1.Introdução
O processo de criação textual não é fácil, principalmente quando se trata de alunos que foram alfabetizados há pouco tempo. O caminho que o escrevente percorre até ter uma relativa autonomia de seus escritos é algo complexo que exige conhecimentos como: ortografia, semântica, sintaxe, morfologia, pontuação acentuação, entre outros (BEREITER; SCARDAMALIA, 1987 BERNINGER et. Al; 1994, apud PEREIRA).
A proposta de produção textual é algo muito utilizado pelos professores como uma forma de avaliação em diversos aspectos e que correspondem aos conteúdos dirigidos para determinada fase de escolarização e faixa etária.
O manuscrito escolar que é produzido pelos alunos em sala de aula é objeto de estudo de diversas áreas, por diferentes estudiosos tais como: psicólogos, pedagogos, linguistas e etc. No entanto, no processo de criação textual e das obras escritas leva em consideração na grande maioria das vezes, a produção acabada, ou seja, o texto pronto, definitivo; descartando os esboços, as rasuras que ocorreram antes do processo de produção textual.
A partir disto, surgem os seguintes questionamentos: o que há por trás dos textos que são escritos antes do texto final (rascunhos)? O que há por trás das rasuras desses manuscritos produzidos por alunos ainda no início do processo de escritura?
É justamente essa parte do processo, ou seja, do caminho que é traçado pelos escreventes até o resultado final do texto elaborado, que é resgatada pelo Sistema Ramos[1]. Através do filme sincronizado capturado por esse sistema, é possível identificar os momentos em que ocorrem as rasuras e consequentemente o que leva os alunos a rasurar.
De acordo com Almuth Grésillon (2008, apud CALIL 2012), “a rasura seria um “apagamento visível”, um traço legível que permitiria recuperar por meio de análises de dossiês genéticos, os caminhos de ida e vinda da criação literária”. Em outros termos, ela permite que se tenha uma noção do que o autor pensava antes da sua obra acabada e quais ideias ele (autor) tinha antes de reformular, acrescentar, retirar, substituir e modificar seu texto até a produção acabada, ela permite que se tenha uma noção do “caminho percorrido pelo aluno até a obra pronta. ”
Segundo Calil (2012) a rasura como operação metalinguística, traz em sua essência uma ação do escrevente sobre o que foi escrito. Ela é o reflexo dos pontos de tensão, de interação e “conversação” entre o escrevente e o texto em curso.
Neste trabalho serão expostos algumas das rasuras e os manuscritos produzidos por alunos de uma escola em Portugal e tem como objetivo, descrever os tipos de rasuras a partir da análise metalinguística dos processos de escritura a dois, em tempo e espaço real entre alunos recém alfabetizados do 2º ano do Ensino Fundamental.
[1] O Sistema Ramos foi desenvolvido pelo Professor Doutor Eduardo Calil junto com a equipe do Laboratório do Manuscrito Escolar, trata-se de um sistema que permite a captura multimodal do processo de escritura em tempo e espaço real da sala de aula. Nele há uma sincronização entre o registro fílmico da interação entre os alunos, o traçado da caneta sobre a folha de papel e o registro em áudio do diálogo entre os participantes, durante o momento do manuscrito em curso, fornecendo então uma grande quantidade de informações em relação as ideias que são discutidas pelos alunos envolvidos (Ditante e escrevente) e o texto em andamento.
2. As rasuras e os pontos de tensões
De acordo com Fabre[1] (1987 2004; apud C0RDEIRO, 2018) as rasuras são os traços, rastros da função metalinguística em ação, pois segundo a autora, tais mudanças podem ocorrer no manuscrito, principalmente nos rascunhos que são produzidos pelos alunos, eles caracterizam os resquícios das atividades metalinguísticas dos escreventes que estabelece a relação entre o texto em curso e os alunos (escreventes) envolvidos no processo.
