Metadados do trabalho

Formação De Professores: De Educador Para Educador - Uma Experiência Com Docentes Da Mata Sul De Pernambuco

Marineide Cavalcanti Arruda; Karl Heinz Efken; Cristiane Maria Pereira Conde

Este trabalho relata experiências obtidas no curso de extensão “Formação de Professores”, realizado em 2018 e 2019 no IFPE - Campus Barreiros, para docentes de Língua Portuguesa do ensino fundamental da Secretaria Municipal do Rio Formoso – PE, partindo do pressuposto de que a formação continuada contribui para a evolução do fazer pedagógico e, consequentemente, reflete no aprendizado dos discentes. “A formação contínua de professores deve alimentar-se de perspectivas inovadoras que não utilizem preferencialmente “formações formais”, mas que procurem investir do ponto de vista educativo as situações escolares” (Nóvoa, 2002). Tivemos como aporte teórico:  Nóvoa, Tardif, Freire, Libâneo e Charlot. O objetivo do curso foi atender às necessidades dos docentes na elaboração de enunciados para questões de interpretação textual, visando a um melhor desempenho nas aulas de Língua Portuguesa, bem como um aprendizado eficaz para proporcionar aos discentes resultados positivos nas avaliações internas e externas. Os docentes revelaram que o curso modificou significativamente suas práticas, principalmente, na elaboração de questões de interpretação textual, nas leituras dirigidas com os discentes. A troca de experiências foi enriquecedora, contribuiu para refletir acerca do planejamento cotidiano, outro fator positivo foi o resultado do desempenho dos discentes nas avaliações externas.

Palavras‑chave:  |  DOI: 10.18676/cadernos

Como citar este trabalho

ARRUDA, Marineide Cavalcanti; EFKEN, Karl Heinz; CONDE, Cristiane Maria Pereira. FORMAÇÃO DE PROFESSORES: DE EDUCADOR PARA EDUCADOR - UMA EXPERIÊNCIA COM DOCENTES DA MATA SUL DE PERNAMBUCO. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2021 . ISSN: 1982-3657. DOI: https://doi.org/10.18676/cadernos. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/245-forma%C3%A7%C3%A3o-de-professores-de-educador-para-educador-uma-experi%C3%AAncia-com-docentes-da-mata-sul-de-pernambuco. Acesso em: 16 out. 2025.

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: DE EDUCADOR PARA EDUCADOR - UMA EXPERIÊNCIA COM DOCENTES DA MATA SUL DE PERNAMBUCO

1 Introdução

 

            A legislação das políticas Educacionais brasileiras por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, (BRASIL LDBEN – Lei nº 9.394, de 20/12/1996), como também decretos e resoluções pertinentes, dispõe sobre a relevância da formação continuada para o desenvolvimento do professor da educação básica para ações de estudo, capacitações, análises e planejamento da prática pedagógica, com o objetivo de enriquecê-la e garantir o sucesso dos alunos no processo ensino/aprendizagem.

            O exercício da docência exige inovação, reflexão, revisão e construção de saberes cotidianamente. A formação inicial, apenas, não atende às diferentes necessidades de aprendizagem que emergem conforme às demandas das políticas educacionais.

            Para o professor Charlot (2000, p. 43), “não se pode pensar o saber (ou o “aprender”) sem pensar ao mesmo tempo no tipo de relação que se supõe para construir esse saber ou para alcançá-lo”. Assim, a formação continuada docente deve priorizar as necessidades de aprendizagem, os desafios encontrados no fazer pedagógico, bem como impulsionar o docente a desenvolver as suas habilidades por meio de práticas criativas que tenham relação com o seu saber e com a sua identidade profissional.

          Nesse sentido, Nóvoa (2018) defende que ninguém constrói novas práticas pedagógicas sem se apoiar numa reflexão com os colegas. Precisamos da experiência, da troca de ideias, do saber de outros para a completude profissional, para sanar os dilemas do cotidiano, valorizando assim o trabalho em equipe. Essas reflexões são o ponto de partida para a exposição dos elementos que materializam o trabalho aqui apresentado.

