Esse artigo busca desenvolver um Estado da Arte sobre as ruralidades contemporâneas, com enfoque na Educação Básica, a partir da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações – BDTD, desenvolvida e coordenada pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia – IBICT[i]. Os descritores utilizados foram ruralidades, educação rural, educação do campo e roça. As buscas foram realizadas a partir de cada descritor, separadamente. Como existe uma variação significativa de termos que os autores usam para os estudos das ruralidades contemporâneas, utilizamos os quatro descritores na perspectiva de mapear o conjunto de trabalhos que de algum modo sinalizam a relação que as pessoas que vivem e convivem nos espaços rurais estabelecem com as diversas formas de vida nestes espaços.
Este trabalho se inscreve no âmbito da pesquisa qualitativa, tendo caráter investigativo e descritivo sobre a produção acadêmica e científica referente à temática ruralidades. As questões de pesquisa que motivaram este levantamento foram: Quais pesquisas versam sobre ruralidades na área de Educação Básica no período de 2007-2017? Quais são as abordagens sobre ruralidades que os estudos evidenciam? Quais aportes metodológicos apresentam?
Cabe ressaltar, que as pesquisas mapeadas compõem o Estado da Arte sobre ruralidades contemporâneas no período de 2007 a 2017. Esse recorte temporal se dá em virtude das políticas públicas da educação do campo e legitimidade de marcos legais efetivados neste período buscando atender ao que institui a Resolução CNE/CEB nº 1, de 03 de abril de 2002, que apresenta as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das escolas do campo, e a ampliação dessa política educacional através da Resolução CNR/CEB nº 4, de 13 de julho de 2010, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica e do Decreto nº 7.352, de 04 de novembro de 2010, que compreende também a política nacional de Educação do Campo e o Programa Nacional de educação na Reforma Agrária – PRONERA.
[i] Este banco integra os sistemas de informação de teses e dissertações que existem em muitas instituições de ensino e pesquisa no país, estimulando a publicação e registro destas produções por meio eletrônico. Atualmente a BDTD tem 15 anos de existência e abriga 348.116 dissertações e 169.522 teses de 119 instituições.
Estado da Arte: percursos metodológicos de estudo
A construção deste estudo sobre ruralidades contemporâneas baseia-se na abordagem qualitativa. Trata-se de uma pesquisa de cunho bibliográfico e tem caráter descritivo a partir do mapeamento de produções acadêmicas e científicas. Assim, tivemos a oportunidade de inventariar pesquisas que se relacionassem com as perspectivas das ruralidades a partir de quatro descritores, quais sejam: ruralidade, educação do campo, educação rural e roça. Dessa maneira, foi necessário especificar etapas para organização, sistematização e análise de cada trabalho.
O Estado da Arte tem sido desenvolvido por vários/as pesquisadores/as que se dedicam a mapear outros estudos como objetivo de trazer à baila o que se tem feito em diversos campos do conhecimento. Neste aspecto, as pesquisas desta natureza, que se dedicam a mapear a produção científica iniciaram-se por uma revisão de investigações que têm caráter bibliográfico e são denominadas “Estado da Arte” ou “Estado do Conhecimento” (FERREIRA, 2002). Para alguns/mas autores/as, há variações no termo. No campo da educação destacam-se os estudos da professora e pesquisadora Marli André. Para essa pesquisadora, o Estado da Arte é chamado de “síntese integrativa” (ANDRÉ, 2002) ou por outra estudiosa do campo da biologia, a Ionê Inês, que denomina o Estado da Arte de “pesquisas que estudam pesquisas” (SLONGO, 2004).
Compreendemos que a proposta da construção do Estado da Arte em determinada área ou campo do conhecimento evidencia dois movimentos centrais: um de cunho da divulgação e outro da própria produção como pesquisador/a. Neste sentido, esse tipo de pesquisa aporta algumas características, a saber: 1) Impulsiona o/a pesquisador/a a mapear o que já existe de produção acadêmica e científica, dando condições para a disseminação de discussões que são legitimadas como resultados de estudos a partir de condições metodológicas aplicadas/produzidas e teorias que congregam com suas crenças e perspectivas; 2) Instiga o/a pesquisador/a a refletir sobre o que encontrou no mapeamento e o que ele/a elegerá como elemento diferenciador entre sua produção e as outras, como também, 3) Possibilita que o/a pesquisador/a pontue aquilo que converge e diverge a nível de perspectiva teórica e construção metodológica de seu estudo, visando traçar uma trajetória de pesquisa que atenda aos princípios de uma formação efetiva do tornar-se pesquisador/a.
O Estado da Arte se apresenta como uma abordagem interessante de mapeamento de estudos já realizados, sobre a qual o/a pesquisador/a pode dispor para identificar o que já foi ou não produzido em uma determinada área do conhecimento e poder, por esta condição, demarcar a singularidade das novas pesquisas que pretende desenvolver.
Para compreender como o panorama de pesquisas sobre as ruralidades contemporâneas se apresenta, buscamos: identificar quais pesquisas aparecem com a temática ruralidades; analisar quais são as temáticas investigadas e quais aportes metodológicos apresentam; mapear o quantitativo de pesquisas apresentadas em cada ano do recorte e; discutir sobre a relevância do Estado da Arte para o campo da pesquisa em educação e suas contribuições no processo inicial do percurso metodológico de pesquisador.
Neste sentido, o Estado da Arte acaba sendo uma metodologia interessante que permite ao/a pesquisador/a encontrar o que se tem estudado num determinado campo do conhecimento, como também o modo em que os estudos têm sido feito, gerando outras aprendizagens. No caso da pesquisa em tela, foi possível analisar no decênio 2007-2017 como os trabalhos se insurgem no campo da educação a partir das discussões que têm sido produzidas no contexto do que concebemos como ruralidades contemporâneas.