No entanto, a mesma autora ressalta que: “nem toda rasura é potencialmente metalinguística, pois pode remeter à heterogeneidade do conjunto das atividades épi- e metalinguísticas, por exemplo, a motricidade”. (FABRE, 2004 apud CORDEIRO; 2018).
Porém, é importante ressaltar que os estudos de Fabre nos ajudam a compreender a frequência com que os alunos rasuram e quais são mais ocorrentes, no entanto, não mostram o momento exato delas e o que os levou a rasurar, diferentemente dos estudos de Calil e Felipeto, que embora realizem pesquisa no mesmo campo científico, mostram através do Sistema Ramos, o momento exato em que ocorre as rasuras e consequentemente os fatores que os influenciam a rasurar.
A rasura seria um traço legível que nos permite identificar o “rastro” deixado pelo escrevente, que possibilita certo entendimento acerca das ideias presentes para o processo de produção textual.
No processo de escritura colaborativa (entre díades) Calil (1998 p.97) caracteriza os pontos de tensão como um momento em que as duplas interrompem o texto em curso (escrita) em função de algum tipo de conflito ou de ideias divergentes que possam surgir ao longo do processo de escritura. Esses são pontos muito comuns nesse tipo de criação textual (escrita a dois) que é perceptível na fala, nos gestos das crianças e que são capturados em vídeo.
É a partir dessas análises audiovisuais, que caracterizamos com precisão o tipo de rasura ocorrente, algo que não seria perceptível apenas lendo o manuscrito produzido pelos os mesmos.
Segundo Calil (2017) o manuscrito escolar tem sempre o preceito de ser aquele texto que é produzido e entregue ao professor para que o mesmo (professor), possa avaliar e intervir ou que o pesquisador possa analisar as marcas (rasuras) gráficas do processo de escritura, sem necessariamente saber o percurso que o escrevente fez até chegar ao texto final.
Os estudos desenvolvidos pelo grupo de pesquisa do Laboratório do Manuscrito Escolar (LÂME), que objetiva a análise da gênese textual em tempo real, mostram em seus mais diversos trabalhos publicados como (FELIPETO, 2018, CALIL, 2008, 2009, 2012, 2016, 2017; LIRA, 2011; AMORIM, 2017, etc.) que o manuscrito escolar é um meio de favorecer aos alunos envolvidos nesse processo de escrita, reflexões sobre os elementos narrativos do texto.
A prática de trabalhar com produção textual em sala de aula se faz necessária não somente em séries mais avançadas, mas desde o momento em que as crianças são alfabetizadas, em outras palvras, a partir do momento em que as mesmas já possuem conhecimento e uma certa apropriação da língua escrita, pois tal atividade contribui para a apropriação da linguagem escrita e para a tomada de consciência a respeito de características ou propriedades da linguagem.
De acordo com Calil (2017), a rasura só pode ser reconhecida como tal depois de ter produzido algum efeito em relação ao “antes” e um “depois” em relação ao caráter linear e cursivo do texto.
Ela faz parte do caminho a ser traçado para favorecer a criação textual. Entretanto, é sabido que a sala de aula é um espaço diverso, em que há alunos cuja aprendizagem se dá de maneiras diferentes. Diante dessa perspectiva, trabalhar com produção textual com alunos ainda inexperientes, recém alfabetizados, se torna um desafio para qualquer professor.
Nessa proposta de escritura a dois, percebe-se as inúmeras dúvidas que surgem acerca do processo de escrita, tais como: acentuação, pontuação, letra maiúscula ou minúscula, se determinadas expressões da oralidade se escreve junto ou separado, se o trecho em questão (escrito) tem sentido ou não.
Além disso, como se trata de uma produção textual realizada em dupla, também é importante pensar no quanto um aluno pode auxiliar o outro acerca de tais dúvidas ocorrentes no decorrer do manuscrito, pois possibilita que eles (alunos) possam articular uma gama de variedade de conhecimentos linguísticos, há então nesse processo, uma troca de conhecimentos em relação aos elementos textuais, sentido, coesão, ortografia, entre outros elementos.
