Metadados do trabalho

O Lugar Da Avaliação Da Aprendizagem No Contexto Da Formação Inicial De Professores De Ciências Biológicas

Maria de Fátima Camarotti; Joseval dos Reis Miranda; Flávio Vieira Carvalho da Silva

Esta pesquisa tem como objetivos analisar as concepções sobre avaliação da aprendizagem dos docentes e discentes do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas (LCB) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e identificar entre os discentes de LCB da UFPB como as vivências em seu curso que promoveram a reflexão e preparação para o processo de avaliação da aprendizagem. A pesquisa se caracteriza como um estudo de caso que tem como abordagem a pesquisa quali-quantitativa e exploratória. Os dados foram coletados através de questionários junto ao público-alvo que são docentes e discentes do curso de LCB da UFPB, Campus I, João Pessoa. A análise e intepretação dos dados foram realizadas através da análise de conteúdo. Os resultados indicam que tanto os docentes quanto discentes associam o tema e concepções distintas. Desse modo, a avaliação da aprendizagem tem sido concebida no curso de LCB mediada por diversas visões e práticas distintas, nas quais ainda se perduram a avaliação sendo exercida apenas pela lógica tradicional, na qual se conservam elementos de uma ação de verificação da aprendizagem, através de momentos estanques que ocorrem pela aplicação de exames.

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Como citar este trabalho

CAMAROTTI, Maria de Fátima; MIRANDA, Joseval dos Reis; SILVA, Flávio Vieira Carvalho da. O LUGAR DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2021 . ISSN: 1982-3657. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/149-o-lugar-da-avalia%C3%A7%C3%A3o-da-aprendizagem-no-contexto-da-forma%C3%A7%C3%A3o-inicial-de-professores-de-ci%C3%AAncias-biol%C3%B3gicas. Acesso em: 16 out. 2025.

O LUGAR DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

Pelos indicativos da literatura, sejam as já consolidadas na área ou as mais recentes, a avaliação da aprendizagem sempre foi um dos eixos motores do processo de ensino e aprendizagem. No entanto, seu papel nem sempre ficou bem definido no campo educacional, ora era utilizada apenas como forma de verificar e classificar, ora sendo colocada como instrumento de poder nas instituições de ensino, usada a favor de disciplinamento e afastando- se ainda mais do seu papel de mediadora da aprendizagem (CARMINATTI; BORGES, 2012). Mesmo diante do cenário de constantes mudanças no campo da educação, das pedagogias que nascem como alternativa a perspectiva tradicional de ensino, a avaliação continua ocupando pouco espaço no debate, sendo ainda, confundida com a aplicação e correção de exames.

Deste contexto também emergem novas perceptivas teóricas que passam a inserir o tema sobre novos recortes. Agora, vista como um mecanismo orientador do processo de ensino e aprendizagem, que perpassa a mera aplicação de exames, classificação e exclusão dos sujeitos. Assume uma perspectiva multifatorial, não sendo apenas um fenômeno de ordem pedagógica, mas também relacionado com o campo político e social. Na Educação Superior, seu debate ainda é escasso, sua função ainda conserva o caráter de aferição do conhecimento adquirido ao longo de determinado período de tempo e se finda na estipulação de notas ou conceitos.

A avalição da aprendizagem problematizada na formação inicial carrega consigo uma série dos fatores que podem impactar o desenvolvimento das concepções e práticas avaliativas dos futuros professores. Entre eles estão os modos de como o tema é tratado nos cursos, nem sempre ocupado lugar de debate, seja nas esferas institucionais ou através das componentes curriculares. Também ocorre devido à forma ainda tradicional e técnica que a avaliação é desenvolvida por alguns docentes universitários.

Tendo como plano de fundo esse cenário, a pesquisa tratou sobre as seguintes questões: Quais as concepções de avaliação da aprendizagem dos docentes e discentes do curso de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba? e Como os discentes de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba percebem as vivências em seu curso e o impacto em sua formação para saber avaliar?.

Para responder a essas questões tomamos como objetivos analisar as concepções sobre avaliação da aprendizagem dos docentes e discentes do curso de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e identificar entre os discentes de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFPB como as vivências em seu curso que promoveram a reflexão e preparação para o processo de avaliação da aprendizagem.

Avaliação da aprendizagem: perspectivas e desdobramentos

Nas linhas subsequentes, propõe-se dialogar acerca da avaliação enquanto prática presente nos diversos níveis de ensino, sendo um dos agentes do processo educativo. Portanto, sua discussão será circundada dentro de uma dimensão pedagógica, considerando a incorporação das demais dimensões como fatores influentes em seu desdobramento.

A origem e exposição do termo avaliação da aprendizagem se deu por intermédio dos estudos do educador norte-americano Ralph Tyler, nos anos de 1930, diante da sua preocupação com o grande número de estudantes que eram reprovados na época. No Brasil, o termo passou a ser discutido na esfera educacional durante as décadas de 1960 e 1970, surgindo como uma substituição, mesmo que sutil, aos chamados exames escolares, mas só foi incorporado a legislação da educação na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de 1996 (LUCKESI, 2011a).

No entanto, segundo Luckesi (2011a), apenas uma mudança no termo utilizado não foi suficiente para superar a narrativa equivocada que se construiu em torno da avaliação da aprendizagem. As práticas e concepções, fruto da escola moderna durante os séculos XVI e XVII, na qual avaliação era pautada em provas/exames, deixou resquícios até a contemporaneidade.