Foram organizadas cinco etapas da organização do Estado da Arte. Na primeira etapa foi feito o mapeamento de teses e dissertações no banco Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações – BDTD e organização de uma tabela geral contendo título, autor/a, ano de apresentação, tipo, programa/instituição/região, objetivo de pesquisa, elementos metodológicos e principais resultados da pesquisa, extraídos do resumo de cada trabalho; na segunda, procedemos com a leitura dos objetivos, elementos metodológicos e resultados finais contidos na tabela geral e categorização dos trabalhos. Já na terceira etapa foi realizada a seleção de trabalhos que mais tinham aderência com a temática ruralidades e Educação Básica. Nesta etapa, fizemos também, a leitura de capítulos teórico-metodológicos e revisão de literatura desses trabalhos. Na quarta etapa realizamos a sistematização de dados referentes às temáticas das pesquisas, tendências teóricas e elementos metodológicos e por fim, na quinta etapa realizamos a análise qualitativa dos dados (interpretação dos números).
Cada uma dessas etapas congregou aspectos metodológicos de análise que são, em seu conjunto, um procedimento importante para o processo do mapeamento, evidenciando os critérios e modos de fazer deste Estado da Arte. Isso possibilitou perceber qual o panorama do cenário das produções acadêmicas e científicas neste campo temático.
Cenário das produções acadêmicas e científicas
Como critério inicial do mapeamento dos descritores, buscamos analisar sua ocorrência nos títulos e palavras-chave de cada trabalho. Dessa forma, foi mapeado um total de 523 trabalhos e nenhum deles foi encontrado pelo descritor ruralidade. Isso já indica que os títulos dos trabalhos não trazem ruralidade como uma categoria central sobre a qual a pesquisa se desenvolve. Esse dado sugere que essa categoria não é caracterizada como central, ao menos na parte que os autores nominam suas pesquisas. O título de um trabalho científico, geralmente, evidencia as principais categorias sobre as quais o estudo foi realizado e as palavras-chave especificam categorias teóricas centrais de uma produção.
O mapeamento das produções acadêmicas e científicas defendidas no período de 2007 a 2017 nos mostra uma evolução significativa para as discussões sobre a valorização dos povos do campo no que se refere à sua diversidade local, considerando os aspectos históricos, sociais e culturais desses espaços. Na tabela 1, podemos visualizar o percentual dessas produções por ano e tipo de trabalho para compreendermos como o cenário das produções nessa área se encontra.
Tabela 1 – Teses e Dissertações por data de apresentação (2007 a 2017)
Data de apresentação |
Teses (frequência) |
Dissertações (frequência) |
Nº de trabalhos |
Percentual das produções de teses e dissertações |
2007 |
0 |
1 |
1 |
0,8% |
2008 |
4 |
6 |
10 |
8,1% |
2009 |
2 |
6 |
8 |
6,5% |
2010 |
5 |
2 |
7 |
5,7% |
2011 |
5 |
4 |
9 |
7,3% |
2012 |
4 |
8 |
12 |
9,8% |
2013 |
4 |
13 |
17 |
13,8% |
2014 |
5 |
17 |
22 |
18% |
2015 |
3 |
15 |
18 |
14,6% |
2016 |
2 |
8 |
10 |
8,1% |
2017 |
4 |
5 |
9 |
7,3% |
Fonte: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (2018).
Considerando a produção anual nos Programas de Pós-graduação podemos perceber o crescimento do número de pesquisas desenvolvidas com vista para uma maior reflexão a respeito do tema até 2014 e, depois, vai diminuindo até o ano de 2017. Conforme informações da tabela 1, temos uma grande elevação no número de trabalhos produzidos se observarmos o percentual nos anos de 2007 (0,8%) e 2008 (8,1%), isso mostra que, mesmo tendo a promulgação da lei que institui as Diretrizes operacionais para a educação do campo em 2002[i], sua efetivação ainda não consegue atingir o contingente de escolas que existem nos espaços rurais.
O ano que tem maior número de produções de teses e dissertações é 2014 com percentual de 18%, daí por diante o número de pesquisas nesta área foi diminuindo. Mas sabemos que mesmo com um número significativo de produções de pesquisas nesta área ainda perdura uma situação crítica no cenário daquelas pessoas que habitam os espaços rurais no que diz respeito ao acesso às políticas públicas em todos os sentidos.
As teses e dissertações são apresentadas conforme as propostas das linhas de pesquisas que os Programas de Pós-graduação se propõem a investigar. Assim, podemos visualizar que o maior percentual de produções (41,5%) de teses de doutorado e dissertações de mestrados está concentrado na região sudeste.
Duas observações poderão ser sinalizadas ao considerar o elevado número de produções nesta região do país. Uma versa sobre uma maior densidade[ii] existente nesta região implicando em um número significativo de organizações de grupos dos movimentos sociais, outra questão está relacionada a um número maior de universidade que tem seu banco de teses e dissertações vinculados à BDTD.
O menor percentual de produções (6,5%) está concentrado na região norte do país, logo podemos sinalizar, que um dos fatores que pode ter influência nisto é a menor densidade[iii], na qual o número de organizações sociais é pequeno e a quantidade de universidade também é reduzida.
Tabela 2 – Teses e Dissertações por região
Região |
Teses (frequência) |
Dissertações (frequência) |
Nº de trabalhos |
Percentual |
Norte |
3 |
5 |
8 |
6,5% |
Centro-Oeste |
4 |
8 |
12 |
9,8% |
Nordeste |
9 |
14 |
23 |
18,7% |
Sudeste |
15 |
36 |
51 |
41,5% |
Sul |
7 |
22 |
29 |
23,5% |
Fonte: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (2018).
