Metadados do trabalho

Avaliação Da Aprendizagem No Curso De Ciências Biológicas: Das Prescrições Às Práticas

Maria de Fátima Camarotti; Joseval dos Reis Miranda; Flávio Vieira Carvalho da Silva

Esta pesquisa objetiva analisar a perspectiva de avaliação da aprendizagem a partir dos documentos oficiais e identificar os instrumentos avaliativos utilizados no curso de licenciatura em Ciências Biológicas (LCB) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) na perspectiva dos docentes e discentes. É caracterizada como um estudo de caso que tem como abordagem a pesquisa quali-quantitativa. Os dados foram coletados através de questionários junto ao público-alvo que são docentes e discentes do curso de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba, Campus I, João Pessoa e dos documentos oficiais relacionados ao curso. A análise e intepretação dos dados foram realizadas através da análise de conteúdo e documental. Os resultados indicam que os documentos apontam para uma perspectiva generalista e burocrática da avaliação da aprendizagem. Tanto os docentes quanto discentes associam o tema em uma concepção distinta, sendo tanto tradicional e classificatória, como formativa e contínua. Observaram-se as utilizações de diversos instrumentos avaliativos e a permanência de prova entre os principais. Diante deste cenário, a pesquisa contribui na promoção do conhecimento sobre indicativos sobre as prescrições e práticas presentes nos documentos oficiais e não fazer docente dos professores do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas.

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Como citar este trabalho

CAMAROTTI, Maria de Fátima; MIRANDA, Joseval dos Reis; SILVA, Flávio Vieira Carvalho da. AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: DAS PRESCRIÇÕES ÀS PRÁTICAS. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2021 . ISSN: 1982-3657. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/150-avalia%C3%A7%C3%A3o-da-aprendizagem-no-curso-de-ci%C3%AAncias-biol%C3%B3gicas-das-prescri%C3%A7%C3%B5es-%C3%A0s-pr%C3%A1ticas. Acesso em: 16 out. 2025.

AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: DAS PRESCRIÇÕES ÀS PRÁTICAS

Ao imergir no contexto da avaliação da aprendizagem no Ensino Superior observa-se que assim como na educação básica as concepções e práticas associadas a esse processo ainda carregam uma série de tensões no modo como é compreendida e praticada nas Instituições de Ensino Superior (IES), podendo ser reveladas através das práticas dos professores, das concepções dos estudantes e das postulações presentes nos documentos oficiais que regem as atividades acadêmicas.

Alguns estudos apontam que nesse nível de ensino o tema em questão ainda possui pouca produção teórica e tem lugar silencioso nas discussões acadêmicas. A formação dos docentes universitários e sua prática avaliativa podem ser influenciadas por fatores externos e, também, afetar a formação e a concepção dos estudantes. Além disso, o que se tem constatado é que a lógica da verificação, pautada na aplicação de exames, ainda impera no cenário avaliativo, revelando a promoção do julgamento sobre os resultados alcançados.

Outro cenário que se insere nesse contexto e que alimenta a lógica da verificação está associado ao modo como os instrumentos avaliativos são desenvolvidos na Educação Superior, muitas vezes, permeados pela lógica dos exames na qual o processo de ensino e aprendizagem e ancorada no viés tradicional, na qual se conserva a figura do professor como agente principal do processo e articula sua prática avaliativa pautada na elaboração e execução de exames refletidos em provas e que possuem caráter unicamente quantitativo e classificatório.

Tendo como ponto de partida essas reflexões, buscamos através de um estudo de caso no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas (LCB) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) responder as seguintes questões: qual a perspectiva de avaliação da aprendizagem presente nos documentos oficiais? E quais instrumentos avaliativos são utilizados no curso de licenciatura em Ciências Biológicas na visão dos docentes e discentes.

Sendo assim, a pesquisa teve como objetivos analisar a perspectiva de avaliação da aprendizagem a partir dos documentos oficiais e identificar os instrumentos avaliativos utilizados no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba na perspectiva dos docentes e discentes.

A avaliação da aprendizagem na educação superior                                    

As implicações em torno da avaliação da aprendizagem na Educação Superior compartilham semelhanças com a Educação Básica, ao passo que incorporam novas características, resultado das demandas requeridas pelo contexto ao qual está inserido. Mais que preparar os estudantes rumo à progressão para os anos subsequentes como na educação básica, os estudantes do ensino superior necessitam desenvolver uma série de conhecimentos e habilidades importantes e indispensáveis, não só para avançar ao longo do curso e conseguir uma certificação, mas para garantir uma formação de um sujeito crítico e preparado para lidar com as demandas advindas do seu campo de atuação.

Ainda que sejam notáveis os avanços teóricos em torno da avaliação, quando se observa o contexto do ensino superior, pelo menos no Brasil, os estudos alinhados com a realidade e os paradigmas que se expressam dentro desse nível de ensino são primários e carentes em relação aos múltiplos contextos ao qual está inserido (SOUZA et al., 2018).

Para Chaves (2004) ainda existe uma relação de conflito no que tange a avaliação na Educação Superior, uma vez que muitos docentes seguem normas institucionais distantes da realidade pedagógica da sala de aula ao passo que não questionam sua prática, enquanto que os estudantes demostram estar pouco preocupados com sua formação, dando importância apenas atividades que tenham algum peso na avaliação.