Esses são pontos importantes para os estudos da genética de texto, pois evidenciam a grande quantidade e diversidade de operações metalinguísticas de textos produzidos por alunos ainda “inexperientes” com a produção textual, segundo Calil (2016):
Fabre (1990) mostra, e em estudos posteriores afirmam que, mesmo o manuscrito de alunos recém alfabetizados (entre 6 a 9 anos de idade) há uma grande quantidade de rasuras, indicando operações metalinguísticas em diferentes níveis linguísticos (gráficos, ortográficos, lexicais, semânticos, sintáticos, de pontuação). (CALIL, 2016, p. 532).
Ao longo da criação das histórias, é comum que os alunos discutam em relação a como colocar os seus “pensamentos/ideias” num texto escrito, percebem o que estão fazendo e se o texto em construção está estabelecendo sentido, se há algo que deve ser mudado, se uma palavra ou expressão está escrita de forma inadequada. Eles (alunos) realizam diversas alterações e correções no decorrer do processo (escrita/construção da história), o que evidência as operações metalinguísticas ocorrentes nesse processo de escrita a dois.
3. Processo de escrita colaborativa surgimento das rasuras e análise dos manuscritos
Segundo Calil e Felipeto (2012), no processo de criação textual entre díades é comum que haja um diálogo entre o escrevente e o ditante, essa interação entre as duplas favorece o debate e potencializa reflexões acerca das palavras empregadas no texto, o que indica importantes operações metalinguísticas favoráveis ao processo de criação textual de alunos recém alfabetizados.
A interação entre os “novos escreventes” permite que os mesmos façam descobertas acerca do processo de criação textual mediante as rasuras, pois como já mencionado, no diálogo entre eles surgem os pontos de tensões acerca do manuscrito em curso.
A interação que há nesse processo de escritura a dois favorece também a cumplicidade e colaboração no que diz respeito ao processo de escrita, pois comumente um aluno corrige ou chama a atenção do outro para determinados elementos do texto.
A análise metalinguística é feita a partir do material coletado através do Sistema Ramos (Sistema de captura multimodal) que como mencionado anteriormente, trata-se de um sistema que capta a imagem da sala de aula, o áudio das falas dos alunos e as imagens da escrita em tempo real, utilizando a caneta inteligente do programa HandSpy, que capta através de uma micro câmera conectada na ponta da caneta, o momento em que surge a rasura no manuscrito.
Através da sincronização do vídeo, áudio e as imagens da caneta é realizada a análise do processo de escrita colaborativa. A partir desse material é realizada a transcrição dos processos fílmicos que mostram a criação de história de alunos recém-alfabetizados do 2º ano de uma escola em Portugal.
Os alunos têm idade entre 7 a 8 anos, são da mesma escola e da mesma turma. Para a realização desse processo de criação textual e da coleta de dados é proposto para as professoras seguir alguns pontos estratégicos de organização, para que seja possível capturar em vídeo as duplas e os momentos indicativos de cada rasura a partir do momento especifico indicado nessa formação; são seis momentos estratégicos ao todo:
- 1º momento - organização da sala (instalação dos equipamentos);
- 2º momento- apresentação da equipe e do que será proposto para ser escrito para os alunos (proposta de criação textual);
- 3º momento- combinação das duplas para o que será desenvolvido por eles (articulação das ideias, antes de começar a elaborar o texto);
- 4º momento- inscrição e linearização da história;
- 5ºmomento- revisão do texto escrito;
- 6º momento- desenho, pois muitos acabam de escrever sua história antes do sinal do intervalo ser tocado, visto que, nesse processo de criação textual e captura dos vídeos e dos áudios, há uma determinada duração entre mais ou menos 01: 16: 19: 21 a depender da dupla, mas que ao tocar o intervalo se encerra a gravação, com isso nem todas as duplas conseguem fazer o desenho.
Os desenhos realizados pelas duplas fazem parte da criação artística e ilustrativa da história criada pelos os mesmos, mas como mencionado, poucas duplas terminam a tempo a sua produção textual para realizar essa parte do processo.