O cenário das produções acadêmicas e científicas no Brasil no campo das ruralidades tem se apresentado como animador, se considerarmos as especificidade de cada região do país e propostas existentes nos Programas de Pós-graduação que se propõem receber e fomentar proposições de pesquisas sobre tal temática, levando em conta a importância de fortalecer as políticas públicas de educação e outras para os territórios rurais. Nota-se, que como em outros estudos sobre o campo educacional, as regiões sudeste e sul lideram com o maior número de produções. Esse dado tem uma relação com a densidade demográfica elevada dessas regiões, que de algum modo se justifica pelo maior número de Programas de Pós-graduação em Educação, o que favorece, consequentemente, uma elevação do número de pesquisas realizadas.
Na tabela 3, temos o quantitativo de pesquisas levantadas considerando os outros três descritores. Isso nos possibilitou identificar que os trabalhos inscritos na área das ruralidades não aparecem neste banco, mas quando buscamos as produções com os outros descritores e buscamos ler cada resumo dos trabalhos fica claro que muitos deles têm uma aderência a essa temática.
Tabela 3 – Teses e Dissertações relacionadas à temática Ruralidade
Descritor |
Nº de trabalhos (frequência) |
Ruralidade |
Nenhum trabalho |
Educação Rural |
63 trabalhos |
Educação do Campo |
394 trabalhos |
Roça |
66 trabalhos |
Total |
523 trabalhos |
Fonte: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (2018).
Lembramos que muitos desses trabalhos que apareceram a partir dos descritores apresentados não foram selecionados para compor este Estado da Arte, pela razão de que muitos deles evidenciavam outros enfoques que não tinham nenhuma relação com o campo educacional da Educação Básica. Parte destas produções tomava a educação do campo nas propostas curriculares de cursos de licenciaturas, outra parte trazia a temática com enfoque na educação popular ligada aos movimentos sociais, ou seja, a Educação Básica não era centralidade nestes trabalhos que não foram selecionados. Cabe ressaltar, que neste banco de teses e dissertações, muitos trabalhos se repetiam.
Considerando os trabalhos que versam diretamente sobre a Educação Básica, ou ainda, tomando o número geral de trabalhos pelos descritores, identificamos que 74,8% são mapeados quando utilizamos o descritor educação do campo. Isso revela que muitos Programas de Pós-graduação têm amparado e fomentado as discussões nesta área do conhecimento, possibilitando que muitos/as pesquisadores/as se debrucem na investigação de problemáticas que emergem das diversas realidades da educação do campo no país.
Como podemos perceber na tabela 4, a baixa frequência (2,4%) de trabalhos tomando o descritor roça demonstra que muitos/as pesquisadores/as não fazem a opção por tomar esta categoria teórica por não conhecer que é uma ruralidade específica e carrega uma política de sentido para grande parte da população que habita territórios rurais situados na região norte e nordeste do Brasil, mas não para a região sudeste, que congrega a maioria dos trabalhos. Pois, conforme Rios (2011) a categoria roça é definida como uma ruralidade própria dos territórios situados na região do sertão da Bahia por considerar uma semiótica da terra a partir de uma perspectiva geográfica e social de quem mora nesses espaços rurais.
As produções que apareceram com o descritor educação rural (22,8%), não se inscrevem na concepção do ruralismo, pois se nota que as dimensões teórico-metodológicas apresentam elementos e bases que congregam e se associam às ruralidades, comungando com os sentidos da luta dos povos do campo em legitimar e garantir uma educação pública de qualidade em espaços rurais, evidenciando a dinâmica de vida nestes espaços.
Tabela 4 – Teses e Dissertações selecionadas
Descritor |
Nº de trabalhos |
Percentual |
Ruralidade |
Nenhum trabalho |
0 % |
Educação Rural |
28 trabalhos |
22,8% |
Educação do Campo |
92 trabalhos |
74,8% |
Roça |
3 trabalhos |
2,4% |
Total |
123 trabalhos |
100% |
Fonte: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (2018).
O cenário de produções nos Programas de Pós-graduação em Educação e áreas afins tem apresentado um quantitativo considerável de trabalhos que abordam a perspectiva das ruralidades pelo viés da educação do campo conferindo uma abertura para discutir e investigar fenômenos que geram questionamentos no cotidiano dos contextos rurais, seja pelas condições da produção da docência em escolas rurais de caráter estrutural e curricular, ausência de políticas públicas ou pelos princípios dos movimentos sociais que não são considerados em suas comunidades.
Então, o número de produções nestes espaços da Pós-graduação revela que tem sido maior a produção de dissertações de mestrado com percentual de 68%, como podemos visualizar na tabela 5.
Tabela 5 – Tipo de trabalho
Tipo |
Quantidade |
Percentual |
Teses |
38 |
32% |
Dissertações |
85 |
68% |
Total |
123 trabalhos |
100% |
Fonte: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (2018).
No decorrer de uma década as propostas educacionais para uma educação do campo que atendesse aos princípios específicos dessas comunidades começam a se efetivar e a ganhar outras dimensões que geram condições de respeito e cumprimento de proposições legais para aqueles e aquelas que vivem e convivem em territórios rurais.
As diretrizes operacionais para a educação do campo e os decretos sancionados como forma de legitimar uma política pública específica de educação começam a dar maior visibilidade para as necessidades das comunidades rurais, gerando espaço para ouvir os povos do campo e desenvolver estudos a partir disso.