Uma das razões para esse problema está associada a pouca valorização acadêmica das produções em torno do tema, mesmo que tenha grande relevância, pois constantemente universitários e professores estão inseridos e submetidos a processos avaliativos. Todavia, mesmo fazendo parte de suas práticas cotidianas, paira um clima de desatenção e indiferença para confrontar e discutir o tema (LUDKE; SALLES, 2002).

Com relação aos docentes universitários, Hoffmann (2002) sinaliza que impera sobre seu imaginário a concepção de que a qualidade do ensino está interligada a procedimentos avaliativos exigentes e que promover a aprovação de todos revela certa incompetência. Sob tal colocação, revela-se o forte viés classificatório e excludente que a avaliação assume, distorcendo sua real função.

Aliado a isso, a ausência de formação continuada de professores na Educação Superior; a deficiência da formação de natureza didática para além de suas áreas de especialização e a reprodução dos modelos vivenciados ao longo de sua trajetória escolar e acadêmica encontra terreno fértil para fomentar a concepção de que uma avaliação de excelência só pode ser concebida a partir de modelos que possibilitem quantificar as aprendizagens (SOUZA et al., 2018) e consequentemente validam o temor de que a prática avaliativa perca seu caráter classificatório.

Nessa direção, os modelos e práticas avaliativas concebidas na Educação Superior podem contribuir na construção da percepção que os estudantes desenvolvem sobre esse fenômeno e mais precisamente nos cursos de formação docente, nessa linha de pensamento Hoffmann (2000) faz a seguinte observação:

Muito mais forte do que qualquer influência teórica que o aluno desses cursos possa sofrer, a prática vivida por ele enquanto estudante passa a ser modelo seguido quando professor. O que tal fenômeno provoca é, muitas vazes, a reprodução de práticas avaliativas ora permissivas (a partir de cursos de formação que raramente reprovam os estudantes), ora reprovativas (a partir de cursos, como os de Matemática, que apresentam abusivos índices de reprovação nas disciplinas) (HOFFMANN, 2000, p. 52).

 

Outra questão que se estabelece em torno deste tema nos cursos de nível superior, também se sucede através do papel centralizador que recai sobre o docente no que concerne o cenário que se insere o campo avaliativo na Educação Superior. Existe uma relação hierárquica na qual os docentes são quem estabelecem as “regras do jogo” e nesse, pouco ou quase nunca, existe a participação ou diálogo com os estudantes, cabendo a esses, apenas seguir e obedecer aquilo que lhes foi dado, como foi exposto no estudo de Abramowicz (1990).

O modelo em que está organizado o ensino na Educação Superior, muitas vezes, pode não oferecer espaço para que professores e estudantes possam trabalhar em conjunto e desenvolver modelos avaliativos mais democráticos. Diferente da escola, na qual os professores convivem com os mesmos estudantes ao longo de vários anos, na universidade essa relação é mais pontual, ocorrendo um distanciamento afetivo/emocional bem mais acentuado.

Esse distanciamento, talvez, torna-se um entrave para que avaliações possam ser desenhadas sob as realidades subjetivas e considerando as diversas realidades de contextos sociais que estão representados nas salas de aulas das universidades. Desta forma, todos são submetidos ao mesmo modelo de avaliação, em um ideal de tornar o processo mais justo, quando na verdade se transforma em um instrumento que normaliza a exclusão (FERNANDES; FREITAS, 2007). De tal modo, é estabelecida uma relação instrumentalizada do conhecimento, na qual o professor “oferece” o mesmo conteúdo a todos e sobre essa lógica as aprendizagens são “cobradas” tendo como premissa a submissão de todos ao mesmo processo.

Fica evidente, por conseguinte, como a cultura avaliativa está cercada por diversas influências, de tal modo que sua função passa exercer outros papéis, pois conscientemente ou inconscientemente os professores revelam sua concepção de educação, sociedade e conhecimento pela execução de sua prática. Por isso, vencer o modelo de avaliação que se estabeleceu na prática docente é um processo complexo, visto que “[...] essa mudança de rumo representa-lhes, ao mesmo tempo, a desmistificação do poder da avaliação exercida sobre os estudantes e de outra visão do seu papel de professor, não mais entendido como transmissor de conteúdos” (HOFFMANN, 2002, p. 80).

Outro fenômeno que emerge da cultura avaliativa na Educação Superior é o uso frequente da verificação, ou seja, após os conteúdos serem desenvolvidos ao longo de determinado período, o docente estipula uma data na qual será aplicado o instrumento de coleta de dados, aplica-o e corrige-o, posteriormente lhes conferindo uma pontuação (nota/conceito) e finalizando com sua submissão ao sistema. Desse processo, não surge uma reorientação do trabalho pedagógico, uma reflexão sobre os dados que foram obtidos, um diagnóstico com uma consequente tomada de posição. Destarte, a avaliação perde sua função, sendo, dentro desse processo ritualizado de avaliar, confundida com a mera verificação e classificação (LUCKESI, 2011a).

A diferença entre praticar a avaliação ou a verificação da aprendizagem recai sobre a decisão que será tomada a partir dos resultados. Na avaliação, os resultados oferecem subsídios para o posicionamento frente ao objeto que está sendo avaliado. Na verificação, o resultado fica estagnado na quantificação.