         O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE) Campus Barreiros desempenha seu papel social nas três dimensões: ensino, pesquisa e extensão, componentes indissociáveis para o desenvolvimento educacional. A extensão é considerada ¨o chão do Campus”, pois é por meio dela que eclode a relação dialógica e se promove troca de saberes. Nos anos 2018 e 2019, nós, docentes de Língua Portuguesa, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação da cidade de Rio Formoso-PE, desenvolvemos um curso de extensão com ênfase na formação continuada de professores do Ensino Fundamental II, tendo como foco o trabalho pedagógico a partir dos descritores da área de linguagens apresentados na prova Brasil (SAEB).

            O curso foi desenhado com o objetivo precípuo de atender às necessidades dos docentes no concernente à elaboração de enunciados para questões de interpretação textual a partir de diferentes gêneros textuais e temas transversais, visando a um melhor desempenho nas aulas de Língua Portuguesa desses educadores, melhorar a qualidade do ensino no município de Rio Formoso, usando como instrumento as formações continuadas. Ademais, desenvolver atividades interativas com o propósito de possibilitar um aprendizado eficaz para proporcionar aos discentes resultados positivos nas avaliações internas e, principalmente, nas avaliações externas, bem como progredir nos índices educacionais, aproximando cada vez mais das metas propostas pelo governo, com a intenção de atingi-las em curto espaço de tempo.

       Como objetivos específicos propomos: Estruturar e implementar novas estratégias de ensino, a partir de pesquisas realizadas com os docentes durante os encontros; refletir sobre as estratégias avaliativas utilizadas e ressignificar as práticas de ensino; elaborar material pedagógico em consonância com as estratégias de ensino desenvolvidas a fim de atender os critérios de avaliação propostos pela política de avaliação externa.

        Essa nova política avaliativa exige dos professores produção de material didático específico para atender os critérios desse novo modelo de avaliação, para alguns docentes, isso é um desafio, pois a sua formação acadêmica não proporcionou subsídios suficientes para essa nova modalidade de avaliação. Isso evidencia a importância da formação continuada para os docentes como suporte no desenvolvimento de atividades que instrumentalizem as suas práticas de ensino.

         Nesse contexto, Tardif (2002, p. 41) ressalta: "Os saberes científicos e pedagógicos integrados à formação dos professores precedem e dominam a prática da profissão, mas não provêm dela". Assim, a formação docente como canal de aprendizagem proporciona meios que auxiliam a prática docente nas especificidades do seu trabalho. Conforme Nóvoa (2001), “A formação contínua de professores deve alimentar-se de perspectivas inovadoras que não utilizem preferencialmente “formações formais”, mas que procurem investir do ponto de vista educativo as situações escolares”. 

       O dinamismo, a troca de experiência, a socialização de práticas pedagógicas são estratégias essencialmente profícuas na mobilização de saberes, na construção de novas aprendizagens para a solução de problemas do cotidiano escolar e para o fazer pedagógico diante das inúmeras demandas que emergem em diversas situações no espaço escolar. Nessa perspectiva, Paulo Freire (2003) reflete:

Para mim é impossível compreender o ensino sem o aprendizado e ambos sem o conhecimento. No processo de ensinar há o ato de saber por parte do professor. O professor tem que conhecer o conteúdo daquilo que ensina. Então para que ele ou ela possa ensinar, ele ou ela tem primeiro que saber e, simultaneamente com o processo de ensinar, continuar a saber por que o aluno, ao ser convidado a aprender aquilo que o professor ensina, realmente aprende quando é capaz de saber o conteúdo daquilo que lhe foi ensinado. (FREIRE, 2003, p. 79)

 

            Diante disso, o presente trabalho relata a experiência do projeto de extensão Formação de Professores: de educador para educador - uma experiência com docentes da Mata Sul de Pernambuco - está dividido da seguinte forma: na próxima seção, trataremos da importância da formação docente continuada, em seguida, relataremos a gênese do nosso projeto e discorremos detalhadamente a metodologia desenvolvida. E, por fim, apresentaremos as considerações finais.