Assim, podemos compreender que de acordo às concepções abordadas nas pesquisas que compõem o banco de dados organizado para a produção do presente Estado da Arte, mesmo quando apresentam a categoria teórica Educação Rural as pesquisas buscam desenvolver uma discussão embasada nos princípios e concepções de Educação do Campo. Consideramos, a partir deste aspecto, que não há um foco em elementos fundados nas bases que cunhavam para os povos do campo uma educação ruralista que motivava o esvaziamento dos territórios rurais e reforçavam ideários de um espaço apenas de produção agrícola e de extração de matéria prima. Neste sentido, apresentamos na tabela 6 as principais concepções teóricas evidenciadas nas produções acadêmicas e científicas que integram cada conjunto por descritor.
Tabela 6 – Principais concepções teóricas por descritor
Descritores |
Principais Concepções teóricas |
Educação Rural |
Educação do campo tomada a partir da superação da categoria educação rural como fundamento do ruralismo, o mundo rural como espaço de produção de sentido e ressiginificação pela educação do campo. Movimento de transição de escolas rurais para escolas do campo. |
Educação do campo |
O termo é tomado como uma categoria que vincula à educação uma relação que está atrelada aos movimentos sociais em virtude de uma construção política e ideológica de uma Educação do campo em superação de propostas de uma educação para o campo. |
Roça |
A categoria roça integra as concepções de uma ruralidade a partir dos modos de vida em comunidades rurais e as relações que os sujeitos estabelecem com os territórios rurais que habitam, cuja relação com a urbanidade não está colocada como oposta, mas numa perspectiva de complementariedade aos espaços rurais |
Fonte: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (2018).
Conforme as concepções apresentadas, podemos compreender que as categorias congregam entre si no que diz respeito à valorização dos povos do campo, seus modos de viver e fazer a vida acontecer nestes espaços. Quando nos atemos aos conceitos de educação rural e educação do campo, percebemos que o fervor dessas pesquisas está centrado no sentido político que o termo educação do campo carrega, tomando princípios dos movimentos sociais para legitimar uma luta por uma educação que valorize as especificidades locais e a escola do campo.
A categoria roça é compreendida aqui, como uma ruralidade que toma como elemento fundante a maneira que as pessoas, que vivem e convivem em espaços rurais, utilizam para produzir a vida, bem como, dão sentido e significado ao vivido nestes espaços. Assim sendo, o conceito de roça não desconsidera os sentidos políticos que a educação do campo emprega.
Considerando as concepções teóricas que cada termo significa, percebemos que mesmo seguindo vertentes distintas para fundamentação das pesquisas e sustentação dos argumentos e especificidades de cada uma, os princípios e objetivações culminam num movimento comum, na valorização da vida e das pessoas que produzem a vida em contextos rurais.
O cenário das produções acadêmicas e científicas apresentado aqui, a partir de uma descrição e discussão do Estado da Arte sobre ruralidades, além de nos possibilitar compreender como os estudos nesta área estão sendo construídos ao longo de uma década, nos possibilitam buscar conhecer o que cada uma dessas produções tem tomado como categorias, métodos e abordagens. Por isso, temos a seguir a apresentação de alguns achados que complementam a parte descritiva deste trabalho.
Alguns achados: categorias, métodos e abordagens
Considerando a importância de analisar os trabalhos a partir do que se encontrava explícito nos resumos das teses e dissertações, de modo mais específico, o objetivo de pesquisa, elementos metodológicos e alguns resultados do estudo, fez-se necessário a organização de categorias para sistematização das 123 pesquisas selecionadas como uma maneira que possibilitasse o agrupamento dessas pesquisas a partir dos descritores presentes nos títulos e palavras-chave, em alguns casos, quando o título não deixava tão claro o descritor como elemento direcionador para as categorias elencadas recorria-se, então, ao que estava exposto no objetivo e/ou elementos metodológicos.
No que concerne às abordagem de pesquisa, destacamos aqui que, apenas 1,6% dos trabalhos tomam a abordagem quantitativa estão sistematizados na categoria Práticas educativas e 2,4% que assumem a abordagem quali-quanti e se ancoram na abordagem estrutural compõem as categorias Políticas públicas e educacional, Formação e Outros. 96% das propostas se inscrevem com uma abordagem qualitativa.
Vale destacar que as categorias especificadas para o movimento de construção do Estado da Arte e análise de estudos acadêmicos e científicos sobre ruralidades emergiram de fatores que estão articulados a políticas de sentido embutidas nos termos que aparecem nos títulos e resumos dos trabalhos. Percebemos que os estudos congregam com as condições epistemológicas de pesquisas em educação que tomam as ruralidades como modo de vida nos espaços rurais a partir de perspectivas sociológica, histórica e geográfica como base ou concepção teórico-metodológica.
Neste sentido, os trabalhos analisados evidenciam as seguintes categorias:
a) Práticas educativas - As pesquisas que compõem esta categoria versam sobre práticas educativas em escolas rurais, tomando o descritor Educação do campo com maior frequência. A perspectiva da prática educativa tem sido utilizada para discutir sobre a convivência e sentidos que os povos do campo produzem. Observa-se, ainda, que essa categoria revela como são desenvolvidas aulas e propostas didáticas e pedagógicas nos espaços da sala de aula que tratem sobre as relações étnico-raciais, compromissos ético-social-político da escola, saberes da infância, agroecologia, mediações e significações entre mundo rural e educação do campo. Temos aqui um quantitativo de 13 teses e 3 dissertações. Do total de 16 produções acadêmicas e científicas, temos 14 pesquisas numa dimensão empírica e 2 na dimensão teórica.
As escolas citadas nessas pesquisas se apresentam como espaços constituídos com classes multisseriadas, algumas situadas em assentamentos do Movimento Sem Terra – MST ou Escolas Famílias Agrícolas – EFAs. As perspectivas assumidas são de cunho fenomenológico com enfoques descritivos-compreensivo.