 

Os instrumentos e critérios: exame versus avaliação

O ato de avaliar se concebe a partir de diversas ações ao longo de sua execução, entre elas estão os procedimentos e/ou instrumentos que são parte fundamental na efetivação de sua prática. Na perspectiva de Schon e Ledesma (2008), os instrumentos avaliativos são:

[...] todas as manifestações dos alunos que permitem ao professor acompanhar o processo ensino-aprendizagem, como por exemplo: testes, trabalhos, tarefas, resenhas, textos, pesquisas, trabalhos em grupos, apresentação oral, expressão corporal etc. A observação do professor quando registrada em forma de conceito ou notas torna-se um instrumento avaliativo (SCHON; LEDESMA, 2008, p.05).

 

Esses também são frutos de diversas tensões no contexto avaliativo, pois a depender de como são utilizados contribuem para ditar ritmos na prática avaliativa. Nessa, o ato de examinar permanece supervalorizado, carregando consigo as marcas que caracterizam um processo de ensino e aprendizagem tradicional e técnico.  Contrapondo-se a este quadro, surgem a inserção de novos instrumentos, critérios e a discussão sobre o feedback associados a intencionalidade dos objetivos de aprendizagem, com vista romper como a mera explicação de exames, que assume caráter punitivo e regulador.

A pedagogia do exame é um dos principais elementos que opera a favor de diversos equívocos comuns no processo de ensino e aprendizagem nos vários níveis de ensino. Utilizados no exército chinês 3.000 anos antes da era cristã e sistematizados entre os séculos XVI e XVII, ainda atua, mesmo que dentro de diversas dimensões específicas, no campo da avaliação (LUCKESI, 2011a), na qual, entre outras formas, assumiu um lugar privilegiado de influência na caracterização dos procedimentos/instrumentos usados na esfera avaliativa.

Como visto, tais instrumentos são utilizados há milênios como formas de “educar” e disciplinar determinados grupos sociais. A história brasileira demonstra que ocorriam no cotidiano escolar, no século XIX, desde essa época os exames que já assumiam um lugar de destaque, pois associado a eles estavam os castigos escolares, como o uso da palmatória, por exemplo (SOUZA; FREITAS, 2012).

Essa perspectiva histórica revela o quanto o processo de educação tradicional foi construído e mediado por concepções associadas ao medo e ao disciplinamento como recurso para garantir o aprendizado e o comportamento.

Luckesi (2011b) discorre que tanto nos exames quando na avaliação existe a necessidade dos chamados instrumentos de coleta de dados, ou seja, uma maneira de acompanhar se determinados objetivos de aprendizagem foram alcançados pelos educandos. Acrescenta que não praticar o exame, não necessariamente implica estar avaliando, pois a diferença entre o avaliar e examinar está presente nas concepções pedagógicas por trás de determinadas práticas e não apenas pelos procedimentos utilizados, pois na avaliação os dados coletados serão utilizados como diagnóstico, enquanto no exame apenas para classificar.

 O uso de instrumentos não deve ser utilizado sem nenhuma preparação prévia ou reflexão, existe a necessidade de estarem de acordo com as demandas específicas de cada conteúdo, desse modo, devem oferecer suporte para refletir da maneira mais clara possível os rumos das aprendizagens.

Por isso, ressalta-se a importância em relação à compressão sobre os instrumentos de coleta de dados para a avaliação, ou seja, mecanismos que buscam oferecer um caminho mais justo e democrático para a observação e acompanhamento da aprendizagem, visto que “[...] eles ampliam nossa capacidade de observar a realidade. Sem esse passo, nossa prática avaliativa carece de base [...]” (LUCKESI, 2011b, p. 300-301). Reitera-se, ainda, a importância de não reduzir o processo de avaliação aos momentos que se realiza a verificação das aprendizagens, pois os instrumentos servem para coletar dados que são importantes para a observação da execução da prática avaliativa, mas por si só, não representam o processo dinâmico e complexo que consiste a avaliação.

 Na Educação Superior, evidencia-se que o uso de instrumentos alimenta uma avaliação que contribui para selecionar e classificar, quase que em um processo de ritualização em torno de sua prática avaliativa. Dão as aulas, aplicam os instrumentos, corrigem e submetem uma nota (VILLAS BOAS, 2005), valorizando o caráter quantitativo e provocando o distanciamento da reflexão sobre a ação de avaliar e o consequente ato dialógico entre professor e estudante. 

Sendo assim, a avaliação passa a dar lugar ao ato de examinar e selecionar, na qual o professor se distancia de sua função como mediador das relações de ensino e aprendizagem e passa a exercer, através da utilização do exame como instrumento, a função de inspetor, pois segundo Foucault (2009, p. 164) “O exame combina as técnicas da hierarquia que vigia e as da sanção que normaliza. É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir”.

Outro problema relacionado ao uso dos instrumentos diz respeito a pouca diversidade e ao uso isolado dos mesmos, implicando em uma coleta de dados insuficiente, consequentemente apresentando resultados que podem não representar a realidade do processo avaliativo e dos avanços na aprendizagem.

Contrapondo-se a isso, Chulek (2014); Lima, Grillo e Harres (2010) defendem que a aprendizagem deve ser avaliada de diversas formas, possibilitando que o professor possa ter uma gama maior de informação em relação aos processos de aprendizagens dos educandos ao longo do seu percurso, além de colaborar para que a pluralidade na expressão das diversas formas de conhecimento possa ser alcançada.

 

O caminho metodológico da pesquisa

O percurso metodológico da pesquisa foi orientado pelo o prisma da pesquisa quali-quantitativa com uma abordagem exploratória.  Enquanto a pesquisa quantitativa busca auxiliar a compressão de dados de perspectiva menos subjetiva, contribuindo para alcançar a compreensão da questão que foi levantada, a qualitativa pode ser caracterizada como tendo o objetivo de contribuir para analisar a subjetividade dos dados (RICHARDSON, 1989; FLICK, 2013).