2 Formação continuada docente – construindo saberes, inovando práticas

       Diversas redes de ensino vêm promovendo a formação continuada como recurso pedagógico para atualização, familiarização e reflexão dos saberes docentes e para a construção de novas práticas inovadoras e facilitadoras para o desempenho das suas atividades cotidianas. Partimos do pressuposto de que a formação contínua dinamiza o processo ensino/aprendizagem e potencializa a qualidade da educação, a formação continuada, geralmente, emerge de alguma necessidade de sala de aula e para ela deve retornar com novos práticas transformadoras. Conforme Paulo Freire (2001):

A melhora da qualidade da educação implica a formação permanente dos educadores. E a formação permanente se funda na prática de analisar a prática. É pensando sua prática, naturalmente com a presença de pessoal altamente qualificado, que é possível perceber embutida na prática uma teoria não percebida ainda, pouco percebida ou já percebida, mas pouco assumida. (FREIRE, 2001a, p.72)

           

            Assim, entendemos que a formação continuada estimula o docente a revisar e dar nova roupagem a um conhecimento epistemológico adquirido inicialmente na sua graduação, mas que por algum motivo ainda tem dúvidas ou não tem o domínio necessário para o desenvolvimento de práticas inovadoras que atendam às novas exigências do sistema educacional. Nesse contexto, GALINDO e INFORSATO (2008) definem formação continuada como realização de ação formativa posterior à outra ação formativa primária denominada de formação inicial, portanto uma continuidade a algo que se teve início, ao menos ao nível dos fundamentos e das bases teóricas e metodológicas gerais para a área ou nível de ensino que se pretende atuar/formar.

          Nóvoa (1999) defende uma formação continuada, não mais como reciclagem, mas uma qualificação para as novas funções da escola e do professor. Corroboramos com o pensamento do autor, pois desenhar um curso de formação continuada é refletir quais são as necessidades básicas, concretas dos docentes, sobre quais são as dificuldades encontradas na sua prática pedagógica, o que está impedindo a desenvolver as suas atividades, quais os entraves, para que coletivamente se construa subsídios que os auxiliem em suas respectivas funções.

       O saber acadêmico é a base para a formação inicial na área em que o docente pretende atuar, no entanto, na prática, no chão da escola, nos deparamos com situações que vão além desse conhecimento sistêmico. Isso resulta em dilemas por não conseguirmos resolver tais questões balizadas apenas no que foi ensinado na formação inicial, necessitando assim de buscar novas estratégias para desenvolver o trabalho docente em sala de aula.  [...] “ensinar é agir com outros seres humanos” (TARDIF, 2011, p. 13). Conforme Tardif é preciso a interação com outros atores sociais, que partilhem de novas ideias para que os objetivos sejam alcançados.

       Para Sacristám (1995), a educação se constitui como um campo sobre o qual diversos atores sociais refletem e opinam. A formação continuada tem esse papel na educação, consideramos como um instrumento de mobilização, de reflexão e de construção mútua, na qual não há quem saiba mais ou que saiba menos, o que há é uma cooperação para atenuar as dificuldades individuais e/ou coletivas, pensando-se em um só objetivo, melhorar a qualidade do ensino.

       Conforme Charlot (2000, p. 27), “toda relação com o saber é também uma relação com o outro. [...] é o outro como fantasma do outro que cada um traz em si”. Dessa forma, o saber na formação continuada é construído conjuntamente. Na concepção de Shulman & Shulman (2016), a formação contínua também é importante para que os professores se sintam dispostos e motivados, sejam capazes de entender o que deve ser ensinado, e como ensinar, compreendam, entre outros campos, o currículo, a organização e a gestão de sala de aula, a avaliação da aprendizagem e os princípios pedagógicos que embasam suas práticas.

       Diante dessas reflexões, percebemos que a docência necessita de formação ao longo de todo o ano letivo, não se pode articular a formação docente de forma fragmentada, é necessário promover uma formação concomitante com o fazer pedagógico, articulada com as necessidades docente/discente, assim a formação fará sentido para o docente o estimulará a participar dos encontros formadores.  

