Metadados do trabalho

A Gestão De Projetos Na Educação: Diagnósticos E Soluções Para Um Curso De Formação Continuada

Camila Araujo Lopes

Desde a sistematização de suas boas práticas nas décadas de 40 e 50, a gestão de projetos vem expandindo sua atuação para os mais diversos ramos, inclusive o da educação. Dentro dessa perspectiva, as áreas da gestão de projetos que deveriam ter sido priorizadas por uma ONG do setor da educação foram mapeadas a partir do diagnóstico dos problemas que os integrantes da mesma tiveram ao implementarem seus projetos em escolas públicas da Grande Vitória/ ES. Para este fim, analisou-se e tabulou-se os dados do Diagnóstico Rápido Participativo realizado com os integrantes de 2018, levando em conta a frequência, a gravidade e a possibilidade real de solução dos problemas que apareceram nas escolas. Tal identificação permitiu classificar as áreas de gestão de projetos que precisavam de uma maior atenção pela instituição, ou seja, o gerenciamento de expectativas das partes interessadas, a comunicação, o cronograma e os recursos. A proposta prevê uma mudança no escopo da formação das próximas turmas, de modo que a ONG possa focar no que de fato seja um entrave ao êxito dos projetos de seus integrantes.

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Como citar este trabalho

LOPES, Camila Araujo. A gestão de projetos na educação: diagnósticos e soluções para um curso de formação continuada. Anais do Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, 2021 . ISSN: 1982-3657. Disponível em: https://www.coloquioeducon.com/hub/anais/145-a-gest%C3%A3o-de-projetos-na-educa%C3%A7%C3%A3o-diagn%C3%B3sticos-e-solu%C3%A7%C3%B5es-para-um-curso-de-forma%C3%A7%C3%A3o-continuada. Acesso em: 16 out. 2025.

A gestão de projetos na educação: diagnósticos e soluções para um curso de formação continuada

Maximiano (2014) define projeto como uma sequência de atividades intencionadas com o objetivo de promover alguma mudança, o que complementa àquela trazida pelo PMBOK (2017) em que projeto é um esforço realizado durante determinado período a fim de criar um produto, serviço ou resultado único. Embora a sistematização dessa área tenha iniciado entre as décadas de 40 e 60 a partir do método Critical Path Method [CPM] e do programa Evaluation and Review Techniques [PERT] restritos à construção civil, ela há muito é usada para a realização de grandes empreendimentos humanos, desde a arca de Noé, passando pelas pirâmides, as grandes catedrais e o lançamento da última versão de smartphone (Maximiano, 2014).

As principais diferenças de antes para hoje talvez sejam a frequência e as áreas que utilizavam os conceitos de gestão de projetos, que deixaram de ser restritos ao campo da engenharia civil ou empreendimentos, para alcançar os mais diversos objetivos (Maximiano, 2014). No contexto escolar, por exemplo, por mais que se ouça falar sobre projeto pedagógico, aprendizagem baseada em projetos, projeto de vida ou projetos interdisciplinares, parece existir ainda um enorme desconhecimento dos passos, das ferramentas e da metodologia que essa área já produziu. Além disso, ao considerar que o corpo discente e docente é numeroso e extremamente diverso e, sabendo-se que um dos determinantes para a gestão de projetos ser mais ou menos complexa são as pessoas e as relações humanas (Maximiano, 2014), é possível vislumbrar o quão complicado pode ser a gestão de projetos no espaço escolar. Por isso, é compreensível que Moura (2017) diga que embora haja uma disposição para se implementar a cultura de projetos na educação, o cenário ainda está mais próximo do improviso.

Essa complexidade intrínseca a projetos educacionais, de acordo com Moura (2017), reside justamente no fato de que enquanto em outros projetos se produz resultados materiais, tangíveis, que podem ser testados e medidos, nos projetos educacionais os resultados não podem ser observados diretamente, exigindo instrumentos de avaliações mais sofisticados (Moura, 2017). A falta de possibilidade de criar protótipos, simulados ou testes, dificulta a gestão de projetos educacionais, já que tendem a ser atividades relacionadas aos processos de formação humana como aquisição de novos conhecimentos, valores e competências, isto é, os resultados possuem natureza abstrata,  exigindo cuidado especial para identificá-los, medi-los e avaliá-los (Moura, 2017). 