O estudo de caso foi escolhido como estratégia metodológica para entender as questões que envolvem o processo de avaliação da aprendizagem no contexto do ensino superior com foco na formação docente, no qual o curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba como fonte de representação de análise posta em questão. O estudo de caso se caracteriza “não como via de detenção de informação complementar, mas como momento essencial na produção de conhecimentos e constitui um processo irregular e diferenciado que se ramifica à medida que o objeto se expressa em toda sua riqueza”(GONZÁLEZ REY 2005, p. 71).

O primeiro instrumento utilizado foi à análise dos documentos oficiais. Aqui se respaldou na pesquisa documental como caminho norteador do processo de coleta de informações que pudesse colaborar para compreender o objeto em questão. Para Godoy (1995) a pesquisa documental oferece fonte de informações relevantes e que são capazes de aumentar a amplitude de discussão dos dados. 

Partindo destes pressupostos teóricos, foram analisados os seguintes documentos: Regulamento dos Cursos Regulares de Graduação da UFPB; Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de licenciatura em Ciências Biológicas da UFPB e quatorze planos de curso dos componentes curriculares ministrados pelos docentes do curso de LCB da UFPB.

A pesquisa online foi à segunda rota percorrido para a coleta de dados. Esse tipo de procedimento é caracterizado por possuir metodologias características da pesquisa social aplicadas ao modelo online (FLICK, 2013). Para o autor, métodos para a coleta de informações dos interlocutores da pesquisa como levantamentos, entrevistas, grupos focais e a etnografia podem ser alcançados pelo emprego de recursos online.  Entre os métodos que podem ser utilizados para coleta de dados online, optou-se pelo uso de questionários, que na perspectiva de Lakatos e Marconi (2011), é um formidável material para a coleta de dados.

Os dados foram coletados por dois tipos de questionários. O primeiro foi direcionado aos docentes e o segundo foi direcionado aos discentes do curso. Ambos os instrumentos possuíam questões análogas que serviram como eixo para analisar um mesmo fenômeno segundo as diferentes perspectivas do público alvo, pois ambos compartilham a prática avaliativa, no entanto, por lados distintos, revelando o potencial que esse instrumento possui para a coleta de dados (LAKATOS; MARCONI, 2011).

O público alvo da pesquisa foram 14 docentes que ministraram disciplinas para o curso de LCB nos períodos 2019.1 e 2019.2 e 29 discentes que estavam cursando o penúltimo ou último período do curso.  Os docentes foram identificados pelo código (Docente) “D” os discentes por DCB (Discente de Ciências Biológicas) e os Planos de Curso por PCD (Plano de Curso Docente). Em cada código existe um numeral que corresponde à ordem das respostas nos questionários.

De posse dos materiais, foi realizado o processo de análise documental. Inicialmente, se segue as indicações das etapas para a realização deste tipo de pesquisa. A avaliação preliminar deu-se através dos indicativos de Sá-Silva; Almeida e Guindani (2009). Observou-se o contexto sócio político aos quais os documentos, em questão, foram coletados e construídos; as vozes que estavam por trás de sua construção, ou seja, os autores; verificou-se a confiabilidade e a autenticidade dos documentos; a natureza dos textos, bem como as condições e objetivos em que foram construídos; por fim, foram observados os conceitos chaves e a lógica interna do texto.

Vencida esta etapa, deu-se continuidade realizando a análise dos documentos. A segunda fase foi orientada por um roteiro. A partir dele cada documento foi confrontado segundo os itens e critérios presentes no roteiro de análise. Após isso, foi reunido elementos da problemática e do quadro teórico do tema em questão a fim de traçar e identificar a perspectiva de avaliação da aprendizagem que emergia das informações presente nos documentos.

Não poderìamos deixar de mencionar que os dados  foram analisados por meio da análise de conteúdo segundo Bardin (2016) e Franco (2012). As informações de cunho subjetivo passaram pelas seguintes etapas de pré-análise que se constitui em um processo de organização do material que será analisado; a segunda etapa corresponde à exploração do material, nessa foi realizada a codificação e a construção das categorias de análise; e por fim, a terceira etapa que consistiu quando os resultados foram tratados e submetidos a processos de interpretação, inferência e crítica das informações coletadas.

A concepção de avaliação da aprendizagem a partir dos documentos oficiais: o que se prescreve?

O primeiro documento foi o Regulamento dos Cursos Regulares de Graduação da Universidade Federal da Paraíba, este toma como finalidade normatizar e consolidar os cursos de graduação, representando indicativos para o desenvolvimento das atividades acadêmicas, sendo, portanto, um marco legal para a UFPB.

No capítulo I do título X, o documento trata acerca do tema avaliação da aprendizagem, definindo da seguinte forma:

 

Entende-se por avaliação da aprendizagem o processo formativo contínuo que compreende diagnóstico, acompanhamento e somatório da aquisição de conhecimentos, habilidades e atitudes pelo estudante, mediado pelo docente em situação de ensino, expressa em seu rendimento acadêmico e na assiduidade (UFPB, 2015, p. 42-43).