Neste trabalho serão descritas a análise de duas díades de uma escola em Portugal, tomaremos alguns aspectos específicos acerca do manuscrito produzido pelas duplas, alguns comentários acerca do texto, o texto escrito e as transcrições das rasuras correspondentes ao manuscrito criado pelos alunos envolvidos no processo.
Nos manuscritos analisados observou-se a ocorrência de dez rasuras especificas: RO[2] (Rasura Oral), ROC[3] (Rasura Oral Comentada), RE[4] (Rasura Escrita), REC[5] (Rasura Escrita Comentada), LS[6] (Rasura referente a Soletração Lexical), PON[7] (Rasura de Pontuação), G[8] (Rasura Gráfica).
As rasuras produzidas pelas díades em geral estão relacionadas ao que Calil (1998), coloca como “pontos de tensões” como já mencionado. Após a coleta de dados, o material é analisado e as falas dos alunos e das professoras são digitalizadas, organizadas de acordo com os momentos citados anteriormente.
É realizado uma análise minuciosa entre as falas dos alunos em relação ao momento de criação textual e as rasuras que constam no manuscrito pronto, a partir das falas, é possível identificar as causas das rasuras e o que houve para que determinados trechos da história criada tivessem que ser rasurados.
As falas das crianças durante o processo de escrita, caracterizam o percurso traçados por eles (as ideias) até chegar ao resultado final, ou seja, a história pronta e acabada.
Vejamos a transcrição diplomática do manuscrito dos manuscritos das díades estudadas. A primeira transcrição é referente ao manuscrito da dupla Gabriel e Francisco:
Transcrição diplomática do manuscrito (história intitulada -“ O rei mal feitor”( EV_004_D2_Gabriel B. Francisco P.) 1º e 2º parte:
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1. O rei mal feitor 2. (Eraumave)(Erauma), Era uma vez, um rapaz 3. que vivia na aldeia. 4. 5. Zé Costa, 6. rico e 7. rei. Muito mal! 8. O rei Zé Costa era: alto, 9. Mosculado 10. Ele um dia saiu do castelo para bater nas galinhas. 11. (d) De (segida) seguida p pegou a espada e foi á rua partir 12. As janelas das casas. 13. Cuale não foi o ( 14. 15. – Ei ! 16. ( 17. – Eu ? (=) – Eu esclamou Zé Coste. 18. (ja) Já para a prizão 19. 20. Sempre na prizão.
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Fonte: Laboratório do Manuscrito Escolar (LÂME)
Os objetos textuais desse manuscrito (correspondente a essa transcrição) foram reconhecidos no processo de inscrição e linearização, e quase em sua totalidade com a intervenção do aluno ditante.
Ao todo foram cerca de 40 rasuras, dessas, apenas sete surgiram com a “intervenção” do aluno escrevente/Francisco*, em termos quantitativos, ao todo esse manuscrito tem em seu corpo: 8 RE; 4 ROC; 5 REC; 1 LS; 2 S/L; 4 PON; 13 G; 1 GS e 2 T. Em um determinado momento, foi possível perceber que em uma mesma parte do processo de escritura, houve comentários diferentes, que posteriormente se caracteriza como uma rasura no manuscrito, um dos comentários foi realizado pelo aluno ditante, e outro pelo escrevente.
Além disso, nota-se que há duas OT numa mesma rasura. A partir dessa análise, descobrimos que o percurso traçado pelos alunos até o manuscrito pronto, revela todo um contexto que caracteriza o envolvimento dos mesmos com o processo de escritura e também conhecimentos acerca da língua escrita, tais como: acentuação, pontuação, etc.
Vejamos a análise de uma pequena parte do trecho do manuscrito produzido pelos alunos e suas respectivas falas, troca de ideias entre os alunos envolvidos no processo e consequentemente as falas que correspondem ao momento das rasuras.