       As orientações gerais da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica estão descritos seus objetivos, diretrizes e funcionamento, preconizam que

A formação do educador deve ser permanente e não apenas pontual; formação continuada não é correção de um curso por ventura precário, mas necessária reflexão permanente do professor; a formação deve articular a prática docente com a formação inicial e a produção acadêmica desenvolvidas na Universidade; a formação deve ser realizada também no cotidiano da escola em horários específicos para isso, e contar pontos na carreira dos professores. (BRASIL, 2005, p. 5)

 

            Pode ser utopia, mas se assim fosse executado o que reza as orientações para a formação continuada, acreditamos que teríamos mais professores preparados, menos frustrados e inconformados com o fazer pedagógico e, consequentemente, discentes com uma aprendizagem mais eficaz. Logo, é necessário compreender que a formação continuada requer do docente, reflexão, mudança, troca de saberes, construção de novas práticas pedagógicas a partir do seu saber e do saber dos outros. Nessa perspectiva, Bondía (2002) entende que é preciso

 

Pensá-la como um tipo particular de relação, como uma relação de produção de sentido (...) a formação implica, necessariamente, nossa capacidade de escutar (ou de ler) isso que as coisas (textos, filmes, notícias, pessoas, objetos, animais, cotidiano, etc) têm a nos dizer. Uma pessoa que não é capaz de se pôr à escuta cancelou seu potencial de formação e de trans-formação (BONDÍA, 2002, p.133)

 

       A formação continuada é extremamente necessária para que o agente escolar por meio de construções sociais e práticas interativas com seus pares vivencie e desenvolva atividades que serão trabalhadas no seu espaço escolar, beneficiando as suas ações com novas formas didáticas e metodológicas, inovando e promovendo, assim, o processo ensino/aprendizagem de seu estudante.

 

3 A gênese do nosso projeto de extensão com ênfase na formação docente

 

       O Campus Barreiros-IFPE, ao longo da sua caminhada educacional, vem se aproximando intensamente o diálogo com a comunidade externa, indo além das fronteiras do Campus, cumprindo assim o que está proposto sobre extensão no PDI (Plano de Desenvolvimento Institucional)

Entende-se por Extensão o processo educativo, científico e cultural integrado ao Ensino e à Pesquisa de forma indissociável, que viabilize a relação transformadora entre o Instituto e outros setores da sociedade, assegurando a troca de saberes sistematizados - acadêmico e popular - e permitindo a produção do conhecimento a partir do confronto com a realidade, de forma a democratizar o conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Instituição. (PDI- IFPE, 2014-2018)

 

            O projeto de extensão, aqui relatado, eclode dentro dessa perspectiva de socialização, democratização do saber e na construção e reconstrução de práticas pautadas no desenvolvimento de novas técnicas de ensino para o desenvolvimento das ações pedagógicas dos docentes de Língua Portuguesa do ensino fundamental II.

       O nosso curso de extensão foi formulado a partir de convênio do IFPE- Campus Barreiros com a Secretaria de Educação do município do Rio Formoso-PE, cidade da Mata Sul do Estado de Pernambuco, situada a aproximadamente 88km da capital, Recife, tem uma população um pouco maior que 23 mil habitantes (IBGE, 2016), está aproximadamente a 18km de Barreiros/PE.

      A Secretária de Educação discorreu sobre a preocupação com os resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), o município vinha registrando números muito baixo nas avaliações externas. Diante desse quadro, propusemos projetar o curso com ênfase na formação docente a partir dos descritores e metas propostos nas Matrizes de Referência da prova do SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), visando obter melhores índices qualitativos na área educacional.