Por tal afirmação, o documento prevê a avaliação da aprendizagem em uma perspectiva bem ampla, contemplando aspectos que demandam do processo avaliativo uma ação contínua de caráter formativo, proporcionando através do diagnóstico. Além disso, caracteriza o professor como mediador dessa ação, o qual deve não apenas observar aspectos de aquisição do conhecimento para avaliar o estudante, mas também habilidades e atitudes, imprimindo uma postura avaliativa integral em relação aos sujeitos avaliados.

No § 2º do Art. 87 algumas especificidades sobre como o processo de avaliação deve decorrer apresentam novas perspectivas sobre o tratamento do tema no documento. Dentre eles, especificam que a ação avaliativa seja dada através do “[...] acompanhamento contínuo de desempenho das atividades didáticas do estudante, e como resultado final dos processos de ensino-aprendizagem” (UFPB, 2015, p. 43). O início da sentença vai ao encontro do que foi exemplificado em sua definição inicial sobre o tema, no entanto, aparece uma bifurcação de sentido quando aponta que além do acompanhamento haverá também a apreciação sobre o resultado do processo. Este pode oferecer diversas visões sobre o tema, pois o acompanhamento não significa, em totalidade, a ultrapassagem de avaliação fragmentada, sobre esse caso Luckesi (2011b, p. 59) observa que “visões teóricas serão somente visões teóricas se não se traduzirem em prática, ou seja, que produzem resultados no cotidiano”. Já a apreciação pelo resultado traz características que se relacionam à perspectiva tradicional de avaliação.

Outras características do documento oferecem mais elementos que permanece com o tema centrado entre duas perspectivas. Apesar de contemplar o processo de acompanhamento e continuidade, reduz a avaliação do estudante pela expressão “[...] por nota compreendida entre 0 (zero) e 10 (dez), atribuída a cada verificação parcial e ao exame final” (UFPB, 2015, p. 44). Além disso, a aprovação será condicionada ao alcance da nota (cinco) ou superior em cada disciplina, mantendo, também, uma assiduidade de 75% nas atividades realizadas ao longo do período letivo.

De pouco adianta a defesa por uma ação formativa se for meramente um elemento teórico. Se seu método de desenvolvimento for orientado pela ação executada em momentos fragmentados de verificação pela lógica do exame e da atribuição de notas que apenas conservará aspectos mecanicistas da educação, portanto, não ocorrendo à ação formativa. 

 Mas não é somente sobre esses aspectos que o documento versa. O processo de feedback, ainda que de forma superficial, aparece inserido na normatização em diversas direções. Apresenta e destaca a importância da discussão sobre resultados, como especificados no seguinte trecho:

 

O docente deve discutir os resultados obtidos em cada procedimento e instrumento de avaliação junto aos estudantes, esclarecendo as dúvidas relativas às notas, aos conhecimentos, às habilidades, aos objetivos e aos conteúdos avaliados (UFPB, 2015, p. 44).

 

Além disso, garante a importância de que os estudantes possam ter acesso prévio sobre como se dará o processo avaliativo, a qual instrumentos serão submetidos, assim como a oportunidade de questionar os resultados obtidos. Tal perspectiva, se cumprida em prática, apresenta uma fuga em relação à mera aplicação de exames e aferição de resultados e oferece espaço para o diálogo em torno dos objetivos de aprendizagem que se precisa alcançar tornando a avaliação um momento que passa a garantir a melhoria da aprendizagem na Educação Superior.

Todavia, apesar de tais sinalizações, o documento, de modo geral, conserva uma descrição técnica e burocrática sobre o processo avaliativo, o qual passa a assumir uma postura de controle estabelecida através da elaboração de regras que regerão essa etapa, afastando-se de aspectos que possam oferecer espaço para que o ensino e aprendizagem caminhem junto a uma avaliação concebida para promover e não apenas verificar e exercer controle (HOFFMANN, 2018).

Explicitado esses indicativos nos Regulamento dos Cursos Regulares de Graduação da Universidade Federal da Paraíba, a seguir são tecidas considerações em torno das perspectivas sobre avaliação da aprendizagem que se desenham a partir do PPC e dos planos de curso.

Outro documento utilizado como arcabouço para a pesquisa foi o Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFPB, Campus I, do ano de 2018. O PPC representa mais que um conjunto de normas e regras que devem ser implantadas e seguidas, mas torna-se um elemento de conotação prática, reflexão e revisitação, que possa espelhar de forma eficaz na formação dos seus sujeitos alvos, pois como menciona Gadotti:

Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade [...] As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autoras (GADOTTI, 1994, p. 579).

Semelhante ao Regulamento dos Cursos de Graduação, o PPC apresenta alinhamentos generalistas sobre alguns encaminhamentos para o desenvolvimento das atividades do curso. Em relação ao tema avaliação da aprendizagem, não foi encontrado nenhuma sentença explícita em seu conteúdo que fizesse menção em relação à forma que a avaliação da aprendizagem deveria ser desenvolvida nos componentes curriculares do curso, quais instrumentos ou formas de acompanhamento deveriam ser utilizados durante o processo, como também o propósito e finalidade impressa em sua ação.

Contudo, denota-se que a proposta pedagógica que está ancorada, traz em seu conteúdo elementos que podem apresentar avanços no campo da formação docente, e consequentemente em relação à prática avaliativa, pois como mencionado ao longo deste trabalho, ainda existem tensões nesse campo que requerem um olhar atento. Entre eles encontra-se a dualidade entre componentes curriculares das áreas pedagógicas e específicas, torna-se a formação fragmentada e sem conexão com a prática docente, o que pode distanciar temas e questões envolvendo o processo avaliativo ainda mais ausente.