Nesse contexto, destaca-se que houve um movimento de invertida em torno desse tema a partir dos anos de 1980, ocorrendo uma série de questionamentos e o nascimento de novas vertentes teóricas/metodológicas com foco na superação de modelos arcaicos impregnados nas concepções existentes. Assim, a ideia de avaliação passou a englobar novos contextos, concepções e metodologias.

Sabendo disso, destaca-se que não serão apresentadas todas as terminologias e características em relação ao tema aqui discutido. Para uma melhor compreensão, as concepções teóricas serão divididas em duas lógicas: a avaliação que está a serviço das aprendizagens e a avaliação a serviço da seleção.

Perrenoud (1999, p. 15) é um dos estudiosos que apresenta, em uma de suas obras, essa marcante diferença presente no campo da avaliação. Embasando-se em outros autores, ele enfatiza o papel da avaliação enquanto processo formativo e progressivo rumo à orientação da ação pedagógica. No entanto, ressalta a necessidade de vencer o mero conceito de avaliação formativa apenas por ser um ato que visa acompanhar as aprendizagens durante certa trajetória, pois “O diagnóstico é inútil se não der lugar a uma ação apropriada. Uma verdadeira avaliação formativa é necessariamente acompanhada de uma intervenção diferenciada, com o que isso supõe em termos de meios de ensino”.

Sem essas características, o ato de avaliar cai no lugar comum e fica a serviço da seleção. Dentro dessa lógica perdura o processo de hierarquização com base nos exames que, consequentemente, acabam carregando consigo outros traços comuns presentes na avaliação tradicional, entre eles a comparação e a classificação. Além disso, tais características estão associadas às práticas comuns dos docentes, pois utilizam esses estigmas como estratégia para induzir e reprimir alguns comportamentos relacionados ao processo de ensino e aprendizagem, por exemplo, o interesse dos estudantes pelo conteúdo (PERRENOUD, 1999).

Para Esteban (2010), a avaliação também assume duas concepções bem distintas que se assemelham as que são levantadas por Perrenoud. A primeira, denominada de avaliação como medida, é posta pela autora como um modelo no qual o processo de obtenção de fatos e dados a partir de testes é supervalorizada, tendo como ponto final a classificação dos sujeitos, havendo pouca consideração aos aspectos qualitativos dos mesmos, sendo a medida, dentro dessa concepção, o ponto nuclear do processo avaliativo.

Já na outra vertente, a avaliação assume um papel crítico e reflexivo, se configurando, também, como resultado de demandas políticas e sociais, em que o sujeito se encontra posto a reorganizar seus conhecimentos durante o processo de ensino e aprendizagem. Tal concepção se distancia de meros testes para aferição do conhecimento, ao passo que dialoga constantemente com aspectos qualitativos e sociais, ganhando uma complexidade bem mais ampla, na qual a reflexão e a crítica criam um elo fundamental durante sua execução.

Nas produções teóricas de Hoffmann (2019), também é possível observar o descontentamento com a avaliação sendo reduzida a meras medições, e é ressaltada a urgência de vencer o modelo simplista e limitado que assume a avaliação quando se reduz a verificação de conceitos baseados na dualidade entre certo ou errado, imperando as concepções de observação e julgamento que fomentam o caráter coercitivo da avaliação.

Todavia, Hoffmann (2019) apresenta uma concepção que busca vencer essa problemática, defendendo que a avaliação necessita se apropriar de um caráter não seletivo, mas ser um processo amplo, valorizando o erro enquanto algo construtivo e importante para reorganização dos saberes, vencendo sua comum usabilidade como objeto de penalização.  À vista disto, concebe a avaliação mediadora como sendo “[...] ação, movimento, provocação, a busca de reciprocidade intelectual entre elementos da ação educativa, professores e alunos buscando coordenar seus pontos de vista, trocando ideias, reorganizando-as, transformando-as” (HOFFMANN, 2019, p. 88). 

Destarte, fica nítido até aqui a relação antagonista que existe nos dois modelos de avaliação em discussão, persistindo uma forte vertente que se articula com um ensino tradicional, fragmentado e inflexível, que não considera as particularidades individuais de cada sujeito, ancorando-se numa constante relação vertical entre professor e aluno dentro de uma pedagogia que vai mais ao encontro do sistema do que das reais demandas sociais.

Freire (1987) foi um dos grandes teóricos a criticar esse modelo “mercantilista” de educação “bancária”, e mesmo que não sendo o foco de seus ensaios teóricos, oferece reflexões acerca do tema objeto desse trabalho, pois demonstra que o modelo de educação “bancária” perpassa o campo do ensino e alcança a avaliação ao argumentar que:

Nas aulas verbalistas, nos métodos de avaliação dos “conhecimentos”, no chamado “controle de leitura”, na distância entre educador e os educandos, nos critérios de promoção, na indicação bibliográfica, em tudo, há sempre a conotação “digestiva” e a proibição ao pensar verdadeiro (FREIRE, 1987, p. 64).

Essas colocações sintetizam o forte viés dos processos avaliativos que vão ao encontro a uma perspectiva tecnicista da avaliação, na qual o conhecimento é encarado como uma mercadoria, e a avaliação torna-se o meio para manter os sujeitos aptos a obedecer e repetir o que lhe foi ensinado, quase que de forma mecânica e, dessa forma, ceifando o processo de emancipação humana a partir da educação. Nessa perspectiva, Luckesi (2011a, p. 41) enfatiza que “O medo e o fetiche são mecanismos imprescindíveis numa sociedade que não opera na transparência, mas sim nos subterfúgios”.