Embora a cultura do improviso seja a regra e não a exceção dentro do contexto escolar, Brito (2011) alerta que o que se alcançou com projetos educacionais provavelmente não seria possível somente com a manutenção e reparos em atividades de rotina. Talvez, o que falte ao contexto escolar seja não apenas as metodologias indicadas pelo PMBOK, mas também outras que tragam em si um caráter lúdico, assentado no desenvolvimento pessoal e comunitário rumo à autonomia. Aspectos esses intrínsecos à metodologias como o Designer Thinking e o Dragon Dreaming, cuja trajetória é dividida em quatro partes: sonhar, planejar, realizar e celebrar (Croft, 2009). 

Acrescenta-se a esse contexto escolar um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo [VUCA], em que a natureza das mudanças é inconstante, não existem certezas e a realidade é difícil de simplificar por ter um caráter dúbio (Oliveira, 2017). Algo que inclusive foi previsto pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional [LDB] - Lei 9.394/96 (Brasil, 1996) que em sua origem declara que os cinco eixos da educação são a flexibilidade, a autonomia, a responsabilidade, o planejamento e a participação. Contudo, ao olhar para a escola pública, percebe-se que ela está longe de preparar os alunos para esse mundo acima anunciado. Logo, a gestão de projetos pode ser uma boa alavanca para garantir que esses eixos façam parte de fato do ambiente escolar, já que, diante desse cenário complexo no qual a escola se encontra, realizar projetos, segundo Brito (2011), pode ser um caminho válido não apenas para diminuir os problemas que assolam a comunidade escolar, como também preparar os alunos para várias profissões que por ora não existem.

Diante do exposto, o objetivo desse trabalho é analisar as principais dificuldades que os participantes de um programa de formação de lideranças de uma Organização Não Governamental [ONG], realizado em 2018, tiveram ao implementarem seus projetos em escolas públicas vulneráveis na região da Grande Vitória (ES). A partir dos resultados obtidos, pretende-se selecionar ferramentas da área de gestão de projetos a fim de aprimorar a trilha de aprendizagem existente no programa de formação para que os conceitos abordados façam sentido no contexto escolar. Espera-se, por fim, impactar os próximos participantes do programa de forma positiva, contribuindo para a efetividade de projetos que eles possam vir a realizar nas escolas públicas nas quais serão alocados.

 

Material e Métodos

Local de estudo e contextualização

A ONG em questão é uma organização sem fins lucrativos que integra uma rede de mais ou menos 40 organizações ao redor do mundo e está em vigor desde 2016. Seu propósito é formar lideranças para a educação a partir da sala de aula por meio de um programa de dois anos. Durante esses anos, os integrantes dão aula em escolas de alta vulnerabilidade social com o apoio de mentores, complementação pedagógica para os que não possuem licenciatura e formação presencial uma vez por mês.

No início de 2018, 30 jovens foram alocados na Grande Vitória (ES) com o intuito de realizarem esse programa de formação de lideranças estratégicas na área da educação a partir da docência. Ademais a função de professor, possuíam uma carga horária extra para desenvolverem projetos no contraturno que, embora fossem importantes para gerar visibilidade, podendo propiciar empregos aos formandos da ONG após os dois anos e, em parte, para a manutenção da mesma, não houve uma preocupação em formar, orientar e acompanhar os participantes em relação aos projetos que eles desenvolviam, visto que o foco estava todo dirigido à sala de aula. 

Faz-se necessário ressaltar, por outro lado, o fato da instituição em questão, na época, atuar em mais três regiões (Caruaru - PE, Campo Grande - MS e Cuiabá - MG), totalizando mais ou menos 150 integrantes, cuja maioria entrava pela primeira vez em sala de aula. Atualmente o número de integrantes chega a 200 e, apesar de terem se retirado de Cuiabá, somaram ao programa as regiões de São Luís - MA e Petrolina - PE, ou seja, a complexidade de se pensar em uma formação única para tantos integrantes em lugares, contextos e contratos tão distintos deve ser levada em consideração nessa análise. 