Como foi observado por Gatti (2010), existe uma forte tendência de caráter histórica que ocorre nos cursos de licenciatura uma sobreposição das áreas específicas em relação às pedagógicas. No caso dos cursos de LCB, a autora observou haver uma forte discrepância entre à carga horária dos componentes curriculares específicos (65,3%) e dos relacionados à formação docente (10%).  No PPC aqui analisado, constata-se haver uma preocupação em romper com o espelhamento na formação para o bacharelado, quando enfatiza que:

[...] encontra-se em consonância com os princípios gerais norteadores da formação docente e está constituindo de bases teóricas sólidas que abrangem tanto os conhecimentos teóricos do campo específico da Biologia (desde os fundamentos base da Biologia, seu desenvolvimento histórico as suas interações com as diversas áreas), quanto os fundamentos da Educação (nos seus pressupostos político-pedagógicos, didático-metodológicos, sócio históricos, psicológicos, filosóficos, organizacional e curricular) (UFPB, 2018, p. 15).

Ademais, em sua nova estruturação, visualiza-se, também, que as disciplinas de cunho pedagógico passaram a se situar nos períodos iniciais e finais do curso, juntamente com as específicas. Sobre tal aspecto, destaca-se a inserção do componente curricular Avaliação da Aprendizagem como obrigatório e não mais como optativo, como na antiga matriz curricular do ano de 2006. Ressalta-se, também, a criação do novo componente curricular Formação Docente em Ciências Biológicas, que busca dialoga sobre temas relacionados à licenciatura já no primeiro período do curso. Torna-se, desse modo, um avanço em relação à discussão desse tema na formação dos futuros professores e oferece espaço para que os mesmos possam refletir sobre como essa prática é realizada nos demais componentes curriculares, contribuindo para desenvolver o perfil profissional que é indicado no documento, o qual deve estar pautado no desenvolvimento de habilidades e competências integradas ao processo de ação-reflexão-ação (UFPB, 2018), contribuindo para fomentar a discussão e as concepções relacionadas à prática avaliativa no seu fazer docente.

Em relação aos planos de curso foi observado o conteúdo descrito no tópico “Procedimentos de Avaliação da Aprendizagem”. Apesar de ser um tópico comum presente neste documento, observa-se que existem algumas semelhanças e diferenças na forma como o conteúdo é descrito. Alguns docentes acabam dando ênfase em pontos semelhantes enquanto divergem em outros.

Inicialmente, a descrição acerca da condução da avaliação toma dois caminhos distintos. Parte deles se reporta ao desenvolvimento do processo avaliativo em seu componente curricular resumindo a aplicação dos instrumentos de coleta de dados, não sendo feito referência a nenhuma corrente teórico-metodológica do campo, tão poucas são utilizadas tipologias da área, como se observa nos seguintes trechos retirados dos planos de curso um e três, respectivamente:

Avaliação: Provas escritas com questões discursivas; Teste de avaliação; Relatórios Estudos dirigidos (PCD1).

A avaliação consistirá de três provas teóricas (75% dos pontos), um seminário e a entrega e apresentação de um artigo (25% dos pontos) (PCD3).

Na contramão dessa perspectiva, outros planos de curso indicam a construção de uma prática avaliativa planejada a partir dos pilares da observação e acompanhamento contínuo ao longo do processo, privilegiando elementos que vão além da mera aplicação de instrumentos e estipulação de notas.

Avaliar requer romper o modelo de transmissão e decodificação da informação para replicá-la em testes. Como enfatizado nas sentenças presentes nos planos de curso, conceber a avaliação tendo como parâmetro a observação do processo e não apenas o final, requer do avaliador a criação de situações que evoquem o diálogo. Que gerem perguntas sem necessidade de uma resposta pré-definida, pois como é exposto por Hoffmann (2018, p. 85), avaliar é “[...] promover experiências interativas que signifiquem provocações intelectuais significativas no sentido do desenvolvimento do aluno”.

Outro fator que se mostrou de forma escassa foi à condução do processo avaliativo de modo a privilegiar situações que pudessem contribuir para aperfeiçoar e desenvolver habilidades relacionadas ao campo da docência em Ciências e Biologia, diferente do que foi destacado pelo docente (PCD12):

 

[...] Oficinas pedagógicas na sala de aula; Relatório da análise crítica dos conteúdos dos livros didáticos de Ciências (6° ao 9° anos) sobre meio ambiente e saúde; Relatório da atividade didático-prática (oficina pedagógica) em uma escola pública (ensino de ciências do 6º ao 9º anos ou ensino de biologia – ensino médio); [...] ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA (ensino médio); [...] RELATÓRIO DA APLICAÇÃO DE UMA ATIVIDADE DIDÁTICO-PRÁTICA (Oficina Pedagógica) EM UMA ESCOLA PÚBLICA (fundamental ou médio).

Observa-se que houve a preocupação em idealizar o processo de ensino e aprendizagem associado à distribuição de atividades que colocam o estudante frente a sua futura área de atuação. A avaliação passou a contemplar não apenas elementos teóricos que pudessem ser respondidos através de questões, mas desafia o estudante a mobilizar conhecimentos de diversas áreas de sua formação e aplicá-los de forma prática, possibilitando inseri-lo em situações reais de sua profissão.