Na perspectiva de Luckesi (2011a), as dicotomias das vertentes aqui discutidas rondam em torno dos exames e da avaliação como processo diagnóstico. No ato de avaliar que se reduz aos exames, apresenta-se a forte característica da inércia na condução das aprendizagens, pois o exame implica em obter resultado e classificar, reduzindo o estudante em bom ou ruim, aprovado ou reprovado, tornando o ato de avaliar pontual e sem permissão de retomada, como uma página virada sem nenhuma perspectiva de releitura, na qual os sujeitos carregam consigo a total reponsabilidade por seu “fracasso” ou “sucesso”.

Já a avaliação representa a ação que considera o antes, agora e o depois, que permite retomada, que não se reduz a meros testes, representa investigação que subsidia o processo de diagnose que gera um constante movimento de retroalimentação e visitação em busca das aprendizagens essenciais, se concretiza como diagnóstica quando é “[...] investigação sobre o desempenho escolar, ela gera um conhecimento sobre o seu estado de aprendizagem e, assim, tanto é importante o que ele aprendeu como o que ele ainda não aprendeu” (LUCKESI, 2011a, p. 62).

Como já mencionado, a tradição que permeia a área da avaliação é induzida por diversos fatores. Para Zabala (2015), a redução da avaliação a meras obtenções de dados sobre determinados objetivos de aprendizagens comuns, sofre influência da preparação para a universidade, que visa selecionar os mais aptos. O autor se opõe a essa concepção, pois a educação vai muito além de preparar para a universidade, e explica que o ato de avaliar compreende identificar as experiências já vividas pelos estudantes (avaliação inicial), observar como cada um aprende e responde as estratégias ao longo do processo (avaliação reguladora) e quais foram os resultados obtidos e os conhecimentos adquiridos (avaliação final).

O caráter tecnicista presente na avalição classificatória não representa apenas um processo de exclusão em nível escolar e acadêmico. Por se deleitar apenas sobre os resultados obtidos, oferece informações ínfimas e não é capaz de subsidiar de forma eficaz o progresso da aprendizagem. Além disso, essa imposição da avaliação em torno de resultados é excludente e colabora tanto para o fracasso das aprendizagens quanto para subsistência das desigualdades presentes na sociedade (FATZNER, 2010).

Apesar dos esforços e das contribuições advindas de diversos estudos e pesquisas que trouxeram novas discussões, concepções e metodologias, como as apontadas anteriormente, não foram suficientes para sanar concepções equivocadas em relação ao campo da avaliação da aprendizagem (LIMA; GRILLO; HARRES, 2010), que perduram desde o ensino fundamental até o ensino superior, como os que foram assinalados no decorrer desse texto.

Percebe-se, desse modo, que o tema em questão evolui do ponto de vista teórico, mas caminha a passos lentos em relação à mudança prática nos diversos campos de ensino, nos quais parece sempre ocupar um lugar de subalternização ou inferioridade nas discussões, contribuindo para que concepções errôneas permaneçam fomentando práticas que não contribuem para o progresso da aprendizagem, perdurando a lógica limitada de seleção e classificação.

 

Ser futuro professor de Ciências Biológicas e a relação com a avaliação da aprendizagem

Durante a formação acadêmica todo indivíduo é levado a desenvolver um conjunto de conhecimentos sobre sua área de formação, assim como imergir nas particularidades e no aprimoramento de habilidades que são necessárias para a execução de seu ofício. Nos cursos de formação docente, para além do desenvolvimento desse arcabouço teórico acerca das diversas áreas específicas das licenciaturas, encontra-se, pelo advento particular de sua ação como futuro docente, a necessidade da mobilização de um conjunto de atitudes e saberes importantes para o desenvolvimento de sua prática. Por tal particularidade, a formação inicial docente, compreende-se como um campo do conhecimento que busca entender os caminhos e as peculiaridades que estão assentadas sobre a formação dos futuros profissionais da educação básica, assim como entender e desenvolver mecanismos que garantam uma formação mais sólida. Mesmo que já venham sendo realizadas pesquisas nessa área, ainda existe uma série de tensões em torno do tema em questão, bem como reflexões teóricas que buscam oferecerem indicativos que são indispensáveis para a formação inicial docente.

Para Tardif (2014) no âmago formativo da identidade docente, existe um conjunto de saberes que estão ligados a figura do professor, esses, por sua vez, necessitam ser desenvolvidos e mobilizados não apenas durante a formação inicial, mas ao longo de sua trajetória profissional. Tais saberes provêm de diversas fontes, constituindo-se em saberes plurais.

Segundo o autor, os saberes profissionais correspondem à produção teórica que é trabalhada nos cursos de licenciatura. Os disciplinares são moldados sob a forma de disciplinas, através de faculdades e dos diversos campos do conhecimento. Os discursos, conteúdos e métodos apresentados na escola compreendem os saberes curriculares. Por fim, existem os saberes experienciais, que são produzidos no exercício da ação docente em seu cotidiano e no conhecimento do contexto em que está inserido.

 Os apontamentos feitos por Tardif (2014) abrem espaço para esclarecer a dinâmica que circunda a formação docente e suas implicações multifatoriais, visto que existe esse conjunto articulado de saberes em sua formação. Por essa perspectiva, compreende-se que a formação também deve conter singularidades que visem oferecer lugar para a articulação desses múltiplos saberes. Nessa ótica, encontra-se espaço que oferece terreno para a discussão da relação entre formação inicial e avaliação da aprendizagem.