Em relação à gestão de projetos, a própria instituição apoiou e incentivou grupos de trabalho em áreas que pelas limitações intrínsecas acima elencadas não conseguiram atuar.  Assim, no início de 2019, os próprios participantes começaram, por iniciativa própria, um Grupo de Trabalho [GT] com o intuito de entender o panorama geral dos projetos que foram realizados, pois perceberam a importância dos mesmos tanto para a própria visibilidade, como para a da ONG, sendo tão importantes quanto a sala de aula. Após essas constatações, a ONG em questão também reagiu e criou uma trilha virtual como forma de fomentar um conhecimento teórico sobre a área de gestão de projetos. 

Nesse âmbito, foram analisadas as principais dificuldades que os integrantes em questão tiveram para depois eleger as áreas e ferramentas da gestão de projetos que poderão ser úteis no desenvolvimento de projetos que gerem impacto na educação pública. 

 

Coleta e análise de dados

 

Para o desenvolvimento do trabalho, foram analisados os dados do Diagnóstico Rápido Participativo [DRP] aplicado pela ONG aos integrantes do ano de 2018 da região da Grande Vitória (ES). Segundo Botelho e Barros (2016), o DRP é um diagnóstico rápido participativo que parte de reflexões e críticas de quem vivenciou a experiência, fazendo com que os participantes, ao fim, apresentem consensualmente soluções para os problemas elencados. Essa técnica é composta de 7 etapas apresentadas a seguir e detalhadas no Anexo 1:

  1. Identificação de problemas de acordo com a percepção individual de cada participante do grupo;
  2. Síntese dos problemas;
  3. Hierarquização;
  4. Priorização;
  5. Soluções;
  6. Pontos positivos; e
  7.  Apresentação dos resultados.

 

Depois de realizado o DRP nas escolas, os dados colhidos foram organizados em uma planilha. Na primeira coluna, agrupou-se os problemas que se referiam a um mesmo fator, já nas adjacentes foram colocadas as notas que cada escola atribuiu e, por fim, somou-se as notas e as dividiu pelo total de escolas, isto é, onze. 

Dessa forma, foi possível identificar os problemas nos quais os integrantes como um todo atribuíram maior relevância. Em outras palavras, os problemas com maior pontuação e citados por um maior número de escolas tiveram pontuação mais elevada. Na segunda aba, elencou-se e agrupou-se as soluções que os participantes apresentaram para os problemas por escola. Na terceira, optou-se por elencar todos os projetos citados nos DRPs, colocar o nome de quem desenvolveu, assim como a pontuação final que deram, se teve ou não alguma evidência de sucesso e se houve a realização de um diagnóstico prévio. Por fim, na última, foram agrupados os feedbacks sobre o DRP por escola.

 

Resultados e Discussão

 

Acompanhamento dos projetos educacionais

 

Os 30 jovens integrantes do programa de formação de lideranças estratégicas tinham como incumbência o desenvolvimento de projetos no contraturno das escolas onde estavam alocados. No entanto, não houve, por parte da ONG, como citado anteriormente, uma metodologia de acompanhamento para a gestão dos projetos realizados. A ausência de acompanhamento foi identificada tanto no intensivão, curso presencial de um mês cuja carga horária fora de 210 horas, quanto nas formações presenciais e não presenciais após o intensivão. Isso ocorreu provavelmente porque a ONG partiu do pressuposto de que os integrantes já tivessem essa bagagem de conhecimento, o que de fato não se verifica, visto que eles vieram das mais diversas áreas,  muitas das quais não possuem na base curricular os fundamentos de gerenciamento de projetos, como por exemplo, Letras. 

O DRP apontou cerca de 63 projetos realizados nas 11 escolas em questão. Isto é, ainda que não houvesse nenhuma metodologia, existia um número significativo de projetos que poderiam ter sido melhor consolidados caso tivessem tido algum tipo de investimento ou orientação nesse sentido. 