Esse cenário contrapõe-se aos modelos vistos em outros planos de curso, pois apresenta em suas descrições a utilização de instrumentos comuns como provas e seminários, bem como a ausência na elaboração de critérios, de tal forma que não contribuem suficientemente na criação de problematizações necessárias para que os futuros professores possam visualizar formas de desenvolver uma cultura avaliativa que vá além da aplicação de exames e consequente classificação, pois como apontado por Gatti (2003, p. 111), é através dos atravessamentos com o exercício da atividade docente que são estabelecidos “[...] propósitos claros e consensuais alimenta um processo de avaliação mais consistente e mais integrado na direção de uma perspectiva formativa, voltada para o desenvolvimento dos alunos e não para cumprir uma formalidade burocrática [...]”.

É oportuno notar, também, que mesmo sendo um espaço de síntese para discorrer sobre o desenvolvimento dos aspectos avaliativos, alguns docentes privilegiaram expor informações que poderiam ser discutidas de forma presencial, como:

[...] o aluno precisa ter, pelo menos, 75% de frequência. Abaixo disso será reprovado por falta. Fiquem atentos e controlem suas faltas” (PCD9).

 

Revelando uma preocupação em seguir normas técnicas e burocráticas relacionadas ao que é estabelecido nos documentos oficiais da Universidade e deixando um vácuo na exemplificação de como ocorrerá o processo avaliativo no componente curricular.

 

Os instrumentos e critérios segundo docentes e discentes da Licenciatura em Ciências Biológicas: o que se vivencia?

Um dos principais aspectos relacionados à algumas tensões que ocorrem na condução da prática avaliativa relacionam-se aos tipos de instrumentos que são utilizados pelos docentes, seja pelo modo autoritário que são utilizados, pelo caráter de aferição que assumem ao serem usados apenas com o intuito de penalizar e atribuir nota.

No contexto do curso aqui estudado, buscou-se identificar os instrumentos que são utilizados durante o processo de avaliação da aprendizagem.  A prova objetiva e subjetiva (57,1%) e o Seminário (64,3%) foram os mais representativos na perceptiva dos/das docentes.  Fora as demais modalidades de provas que foram indicados no momento da pesquisa, o estudo dirigido (28,6%), pesquisas (42,9%), relatório (42,9%) e microaulas (35,7%) também foram apontados por grande parte dos docentes.

 Esse cenário oferece dois indicativos. O primeiro está associado à prova como instrumento prevalecente na prática dos docentes. O segundo diz respeito à diversidade de instrumentos utilizados pelos docentes. Por ser um curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, é possível notar a prevalência de alguns instrumentos que estão relacionados à parte específica do curso, quando da parte pedagógica, como, por exemplo: estudo de caso, estudo dirigido, relatório e microaulas.

Essa diversidade de instrumentos pode apresentar contribuições positivas para o processo de ensino e aprendizagem. Quando avaliados através de instrumentos diversos, pode possibilitar que a informação que se busca coletar seja mais consistente e fiel a realidade. Além disso, contribui para que o sujeito avaliado seja capaz de demonstrar habilidades que poderiam não ser possíveis através de uma prova. 

Já na perspectiva dos/das discentes, o cenário se mostra diferente. Para esse grupo, seminário e relatório, ambos com 96, 6%, foram indicados como sendo presente na prática avaliativa dos docentes. Para o instrumento prova e suas respectivas modalidades, diferente do que foi observado entre os docentes, todas tiveram mais de 75,9% de representatividade.

Tais indicativos mostram, na visão dos discentes, que a prova em suas modalidades, ainda é o instrumento frequentemente utilizado no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas. Esse instrumento carrega consigo uma série de tensões e impasses, primeiro porque pode exercer apenas o papel de quantificar determinados fragmentos de conhecimentos, o qual pode conservar elementos quantitativos que podem servir como classificador. Segundo, a depender de como é concebida, pode servir como alternativa para acompanhar o aprendizado de determinados conteúdos, no entanto, assim torna-se um instrumento não apenas para identificar os “erros” de quem está sendo avaliado, tão pouco, para ser um veredicto final sobre a aprendizagem.

Outro importante processo no contexto da avaliação da aprendizagem, diz respeito ao modo como é desenvolvido e se é desenvolvido o feedback ao logo do processo de ensino e aprendizagem e auxílio aos instrumentos avaliativos. O modo como o feedback é desenvolvido pelo docente e como é percebido pelo discente pode contribuir para prática avaliativa, assim como sua ausência pode trazer fragilidades.

Entre os docentes participantes da pesquisa, todos afirmaram realizar o feedback  durante o desenvolvimento do componente curricular que ministra para o curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, oferecendo, inicialmente, indicativos da concepção da avaliação associados a um processo integrativo  e que promove o feedback, ou seja, permite a retomada e oferece espaço para que o conhecimento possa ser construído de forma contínua. Todavia, buscou-se compreender, também, de que forma os docentes realizam o feedback no componente curricular ministrado.

Das sete categorias resultantes, as de maior representatividade foram Através do diálogo (35,7%) e Correção em sala de aula (28,6%), sendo as demais (Disponibilização dos instrumentos, Questionário, Através de dinâmica, Discussão, Indicação de erros e acertos) representadas por 7,1% cada.  É possível observar que os docentes apontaram diferentes formas de fazer o feedback em seu componente curricular. Na categoria que está representada por Através do diálogo, corresponde aos docentes que trabalham o feedback centrado no estabelecimento do diálogo como caminho que possa oferecer ao discente, um momento para verificar o seu desempenho no instrumento avaliativo que participou, como aponta o (D6):

Todas as atividades são corrigidas individualmente com a presença do estudante, e é realizado o diálogo para identificação de quais pontos estão corretos e quais precisam de adequações. Posteriormente os estudantes tem um prazo para entregar a atividade corrigida.