O campo da avaliação perpassa todos os níveis de ensino, assim como tece relações e implicações com outros fatores. Dessa forma, aos cursos de formação inicial, cabe oferecer meios para que os futuros professores possam compreender os aspectos que estão imbricados na prática avaliativa. Como foi colocado por Tardif (2014), é perceptível que exista, principalmente, entre a mediação dos saberes de ordem profissional e os sabres curriculares o espaço para a compressão dos aspectos que se referem ao saber avaliar.

Outro desafio que se correlaciona com aspectos das práticas avaliativas diz respeito, ainda, ao modelo que os cursos de licenciatura estão organizados. Os estudos realizados por Gatti (2014), apontam que ocorre uma forte fragmentação entre os conhecimentos das áreas específicas e das áreas relacionados à formação docente. Além disto, esta segregação tende a valorizar mais os conhecimentos relacionados às áreas específicas, descaracterizado os cursos de licenciatura e consequentemente afetado a formação dos futuros docentes.

Como resultado desta formação desarticulada, na qual os conhecimentos pedagógicos ocupam um lugar “inferior” ou de menor importância, reverberando na identidade do profissional professor e no seu fazer docente. Diante deste contexto, o lugar da avaliação fica ainda mais subalternizado, o tema tende a ocupar pouco espaço nas discussões acadêmicas. Por tal situação, no contexto formativo a avaliação vem sendo um tema silenciado nos cursos de formação de professores (MORAES, 2011).

Outro ponto que gera tensão na formação inicial corresponde aos professores formadores. A lógica da fragmentação presente nos cursos de licenciatura não está apenas ligada aos conteúdos e currículos, como também na própria relação entre os docentes formadores. Em muitos casos, os professores que ministram disciplinas específicas (associadas à formação básica do Biólogo, como por exemplo, Zoologia e Botânica) das licenciaturas tornam-se professores sem passar por nenhum processo de formação pedagógica, havendo apenas tido experiências como o estágio obrigatório presente na pós-graduação. Tal situação pode contribuir para o exercício da sua prática docente, uma vez que podem ter desconhecimento sobre aspectos didático-pedagógicos.

Essa situação pode acarretar problemas no processo de ensino e aprendizagem nos mais diversos cursos da Educação Superior, e representa uma questão ainda mais emblemática para os cursos de licenciatura, uma vez que as aulas e procedimentos didáticos-metodológicos tendem a serem desenvolvidos de forma similar para cursos com objetivos formativos distintos. Desse modo, nota-se novamente, a lógica de fragmentação, pois os saberes relacionados à prática docente acabam ficando restritas as disciplinas de formação pedagógica (associadas à formação do licenciando, como por exemplo, Didática e Avaliação da Aprendizagem).  

Neste sentido, o desconhecimento didático-metodológico do fazer docente pode contribuir para que os professores formadores executem e encarem a avaliação baseando-se no seu processo de formação ao longo da vida e, por isso, tendem a reproduzir os modelos que foram vivenciados, não se questionando sobre sua prática. Esse fenômeno também pode ser incorporado pelos alunos das licenciaturas, pois mesmo quando há a discussão ou a realização de práticas avaliativas que fogem da lógica classificatória, são em momentos bem pontuais e não como algo corriqueiro em sua formação, logo, refletindo a influência que os professores formadores podem exercem no âmbito da formação inicial docente (FLORES, 2010).

Por isso, cabe, também, aos cursos de formação docente, despertar uma identidade docente reflexiva já no processo de formação inicial, oferecendo suporte para que possam identificar e gerir conflitos durante sua formação. Para Loughran (2009, p. 34) “Na formação de professores há uma tendência para se centrar a atenção na aquisição de destrezas de ensino e para se ofuscar a importância dos alunos futuros professores enquanto alunos e investigadores”. A atitude crítica e reflexiva fomenta o caráter investigativo no âmbito da formação de saberes essenciais, desse modo, tornando o aluno apto a se posicionar frente a demandas relacionadas à sua prática, entre elas a concepção da avaliação.

Ser docente é também estar apto a ser avaliador e avaliado, é dispor-se ao olhar atento das circunstâncias em que se produzem as situações de ensino e aprendizagem, é mostrar-se aberto para perceber a cumplicidade que há entre teoria e prática. Esta sinergia deve estar bem calcada no fazer docente, para que, desta forma, possa enxergar a avaliação como terreno frutífero para as aprendizagens. Nessa direção, Freire (1996) discorre sobre uma série de saberes que são necessários a prática docente, entre eles reflete que ensinar exige bom senso, pois ele atuará como um balizador de sua prática, contribuindo para desenvolver seu percurso de forma atenta.

No contexto da formação de professores de Ciências e Biologia, para além desses aspectos, ainda surgem demandas que estão associadas ao processo de ensino e aprendizagem que detém demandas específicas associadas à construção de saberes específicos das Ciências Naturais e as características com que esses conteúdos devem ser ensinados, pois,

É espaço de expressão das explicações espontâneas dos alunos e daquelas oriundas de vários sistemas explicativos. Contrapor e avaliar diferentes explicações favorece o desenvolvimento de postura reflexiva, crítica, questionadora e investigativa, de não aceitação a priori de ideias e informações. Possibilita a percepção dos limites de cada modelo explicativo, inclusive dos modelos científicos, colaborando para a construção da autonomia de pensamento e ação (BRASIL, 2001, p. 25).