Quanto aos métodos apresentados, fica evidente uma variação que aborda o estudo de caso, revisão bibliográfica, proposta de prática humanizadora centrada na pedagogia freiriana, pesquisa participante e pesquisa etnográfica. As propostas de análise não são reveladas com muita frequência nos estudos que compõem esta categoria. As poucas que explicitam, apresentam as perspectivas fundadas na compreensão fenomenológica, análise temática e de conteúdo. Os dispositivos de pesquisa são compreendidos nestes estudos como observação das aulas, anotações em diário de campo e entrevistas semiestruturadas, questionários, oficinas de diálogos, roda de conversas, depoimentos, relatos orais e fotografias.
Em algumas destas produções são mencionadas bases teóricas importantes para ancorar conceitos de educação do campo, pedagogia da alternância e pedagogia da terra, tais bases tem fundamentação nas obras de Paulo Freire e Miguel Arroyo. Os sujeitos colaboradores das pesquisas aqui apresentadas são professores/as, coordenadores, estudantes, gestores/as escolares e pessoas da comunidade.
Os resultados apontados pelas pesquisas convergem bastante no que diz respeito a práticas educativas urbanocêntricas, com uma forte relação à educação tradicional que não levam em conta o contexto rural e, quando muito, apontam para a importância da valorização do conhecimento prévio e saberes locais como potência para o desenvolvimento da aprendizagem de estudantes que frequentam as escolas rurais, seja nas classes multisseriadas, escolas de assentamentos ou EFAs.
Outro fator convergente nas produções acadêmicas e científicas que ressoa é o protagonismo que é assumido pelos povos do campo. Também pode ser enfatizado que o espaço rural tem se colocado como um campo de tensão, sobretudo em locais de assentamentos e onde existem outros tipos de movimentos de organizações civis e sociais;
b) Políticas públicas e educacional - As produções acadêmicas e científicas relacionadas a esta categoria abarcam uma amplidão de aspectos que estão diretamente articulados às políticas públicas e educacionais de nosso país. Estes aspectos estão compreendidos como políticas educacionais e formação de professores/as, educação do campo numa perspectiva rural, relações de poder, campos de disputas, programas instituídos e deliberados a partir de reivindicações dos grupos sociais que habitam os territórios rurais, marcos legais que instituem a implantação e legitimam uma educação do campo e não para o campo, direitos humanos e propostas contra hegemônicas. Tais produções dão ênfase ao movimento social, econômico e político em que a educação se vincula, chamando nossa atenção para temáticas de grande relevância social, tanto no campo teórico quanto no empírico, pois das 36 pesquisas divididas em 12 teses e 16 dissertações, 18 compõem a dimensão empírica e 18 a dimensão teórica.
Estes trabalhos tomam como princípios para suas análises a perspectiva descritiva. Os métodos apresentados nestas produções estão articulados como pesquisa exploratória, bibliográfica e documental, pesquisa participante, estudo de caso, materialismo histórico-dialético. As propostas de análises estão centradas na análise do discurso e crítico dialética.
As abordagens teóricas que aparecem nestes estudos buscam fundamentar categorias como políticas educacionais, educação rural, prática pedagógica, formação de professores/as e ruralidades. Abordam, também, Programas como PRONERA, PRONACAMPO, Escola ativa, Projovem campo – Saberes da Terra, como também, documentos referentes à Constituição Federal, Plano Nacional de Educação 2014/2024, Conselho Nacional de Educação em 2002, as Diretrizes Operacionais da educação do Campo, Conferência Nacional de Educação 2010. Alguns trabalhos são produzidos com ênfase na contribuição de teóricas como Roseli Caldart, Mônica Molina e Adelaide Coutinho que trazem discussões e reflexões sobre o direito à educação.
Quanto aos dispositivos de pesquisa encontra-se em evidência a entrevista semiestruturada, questionários com questões abertas e fechadas, observações, análise documental e registros fotográficos. Os/as colaboradores/as das pesquisas são professores/as, estudantes, gestores/as municipais, diretores/as, funcionário/as e outros sujeitos da comunidade como pais, mães e outros.
Salienta-se que os resultados finais destas pesquisas têm uma relação intrínseca entre os trabalhos, no que diz respeito aos Programas específicos para escolas do campo. Esses Programas têm sido caracterizados como política de governo em algumas regiões do país. No entanto, a baixa escolaridade da população rural não é problematizada no contexto desses Programas. De igual modo, a política de formação de professores/as não tem considerado as questões do universo das comunidades rurais. Outro elemento que tem sido apontado nos resultados das pesquisas anuncia que, quando há uma política pública e/ou educacional que lance mão de propostas de formação diferenciadas vinculadas aos espaços de vida no campo há um desenvolvimento nas comunidades em que as escolas estão inseridas e, consequentemente, uma modificação nas ações e posições dos sujeitos desses espaços;
c) Diversidade - A categoria diversidade vem abarcando as produções acadêmicas e científicas que atendem às discussões relacionadas a gênero, geração e identidades. Estas pesquisas estão apresentando perspectivas outras no âmbito das ruralidades a partir de estudos desenvolvidos em contextos rurais, se colocando aqui como os processos de produção da vida e dos sentidos se dão nestes espaços. Assim, temos um total de 5 trabalhos, sendo 2 teses e 3 dissertações, em que todas as produções são consideradas na dimensão empírica.
Nestas pesquisas sistematizadas são enfatizadas as temáticas que abordam a respeito da juventude rural, a presença de homens como professores de crianças e as relações de gênero nesses espaços, identidades, discursos e saberes na escola. O termo roça é tomado como uma ruralidade específica na maioria dessas produções, propondo uma ampla discussão à luz de perspectivas sociológicas, históricas e geográfica por valorizarem os modos de vida das pessoas que vivem e convivem nestes espaços.