       O SAEB avalia os estudantes nas disciplinas de Matemática e de Língua Portuguesa, exige conhecimento e domínio de leitura e interpretação textual. Isso requer do docente conhecimento de estratégias de leitura, de produção de questões que atenda às propostas desse modelo de avaliação. Tais exigências deixam o docente meio atônito, uma vez que a formação inicial não ensina exatamente como resolver esses conteúdos.  “Ninguém promove a aprendizagem de conteúdos que não domina, a constituição de significados que não compreende nem a autonomia que não pôde construir”. (MELLO 2000, p.102)

      A prova do SAEB avalia, em Língua Portuguesa, habilidades de leitura, divididas em cinco blocos de conteúdo:

 

  • procedimentos de leitura;
  • implicação do suporte, do gênero e/ou do enunciador na compreensão do texto;
  • relação entre textos;
  • coerência e coesão no processamento do texto;
  • relações entre recursos expressivos e efeitos de sentido e variação linguística.

 

       Cada bloco de conteúdo tem seus respectivos descritores que descrevem as habilidades a serem trabalhadas e avaliadas, a partir deles, o docente deve elaborar as questões de interpretação textual. Dentre esses descritores, evidenciamos que alguns professores demonstraram extremamente inseguros em construir enunciados para as questões, isso advindo da falta de domínio do conteúdo.

       O ensino de Língua Portuguesa no contexto atual, para atender as habilidades exigidas pelos descritores da avaliação do SAEB, requer do docente um conhecimento amplo para identificar o que se pede cada descritor, saber distinguir conceitos de conteúdos, às vezes, muito similares, mas que têm aplicabilidade diferentes e também ser capaz de formular enunciados para questões objetivas.

        Assim, novas opções didáticas e metodológicas, reflexão sobre o ensino da leitura e estudo em grupo por profissionais da mesma área devem ser desenvolvidas constantemente. A formação continuada tendo como formadores atores sociais da mesma área dos atores em formação é mais envolvente e interativa, uma vez que esses profissionais têm familiaridade com o conteúdo em pauta, além disso, a construção com seus pares flui com mais espontaneidade e não sobre pressão.

       Para Efken; Cirne (2017, p. 127) “Aprender em rede exige abertura permanente ao outro, disposição para o diálogo, capacidade de se ver a si mesmo e os outros interconectados não como imposição.” O posicionamento desses autores reafirma a importância da formação docente balizada em uma construção coletiva, visando ao crescimento de toda uma comunidade acadêmica, na qual o docente é o público primário e o discente, o público secundário, pois o que se aprende em uma formação pedagógica reflete no processo ensino/aprendizagem dos estudantes.

       Para Nóvoa (1995), a formação continuada de professores deve estar constantemente articulada aos objetivos das instituições formadoras, as necessidades dos profissionais e aos interesses das escolas em que os mesmos atuam. Por isso que a formação deve ser concomitante com o fazer pedagógico, o objetivo da proposta de formação deve ser claro para o docente, ele atuando como protagonista desse processo, é preciso visibilidade e aplicabilidade do conteúdo vivenciado no curso de formação, o conhecimento construído, necessariamente, deve retornar para o espaço escolar do docente.

       O nosso projeto de extensão de educador para educador foi significantes para os docentes porque eles foram os principais atores deste curso, os formadores eram apenas mediadores. Os professores tinham consciência da necessidade da formação, quais as dificuldades enfrentadas deveriam ser sanadas para que a sua escola, ou melhor, seu município melhorasse o índice de aprendizagem nas avaliações externas e internas. Freire nos leva a refletir que “é pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”. (FREIRE, 2016, p.18)

      Entendemos que a formação continuada docente é mais uma possibilidade para o profissional avançar nos estudos, ter propriedade para verificar quais as “pedras do meio do caminho” nas atividades pedagógicas e como agir e criar novas estratégias para atender as mudanças educacionais na contemporaneidade e também refletir o seu próprio fazer pedagógico, consciente de que o que desenvolvemos no nosso espaço reflete no comportamento e na formação do outro. Para Libâneo (2001, p. 14), “Formar-se é tomar em suas mãos seu próprio desenvolvimento e destino num duplo movimento de ampliação de suas qualidades humanas e profissionais, religiosas e de compromisso com a formação da sociedade em que vive.”

       Outros fatores importantes para o êxito da formação continuada são: a recepção, reciprocidade e envolvimento dos agentes educacionais, quando o docente aceita participar ativamente e conjuntamente de uma formação, o resultado é positivo para toda a comunidade escolar. Isso ficou evidente no nosso curso de formação, o apoio e a presença de diretores, de coordenadores juntos com os professores estimularam a participação dos docentes nas leituras e construção das atividades.