Para alcançar tais objetivos educativos, o futuro professor deve apropriar-se de um conjunto de métodos que possibilitem alcançar o que é previsto para as disciplinas de Ciências e Biologia, valendo-se do ensino por investigação, de metodologias ativas e da busca pela alfabetização científica. Logo, ao futuro docente, cabe desenvolver a aptidão de articular os conteúdos de forma dinâmica. Já no contexto avaliativo, a mera aplicação de exames não será suficiente para avaliar o desenvolvimento do estudante dentro de uma perspectiva de formação integral. Como é posto por Pozo e Crespo (2009, p. 255) ao ultrapassar o método tradicional de ensino, também é preciso avaliar considerando “[...] o conhecimento conceitual alcançado, mas também a forma como ele se alcança, ou seja, os procedimentos e atitudes mostrados pelos alunos”.

Como visto, a avaliação da aprendizagem problematizada na formação inicial está fincada em outras questões já eminentes nos cursos de Licenciatura. No entanto, é importante que sua discussão tome proporções mais amplas não só do ponto de vista de mudanças em torno das práticas avaliativas na Educação Superior, mas também do impacto que tal tema possui na formação dos futuros professores de Ciências e Biologia e consequentemente na execução do seu fazer docente.

 

O caminho metodológico da pesquisa

Na busca de responder as questões levantadas e alcançar os objetivos definidos neste trabalho, optou-se por trabalhar sob o prisma da pesquisa quali-quantitativa. Para Flick (2013) a pesquisa qualitativa pode ser caracterizada como tendo o objetivo de analisar a subjetividade da problemática, vista segundo a perspectiva dos sujeitos na pesquisa, levando em consideração a interpretação feita pelo entrevistado.

Enquanto a pesquisa quantitativa buscou oferecer suporte para a compressão de dados de origem menos subjetiva, contribuindo para alcançar a compreensão da questão que foi levantada. Já que tende a empregar a quantificação dos dados, possibilitando análises estatísticas das mais simples as mais complexas (RICHARDSON, 1989).

Nesse estudo optou-se pela abordagem exploratória, a fim de conhecer e se aprofundar na temática investigada, pois esse tipo de pesquisa proporciona “[...] Maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses. Pode-se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições” (GIL, 2002, p. 41).

Adequando-se aos pressupostos supramencionados e tendo em vista situar o objeto de análise, adotou-se o estudo de caso como estratégia metodológica para entender as questões que envolvem o processo de avaliação da aprendizagem no contexto do ensino superior com foco na formação docente. Na concepção de González Rey (2005, p. 71) o estudo de caso se caracteriza “não como via de detenção de informação complementar, mas como momento essencial na produção de conhecimentos e constitui um processo irregular e diferenciado que se ramifica a medida que o objeto se expressa em toda sua riqueza.

A pesquisa online foi o segundo caminho percorrido para a coleta de dados. Esse tipo de procedimento é caracterizado por ter os métodos típicos da pesquisa social readequados ao modelo online utilizando a internet (FLICK, 2013). Segundo o autor, métodos para a coleta de informações dos interlocutores da pesquisa como levantamentos, entrevistas, grupos focais e a etnografia podem ser realizados por intermédios de recurso online.  Entre os métodos que podem ser utilizados para coleta de dados online, optou-se pelo uso de questionários, que na perspectiva de Lakatos e Marconi (2011), é um formidável material para a coleta de dados.

A escolha pelos recursos online se deu devido ao cenário pandêmico anunciado em março de 2020 acarretado pelo coronavírus, causador da COVID-19. As normas previstas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) indicaram o isolamento social como uma das formas de diminuir a propagação do vírus. Por essa razão a maior parte das atividades presenciais da Universidade foi suspensa, impedindo a aplicação de questionários ou realização de entrevistas de forma presencial.

Foram construídos dois tipos de questionários tendo em vista contemplarem o desígnio do estudo. O questionário A foi direcionado aos docentes e o questionário B foi direcionado aos discentes do curso supramencionado. Ambos os instrumentos possuíam questões semelhantes que serviram como eixo de análise para compreender um mesmo fenômeno segundo a versão de docentes e discentes, pois ambos compartilham a prática avaliativa, no entanto, por perspectivas e lugares distintos. Os questionários foram encaminhados para os docentes e discentes que se encaixavam nos critérios de inclusão da pesquisa via rede social e e-mails.

O estudo foi realizado junto ao curso de Licenciatura em Ciências Biológicas (LCB) do Campus I da UFPB, pertencente ao Centro de Ciências Exatas e da Natureza (CCEN). Os participantes foram 14 docentes que ministraram disciplinas para o curso de LCB nos períodos 2019.1 e 2019.2 e discentes que estão regularmente matriculados e cursando o penúltimo ou último período do curso.  Os docentes foram identificados pelo código (Docente) “D” os discentes por DCB (Discente de Ciências Biológicas) e os Planos de Curso por PCD (Plano de Curso Docente). Em cada código existe um numeral que corresponde a ordem das respostas.

Para a análise das informações provenientes dos questionários, foi utilizada a análise de conteúdo segundo Bardin (2016) e Franco (2012).

A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações. Não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações (BARDIN, 2016, p.37).

 As informações de cunho subjetivo passaram pelas seguintes etapas, como é proposto pela autora. A primeira etapa é a pré-análise que se constitui em um processo de organização do material que será analisado; a segunda etapa corresponde à exploração do material, nessa foi realizada a codificação e a definição das categorias de análise; e por fim, a terceira etapa que consistiu quando os resultados foram tratados e submetidos a processos de interpretação, inferência e crítica das informações.