Em relação aos métodos presentes nestes trabalhos, temos as histórias de vida e etnografia como preponderantes. Sujeitos da pesquisa estão caracterizados como jovens residentes em territórios rurais que cursaram a Educação Básica em escolas do campo e da cidade, pais/mães, professores/as e gestores/as. Os procedimentos de análise situam-se aqui como a análise do discurso. Assim, os dispositivos de pesquisa que aparecem nestas produções são entrevistas semiestruturadas e com profundidade, pesquisa bibliográfica, depoimentos, rodas de conversas, observação-participante e caderno de anotações.
Como resultados finais vão aparecendo indicativos muito fortes a respeito de uma tendência para a divisão sexual das atividades e do trabalho nestes espaços, reforçando-se visões, posições e ações calcadas no machismo, produzindo-se uma descontinuidade a partir da presença física do gênero masculino na escola para crianças, num contexto do magistério feminilizado, em que imperam práticas docentes associadas à masculinidade tradicional heterossexual. É importante mencionar que os sujeitos que moram em espaços rurais (de)marcam seu itinerário pela escola da cidade (re)significando suas tradições, em um movimento de tradução de suas próprias experiências.
d) Formação - As pesquisas consideradas aqui, na categoria formação, compõem um total de 9 estudos, 3 são teses e 6 são dissertações. No que tange à dimensão, temos 8 trabalhos compondo a dimensão empírica e 1 na dimensão teórica. Os trabalhos apresentados versam sobre a formação de professores/as nos espaços rurais, em contextos de classes multisseriadas. A formação é tomada a partir de elementos e concepções da educação popular e representações sociais construídas por estudantes-professores/as de cursos de pedagogia. Também se apresenta a formação pelo viés das histórias de vida e formação com ênfase nas experiências. Evidenciam-se, ainda, temáticas sobre a formação no contexto dos movimentos sociais.
Quanto aos métodos utilizados nesses estudos pode-se mencionar o materialismo histórico dialético, estudo de caso, teoria das representações sociais e revisão bibliográfica. Os sujeitos, em geral, são caracterizados pelo perfil de professores/as e lideranças sindicais. No que tange aos dispositivos de pesquisa, os mesmos são compreendidos aqui como observação participante; relatos autobiográficos, entrevistas, questionários, entrevistas narrativas, questionário sócio demográfico e pesquisa documental, entrevistas semiestruturadas e estudo de caso.
No que diz respeito a elementos suscitados como propostas de análise e compreensão dos dados estão fundados na orientação do materialismo histórico dialético e por meio da análise narrativa autobiográfica, análise de conteúdos, técnica de associação livre de palavras.
O que está sendo evidenciado como resultados finais das produções acadêmicas e científicas no campo da formação se apresentam como a necessidade de um maior investimento na formação de professores/as que possibilite uma aproximação de perspectivas outras independentes dos formatos que têm sido propostos que tomam como princípios fatores de outros espaços distantes dos contextos da docência em escolas rurais.
Também são apontados como resultados as práticas desenvolvidas por professores/as em classes multisseriadas como potência, mesmo não tendo as condições mínimas e necessárias para que a docência pudesse acontecer nas localidades rurais. Estes trabalhos também apontam em seus resultados que professores/as e alunos/as estão construindo representações sociais sobre a educação do campo;
e) Movimentos sociais - Os aspectos das temáticas relacionadas aos movimentos sociais como uma categoria organizada neste mapeamento de produções acadêmicas e científicas revelam que neste contexto tem sido recorrentes as propostas sobre dilemas e perspectivas da educação em assentamentos, histórico da educação como cenário para a construção de proposições políticas da educação do campo, ruralismo pedagógico em contraponto com concepções de educação do MST, movimento popular e política pedagógica no âmbito das propostas de processos de territorialização, significações sociais imaginárias no contexto de projetos de educação do campo, educação matemática nas relações estabelecidas por camponeses/as e professores/as. Dos 13 trabalhos apresentados nesta categoria temos 5 teses e 8 dissertações. Dos 13 estudos, 8 estão na dimensão empírica e 5 na dimensão teórica.
Os métodos que ressoam nestas pesquisas, da categoria em questão, são a história oral, pesquisa bibliográfica, (auto)biográfica e pesquisa participante. As análises apresentadas no bojo de cada pesquisa, quando explícitas no resumo, evidenciam a análise de documentos e análise comparativa e interpretativa. Cabe mencionar que os/as estudiosos/as que aparecem como maior ênfase para a sustentação das discussões teóricas sobre o movimento da educação do campo tem sido Miguel Arroyo e Caldart.
Sobre dispositivos de pesquisa compreende-se que as produções têm tomado com muita frequência a utilização de fontes documentais, tais como: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Diretrizes Curriculares da Educação do Campo, Decretos, Projetos Políticos Pedagógicos, Regimentos Internos das escolas, Pareceres e outras fontes das Secretarias de Estados. Em poucas pesquisas apareceram, também, entrevista semiestruturada e observação participante.
Aparecem como sujeitos colaboradores das pesquisas jovens, pais/mães, monitores, docentes, coordenação pedagógica, alunos egressos, representantes dos movimentos sociais e membros da comunidade.
Os resultados finais dessas pesquisas mostram diversos pontos inerentes ao processo sociopolítico promovido no âmbito dos movimentos sociais que têm refletido e gerado desdobramentos outros em relação à educação em contextos dos assentamentos dos grupos do MST, pois os princípios do movimento têm potencializado o fortalecimento das comunidades rurais.