Imagem de um trecho do manuscrito acima: “ O rei mal feitor” (EV_004_D2_Gabriel B. Francisco P.) Tabela referente ao texto dialogal correspondente a transcrição do manuscrito |
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Turnos |
Texto dialogal |
Rasura |
165 |
GABRIEL: Tá mal! Parêntese; parêntese (Não gostou como Francisco escreveu) |
|
166 |
FRANCISCO*: |
|
167 |
GABRIEL: -Não! Com o Q de queijo U- A- N –D-O; quando ([soletra])
|
|
168 |
FRANCISCO*:- Já fiz |
REC |
169 |
GABRIEL:-Quando era grande; quando era grande; há não, quando tinha, tinha 45 anos; |
Tinha |
170 |
FRANCISCO*: Ei! Perto do meu pai ele é 42 anos. |
Tinha( |
171 |
GABRIEL: Quando ele tinha 45 anos;
|
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172 |
FRANCISCO*: Já sei 45 anos, 54 anos. |
|
173 |
GABRIEL: Não! 45. |
|
174 |
FRANCISCO*: 54 anos.
|
|
175 |
GABRIEL: 45!
|
|
176 |
FRANCISCO*: Não 54. |
|
177 |
GABRIEL: 45, mas o rei da história tem 45 anos! ([Se irrita]) Teimoso! |
ROC |
Fonte: Laboratório do Manuscrito Escolar (LÂME)
Os turnos de fala acima correspondem as seguintes rasuras: a primeira relacionada a palavra “quando” o aluno escrevente Francisco escreve a palavra incialmente sem nenhuma intervenção, após a observação e comentário do aluno ditante Gabriel: “Tá mal! Parêntese; parêntese”, ele pergunta como se escreve a palavra “quando” e se escreve com a letra “U”, após a soletração do colega, Francisco faz a correção no manuscrito.
Essa rasura se caracteriza como uma REC (Rasura Escrita Comentada), pois houve uma correção na escrita mediante um comentário feito pelo aluno ditante Gabriel. Conforme Calil (1998), os registros do diálogo entre as díades estabelecem o que iriam escrever ou sobre o que já haviam escrito, dessa forma, é possível acessar o que estavam pensando, ou o que houve para que determinado elemento textual fosse rasurado no manuscrito.
A segunda rasura em destaque é referente a idade do personagem, pois para essa criação de história inventada, a professora propôs que eles criassem um personagem que fosse mau (um rei malvado).
É comum que os alunos coloquem suas associações de algo próximo a eles (elementos próximos) para a composição do enredo da história. Há nesse momento um conflito de ideias entre os alunos relacionada a idade do personagem.
De acordo com Calil (2014), alguns fatores contribuem para a caracterização das condições de produção que favorecem o estabelecimento de relações associativas, ou seja, é comum que nesse processo de criação textual os “novos escreventes” realizem associações entre os elementos textuais (escrita) e suas memórias, delimitando assim a sua criatividade textual.
Por se tratar de um personagem com uma característica ruim o aluno ditante (Gabriel) atribui algumas características ao personagem fictício que desagrada ao aluno escrevente (Francisco), uma delas é a idade do “rei malvado”. Gabriel propõe que o “rei” tenha 45 anos de idade, o que causa incomodo em Francisco, pois ele associa essa idade a idade de seu pai (idades próximas), como se trata de um personagem “mau” ele não quer associar a idade de seu pai a do personagem criado.
Após a discussão, Francisco sede e risca o número “54” e coloca “45” como sugerido pelo colega, nesse momento surge a ROC, pois o aluno escrevente inicialmente se recusa a colocar a idade do personagem mau, tal como sugeriu o seu colega, visto que, ele associou essa característica com alguém próximo a ele, nesse caso, seu pai.
Vejamos a transcrição diplomática da história criada e rasurada por outra dupla da mesma escola da díade anterior (Gabriel e Francisco), assim como a análise das falas correspondentes a cada rasura do manuscrito escolar.