 

As concepções sobre a avaliação da aprendizagem nas perspectivas docente e discente

Educador e educando desempenham papeis importantes e singulares no desenrolar da prática pedagógica, como aponta Luckesi (2011b, p. 133) ocupam níveis diferenciados de maturidade, no qual o “Educando tem o encargo de aprender e desenvolver-se, e o educador, de ensinar e dar suporte ao seu desenvolvimento”. Essa relação também se arrasta para o campo avaliativo, pois ocupam lugares distintos nesse processo, quem avalia e quem é avaliado. No entanto, ela não se desvela de forma tão límpida, podendo haver uma relação harmônica ou conflituosa, dado o grau de complexidade que assume a avaliação no contexto da Educação Superior.

Por tal cenário e compreendendo que professor e aluno vivenciam o mesmo processo de lados opostos, assumem posturas e são evocados a assumir papeis distintos. Logo as concepções sobre o mesmo objeto podem ter visões multifacetadas. Aqui assumido concepção a partir do que é descrito por Guimarães (2010).

 

[...] quando perguntamos a alguém qual é a sua concepção disto ou daquilo, o que, de um modo geral, queremos saber é o que a pessoa pensa sobre determinada coisa, que entendimento tem dessa coisa, qual é a forma como ela a vê ou encara (GUIMARÃES, 2010, p. 83).

Para isso, foi necessário debruçar-se sobre os dados que emergiram a partir dos questionários e valer-se da análise de conteúdo para traçar rotas que permitissem visualizar as concepções de avaliar na perspectiva tanto docente como discente. Relatam-se, inicialmente, as concepções da avaliação da aprendizagem segundo visão dos/as docentes e posteriormente dos/as discentes, as quais foram constituídas a partir das indagações relacionadas ao que seria avaliação da aprendizagem, qual papel desempenha no processo de ensino e aprendizagem e finalidade que possui o componente curricular que ministra.

As falas dos 14 docentes que denotam suas concepções sobre o que seria a avaliação da aprendizagem resultaram na construção de oito categorias que emergiram das diferentes perspectivas relatados por eles. A categoria de maior representatividade com 42,9% foi Avaliar conteúdo assimilado, seguida da categoria Feedback do trabalho pedagógico com 14,3%, as demais categorias (Acompanhar o desenvolvimento do aluno, Reflexão sobre o processo de ensino e aprendizagem, Mediação da aprendizagem, Mediação da aprendizagem, Análise do processo de ensinar e aprender, Processo contínuo, Diálogo e interesse nos conteúdos) representaram 7,0% cada.

As respostas que deram origem a categoria de maior representatividade revelam que os docentes ainda conservam uma visão limitada do tema em questão, uma vez que suas falas estão associadas à ideia de que a avaliação da aprendizagem está limitada ao desempenho dos estudantes nos instrumentos avaliativos aplicados, como foi colocado pelo D3: “É o processo de avaliação do domínio do assunto pelo aluno [...]” e na mesma direção pelo D4: “[...] compreender o grau de entendimento pelo discente/indivíduo de um tema ministrado ou material de leitura fornecido [...]”. De tal forma que enquadram o ato de avaliar na ação de aplicar instrumentos e verificar a capacidade dos estudantes de responder ao que foi solicitado diante do que foi ensinado durante determinado período, apenas observando elementos relacionados aos conteúdos conceituais.

Tais indicativos se entrelaçam com as reflexões que são levantadas por Olenir (2005), na qual discute sobre alguns princípios relacionados à avaliação formativa na Educação Superior. A autora enfatiza que ainda ocorre um deslocamento no ato de avaliar, o qual se centra no papel do professor, no anseio pelo alcance de objetivos já pré-estabelecidos, conservando uma avaliação de cunho somativo que se alimenta pelo aspecto conteudista e decorativo, elementos esses que puderam ser evidenciados a partir da categoria citada acima.

Além disso, a autora reflete que é necessário ressignificar o sentido que é dado a avaliação na Educação Superior, para que se torne um elemento direcionado ao desenvolvimento pleno do aluno. Nessa direção, as demais categorias abarcam a ideia da avaliação de alguns docentes do estudo, pois de suas falam também surgiram categorias que contemplam aspectos formativos da avaliação, pois trazem como elementos a reflexão, o diálogo, o feedback e a mediação inseridos no contexto do seu fazer docente.

Outro ponto que gera tensão dentro do contexto avaliativo diz respeito à compreensão daqueles que a praticam em relação ao papel que a avaliação assume dentro do processo de ensino e aprendizagem, como também a sua finalidade. A depender das concepções de educação, assim como da postura que é tomada frente ao processo de ensino e aprendizagem, a avaliação pode representar tanto uma cisão com o processo pedagógico, podendo ocupar apenas o final, sem retomadas ou entrelaçamentos, assumindo uma perspectiva tradicional e mantendo apenas a finalidade de classificação. Ainda, segundo Luckesi (2011b) outra perspectiva que também pode assumir a depender de sua condução é a de uma ação que caminha coordenada ao processo de ensino e aprendizagem, de maneira articulada e dinâmica, possuindo diversas finalidades e não apenas servindo como julgamento de valor sobre resultados obtidos.