Após iniciativas dos integrantes como a do Grupo de Trabalho [GT] em gestão de projetos, a ONG criou uma trilha em uma plataforma virtual como forma de fomentar um conhecimento teórico sobre a área. A trilha possuía dez telas: por que gerir projetos?; o que é um projeto?; estruturando o projeto na prática (iniciação, planejamento, execução, controle, finalização); métodos auxiliares (planejamento de riscos, planejamento de prazo/tempo/custo); construindo o escopo; vídeo da plataforma youtube que resume o que já foi dito; como usar aplicativos de gestão de projetos como o trello e o asana; desafio; e competências desenvolvidas. 

A trilha como um todo era bem teórica, caracterizando-se como um resumo de todos os tópicos acima elencados. Portanto, verificou-se a necessidade de adequar-se e focar no que é próprio do contexto escolar. Outra questão identificada foi a falta de ferramentas que auxiliem os integrantes a realizar cada uma das etapas descritas. As sugestões em relação ao uso do trello e do asana são insuficientes, porque se restringem a organização do cronograma e do escopo, não abrangendo partes importantes como a de stakeholders, ou seja, todas as pessoas, grupos ou instituições que podem ser impactadas pelo projeto (Carvalho, 2019), que é pouco detalhada, mesmo sendo decisiva para que o projeto ocorra ou tenha continuidade. 

 

Adaptação do DRP

 

Moura (2017) categoriza projetos sociais e educacionais como projetos que carregam em si as mesmas complexidades. Por isso, o DRP de Botelho e Barros (2016), utilizado em suas formações para diagnosticar pontos de melhoria em projetos culturais, foi adaptado para ser aplicado na ONG a fim de analisar os projetos de caráter educacional. 

O DRP foi realizado com todos os integrantes que estavam no ES e iniciaram seus trabalhos em 2018, obtendo ao fim da tabulação dos dados uma lista com os problemas mais comuns. Percebeu-se, logo no início da aplicação do DRP, que a etapa 6 era inadequada, pois, apesar de os participantes da ONG trabalharem na mesma escola e terem problemas semelhantes em relação à implementação de seus projetos, como estes não eram os mesmos, não foi possível estabelecer pontos positivos e evidências comuns ao se tentar abranger os projetos de todos os participantes, generalizando-os. Por isso, a partir dos feedbacks dados pelos integrantes, essa última etapa foi adaptada, adquirindo um outro formato.

O formato inicial da etapa 6 era composto por pontos positivos e uma pontuação de um a três, sendo um baixo, dois médio e três alto (Anexo 1). Com o objetivo de aprimorar a ferramenta para que depois fosse usada pela ONG para o monitoramento dos próximos projetos, os próprios integrantes foram sugerindo modificações, tanto no formato de aplicação, quanto em sua estrutura. Ao fim, para cada projeto realizado nas escolas, os integrantes elencaram os pontos positivos, as evidências de que o projeto deu certo e uma nota de um a três em relação ao quanto eles achavam que o projeto realizado impactou os alunos que participaram, o quanto os alunos que iniciaram o projeto se mantiveram engajados até o fim e quanto dos objetivos iniciais foram alcançados ao final (Figura 1).

 

Nome do projeto

Pontos Positivos

Evidências

Impacto

Engajamento 

Objetivos

iniciais 

           

Figura 1. Adaptação da etapa 6

Fonte: Resultados originais da pesquisa

 

Porém, problemas ainda foram constatados, pois a palavra ‘impacto’ possui um significado amplo, chegando-se à conclusão de que o termo mais adequado para o DRP ao aplicá-lo é ‘objetivo geral’, uma vez que o integrante, junto com seu tutor, poderá consultar o projeto e dizer de forma mais prática quanto do objetivo geral foi atingido até aquele momento, lembrando-se sempre de ressaltar que o impacto na área educacional geralmente é algo intangível, só visível um tempo depois que o projeto foi finalizado (Moura, 2017). Já os objetivos específicos estão relacionados às tarefas realizadas e aos resultados finais do projeto, constituindo-se como ponto crucial para acompanhar o progresso do projeto. Por isso, a etapa seis foi adaptada como demonstrada na Figura 2. 