Transcrição diplomática do manuscrito -“ O rei aprendeu a lição”(EV_004_D4_ Rodrigo_ Simão) |
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Em síntese, os estudos que envolvem o processo de criação textual contribuem significativamente para o melhoramento do ensino e aprendizagem da língua escrita, são essenciais para o desenvolvimento e capacidade da elaboração discursiva da produção textual.
Os textos fazem parte de uma atividade dialógica e internacional entre os sujeitos envolvidos no processo e o texto em curso.
É importante que o aluno tenha um conhecimento prévio acerca do gênero sugerido para a produção textual, pois tais conhecimentos prévios favorecem o desenvolvimento do enredo textual (escrita).
Os manuscritos produzidos pelos alunos partem sempre de algo de conhecimento deles, ou seja, eles têm certa noção de como se escreve, o que devem expor no texto e como é estruturada uma história (começo, meio e fim).
A professora antes de iniciar a atividade com os alunos sempre discute com eles um pouco sobre a proposta de criação textual, um pouco sobre uma história que possa fornecer aos alunos uma base para que eles possam criar seus enredos de forma única, proveniente de sua imaginação.
Com base na fala dos alunos envolvidos nesse processo identificam-se as relações que eles estabelecem em relação à criação de sua história, tais como será o início, o nome dos personagens, as características deles e etc.
Também são perceptíveis as substituições de termos que serão empregados na história, para dar mais coerência com o que será escrito.
Pode-se dizer que do ponto de vista enunciativo, o processo de escrita entre díades dá um significado favorável ao surgimento de diálogos relacionados à produção textual, possibilitando então a ocorrência das rasuras e a constituição de relações de alteridade.
Percebe-se que há diferenças de “posicionamentos” das crianças em relação às historinhas que estão sendo criadas, uma procura dar sentido ao que está sendo desenvolvido, enquanto a outra joga as palavras que podem ou não ser empregadas no texto em curso, essas diferenças caracterizam a relação que cada um têm com a linguagem.
Para explicar esse tipo de comportamento entre elas é preciso levar em consideração vários aspectos, que talvez a relação entre o sujeito e o discurso não consiga abranger, mas que, através dessas analises temos uma noção mais abrangente de como esses aspectos se articulam (ideias/pensamentos e escrita).
Percebe-se o quanto esse processo de escrita, revisão e reescrita caracteriza todo um conjunto que influi para a formação de bons escritores, pois tais atividades favorecem a reflexão acerca do processo de escritura.
Nesse contexto, a criatividade e riqueza de diversidade presentes nessa proposta de produção textual colaboram significativamente para o aprendizado e formação de bons escritores, pois faz com que os alunos avancem em vários aspectos de suas produções textuais. Além disso, como perceptível nos manuscritos analisados e nos turnos de fala, os alunos ditantes são responsáveis pela maioria das rasuras, pois suas observações e comentários possibilitam que o escrevente reveja aquilo que ele expôs no papel, e repense a palavra, o trecho da história em questão.
Dessa forma, pensando nos questionamentos iniciais, pode-se dizer que por trás dos rascunhos, das rasuras produzidas, há todo um raciocínio, conhecimento, articulações textuais que caracterizam os pensamentos iniciais dos alunos em relação a produção do manuscrito, as rasuras nos revelam que mesmo se tratando de alunos ainda inexperientes com a prática de produção textual, são capazes de desenvolver a capacidade de elaboração discursiva do texto em curso.
Essa proposta de atividade (criação textual entre díades), possibilita aos novos escreventes realizarem articulações em diferentes níveis de conhecimentos acerca da língua escrita. Nesse contexto, tudo que foi ensinado acerca da língua (escrita, pontuação, acentuação, etc.) vão sendo resinificados no processo de criação textual.
A Deus, por ter me dado forças para continuar e não desistir diante dos impecilhos do caminho.
A minha família, pelo amor, incentivo e apoio incondicional.
Ao meu orientador, por não desistir de mim, pela paciência e por tudo que me ensinou.
"A escrita vem da leitura, e a leitura é o melhor professor de como escrever".
(Annie Proulx)
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