison de Oliveira Ribeiro. Cadeira nº 33 – Patrono: Manuel Joaquim de Oliveira Campos; fundador: Humberto Dantas. Cadeira nº 34 – Patrono: Conselheiro Manuel Ladislau Aranha Dantas; fundador: Olegário Ananias Silva. Cadeira nº 35 – Patrono: José Lourenço de Magalhães; fundador: Augusto Prado Leite. Cadeira nº 36 – Patrono: Brício Maurício de Azevedo Cardoso; fundador: Hunald Santaflor Cardoso. Cadeira nº 37 – Patrono: José Joaquim de Oliveira; fundador: Pedro Sotero Machado. Cadeira nº 38 – Patrono: Guilherme Pereira Rebelo; fundador: Marcos Ferreira de Jesus. Cadeira nº 39 – Patrono: Joaquim Martins Fontes da Silva; fundador: Zózimo Lima. Cadeira nº 40 – Patrono: Baltazar de Araújo Góis; fundador Epifânio da Fonseca Dória e Menezes.

Como se vê, participaram do movimento acadêmico na sua formação inicial  beletristas e agentes culturais de todos os segmentos sociais e políticos de Sergipe que levaram às sessões da instituição debates educacionais tendo em vista os novos rumos da Pedagogia Moderna.

 

4. INTELECTUAIS EDUCADORES: O DEBATE EDUCACIONAL NA ACADEMIA SERGIPANA DE LETRAS.

 

Criada a Academia Sergipana de Letras, os acadêmicos procuraram debater assuntos culturais e, também, os educacionais, estes manifestados por Antônio Manuel de Carvalho Neto, que fora diretor Geral de Instrução, de 1918 a 1921, quando promoveu reformas pedagógicas;  Helvécio Ferreira de Andrade, intelectual, médico e educador, que teve destacada participação nos debates acerca da modernização da escola em Sergipe, principalmente quando atuou como Diretor Geral da Instrução Pública nos anos de 1914 a 1918, de 1926 a 1927 e de 1930 a 1935 e José Augusto da Rocha Lima, que se especializou no campo da Pedagogia Moderna. Além disso, a contribuição dos seus acadêmicos foi notada de forma relevante, pelo que se pode afirmar que a Academia, desde a sua fase inicial, viveu da produção dos seus acadêmicos e da construção de artigos e ensaios publicados nas Revistas do Soligeu, já que, no passado, era muito difícil para os escritores publicarem os seus trabalhos de cunho literário, ou científicos.

Vale frisar que as discussões acadêmicas em torno da Escola Nova no Brasil estavam sempre em debates, com propostas a serem desenvolvidas em face das transformações sociais, políticas e econômicas vividas a partir dos meados de 1920, principalmente, com a renovação educacional frente às várias críticas sobre a educação tradicional que se tinha no momento.

Com isso, verificava-se que a Escola Nova tinha a finalidade de modificar os programas educacionais para projetar a criança como sujeito ativo nos princípios de uma educação voltada para a vida social, como avaliava Helvécio de Andrade[7], pois ele acreditava “[...]que uma educação que primava por uma formação completa da criança, devia observar durante as práticas educativas, a disciplina, pois sua preocupação residia na necessidade de delegar à criança a consciência do dever cumprido”.

Na perspectiva teórica de Sirinelli, a concepção de intelectual é entendida por meio de duas definições: “uma ampla e sociocultural, englobando os criadores e mediadores culturais, e a outra mais estreita, baseada na noção de engajamento [...] na vida da cidade como ator”, validando, portando a compreensão de intelectuais da educação esses fundadores da Academia Sergipana de Letras.

Para Ferreira e Amorim, de igual modo, como intelectual entende-se: 

 

[...], na primeira acepção podem ser incluídos os escritores, jornalistas e professores, bem como os criadores e mediadores em potencial, como por exemplo, os estudantes. Enquanto na segunda acepção estaria localizado um grupo mais restrito, composto por indivíduos que exercem uma atividade de maior influência no cenário público, ao defender uma concepção ideológica ou uma causa de impacto social. Essa função é exercida mediante a utilização de certa especialidade de saberes, que permite uma ação mais incisiva na esfera social, bem como o reconhecimento da sociedade em que está inserido, como atuante na vida da cidade como um ator social[8].