 

Nome do projeto

Pontos Positivos

Evidências

Pontuação

Obj. Geral

Obj. Esp.

         

Figura 2. Adaptação da etapa 6

Fonte: Resultados originais da pesquisa

 

O principal desafio de quem faz o controle do projeto é justamente obter informações precisas sobre o andamento do mesmo para que tome decisões assertivas,  interferindo o mínimo possível no prazo e custo já determinados. Assim, além do DRP, tanto Moura (2017) quanto Brito (2011) propõem outra forma de realizar o monitoramento e a avaliação dos projetos educacionais, que seria por meio da definição de indicadores que quantifiquem os recursos, o trabalho que está sendo realizado, os resultado e os impactos ou benefícios estendidos. Feito os indicadores, é possível monitorar o projeto através da estrutura do Quadro Lógico ou do Processo de Medida de Resultados (PMR).

 

Análise dos dados do DRP 

Antes da aplicação do DRP nas escolas foi necessário enviar uma mensagem explicando as etapas iniciais e o como os integrantes poderiam se preparar, o que agilizou o processo em algumas escolas. Outro ponto importante do DRP foi a solicitação do feedback no final com base em três perguntas: “O que você achou da ferramenta?”; “O que mais te chamou atenção durante o processo?”; “O que eu poderia ter perguntado/ explorado mais?”. As respostas a essas perguntas foram escritas na parte de observações.

A partir da análise dos DRPs, identificou-se os problemas encontrados nos projetos desenvolvidos nas 11 escolas, que foram elencados na Tabela 1, sendo classificados segundo a nota que os integrantes de cada escola deram, a partir dos fatores frequência, dificuldade de solução e gravidade, além da frequência em que eles se repetiram nas 11 escolas.  Alguns problemas foram citados em mais de uma escola, como o caso do problema da falta de engajamento dos alunos que foi relatado em 10 escolas, e outros em apenas uma. Verificou-se que até o 8º problema apresentado na Tabela 1, pelo menos duas escolas o constataram, e a partir do 9º são questões particulares de uma única escola. Dessa forma, escolheu-se focar somente nos oito primeiros problemas, visto que eles abrangem uma quantidade maior de pessoas e escolas. 

 

Tabela 1. Lista de problemas diagnosticados nos projetos educacionais

Problemas

Nota

Falta de apoio da gestão escolar, seja porque impôs o projeto, seja porque não deu suporte, devido à falta de alinhamento adequado entre a ONG e a Direção.

7,0

Falta de engajamento dos alunos

6,4

Falta de expertise para gerir projetos

5,0

Falta de colaboração e/ou engajamento dos demais professores

4,5

Falta de recursos: financeiros, materiais, alimentação e transporte dos alunos

2,3

Não conseguir gerenciar o tempo e se sentir sobrecarregado

2,0

Falha na comunicação interna

1,6

Falta de motivação pessoal

1,3

Muita mudança do escopo por depender de muitas pessoas

0,7

10º

Falta de respeito dos professores e outros funcionários pelo trabalho dos participantes

0,6

11º

Repercussão negativa dos participantes que saíram, acarretando na falta de credibilidade daqueles que ficaram.

0,5

12º

Limitação do horário de projeto

0,5

13º

Diagnóstico e relevância do projeto para a escola

0,5

Fonte: Resultados originais da pesquisa

 

De modo geral, cada problema está relacionado com uma área de conhecimento dentro da gestão de projetos, o que leva à conclusão de que se bem trabalhadas essas áreas, pode-se chegar a uma diminuição da ocorrência dos problemas. Diagnosticar os principais problemas que a instituição enfrenta significa entender o que precisa melhorar, focar e mudar a rota na medida em que se conhece as causas. Por isso, dentre ferramentas tradicionais de gestão, pretende-se também indicar ferramentas ligadas ao método Dragon Dreaming, muito mais no intuito de sugerir do que esgotar ou determinar possibilidades, ao contrário, espera-se que esse seja um ponto de partida para outras reflexões.