       A Secretaria de Educação da cidade do Rio Formoso-PE ao solicitar uma formação continuada com ênfase nos resultados do IDEB revelou a preocupação constante com a formação dos educadores e educandos, com o crescimento educacional e comprometimento com o desenvolvimento do município, buscando meios para suprir as dificuldades que impedem a melhoria dos níveis educacionais.

      Professores preparados e atualizados elevam a qualidade de ensino, bem como a autoestima do próprio docente. Neste contexto Moran (2004, p.3), questiona e nos dá ao mesmo tempo a resposta: “O que deve ter uma sala de aula para uma educação de qualidade? Precisa fundamentalmente de professores bem preparados, motivados e bem remunerados e com formação pedagógica atualizada. Isto é incontestável”.

 

4 Percurso metodológico do nosso curso de extensão

 

 

  1. 4.1 Início do curso

 

          Este curso é resultado de convênio do IFPE-Campus Barreiros com a Secretaria de Educação do município de Rio Formoso-PE, como resposta ao papel da extensão que é a socialização de conhecimento de uma comunidade interna com outras comunidades externas promovendo o desenvolvimento local e regional.

           A abertura do curso foi realizada no auditório central do Campus, contou a com a presença do Diretor Geral do Campus Barreiros, da Secretária de Educação do município do Rio Formoso, da equipe formadora e dos docentes inscritos no curso. Essa recepção inicial foi bastante estimuladora para que os protagonistas do curso se sentissem acolhidos.

            O curso de extensão denominado” Formação de professores – de educador para educador” iniciou em março de 2018, no intuito de desenvolver conjuntamente atividades que elevassem o conhecimento dos docentes de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental a partir das Matrizes de Referência do SAEB e, consequentemente, impulsionar o nível do resultado do IDEB do município de Rio Formoso-PE.

            Os encontros foram realizados mensalmente, já devidamente programado conforme a agenda da Secretaria de Educação do município a fim de que não houvesse nenhum choque nas atividades da equipe formadora e dos docentes envolvidos no curso. A Secretaria de educação disponibilizava o transporte para o traslado dos docentes até o nosso Campus. A equipe formadora era responsável pelo espaço para a realização dos encontros, pela elaboração de material e impressão a ser trabalhado nos encontros. A equipe formadora, professores de Língua Portuguesa, se reuniam antecipadamente, estudavam os descritores a serem trabalhados nos encontros, selecionavam os textos para leitura e construção das atividades.

 

  1. 4.2 Duração do curso

 

      O curso teve a duração de dois anos, de março de 2018 a dezembro de 2019, totalizando 80 horas, com encontros presenciais. A formação foi realizada com 20 (vinte) professores de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental II da Rede Municipal de Ensino, além dos docentes, também participaram os coordenadores pedagógicos. Durante o desenvolvimento desse trabalho, foi utilizada a abordagem qualitativa que “[...] trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes” (MINAYO, 2012, p.21).

         Ao final do curso, em um evento formal, foi entregue certificado aos docentes pela formação concluída, nessa ocasião, estiveram presentes o Diretor Geral do Campus, a Prefeita do município do Rio Formoso, a Secretária Municipal de educação, apoiando e incentivando os seus docentes, vetores do desenvolvimento educacional, foi um momento festivo, muito gratificante e de realização profissional para nós, agentes da educação. 

 

4.3 Procedimentos metodológicos

            No primeiro encontro, além de os docentes explicitaram em uma roda de conversa as dificuldades enfrentadas em sala de aula, realizamos também um questionário semiestruturado a fim de investigar quais os descritores da avaliação do SAEB que mais apresentam dificuldades para os docentes desenvolverem as questões de interpretação e a leitura dirigida, qual comportamento da média de proficiência das respectivas escolas nos últimos anos, como também questioná-los sobre quais as maiores lacunas na aprendizagem e dúvidas apresentadas pelos estudantes na realização das avaliações externas.