 

Pensar os membros fundadores da Academia Sergipana de Letras como sujeitos que desenvolveram práticas educativas no período que atuaram na vida sergipana, exige que se compreenda quais seriam essas práticas, o que, notadamente, incluiriam as suas experiencias em salas de aulas e as inovações que os debates educacionais deste grupo de intelectuais traziam para a escola.

Com efeito, para Chartier[9], “as práticas visam fazer reconhecer uma identidade social”; ele ainda acrescenta, “são práticas culturais a feitura de um livro, uma técnica artística ou uma modalidade de ensino”, mas também os modos como, em uma dada sociedade, o filósofo francês remata: “os homens falam e se calam, comem e bebem, sentam-se e andam, conversam ou discutem, solidarizam-se ou hostilizam-se, morrem ou adoecem, tratam seus loucos ou recebem os estrangeiros”.

Nesse mesmo sentido destacam-se práticas escolares direcionadas ao projeto civilizador das crianças, um dos princípios básicos da modernização educacional, que vinha se firmando no cenário das políticas públicas educacionais em Sergipe. A higienização, por exemplo, foi um dos princípios da Pedagogia Moderna, a que se dedicou o intelectual Helvécio Ferreira de Andrade, fundador da Cadeira nº 15 da Academia Sergipana de Letras, através da sua atuação como Diretor da Instrução Pública, médico e professor e nas suas publicações: Instrução Pública, de 1926 e Curso de Pedagogia, de 1913. Para ele “nem o estado, nem ninguém tem o direito de encerrar as creanças em locaes subtrahidos à luz do sol escassos de are privados dagua e limpeza, por mais que estas masmorras de se condecorem com o nome de escola”.[10]

Em homenagem a Helvécio de Andrade, o seu sucessor na Academia, o médico e professor João Batista Perez Garcia Moreno, ressalta que: 

 

Na estrutura de todos os seus trabalhos sobre educação existem as linhas imutáveis de um estilo inspirado nas belezas das tradições brasileiras. Na conduta do educador nacionalista que, por excelência, ele foi, há gestos e atitudes dignos de perpetuidade no curso das gerações. Em nosso meio, foi um vigoroso “empreiteiro das demolições”, negando a rotina cômoda e esterilizante. Vivificou com o tônico de novos métodos de ensino em Sergipe. Removeu escombros ameaçadores de velhas ruínas. Salvou a criança sergipana da ignorância de uma escola dura e rígida. Foi, não há como negar, um renovador.[11]

 

  Valença[12], em sua Dissertação no Curso de Mestrado em Educação na Universidade Federal de Sergipe, avalia que:

 

Helvécio de Andrade fez parte do que poderíamos designar de intelectuais da educação. Essa designação recobre um conjunto de personagens que engendraram as novas concepções trazidos pela Pedagogia Moderna. Inspirado por essas idéias, esse sergipano, procurava difundir na instrução sergipana, através de suas publicações, as novas diretrizes que a educação vinha firmando.

 

 

A tudo isso, acrescente-se que Helvécio de Andrade defendeu a implantação do método intuitivo na educação, pelo que enfrentou inúmeras dificuldades, mas é inegável a sua contribuição à cultura escolar sergipana, com a adoção de métodos de ensino, práticas pedagógicas e higienistas, baseados nos princípios do movimento escolanovista esboçado na década de 1920, no Brasil.

 Outros educadores da instituição acadêmica, também debateram sobre a educação no momento da sua construção, podendo-se mencionar entre eles, o professor José Augusto da Rocha Lima, uma das personalidades do ensino secundário de Sergipe. Ele foi comissionado pelo Interventor Federal Augusto Maynard Gomes, através do Decreto de 27 de março de 1931, para estudar, em São Paulo, os processos de ensino da Pedagogia Moderna, desenvolvidos pelo Dr. Lourenço Filho, na Instrução Pública daquele estado.  A indicação de seu nome para essa importante missão repercutiu no seio da sociedade aracajuana, como noticiou o Sergipe Jornal, Diário Oficial e a Revista Renovação, como anota Sobral[13].

Como resultados da suas experiencias na Diretoria de Instrução Pública de São Paulo, José da Rocha Lima propôs a separação dos cargos da Escola Normal e da Instrução Pública, já que essas funções eram assumidas de forma cumulativa, em Sergipe, o que ele considerava incompatíveis com as relações administrativas, pois funcionavam num mesmo prédio a administração da Diretoria da Instrução Pública, a Escola de Comércio Conselheiro Orlando e o Grupo Escolar General Valadão. Além disso, ele sugeriu a criação de uma Biblioteca Pedagógica, anexa à Diretoria e de uma Revista Pedagógica, como a Revista de Educação que circulava em São Paulo[14].