O primeiro, o quarto e o sétimo problemas (Tabela 1) estão relacionados à gestão das partes interessadas e a gestão da comunicação. Em gestão de projetos, refere-se às partes interessadas como stakeholders, ou seja, todos que possuem influência para interferir no desenvolvimento ou mesmo serem afetadas pelo projeto. Os stakeholders são tão importantes que eles de fato impediram que vários projetos ocorressem nas escolas, por isso, pensar em estratégias para geri-los é crucial. Carvalho (2019) diz que é primordial identificar os stakeholders, suas influências e gerenciá-los ao longo de todo o projeto, para isso, apresenta-se a matriz de interesses, em que se classifica cada um deles a partir do poder que eles exercem (Figura 3).

 

Figura 3. Matriz de interesses dos “stakeholders

Fonte: Silva e Moratti (2014)

 

O gerenciamento das expectativas das partes interessadas está relacionado à gestão de comunicação (Carvalho, 2019) que pode ser realizada por meio de uma planilha simples com os nomes dos stakeholders, a frequência que se precisa mantê-los informados e o melhor meio para se fazer isso. Pensando no contexto escolar, em que há pouco tempo e muitos imprevistos, essa planilha pode ter o potencial de diminuir atritos e ruídos durante o processo de desenvolvimento do projeto.

O segundo, o quinto e o oitavo problemas dizem respeito à gestão de recursos que, segundo Carvalho (2019), seria organizar os recursos tangíveis do projeto e preparar a equipe.  Em outras palavras, a gestão de recursos pressupõe tanto o recurso físico quanto o humano e ambos devem ser previstos no planejamento. 

Um dos grandes entraves que os integrantes enfrentaram com relação aos recursos foi a falta de alimentação e de transporte para os alunos que participavam do projeto no contraturno, o que colocou em risco a continuidade de diversos projetos. Segundo a pirâmide das necessidades de Maslow, esse problema encontra-se na base, correspondendo à necessidade fisiológica, ou seja, diz respeito à sobrevivência de um indivíduo e à sua preservação (Carvalho, 2019). Os integrantes que conseguiram ultrapassar esse problema se depararam com outro; o engajamento dos alunos que pouco a pouco iam desistindo de participar dos projetos. 

Pensar em estratégias para motivar os alunos ao longo do projeto logo no planejamento é essencial, pois as necessidades sociais, de estima e de autorrealização devem ser consideradas pelo participante que está se desenvolvendo como líder (Carvalho, 2019). Um dos integrantes, por exemplo, pensou em diversas formas de fazer os alunos se sentirem pertencentes, como fazê-los participar de todas as etapas do projeto, ter uma camiseta específica para o grupo, levá-los em visitas técnicas para entender melhor o assunto, participar de eventos, entre outras ações.

O sexto problema está relacionado à gestão de cronograma, já que muitos dos integrantes relataram sobrecarga e envolvimento com os projetos além da capacidade de execução individual. Esses relatos demonstram uma ligação forte com a falta de delegação e divisão de tarefas, retornando a questão de gestão de recursos humanos. Talvez uma ferramenta que auxilie na resolução seja a aplicação da matriz de responsabilidades conhecida como Raci, que separa adequadamente quem deve ser responsável por cada tarefa, quem deve autorizar, ser consultado e informado (Carvalho, 2019). Outra ferramenta é a rede de tarefas, como a criada pela metodologia do Dragon Dreaming chamada de "Karrabirdt", pois, além de ser visual, ela desenvolve a auto-gestão (Croft, 2012).  

Quanto ao terceiro problema, que expõe a causa de todos os outros, no caso, a falta de conhecimento em gestão de projetos, há a trilha que foi feita na plataforma virtual voltada à gestão de projetos que poderia focar nesses pontos, com soluções práticas e ferramentas que auxiliem os integrantes a gerir da melhor forma possível seus projetos dentro do contexto escolar. 