Assim, revelam-se que o ensino praticado em escolas de assentamentos tem seguido as diretrizes impostas por sistemas oficiais de ensino, ou seja, acentuando-se, ainda, características de práticas urbanocêntricas. Ao analisar como esse ensino tem sido desenvolvido, as pesquisas revelam que há discrepâncias entre as propostas de ensino que são desenvolvidas em escolas do campo, com as reais necessidades educacionais daquela população. As propostas metodológicas e didáticas são construídas por sujeitos que não estão no campo e isso é um indicador de que as necessidades educacionais não são pensadas e produzidas por sujeitos que vivem no campo. Dessa forma, os trabalhos são indicativos para reformulações de propostas educativas que possam atender à diversidade, princípios ético-político-social desses grupos;
f) Memória e História da Educação - As produções acadêmicas e científicas organizadas nesta categoria fazem uma abordagem histórica com uma ênfase nos movimentos que situam a trajetória da Educação Rural a partir de recortes temporais que possibilitam uma compreensão a respeito dos percursos educacionais vivenciados pelos povos do campo. Neste contexto, as discussões não tomam o descritivo Educação Rural a partir da proposta ruralista. Assim, ressalta-se que as discussões aderem a princípios e concepções das bases consolidadas teórica e epistemologicamente que apresentam a Educação do Campo e Ruralidades. Tais pesquisas versam também sobre a memória social e educação rural, abordando sobre as histórias de professores/as que atuaram em contextos rurais em determinadas épocas.
Dos 11 estudos, 5 são teses e 6 são dissertações. 3 compõem a dimensão teórica e 8 se encontram na dimensão empírica. Sobre os métodos identificados nestas produções, verificamos a predominância da história oral e revisão bibliográfica. Os dispositivos de pesquisa são identificados como análise de fontes documentais, depoimentos orais, fotos, matérias de jornais e revistas, bibliografias, entrevistas semiestruturadas, material didático, entrevista narrativa. Procedimentos de análise estão associados aos procedimentos de descrição e compreensão, tomando a memória como uma categoria para contribuição nas análises em alguns trabalhos. Verificamos, ainda, trabalhos que utilizam o modelo de análise do conteúdo. Observou-se, também, uma proposta que está estruturada numa vertente que se caracteriza como momentos da heurística, da crítica e da interpretação, ou seja, com fundamentos na hermenêutica. Identificamos, ainda, alguns que tem a base de análise no materialismo histórico dialético.
No que tange aos sujeitos da pesquisa, estes são professoras aposentadas, professores/as que são militantes no movimento da Educação do Campo e MST e alunos/as do ensino técnico profissionalizante em nível Médio em EFAs.
Principais resultados finais das produções apresentam que há um interesse de órgãos federativos em efetivar uma educação rural primária rural e atendimento à demanda populacional existente entre as décadas 1940 e 1950, intencionando alcançar determinado índice de instrução nas áreas rurais. Existem resultados que apontam a grande necessidade de melhorias das condições no oferecimento da educação em áreas rurais. Também são apontadas estratégias utilizadas pelas organizações governamentais e instituições que representavam o poder de grandes latifundiários para minimizar as tensões e conflitos sociais provocados pelas maneiras de ocupação e utilização da terra, tudo com ênfase na visão de um espaço rural como, apenas, espaço de produção agrícola e industrial.
g) Currículo - Na categoria em questão são discutidos temas sobre propostas curriculares contextualizadas, perspectivas que atentam a princípios e aspectos sociolinguísticos com base na realidade local, política de currículo para a educação do campo, cultura e currículo nas propostas de educação do campo e currículo com um enfoque em aspectos da diversidade sócio territorial em espaços rurais.
São 5 pesquisas identificadas nesta categoria e todas elas são produções acadêmicas e científicas caracterizadas como dissertações. Das 5 produções, 3 são associadas à dimensão empírica e as outras 2 são compreendidas na dimensão teórica.
Os métodos versam em descritivo, estudo de caso, pesquisa documental e revisão bibliográfica e os dispositivos de pesquisa são colocados como documentos oficiais, material didático, entrevistas semiestruturadas e observação participante. Perspectivas de análise estão compreendidas como análise do conteúdo, materialismo histórico dialético e análise documental. Os sujeitos da pesquisa são técnicos/as pedagógicos/as, professores/as e lideranças sociais, alunos/as e outras pessoas da comunidade local.
Alguns resultados finais apresentados nas pesquisas estão compreendidos como o entendimento do papel propositivo das organizações sociais populares no processo de contextualização do currículo da convivência como o semiárido e outras especificidades locais de cada região em espaços rurais. Também são apresentados que há um caráter privilegiado para aquelas realidades que constroem suas bases curriculares a partir das experiências dos movimentos sociais e de cada comunidade. Neste sentido, aparece como grande necessidade a formação continuada de professores/as que atuam em comunidades rurais.
h) Outros tipos - As pesquisas categorizadas aqui, apresentam uma variedade de temáticas que não se associaram a nenhuma das outras categorias especificadas anteriormente. Temos 28 produções divididas em 18 dissertações e 10 teses. Das 28 pesquisas, 18 então consideradas na dimensão empírica e 10 na dimensão teórica.
Tais produções apresentam aprofundadas discussões a respeito de abordagens sobre educação de jovens e adultos no campo em uma vertente contemporânea, modelagem matemática em escolas rurais, profissionalidade docente, territorialidade e educação do campo, geografia na educação do campo, representações sociais da educação do campo, letramento, questões epistêmico-historiográficas sobre a educação do campo no Brasil, gestão das classes multisseriadas, agroecologia nas escolas do campo, alfabetização em classes multisseriadas, sentidos produzidos a partir dos modos de vida de camponeses/as.