No seu relatório, ele propôs a criação do Conselho de Educação ou o restabelecimento do Conselho Superior de Ensino, com a finalidade de haver maior interesse nos estudos pedagógicos.

Entretanto, essas indicações só se consolidaram com o tempo.

O médico Augusto César Leite, fundador da Cadeira nº 35 da Academia Sergipana de Letras, além das suas atividades no campo da Medicina, atuou na direção da antiga Escola de Aprendizes e Artífices, no período de 1910 a 1916, quando entrou para a congregação do Ateneu Sergipense como professor de Higiene e de História Natural; ele também ministrou aulas História Natural no Seminário Diocesano Sagrado Coração de Jesus.  Criou a Escola de Enfermagem para apoiar os Hospitais Cirurgia e Santa Isabel, o que muito contribuiu para a assistência social de pessoas menos favorecidas.

A participação do médico e professor Augusto César Leite foi muito representativa em segmentos acadêmicos e socioculturais de Sergipe, participando, inclusive com as fundações das Faculdades de Direito, de Medicina e da Universidade Federal de Sergipe. 

Luiz José da Costa Filho, professor de História e de Geografia e um dos fundadores da Liga Sergipense Contra o Analfabetismo, inaugurada em 29 de setembro de 1916, destinada à alfabetização de adultos e funcionando na Loja Maçônica Cotinguiba, na Rua Santo Amaro, 171, em Aracaju.  

O professor da Língua Portuguesa da Escola Normal Clodomir de Souza e Silva, era um dos especialistas da cultura popular, destacando-se, nacionalmente, como folclorista e muito incentivava os seus alunos à interação social, através da poesia e das narrativas lendárias de Sergipe, processo pedagógico utilizado por ele para educar os seus discípulos. 

Como se vê, esses acadêmicos estavam diretamente ligados ao processo educacional ora como professores, ora como gestores públicos conduzindo as reformas do ensino ocasionadas com o processo de reforma e de modernização do ensino do ensino.

 

[1] Menezes, Raimundo de. Dicionário literário brasileiro. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1978, p. 718.

[2] MENEZES, p. 718.

[3] NASCIMENTO, Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do. Educar, curar, salvar: Uma ilha de civilização no Brasil tropical. Maceió: EDUFAL, 2007.

[4] NASCIMENTO, José Anderson. A Academia Sergipana de Letras. In: O Sodalício. Aracaju: J. Andrade. 1999, p. 9.

[5] LIMA, Jackson da Silva. Prefácio. In: Perfis acadêmicos. Aracaju: Editora do Diário Oficial do Estado de Sergipe – Edise, 2017.

[7] ANDRADE, Helvécio. Instrução Pública: necessidade de uma regulamentação definitiva dos ensinos primário e normal. Relatório apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Cyro de Azevedo, Presidente do Estado, em novembro de 1926. Aracaju: Typografia do Sergipe Jornal, 1926. In: VALENÇA, Cristina de Almeida. Civilizar, regenerar e higienizar : a difusão das ideais de pedagogia moderna por Helvécio de Andrade. São Cristóvão, 2006, p. 24. (Dissertação de Mestrado em Educação)

[8] FERREIRA e AMORIM. FERREIRA, M. S. e AMORIM, R. P. de. Intelectuais, História e Educação: os professores na História Intelectual. Poiesis Pedagogica, Catalão-GO, v. 14, n. 1, p. 77-93, jan-jun 2016, p. 6.

[9] CHARTIER, p. 21.

[10] ANDRADE, Helvécio de. A Creança. Correio de Aracaju, Aracaju, 16 agosto de 1912, no VI, n. 734. P.2. col. 3.

[11] GARCIA MORENO, João Batista Perez Garcia. Discurso. Revista da Academia Sergipana de Letras, Aracaju, n. 10, 1943, p. 34.

[12] VALENÇA, Cristina de Almeida. Civilizar, regenerar e higienizar: a difusão dos ideais da Pedagogia Moderna por Helvécio de Andrade. Dissertação (Mestrado em Educação) – Núcleo de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, p. 179. 2006.

[13] SOBRAL, Maria Neide. José Augusto da Rocha Lima: uma biografia (1897-1969). São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010, p. 181-182.