Outro ponto importante a se ressaltar na construção da trilha e na gestão dos projetos educacionais é o diagnóstico prévio. Durante o DRP, constatou-se que 79% dos integrantes tiveram alguma evidência concreta de que seus projetos estavam realmente dando certo, no entanto, quando perguntados se fizeram algum diagnóstico prévio somente 40,3% o realizaram (Figura 4). Segundo Moura (2017) o diagnóstico faz parte da baseline, isto é, do conjunto de informações sobre a situação inicial do projeto que será usada como base de comparação para medir os resultados finais. Ou seja, se apenas 40,3% dos integrantes realizaram algum tipo de diagnóstico prévio, pelo menos metade das evidências não tem uma baseline, podendo-se inferir que ao menos metade dos projetos tiveram evidências empíricas que não podem ser comprovadas. 

 

Figura 4. Taxa de Diagnóstico e Evidências dos projetos realizados

Fonte: Resultados originais da pesquisa

 

Em comparação com o terceiro problema apresentado pelos próprios integrantes, parece muito plausível que eles não tenham feito um diagnóstico prévio e uma avaliação com base em dados que demonstrassem um resultado efetivo, pois talvez não soubessem desse fato. Faz-se necessário lembrar que os integrantes são compostos pelas mais diversas áreas, isto é, talvez muitos jamais tivessem ouvido falar em gestão de projetos. 

Por fim, terminar o DRP explicitando os pontos positivos e as evidências do que deu certo foi essencial para criar um momento de bem estar e satisfação pessoal, o que gerou reações positivas em relação à ferramenta e mesmo surpresa dos próprios integrantes em relação ao que eles tinham feito sem perceber. Nesse sentido, um fator determinante para essas sensações foi a presença do grupo de integrantes da Organização que fizeram parte da mesma escola durante todo o DRP. Como a ferramenta tem como base a criação de consensos, o grupo tem como objetivo balizar e chegar a uma conclusão mais justa tanto em relação às pontuações da primeira etapa quanto ao que diz respeito às percepções individuais sobre o próprio projeto, que muitas vezes podem estar equivocadas. Ainda que estivessem falando de algo que fizeram, alguns dos integrantes, às vezes, tinha uma percepção muito baixa sobre o que fora feito, e isso acabava sendo regulado pelos demais integrantes que lhe chamavam atenção para pontos positivos ou evidências que ele, por estar muito imerso, não enxergava.

É interessante acrescentar que Carvalho (2019), ao ressaltar o novo perfil de gerente de projetos, caracteriza-o justamente pelas competências de resolver os conflitos entre stakeholders, melhorar o desempenho da equipe, vencer os desafios da comunicação e garantir a qualidade, ou seja, parece que a pesquisa identificou problemas que estão longe de se restringirem à gestão de projetos educacionais. 

Acredita-se ainda que o DRP, ferramenta utilizada e adaptada, possa interessar não apenas para o controle de projetos educacionais realizado pela ONG em questão, mas também a coordenadores pedagógicos, no intuito de monitorar os projetos realizados no ambiente escolar e promover uma gestão mais participativa. Tal ação resultaria em diagnósticos precoces dos problemas e, consequentemente, em soluções mais rápidas e coletivas a fim de viabilizar o êxito dos projetos de ambos os setores. Nesse sentido, o DRP é uma ferramenta que se enquadra na visão de Santos (2012), quando ela diz que o planejamento participativo como um processo dentro de um ciclo de previsão, implementação e avaliação das ações deve resultar de decisões mais democráticas. A autora acrescenta que o planejamento participativo pode ser um antídoto contra a má qualidade do ensino, sendo capaz de reinventar suas práticas pelo fazer conjunto.  

Por fim, Carvalho (2019) chama a atenção logo no início de seu livro para o árduo trabalho que é convencer a alta administração da relevância de investir em gestão de projetos, o que vai de encontro justamente com o que pretendeu esse artigo, de modo que espera-se que essa pesquisa resulte em mudanças significativas na estrutura da formação dos próximos integrantes da ONG e, quem sabe, o modelo final do DRP aqui apresentado possa ser incorporado como uma boa prática dentro da gestão participativa que as escolas de todo país buscam promover nesse momento.