           

Elaboramos as seguintes questões:

 

  • Qual é o comportamento da média de proficiência de sua escola ao longo dos últimos anos? (  ) estável     ( ) está aumentando    (  ) está diminuindo
  • A que você atribui esses resultados? Levantar hipótese.
  • Quais estratégias poderiam ser desenvolvidas para melhorar a proficiência dos estudantes de sua escola?
  • Qual o sentimento que a escola/profissional tem com relação ao resultado apresentado pelos estudantes?
  • É possível perceber se o estudante, de fato, se apropria do conhecimento e consegue aplicá-lo?
  • Para você, quais são as principais lacunas de aprendizagem?

 

            Conforme dados coletados pelos docentes, obtivemos as seguintes respostas:

Todos responderam que o comportamento da média dos estudantes estava estável.

A maioria atribui a atual média dos estudantes a alguns aspectos, tais quais:

  • falta de incentivo familiar,
  • falta de interesse do próprio educando,
  • alguns meios ineficazes de ensino;
  • o fato de só trabalhar os descritores de avaliação no 9º ano;
  • limitação de leitura de mundo dos estudantes;
  • fatores externos que influenciam na aprendizagem: sociais, estruturais.

Os docentes entendem que para melhorar a proficiência dos estudantes seria necessário:

  • Direcionamento mais efetivo dos descritores do SAEB;
  • apoio específico ao professor e aos estudantes em relação aos descritores;
  • estratégias de leitura e dinâmicas envolvendo os descritores, simulados e aulões a partir do 6º ano;

Em relação ao sentimento que os docentes têm sobre o atual resultado, eles apresentaram as seguintes reflexões:

  • Frustrante, uma vez que o professor ainda não está focado nesse tipo de avaliação externa;
  • ansiosos, preocupados e inquietos com o resultado da avaliação;
  • a escola não está satisfeita, pois ela visa sempre o maior e melhor resultado.

 

Na questão referente à apropriação e aplicabilidade do conhecimento pelos estudantes, os docentes responderam que:

  • Sim, mas depende do esforço do professor;
  • alguns alunos não têm estímulo em relação à avaliação externa, mas há outros que participam com pesquisas, roda de leitura.
  • a maioria tem muita dificuldade em se expressar;
  • sim, por meio de avaliações continuadas.

 

Por fim, apresentaram as principais lacunas de aprendizagem:

  • Leitura;
  • produção, compreensão e interpretação textual de diversos gêneros;
  •  compreensão de elementos textuais como: fato, opinião, tese, argumento;
  • funções do léxico na aplicabilidade da língua;
  • ausência dos pais;
  • dificuldade no processo de letramento.

 

       Esse levantamento nos norteou na organização dos conteúdos e oficinas dos encontros de formação. A construção das estratégias desenvolvidas no curso teve como foco os cinco blocos de conteúdos propostos para a realização da prova do SAEB. Nas oficinas, a equipe formadora apresentava o conteúdo e, posteriormente, os docentes em formação desenvolviam as atividades propostas em grupo. As oficinas de Língua Portuguesa funcionaram como potencializador para a compreensão dos descritores.

        Entre as orientações de desenvolvimento das atividades, propomos trabalhar com a formulação de questões com gabaritos, com uniformidade entre o que se ensina em aula e o que se avalia na prova. Como percebemos que os docentes tinham dificuldades em alguns conteúdos específicos, como: tema, fato, opinião, informações implícitas e explícitas, também em formular questões objetivas, demos maior ênfase a estes pontos. Foram desenvolvidas pela equipe formadora e pelos docentes várias questões sobre cada descritor, só adiantávamos para um próximo descritor, quando percebíamos que todo o grupo tinha conseguido apreender e desenvolver a atividade proposta.

       As atividades produzidas pelos docentes eram socializadas para todo o grupo, ao apresentar a questão elaborada, eles explicavam qual o descritor que utilizaram naquela questão e qual a habilidade avaliada. A equipe formadora tinha a sensibilidade e preocupação em orientar as leituras dirigidas e a elaboração das questões para que este material, de fato, fosse subsídio para as aulas dos docentes em suas respectivas turmas.   