[14] SOBRAL, p. 193-194.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Seria a Academia, por seu status social e prestigio um espaço de legitimação de intelectuais no Estado de Sergipe, ou seriam os intelectuais que validam a Academia Sergipana de Letras como uma instituição com potencial intelectual? Concluímos em resposta a este problema que, sem o trabalho deles, a Academia seria uma instituição vazia e sem a menor importância, afinal, a história é feita por pessoas.

Os intelectuais educadores que têm seus nomes nas cadeiras dos fundadores da Academia Sergipana de Letras não só a construíram socialmente como institucionalmente, ou seja, eles literalmente fizeram a ASL, iniciando, na época, com muita força, esse conhecido status social de prestígio dos imortais. Afinal, foi através de suas ideias, movimentos, estudos, revoluções, inquietudes empíricas, que levaram à Academia debates educacionais de extrema importância para a evolução da nossa sociedade, com o conceito de civilização trazido pela Escola Nova.

Debate estes que, atravessando as paredes de suas salas itinerantes de reunião, faziam história no nosso Estado, não só com a implementação das ideias escalonovistas nas escolas, mas também com o vasto conteúdo literário, que enriquecia o campo cultural com artigos em jornais, livros, ensaios e discursos, mostrando o trabalho desses educadores em busca da melhoria dos projetos educacionais no Estado de Sergipe.

Concluímos então que, de nada vale uma instituição vazia em ideias, ideais e ações, não adianta ser acadêmico se a sua participação não agrega e faz história. Os acadêmicos não só fazem a academia como são a Academia viva, em movimento e inquietude, pois foi assim que ela nasceu e se transformou em uma instituição perene, em permanente crescimento e com influencia social.

REFERÊNCIAS

 

 

ANDRADE, Helvécio de. A Creança. Correio de Aracaju, Aracaju, 16 agosto de 1912, no VI, n. 734. col. 3.

 

ANDRADE, Helvécio. Instrução Pública: necessidade de uma regulamentação definitiva dos ensinos primário e normal. Relatório apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Cyro de Azevedo, Presidente do Estado, em novembro de 1926. Aracaju: Typografia do Sergipe Jornal, 1926. In: VALENÇA, Cristina de Almeida. Civilizar, regenerar e higienizar : a difusão das ideais de pedagogia moderna por Helvécio de Andrade. São Cristóvão, 2006, p. 24. (Dissertação de Mestrado em Educação)

CARVALHO NETO, Antônio Manuel de. Quadro social da Academia Sergipana de Letras.  Revista da Academia Sergipana de Letras. Aracaju, n. 1, 1931.  

CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.

FERREIRA e AMORIM. FERREIRA, M. S. e AMORIM, R. P. de. Intelectuais, História e Educação: os professores na História Intelectual. Poiesis Pedagogica, Catalão-GO, v. 14, n. 1, p. 77-93, jan-jun 2016.

GARCIA MORENO, João Batista Perez Garcia. Discurso. Revista da Academia Sergipana de Letras, Aracaju, n. 10, 1943.

 

MENEZES, Raimundo de. Dicionário literário brasileiro. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1978.

 

NASCIMENTO, Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do. A teoria sobre associações voluntárias como matriz interpretativa das instituições escolares protestantes. In: Libânia Xavier; Elomar Tambara e Antoni Carlos Ferreira Pinheiro. (Org.). História da Educação no Brasil: matrizes interpretativas, abordagens e fontes predominantes na primeira década do século XXI. Espírito Santo: EDUFES, 2011, v. 5, p. 355-377.

NASCIMENTO, José Anderson e NASCIMENTO, José Amado. A Academia Sergipana de Letras. In: O Sodalício. Aracaju: J. Andrade. 1999.

NASCIMENTO, José Anderson. Perfis acadêmicos. Aracaju: EDISE, 2017.

SIRINELLI, Jean-François. Os Intelectuais. In: REMOND, René. Por uma História Política. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 2003.

SOBRAL, Maria Neide. José Augusto da Rocha Lima: uma biografia (1897-1969). São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010

VALENÇA, Cristina de Almeida. Civilizar, regenerar e higienizar: a difusão dos ideais da Pedagogia Moderna por Helvécio de Andrade. Dissertação (Mestrado em Educação) – Núcleo de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2006.

WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. 5ª ed. Rio de Janeiro: LTC, 2002.

Encontrou algo a ajustar?

Ajude-nos a melhorar este registro. Você pode enviar uma correção de metadados, errata ou versão atualizada.