 

Após a análise do DRP, identificou-se que os principais problemas que os integrantes enfrentaram estavam relacionados às áreas de gestão de comunicação, de stakeholders, de recursos e de cronograma. Dessa forma, faz-se necessário um empenho em fornecer ferramentas e formação para os futuros integrantes dentro dessas áreas. Com tais informações, acredita-se que esses problemas serão diminuídos, culminando em uma maior probabilidade de sucesso, impacto e visibilidade em relação aos projetos. 

Buscou-se nessa pesquisa não apenas mapear as áreas de maior relevância para a instituição, mas também propor ferramentas para serem utilizadas no seu dia a dia. É importante frisar que o monitoramento e a avaliação dos projetos não é um encargo somente da ONG, mas da escola onde estão alocados os participantes. 

Espera-se como resultado dessa pesquisa que as informações aqui contidas possam influenciar na reestruturação da formação dos próximos integrantes da instituição, que, em última instância, serão veículos de um conhecimento em gestão de projetos que poderá ser disseminado nas escolas onde eles trabalharão, de modo que seus projetos não gerem impacto num período determinado, mas consigam interferir positivamente na forma como a gestão escolar gerencia seus próprios projetos.

 

Gostaria de agradecer a todos os integrantes da ONG que disponibilizaram seu tempo em prol dessa pesquisa.

Ambrose, G.; Paul, H. 2015. Design thinking. Bookman, Porto Alegre, RS, Brasil. 

 

Botelho, I.; Barros, J.2016. Diagnóstico Rápido Participativo. SESC, São Paulo, SP, Brasil.

 

Brasil. 1996. Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da Educação Nacional. MEC. Diário oficial da União, Brasil, 23 de dezembro de 1990. Seção 1, p. 27833.

 

Brito, J. N; Sabariz, A. L. R. 2011. Elaboração e gestão de projetos educacionais. UFSJ, São João del-Rei, MG, Brasil. 

 

Carvalho, M. M; Rabechini Jr., R2019. Fundamentos em gestão de projetos: construindo competências para gerenciar projetos. 5. ed. Atlas, São Paulo, SP, Brasil.

 

Croft, J.  2012. Planejando um projeto - como criar um “Karabirrdt”: um guia para facilitadores. Dragon Dreaming. Curitiba, PR, Brasil.

 

Crost, J. 2009. Introdução: tornando os sonhos realidade, usando Dragon Dreaming para construir um projeto extremamente bem sucedido: uma abordagem. Dragon Dreaming. Curitiba, PR, Brasil.

 

Moura, D. G; Barbosa, E. F. 2017. Trabalhando com projetos: planejamento e gestão de projetos educacionais. Vozes, Petrópolis, RJ, Brasil.

 

Oliveira, S. 2017. O Mundo VUCA da Geração Millennials. Exame. Disponível em <https://exame.abril.com.br/blog/sidnei-oliveira/o-mundo-vuca-da-geracao-millennials/> Acesso em: 10 set. 2019.

 

Maximiano, A. 2014. Administração de projetos: como transformar ideias em resultados. 5. ed. Atlas, São Paulo, SP, Brasil.

 

Project management Institute. 2017. A Guide to the Project Management Body of Knowledge (PMBOK Guide), 6. ed. PMI. Newton Square, PA, Estados Unidos. 

 

Silva, W.; Moratti, K. 2014. Análise e classificação dos Stakeholders para Gestão de Projetos. Disponível em:  <https://pmkb.com.br/artigos/analise-e-classificacao-dos-stakeholders-para-gestao-de-projetos/> Acesso em: 10 de fev. de 2020.


Santos,  C.; FERRI, Lúcia Maria C. G.; MACEDO, Mara Elisa C. M. de. 2012. O planejamento participativo da escola como prática inovadora. Cadernos de Educação, Pelotas [41]: 175 - 187, janeiro/fevereiro/abril.

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