O objetivo principal do curso de formação emergiu nesse intuito de oferecer suporte para a elevação do nível de ensino/aprendizagem e desenvolver estratégias facilitadoras para o trabalho docente, também estudar, conjuntamente, os descritores com vistas ao desenvolvimento de estratégias para consolidar as habilidades de leitura dos alunos tanto para a avaliações externas (são aquelas que a rede não tem interferência na elaboração), como as internas.

 

 

           

            

           

 

5 Resultados e discussões

              Levando em consideração a necessidade de impulsionar o nível de aprendizagem dos discentes da rede municipal da cidade de Rio Formoso-PE para obter melhor resultado no IDEB e de desenvolver estudos dirigidos e oficinas de produção de material para instrumentalizar o fazer pedagógico do docente no cotidiano da sala de aula, realizamos de forma concreta, durante os dois anos de formação, atividades que contribuíram significativamente para esse fim. 

         Acreditamos que a formação só fará sentido se for contínua, assim, pode-se diagnosticar as dificuldades encontradas no processo ensino/aprendizagem. A cada novo encontro, os docentes relatavam como estavam desenvolvendo a prática de ensino de Língua Portuguesa, seus avanços e entraves, diante dessas reflexões procurávamos inovar as oficinas visando atenuar as dificuldades apresentadas. Nesse sentido, Freire (2006) ressalta que na formação permanente dos professores, o fundamental, é a reflexão crítica sobre a prática que [...] tem de ser de tal modo concreta que quase se confunda com a prática. As palavras do autor reforçam que todo o processo de formação continuada deve fazer sentido para o fazer pedagógico no chão da escola do docente, no seu exercício cotidiano.

         Ademais, a docência não se materializa de forma individual, necessita-se de experienciação com outros agentes educativos para suprir as necessidades uns dos outros, que resulta na aprendizagem dos discentes e no desenvolvimento local, assim a prática docente não pode ser uma prática solitária. Essa formação continuada atende ao que Tardif (2014) aponta como a necessidade de repensar a formação levando em conta os saberes dos professores e as realidades específicas encontradas no cotidiano escolar.

        Ao final desse curso, os docentes relataram que a formação potencializou não só a aprendizagem dos estudantes, mas também foi extremamente importante para a revisão de conteúdos que não foram estudados na sua formação inicial, para alguns, esses conteúdos eram vivenciados de forma muito superficial, uma vez que não tinham o domínio desse saber. Aqui retomamos Charlot (2000), ao dizer que se deve pensar o saber (ou o “aprender”) com o tipo de relação que ele tem na prática para alcançar um objetivo.

            Além dos relatos dos docentes sobre o quanto os encontros de formação impactaram no seu fazer pedagógico ao retornar à escola, outro fator relevante que atendeu exatamente à preocupação e ao desenho desse curso foi o avanço no desempenho apresentado nos processos externos de avaliação ( IDEB  de 3,9 em 2017 para 5,1 em 2019), conforme tabela disponível em: https://qedu.org.br/estado/117-pernambuco/ideb/ideb-por-municipios.

         Os resultados comprovam que é necessário investir incansavelmente na formação docente, isso depende de uma ação conjunta entre gestores, comunidade interna e externa. Os dados apresentados ainda não são os desejáveis, mas sinalizou avanço significativo. Portanto, acreditamos que, por meio deste curso de extensão, contribuímos para a melhoria dos índices educacionais do município, principalmente para dirimir dúvidas dos docentes em relação ao desenvolvimento de práticas criativas e inovadoras para o processo ensino/aprendizagem.

 

 

Referências

BONDÍA. L. J. Literatura, experiência e formação. In: COSTA, M. V. Caminhos investigativos – novos olhares na pesquisa em educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 133-160.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (Lei n.º 9394/96). 20 de dezembro de 1996.

_________. Ministério da Educação/SEB. Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica – Orientações Gerais, Brasília, 2005.

CHARLOT.B. Da Relação com o Saber: elementos para uma teoria. Tradução de Bruno Magne. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

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