Os métodos identificados são pesquisa participante, etnográfico, revisão bibliográfica e os dispositivos de pesquisa se colocam como pesquisa-ação, pesquisa participante, mapa de campo, vídeos, relatórios, fotografias, códigos éticos, entrevista, observação participante, questionário, diário de campo, entrevista semiestruturada e história oral de vida.
As bases que fundamentam as análises a partir de abordagem multirreferencial, materialismo histórico-dialético, análise de conteúdo, perspectiva exploratória e descritiva, análise comparativa, perspectivas conceituais da Teoria Antropológica do Didático (TAD), da Etnomatemática e compreensivo-interpretativa. Os sujeitos da pesquisa são alunos/as e professores/as, diretores/as escolares e outras pessoas de comunidades rurais, moradores/as de assentamentos.
Alguns resultados finais indicados nos estudos dizem que a modelagem matemática na educação do campo permite uma relação entre saberes matemáticos e saberes da cultura local, bem como, a importância de práticas de escolarização como uma dinâmica de formação humana que atravessam a constituição da profissionalidade docente na educação do campo. Revelam que há uma diversidade de representações sociais sobre territórios rurais, educação do campo que apontam para processos de territorialização em busca de outras maneiras de envolvimento e desenvolvimento rural sustentável. Tem-se também um destaque para as tensões engendradas na composição do currículo da educação de adultos do campo e a resistência da imposição de práticas curriculares que atendem à realidade urbanocêntrica.
O presente Estado da Arte nos proporcionou compreender o cenário das pesquisas sobre ruralidades contemporâneas, desencadeando que a educação do campo já tem ganhado visibilidade no espaço das universidades, pois ainda persistem tentativas de imposições de lógicas urbanocêntricas para os espaços rurais numa concepção dualista e não de complementariedade. Neste sentido, foi possível analisar como os trabalhos têm revelado discussões sobre ruralidades contemporâneas, apresentando uma diversidade de categorias no campo da educação. Assim, desde práticas educativas aos processos de formação de professores/as, os estudos transversalizam temáticas que trazem para o centro das pesquisas as questões curriculares, de Programas e Políticas governamentais como forma de estudar a educação no contexto das ruralidades.
De certo modo, o estudo mostrou que há uma significativa predominância de trabalhos de cunho qualitativo, o que evidencia a preocupação de autores/as na tentativa de desenvolver pesquisas que compreendam os sentidos, as experiências e as vivências dos sujeitos no contexto das ruralidades contemporâneas. Assim, os sujeitos, suas práticas, fazeres e dizeres ganham conotações específicas e destaque no campo das pesquisas em educação. A preocupação com os elementos quantitativos não são destaques nas pesquisas mapeadas, sendo encontrado apenas um trabalho com a base quantitativa. Isso reforça a ideia de que em se tratando dessa temática, sobretudo no campo educacional, é o sujeito, suas práticas e discursos que mais interessam aos/às pesquisadores/as.
É importante ressaltar que os resumos apresentados nas teses e dissertações, de modo geral, apresentam uma estrutura variada, o que dificulta a identificação, em alguns trabalhos dos elementos necessários para que se possa ter identificação clara a respeito dos objetos de estudo. Neste sentido, os resumos nem sempre trazem de modo evidente o objetivo do estudo, os aportes teórico-metodológicos da pesquisa e resultados finais. Foi comum percebermos no resumo uma estrutura linguística que evidencia uma discussão sobre as temáticas abordadas na pesquisa. Isso foi um elemento dificultador da realização de levantamentos que fizemos nesse trabalho, fato que nos faz concluir que essa diversidade com que os resumos são produzidos tem, também, sido um elemento dificultador para quem realiza pesquisa de Estado da Arte, como a que aqui fizemos.
No conjunto dos trabalhos analisados, percebemos uma tendência de produção mais recorrente na categoria educação do campo em Programas de Pós-Graduação do sudeste do país. A densidade demográfica dessa região foi um elemento observado para justificar a recorrência da maior frequência de trabalhos. O estudo evidenciou, também, que no que tange à categoria ruralidade nenhum trabalho foi mapeado, quando considerada a existência da palavra no título.
Nos contextos de trabalhos que tomam a educação do campo como categoria central, vimos que os trabalhos refletem uma predominância da abordagem qualitativa, tendo nos professores/as e alunos/as como sujeitos por excelência das pesquisas. Percebemos, ainda, que há diferentes metodologias e dispositivos que demarcam distintas maneiras dos/as pesquisadores/as tratarem a temática.
A proposta da construção do Estado da Arte evidenciou dois movimentos centrais, considerando o levantamento bibliográfico das produções e a sistematização dos trabalhos, no que se refere à divulgação das produções acadêmicas e científicas, este impulsionou-nos como pesquisadores/as a mapear as produções existentes na área das ruralidades, possibilitando um maior conhecimento a respeito da construção metodológica e outro de nossa própria produção como pesquisadores/as que no propôs um movimento de reflexão a partir do que foi inventariado para pensar no que elegerá como elemento diferenciador entre sua produção e as outras.
[1] Este banco integra os sistemas de informação de teses e dissertações que existem em muitas instituições de ensino e pesquisa no país, estimulando a publicação e registro destas produções por meio eletrônico. Atualmente a BDTD tem 15 anos de existência e abriga 348.116 dissertações e 169.522 teses de 119 instituições.
[1] Resolução CNE/CEB 1, de 3 de abril de 2002, institui estas Diretrizes com base na legislação educacional, para atender as especificidades de contextos rurais e da diversidade existente no campo, constituindo um conjunto de princípios que podem atender aos projetos institucionais das escolas situadas em territórios rurais.
[1] 92,05 hab./km² (censo, 2010).
[1] 4,56 hab./km² (censo, 2010).
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