Como pode ser visto na resposta do docente, esse momento não é apenas dedicado a mostrar o instrumento ao discente e seu respetivo desempenho nele. O diálogo estabelecido visa trazer um redirecionamento sobre o desempenho, mostrando o alcance no que foi obtivo e o que ainda precisa de adequações. Nesse sentido, oferecendo a importunidade de trabalhar e refletir sobre o que ainda está sendo demandado, ou seja, o feedback passa a ser genuinamente trabalhado, estabelecendo um acompanhamento dinâmico e ativo, que segundo Hoffmann (2019) é capaz de contribuir para a fundamentação da ação pedagógica e do desenvolvimento e observação dos avanços ao longo da construção do conhecimento.

Já outras respostas que refletem a categoria Correção em sala de aula, é representada pelos docentes que estabelecem o feedback baseado na correção no instrumento de coleta de dados que foi aplicado junto aos discentes. Nesse caso, eles dedicam um momento da aula para fazer uma análise do que seria esperado do instrumento que foi aplicado. Nesse caso, seria uma forma generalista de identificar os alcances e as discrepâncias encontradas, como menciona o D6: “Mostro a avaliação e em sala de aula comento os acertos e equívocos principais”.  Nesse caso, o feedback dado não oferece subsídio que indicam um análise individual de cada discente, assim como não apresenta indicativos de que possíveis equívocos poderiam ser corrigidos. 

Ademais, outro ponto observado é a escassez de feedback em outros tipos de instrumentos e centrando, prioritariamente, nas  “provas”, como pode ser  visto nas seguintes respostas dos D2 e  D10, respectivamente: “A prova é corrida em sala”; “Ocorre em cada prova, com sinalização do que ficou faltando o do que foi escrito de forma equivocada equivocada [...]”. Mais uma vez a prova passa a ser frequentemente relatada tanto pelos docentes, quando pelos discentes, carregando consigo elementos de uma avaliação fragmentada e verificadora, tal como é observado por Olenir (2005):

Apesar de ser muitíssimo utilizada nas práticas atuais, em se tratando de avaliação processual, esse instrumento não cumpre um papel significativo. Aplicar a prova, nos moldes tradicionais, provoca uma ruptura com o processo de ensino-aprendizagem, além de favorecer a ênfase à nota, que acaba servindo apenas para classificar o aluno e não para diagnosticar a realidade avaliada (OLENIR, 2005, p.181).

 

Para os discentes foi levantado o mesmo questionamento, se os docentes do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas exercem o feedback em sua prática docente. Para estes foram dadas três opções de respostas e a oportunidade de argumentar o posicionamento escolhido.

Os discentes indicam que nem todos os docentes do curso realizam o feedback ou dão alguma tipo de devolutiva sobre o processo de ensino e aprendizagem e, consequentemente, da avaliação da aprendizagem. Os respondentes (10,3%) apontaram que nenhum dos professores realiza o feedback, outros 20,7% indicaram que eles realizam e os 69,0% mais representativos indicaram que apenas alguns dos docentes realizam tal prática.

Os resultados apontados podem revelar que os discentes tiveram experiências distintas em relação ao modo como a avaliação foi desenvolvida e praticada nos componentes curriculares que cursaram, principalmente com relação ao modo como os resultados foram trabalhados pelos docentes. Esses indicativos podem servir para compreender o modo como os docentes concebem esse processo, uma vez que, se não há uma retomada, indicativos de melhoria, acompanhamento e a presença de uma devolutiva/feedback, a avaliação pode estar sendo exercida como verificação, na qual os resultados que foram obtidos servem  apenas para quantificação (LUCKESI, 2011b).

Mesmo entre os discentes que responderam sim para esse questionamento, foi possível encontrar justificativas que realçam aspectos da prática docente. Como foi colocado pelo discente, o feedback é tratado de forma superficial e não torna uma estratégia capaz de contribuir de forma eficaz para a aprendizagem.

 

Sim, por

Com relação aos documentos oficias escolhidos para a pesquisa, notou-se que eles indicam perspectivas distintas sobre a avaliação da aprendizagem. O regulamento dos cursos de graduação, apesar de fazer algumas indicações que possam tomar uma perspectiva formativa, ainda sinaliza uma forte aparência tradicional, sendo tratada como processo técnico e burocrático. O PPC não faz referências diretas ao que foi pesquisado, mas oferece elementos que indicam uma postura integrativa do tema ao curso através da inserção do componente curricular no novo PPC. Nos planos de curso, houve duas perspectivas dicotômicas, na qual o tema assume tanto uma visão de avaliação como processo integrado, quanto apenas como momento para aplicação de exames.

Os instrumentos avaliativos utilizados no curso são diversos. No entanto, havendo divergência entre as perspectivas dos pesquisados. Entre os docentes prevaleceu a utilização de provas, enquanto que para os discentes foram mais utilizados os seminários e relatórios. Associado aos instrumentos também foi indicado a realização do feedback, todavia, nem sempre praticado de forma adequada. A utilização dos critérios também foi sinalizada de forma diversas, havendo contribuições tanto positivas como negativas.

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