Neste estudo foram encontradas as diferentes perspectivas a partir das respostas dos docentes. Com relação ao papel que assume a avaliação da aprendizagem dentro do processo de ensino e aprendizagem, as categorias de maior representatividade foram Feedback para reorientação da prática docente; Avaliar o ensino e aprendizagem e Mensurar a aprendizagem, sendo, também, representadas mais três categorias (Feedback sobre o ensino, Ajustar o processo de ensino e aprendizagem, Trocar informações e conhecimento).

Tomando como ponto de partida as categorias Feedback para reorientação da prática docente; Feedback sobre o ensino e Ajustar o processo de ensino e aprendizagem, é notável que os docentes, pelo menos do ponto de vista do discurso, entendem que a avaliação assume diversos papeis dentro do processo de ensino e aprendizagem. Esses, por sua vez, estão relacionados a observar não só o caminho que o estudante tem percorrido, mas assumem, também, a capacidade de olhar para o que está a oferecer as setas do caminho, como enfatizado nas seguintes falas: “[...] para avaliar e refletir sobre minha práxis pedagógica, me autoavaliando e produzindo uma nova prática pedagógica.” (D12) e “[...] guia para eu avaliar a minha atividade docente e entender se o processo está adequado [...]” (D13).

Fica nítida a preocupação centrada na própria prática, revelando a importância da avaliação enquanto instrumento que serve como um feedback para reorientar a prática, assim como para ajustamento da mesma, nessa direção Zabala (2015, p. 5) enfatiza que “[...] é preciso conhecer e poder avaliar a intervenção pedagógica dos professores, de modo que a ação avaliadora observe simultaneamente os processos individuais e grupais”.

Partindo para a questão relacionada à finalidade da avaliação da aprendizagem, no contexto do componente curricular ministrado pelos docentes, observa-se um movimento de invertida nas ideais expressas em suas falas. Enquanto, maior parte assumia uma perspectiva avaliativa alinhada ao olhar sobre sua própria prática, na finalidade da avaliação a categoria de maior representatividade foi Mensurar a aprendizagem com 46,2%. Também sendo representadas por 15,4% as categorias Feedback para reorientação da prática docente e avaliar a aprendizagem e alcance dos objetivos curriculares. As demais (Fornecer informação, Reflexão sobre a prática pedagógica) tiveram 7,7 de representatividade.

Aqui, parte dos docentes passa a retomar a concepção de avaliação alinhada a uma perspectiva tradicional e classificatória, pois voltam a trazer caraterísticas que conservam o caráter de aferição do conhecimento e orientada a ser, como aponta Zabala (2015, p. 1),

 

[...] basicamente considerada como um instrumento sancionador e qualificador, em que o sujeito da avaliação é o aluno e somente o aluno, e o objeto da avaliação são as aprendizagens realizadas segundo certos objetivos mínimos para todos (ZABALA, 2015, p. 1).

Com relação aos discentes, foi possível perceber semelhanças e divergências com relação ao papel e a finalidade do tema em questão em relação ao processo de ensino e aprendizagem.  Na visão dos discentes a avaliação vai assumir diversas concepções. 

A categoria de maior representatividade foi Mensurar a aprendizagem, que também já havia sido representada na perspectiva dos docentes, evidenciando que, mesmo ocupando lugares opostos também, podem desenvolver a mesma visão sobre o mesmo objeto. Na mesma direção que os docentes, as falas de alguns discentes direcionam a avaliação como mecanismo utilizado para aferir a aprendizagem do sujeito avaliado, como foi mencionado pelo (DCB5): “Seria avaliar o que foi absorvido pelo aluno, e partir daquilo ver o que ficou pra este, trazendo a figura do aluno como um agente passivo no processo, no qual a avaliação serve unicamente para observar a capacidade de “retenção” de conteúdo e não gera nenhum tipo de reflexão sobre o caminho percorrido, assim como também foi posto pelo (DCB13) quando diz que a avaliação é “Mecanismo aferidor da capacidade de cada aluno assimilar o assunto exposto na sala de aula.

Já outros discentes se posicionaram que a avaliação estaria mais associada a procedimentos que são desenvolvidos para avaliar o aluno e como uma área do conhecimento dedicada a estudar questões relacionadas ao processo avaliativo, sendo representadas nas categorias Metodologias utilizadas para avaliar o aluno e Área do conhecimento. Esses enveredaram para uma perspectiva mais distante da avaliação enquanto um elemento da prática docente, mas englobam o tema em uma perspectiva mais técnica.

Já para as concepções relacionadas ao papel da avaliação apontado pelos discentes, diferente dos docentes, demostraram visões diferenciadas bem mais acentuadas. Por esse cenário, resultou-se em três categorias. A primeira categoria que reflete o papel da avaliação na concepção discente foi Mediador, essa está justificada pelas respostas que apresentam uma direção apontada sempre para o sentido da avaliação que exerce o papel de oferecer informações que possam servir de orientação para rever o percurso que foi feito, tanto do lugar de quem o conduziu, neste caso, os docentes, quanto o de quem era sujeito da avaliação, o discente. Como bem foi colocado pelo DCB12:

Permitir uma atualização das práticas pedagógicas do professor, a partir do entendimento das potencialidades e necessidades do aluno, afim de potencializar a aprendizagem, tal como verificar as habilidades e competências construídas pelos estudantes durante ou ao fim de um conjunto de aulas (DCB12).

É notável que mesmo ainda na graduação o discente demostra o conhecimento da prática avaliativa como sendo, também, um elemento relacionado não apenas ao sujeito avaliado, mas que se conecta com o próprio fazer docente. Nessa mesma perspectiva o DCB3, destaca o papel da avaliação dentro do processo de ensino e aprendizagem,

 

[...] deve ser permanente do início ao fim do processo, e não apenas avaliar o aluno no final de um conteúdo/unidade com uma mera atribuição de notas. A avaliação deve ser norteadora para o professor traçar novas estratégias de ensino (DCB3).

Alguns dos demais participantes também argumentaram nessa mesma perspectiva, compreendendo o papel da avaliação para além da aplicação de testes e a classificação, mas como uma ação que permite enxergar novos cenários para os atores envolvidos no processo. Dessa maneira, visando estabelecer o acompanhamento de sua prática, encontrando conformidade com as ideias de Hoffmann, (2018, p. 18), no sentido de que “Avalia-se para conhecer, para compreender as razões das dificuldades encontradas, para promover ações efetivas, de curto e longo prazo, em benefício aos educandos, às escolas, às universidades [...]”.

 Já as outras duas categorias, foram encontradas concepções diferentes, mas que já tinham sido vistas em discussões anteriores. A categoria Técnico foi resultado das respostas que estavam associadas ao papel da avaliação sendo estabelecida como um ritual ou um processo burocrático, que não se relaciona de forma contínua com a ação do ensinar e do aprender, uma vez que se liga a momentos fragmentados, dedicados a estabelecer métodos e coletar informações que não serão utilizadas com objetivo de reflexão.

Outro papel dado à avaliação foi representado pela categoria Verificador, a qual contempla as respostas que compreendem o papel da avaliação com apontamentos para uma perspectiva tradicional, que seria relacionada a observar o grau de aprendizado dos conteúdos pelo estudante. Sendo assim, passa a ser concebida dentro da lógica classificatória, na qual se pode promover a hierarquização e processos de separação entre aprovados e não aprovados, aptos ou não aptos.

 

Professores em formação: vivências e perspectivas para atuação docente

Ao discutir sobre os saberes profissionais focando nos professores, Tardif (2000) tem apontado, entre outros, que os saberes dessa classe são também produzidos ao longo do tempo (temporais), na qual sua formação pode sofrer influências da sua história de vida e de sua formação escolar, visto que foram imersos em sua área profissional durante longo período. Sendo assim, é possível que as experiências vivenciadas na educação básica e superior possam influenciar na construção e prática dos futuros docentes.

Partindo dessas reflexões e situando no contexto aqui pesquisado, foram indagados aos futuros professores egressos de Licenciatura em Ciências Biológicas, em que momentos estariam sendo avaliado ao longo de sua formação. Foram obtidas sete categorias referentes a esse aspecto e que possuem diferentes indicativos.

As categorias de maior representatividade foram Durante a aplicação dos instrumentos avaliativos e Continuamente. Essas trazem diferentes visões, a primeira indica que o seu processo avaliativo tem se dado exclusivamente nos momentos em que foi realizado algum tipo de procedimento avaliativo, na qual se obteria alguma nota ou conceito.  Mais uma vez, indicando que as próprias visões dos discentes no que tange aos aspectos avaliativos em seu curso revelam uma forte tendência a uma concepção tradicional, classificatória e fragmentada em momentos específicos, assim também aflora nas categorias Após a divulgação dos resultados, Em cada unidade e Meio e fim do curso

Na segunda categoria (Continuamente) estão as respostas que representam os discentes que sinalizaram serem avaliados não somente através de aplicação de exames, mas ao longo do período, sendo considerados tanto elementos quantitativos como qualitativos. Sendo assim, podendo representar uma ruptura como o modelo tradicional que tem ligado a avaliação da aprendizagem como momento de fratura como ensino e aprendizagem, como qualificador final deste processo, o que pode levar os docentes em formação a refletirem sobre as reais finalidades da aprendizagem e contribuir para desenvolver uma visão critica sobre concepção classificatória que ainda permanece na educação básica, pois como sinaliza Villas Boas e Soares (2016, p. 243) aos cursos de licenciatura cabe “[...] formar profissionais da educação capazes de resolverem o dilema aprovação versus reprovação, em busca das aprendizagens de todos, sem que signifique aprovação automática”.

Além desses achados, nota-se que os estudantes que indicarem ainda serem submetidos a uma avaliação resumida pelo momento da aplicação dos instrumentos, indicam insatisfação com essa ação, ao apontarem como os docentes formadores tem concebido a avaliação da aprendizagem no curso de LCB.

Para alguns discentes do curso, a tema em questão foi atribuído aos docentes associando suas práticas permeadas por uma cultura avaliativa distante da perspectiva formativa, pois sua prática tem se traduzido em um viés class

A partir das categorias, fruto das respostas, tanto os docentes quanto os discentes possuem concepções semelhantes sobre o tema. Alguns indicam a ideia de avaliação como ação de mensurar a aprendizagem através de momentos específicos na qual ocorre a aplicação dos instrumentos avaliativos, ou seja, uma concepção tradicional, com a finalidade classificatória e assumindo um papel técnico e burocrático. Já outros associam a uma concepção mais formativa do processo, na qual se busca visualizar o caminho de aprendizagem do aluno, desenvolvendo um papel mediador e com a finalidade de promover o crescimento.

As vivências formativas dos discentes ao longo do curso, seja através dos componentes cursados ou dos programas de iniciação à docência que participaram, indicam contribuir para a formação dos futuros docentes e, mais especificamente, para sua preparação para avaliar quando for professor, no entanto, ainda havendo alguns que não detém essa mesma perspectiva. Portanto, as experiências vivenciadas ao longo da graduação não impactaram da mesma forma sobre todos.

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